1. Mensagem de Beja Santos, dirigida ao Antóno Graça de Abreu, com conhecimento aos nossos editores:
Meu prezado António Graça Abreu e prezados tertulianos:
Enviaste ao Luís Graça, enquanto eu estava de férias, uma apreciação a uma recensão que fiz a um dos livros mais tragicómicos que me foi dado a ler nos últimos anos, acerca dos fuzilamentos dos Comandos guineenses. Aí teceste considerações de elevado teor crítico ao conteúdo da minha recensão, chegando a referir que eu tinha feito declarações infelizes.
Por razões da vida profissional e que também se prendem com a conclusão do segundo volume [do meu Diário da Guiné, 1969/70], não pude responder ao azedume do teu mail. Serei breve. Por favor, estuda. Estuda o que escreveram Marcello Caetano, Spínola e Costa Gomes. Estuda os livros dos diplomatas que de 1972 a 1974 procuraram comprar armamento em Washington, Londres, Bona e Paris.
Quando um Presidente do Conselho propõe em plena sessão do Conselho Superior de Defesa Nacional, em 1973, que a maior parte do território da Guiné não é defensável, na actual conjuntura, a retirada estratégica para os territórios da península de Bissau, que guerra não está perdida?
Quando, nesse mesmo ano de 1973, o general Spínola depois dos acontecimentos relacionados com a chegada dos mísseis terra-ar e com a tentativa bem sucedida do PAIGC em atacar quartéis na Zona Norte com foguetões refere ao ministro do Ultramar que é indispensável armamento compatível sob pena de se entrar em colapso militar, qual a situação risonha de que dispunham as Forças Armadas, quando foi respondido que não havia armamento compatível?
Quando o Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, general Costa Gomes, que se opôs à tese drástica do abandono da maior parte dos aquartelamentos, sugere superiormente a retirada de um conjunto de quartéis das Zonas Leste e Norte, que atmosfera de vitória, com que entusiasmo era possível combater?
Tudo isto está documentado, é público, é acessível a quem quiser ir às livrarias. O que ainda falta saber são duas coisas: a primeira, tem a ver com a documentação de chancelaria entre o Governo, as embaixadas e os representantes pessoais que dirigiram missões para adquirir armamento, essa documentação só estará disponível dentro de décadas; a missão secreta, em Londres, em Janeiro de 1974, entre representantes de Marcello Caetano e uma delegação do PAIGC continua por desvendar, por ambas as partes.
As guerras não se ganham nem se perdem quando as forças em contenda têm equilíbrio no que pensam e na força de que dispõem. Qualquer história da civilização explica como um avanço tecnológico pode levar à derrota de uma das forças em presença. A armada turca era muitíssimo mais forte que a frota de Afonso de Albuquerque. Só que este tinha as bombardas e a frota inexpugnável dos turcos foi desbaratada à entrada do Mar Vermelho. O mesmo se sabia em Lisboa do que representaria a entrada em cena dos MiG, era uma questão de meses (2).
Se subsistirem dúvidas sobre os livros que aqui refiro, posso levá-los para Monte Real. Aceita os melhores cumprimentos do
Mário Beja Santos.
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Nota dos editores:
(1) Vd. poste de 30 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2803: A guerra estava militarmente perdida ? (2): Não, não estava, nós é que estávamos fartos da guerra (António Graça de Abreu)
Meu prezado António Graça Abreu e prezados tertulianos:
Enviaste ao Luís Graça, enquanto eu estava de férias, uma apreciação a uma recensão que fiz a um dos livros mais tragicómicos que me foi dado a ler nos últimos anos, acerca dos fuzilamentos dos Comandos guineenses. Aí teceste considerações de elevado teor crítico ao conteúdo da minha recensão, chegando a referir que eu tinha feito declarações infelizes.
Por razões da vida profissional e que também se prendem com a conclusão do segundo volume [do meu Diário da Guiné, 1969/70], não pude responder ao azedume do teu mail. Serei breve. Por favor, estuda. Estuda o que escreveram Marcello Caetano, Spínola e Costa Gomes. Estuda os livros dos diplomatas que de 1972 a 1974 procuraram comprar armamento em Washington, Londres, Bona e Paris.
Quando um Presidente do Conselho propõe em plena sessão do Conselho Superior de Defesa Nacional, em 1973, que a maior parte do território da Guiné não é defensável, na actual conjuntura, a retirada estratégica para os territórios da península de Bissau, que guerra não está perdida?
Quando, nesse mesmo ano de 1973, o general Spínola depois dos acontecimentos relacionados com a chegada dos mísseis terra-ar e com a tentativa bem sucedida do PAIGC em atacar quartéis na Zona Norte com foguetões refere ao ministro do Ultramar que é indispensável armamento compatível sob pena de se entrar em colapso militar, qual a situação risonha de que dispunham as Forças Armadas, quando foi respondido que não havia armamento compatível?
