Quadragésimo nono episódio da série "Libertando-me" do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGR 16, Mansoa, 1964/66, enviado ao nosso blogue em mensagem do dia 24 de Dezembro de 2015.
Newark, New Yok, Newark!
Devíamos de ter na altura, talvez 8 ou 9 anos de idade, foi
quando celebrámos a “comunhão cristã”, que colocámos
nos pés a primeira protecção, uns sapatos usados,
oferecidos ou emprestados, não sabemos ao certo, pelo
companheiro Carlos, filho do Santos dos Correios de
Águeda, que tinha vindo dos lados de Leiria. Até essa
idade, era “pé descalço”, no inverno, nas manhãs de
geada, divertíamo-nos partindo o gelo das poças de água
com os pés, nos carreiros da nossa aldeia, era uma bricadeira agradável, pois o gelo derretia com mais
facilidade.
Ufa, até nos arrepiamos só de lembrar, mas é Dezembro,
ainda não vimos neve, está muito frio por aqui, mas esta
história de colocarmos nos pés a primeira protecção, para
nós, ainda é considerada “o nosso primeiro Dia de Natal”.
Deixemos o passado, nesse bonito Portugal, vamos falar
de hoje, chegámos a Nova Jersey, viemos em trânsito
para Nova Iorque, passámos na cidade de Newark,
visitámos a portuguesa Ferry Street, procurámos os
lugares nossos conhecidos, onde moravam as
personagens de que vos temos falado, está tudo
diferente, no lugar do “Bar do Minhoto” está um
Restaurante Grill, que aceita reservas via internete; onde
morava a Gracinda está um parque de estacionamento,
onde uma senhora afro-americana, nos atendeu,
embrulhada num enorme casaco e cachecol, pois o
frio era muito, teve dificuldade em receber o pagamento e
guardar o dinheiro, pois usava umas luvas sem a parte
dos dedos, onde sobressaiam umas “unhas azuis”, muito
compridas. Perguntámos se falava português ou
espanhol, pois era a “Ferry Street”, com um sorriso
matreiro, respondeu-nos qualquer coisa como, “mi non
habla”.
A Ferry Street tem algumas árvores, está limpa, alguns
canteiros com flores, onde havia a loja do Orlando está
um grande edifício de um Banco, os estabelecimentos
têm portas de vidro, não mais aquelas portas em madeira,
que “chiavam”, alguns restaurantes têm esplanadas nos
passeios, está uma Avenida para turistas.
Vamos em frente, deixámos a viatura na cidade de
Newark, seguindo de comboio, pois o estacionamento na
cidade de Nova Iorque é muito caro. Estava nevoeiro,
quase cerrado, como se dizia na minha aldeia. Atravessámos um
dos túneis do rio Hudson que desagua na
ilha de Manhattan, que é o mais densamente povoado
dos cinco bairros da cidade de Nova Iorque, que se situa na
ilha com o mesmo nome, delimitada pelos rios Hudson,
East e Harlem, sendo um dos principais centros
comerciais, financeiros e culturais do mundo. É o coração
da "Big Apple", é onde estão os arranha-céus, cujas
imagens correm o mundo, como o Empire State Building. As luzes de néon no Times Square ou os teatros da
Broadway, nós saímos na área do World Trade Center,
visitámos mais uma vez o museu educativo, dedicado ao
“11 de Setembro”, meditámos em homenagem às
vítimas, tomando em seguida o “subway” para a Rua 53,
junto da Quinta Avenida, caminhando, fomos vendo a
Catedral de São Patrício, parando por mais tempo na área
do “Rockefeller Center”, onde está a árvore de Natal que
tradicionalmente é um abeto vermelho da Noruega, sendo
iluminada por 30.000 ecológicas luzes, que envolvem
mais de cinco milhas de fio eléctrico, coroada por uma
estrela de cristal Swarovski. Esta árvore de Natal é um
símbolo mundial em Nova York, foi acesa pela primeira
vez na quarta-feira, 2 de Dezembro, com performances ao
vivo na Rockefeller Plaza, entre as Ruas 48, 51, e a
Quinta e Sexta Avenidas, onde dezenas de milhares de
pessoas todos os dias enchem as calçadas para assistir a
este evento, que milhões podem assistir em todo o
mundo pelos meios de comunicação que hoje existem.
Faz este ano 83 anos que foi iluminada pela primeira vez,
e permanecerá acesa, podendo ser visitada até ao dia 7
de Janeiro de 2016. Oxalá seja a mensageira de Paz para
todos nós, em especial para os nossos companheiros
combatentes.
Comemos “pretzels cookies”, que é um biscoito típico,
parecido com pão, feito de massa, em forma de um nó
torcido, que teve origem na Europa, provavelmente entre
os mosteiros da Idade Média, que se vende em qualquer
quiosque de rua, em Nova Yorque e não só. Continuando
a nossa jornada, vendo os edifícios da cadeia de televisão
NBC, do Rádio City Music Hall, onde em frente algumas
“Rockettes”, que são as tais raparigas que dançando,
levantam a perna esquerda ou a direita, todas ao mesmo
tempo, fazendo uma coreografia de “cabaré do século
passado”, convidam a partilharmos momentos
inesquecíveis juntos, experimentando a magia do Natal,
transformando tudo num país das maravilhas onde o “Pai
Natal” não se cansa de espalhar elogios a todos.
Parámos por momentos no “Times Square”, já andam em
montagem de estruturas para as celebrações da
passagem de ano, continuando, pela Sétima Avenida, em
direcção à estação de comboio “Pennsylvania”, que se
localiza na Rua 34, por baixo do edifício de grandes
eventos desportivos e não só, que é o célebre e histórico
“Madison Square Garden”, onde tomámos o comboio de
regresso à cidade de Newark, em Nova Jersey, de novo
na portuguesa Ferry Street, onde tivemos a sorte de
encontrar um restaurante que dá pelo nome de “Bar &
Restaurante Sagres”, com charme, num espaço
acolhedor, música ambiente, onde numa escala de dez,
damos a nota dez, onde o Henrique, um simpático jovem, que se dedicava ao ensino em Portugal e
veio para os EUA há uns anos para “ver a neve”, e que por
cá ficou, nos atendeu com simpatia, servindo-nos
“Chistorra” e “Bacalhau à Casa” com natas e camarões,
que estava bom, mesmo muito bom, oferecendo-nos no
final, um copo com vinho do Porto.
Não sabemos se era o efeito do vinho do Porto ou se
sonhávamos, mas retornando à Ferry Street, já no
regresso, em direcção ao parque de estacionamento, não
vimos roupas escuras, xailes, tranças e bigodes, mas sim
uma jovem, usava um sapato alto de cada cor, umas
meias compridas de um azul escuro, por baixo de uma
saia que parecia o lenço que a minha avó usava à cintura,
quando ia à romaria do Senhor dos Passos, na vila de
Águeda, onde uma espécie de blusa só lhe tapava parte
da frente do seu corpo, mascava “chiclets”, algumas
pinturas, não para tornar a face mais atractiva, mas sim
diferente do normal, o perfume não era exótico, era
diferente, o cabelo era curto, pintado com uma cor que
nem era verde nem azul, usava óculos à “Hollywood”, não
nos olhos, estavam colocados a segurar o cabelo, um
casaco de “cabedal” amarelo, debaixo do braço onde
usava umas cinco ou seis pulseiras que brilhavam e
completavam a história do seu vestuário, falava alto,
numa linguagem sem preconceitos, havia “frio de rachar”
mas estava excitada, recebendo o calor, talvez do cigarro
que fumava, pois era parecido com aqueles que nós
algumas vezes, quando estávamos com o moral em
baixo, fumávamos lá na então nossa Guiné, pela
coreografia talvez fosse alguma descendente da Inês,
aquela portuguesa espanholada, do nosso tempo da Ferry
Street.
Boas Festas para todos, em especial aos companheiros
combatentes e, já agora, se não é pedir muito, que
continuemos juntos pelo ano de 2016, com saúde, alegria
em ainda por cá andarmos, que nunca nos falte a panela
a cozinhar no fogão e alguma “protecção nos pés”.
Tony Borie, Dezembro de 2015
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Nota do editor
Último poste da série de 20 de dezembro de 2015
Guiné 63/74 - P15514: Libertando-me (Tony Borié) (48): Vamos para Norte