Quando o Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, general Costa Gomes, que se opôs à tese drástica do abandono da maior parte dos aquartelamentos, sugere superiormente a retirada de um conjunto de quartéis das Zonas Leste e Norte, que atmosfera de vitória, com que entusiasmo era possível combater?
Tudo isto está documentado, é público, é acessível a quem quiser ir às livrarias. O que ainda falta saber são duas coisas: a primeira, tem a ver com a documentação de chancelaria entre o Governo, as embaixadas e os representantes pessoais que dirigiram missões para adquirir armamento, essa documentação só estará disponível dentro de décadas; a missão secreta, em Londres, em Janeiro de 1974, entre representantes de Marcello Caetano e uma delegação do PAIGC continua por desvendar, por ambas as partes.
As guerras não se ganham nem se perdem quando as forças em contenda têm equilíbrio no que pensam e na força de que dispõem. Qualquer história da civilização explica como um avanço tecnológico pode levar à derrota de uma das forças em presença. A armada turca era muitíssimo mais forte que a frota de Afonso de Albuquerque. Só que este tinha as bombardas e a frota inexpugnável dos turcos foi desbaratada à entrada do Mar Vermelho. O mesmo se sabia em Lisboa do que representaria a entrada em cena dos MiG, era uma questão de meses (2).
Se subsistirem dúvidas sobre os livros que aqui refiro, posso levá-los para Monte Real. Aceita os melhores cumprimentos do
Mário Beja Santos.
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Nota dos editores:
(1) Vd. poste de 30 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2803: A guerra estava militarmente perdida ? (2): Não, não estava, nós é que estávamos fartos da guerra (António Graça de Abreu)
(2) Já em 22 de Novembro de 1970, aquando da temerária invasão de Conacri, um dos grandes objectivos era a destruição da frota de MiG 15 e MiG 17, de origem soviética, que constituíam uma potencial ameaça às NT no CTIG. O PAIGC nunca teve aeronaves, ao que parece. Mas o regime de Sékou Touré, um dos aliado da União Soviética em África, poderia decidir em quakquer altura pô-los ao serviço do PAIGC... Felizmente, para nós, que nunca o fez. Também, ao que parece, nunca teve pilotos devidamente treinados. É possível que os MiG de Conacri não passassem, na época, de um tigre de papel... No entanto, a não-destruição dos MiG terá levado o comandante Alpoím Galvão a alterar os planos e a regressar à base, de imediato, depois de conseguida a libertação dos prisioneiros portugueses, a destruição das lanchas do PAIGC e de outros objectivos menores.
Vd. Fórum Armada: Fórum Não-Oficial da Marinha de Guerra Portuguesa > Operação Mar Verd- 2ª Parte- A decisão e a preparação
(...) "Mas em Lisboa surgiram dúvidas quanto à validade da operação, nomeadamente da parte do Ministro do Ultramar, Joaquim da Silva Cunha. Ao mesmo tempo, em Bissau, Spínola e Calvão mudavam de planos quanto à operação. Alpoim Calvão propôs que já que se fazia um incursão a Conakry, se devia aproveitar a ocasião para libertar os militares portugueses feitos prisioneiros pelo PAIGC (cerca de vinte) e que eram mantidos na cidade. Spínola concordou e os planos para a operação foram sendo feitos.
"No entanto, começaram a ser equacionados outros objectivos. Se para a Marinha existiam as lanchas Komar e P6, para a Força Aérea existiam os caças MiG-15 e MiG-17 da Guiné-Conakry que, se pilotados por soviéticos devidamente treinados (como acontecia frequentemente em países aliados da URSS) poderiam tirar partido das limitações da Força Aérea Portuguesa, cujos Fiat G-91 não estavam vocacionados para o combate aéreo. Destruir os MiG da mesma forma como se destruiriam as lanchas eliminaria esta ameaça à supremacia aérea portuguesa" (...).
Vd. Fórum Armada: Fórum Não-Oficial da Marinha de Guerra Portuguesa > Operação Mar Verde > 3ª Parte - A operação
(...) "A esta mesma hora é comunicado desde as equipas em terra que, segundo os soldados feitos prisioneiros, os Mig foram enviados para o aeródromo de Labé no dia 20, devido a uma remodelação ministerial. Uma falha da intelligence.
"Este é um grave revés para a operação já que a segurança das forças será seriamente comprometida pela possível entrada em acção dos MiG. As únicas armas anti-aéreas disponíveis são os canhões Bofors de 40mm que equipam as lanchas. Num espaço aéreo limitado como é o caso, com 10 canhões até há razoáveis hipóteses de atingir os aviões, mas os navios são alvos fáceis para um ataque aéreo. Alpoim Calvão dá ainda ordem à equipa SIERRA para destruir a pista antes de retirar, mas já não têm o morteiro e as minas de fragmentação para o poder fazer. A equipa reembarca na Hidra pelas 04h15.
"Falhada a destruição dos MiG, subsistia ainda a esperança de se encontrar Sékou Touré" (...).
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