sábado, 14 de março de 2009

Guiné 63/74 - P4029: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-Quedistas (6): O anjo da guarda do Zé de Guidaje (Giselda Pessoa)

Guiné > Região do Cacheu > Mapa de Guidaje > Em 6 de Abril de 1973, o DO 27 em que seguia a enfermeira pára-quedista Giselda Antunes, com um ferido grave, de Guidaje para o Hospital Militar de Bissau, foi ele próprio vítima do disparo de um míssil terra-ar Strela, tendo sido obrigado a aterrar de emergência em Bigene... Foi um dia trágico, esse, para a FAP e o resto das nossas tropas.

Foto: © Miguel Pessoa (2009). Direitos reservados


1. Mensagem do Miguel Pessoa, em nome de Giselda Pessoa, Srgt Enf Pára-quedista

Caro Luís

Como já tens um texto meu por publicar (o da ejecção no Guileje), mando-te agora um da Giselda, acerca de uma evacuação no Guidaje. Não é má vontade nossa... Acontece que, pelos vistos, estes sítios davam-nos bastante trabalho... Espero que o nosso companheiro António Matos (Poste 4007) não fique desagradado com esta nossa insistência, mas não é por mal... Para compensar, de aqui a uns dias mando um sobre o Cacine - sempre é um bocadinho ao lado do Guileje...
Abraço. Miguel


2. As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-Quedistas (*) >

O ZÉ DO GUIDAJE


Há quase dois anos tive a oportunidade de ser contactada pelo Zé, um velho conhecido da Guiné.

Tudo começou com um artigo publicado num jornal sobre um ex-piloto da Força Aérea na Guiné, o então Ten Miguel Pessoa, artigo esse em que era referido o facto de ele ter casado com uma ex-enfermeira pára-quedista, Giselda - eu. Contava-se também a minha ida atribulada ao Guidaje no dia em que outros aviões foram abatidos pelos mísseis Strela. Com esses dados em mão, o Zé iniciou a busca de um contacto telefónico e, tendo-o conseguido, foi-lhe fácil chegar à fala comigo.

Soube assim que o Zé era um ex-militar que tinha cumprido uma comissão de serviço na Guiné, mais concretamente no Guidaje, de onde tinha sido evacuado em 6 de Abril de 1973, e que procurava confirmar se tinha sido eu a enfermeira que tinha feito essa evacuação.

6 de Abril é uma data que está fortemente marcada na minha memória e não preciso de vasculhar papéis para saber o que sucedeu nesse dia. Dois aviões foram abatidos, um terceiro desapareceu, perderam-se três pilotos e um enfermeiro da Força Aérea, dois oficiais e um sargento do Exército, um milícia local do Guidaje. E o avião em que eu seguia para uma evacuação no Guidage quase foi abatido. Tudo isto já tem sido referido em vários sítios, até neste blogue (**).

O que não se sabe, e este telefonema veio relembrá-lo, é que o dia 6 de Abril começou para mim com uma deslocação ao aquartelamento de Guidaje, logo às primeiras horas da manhã, a fim de evacuar um militar do Exército gravemente ferido. E o mais curioso - e tocante - é que esse militar, descobria-o agora, era o Zé, o homem que estava ao telefone.

Naturalmente, tivemos uma interessante conversa, embora limitada pelo próprio meio utilizado. Mas ficou-me a ideia de poder vir a falar pessoalmente com ele, no futuro. Essa oportunidade surgiu há cerca de um ano, quando fui contactada por um responsável por uma produtora de trabalhos para o Canal História (***). Pretendia essa produtora fazer uma reportagem sobre as enfermeiras pára-quedistas em Portugal, pedindo o contributo das ex-enfermeiras para prestarem depoimentos sobre as suas experiências pessoais.

Para além de me disponibilizar para essa entrevista, lembrei-me de propor igualmente que o Zé fosse convidado a participar nessas gravações, pois certamente o seu testemunho seria interessante. Dado que concordaram, acabei por ter a oportunidade de me encontrar com o Zé em Lisboa, no decorrer dessas gravações.

O que eu me lembro, o que ele me disse e o que ficou gravado podem resumir-se, de uma forma simples, no seguinte:

O Zé encontrava-se a trabalhar na construção de um telhado de um edifício, no exterior, quando repentinamente o quartel é alvejado pelo PAIGC. Estando a descoberto naquele momento, tenta procurar um abrigo, mas quando ali chega verifica que o abrigo está cheio, principalmente com gente da população. Não tendo possibilidade de se proteger completamente, fica à entrada, meio a descoberto. Ouve de repente uma explosão muito próxima, de uma granada ou morteiro, e nesse instante sente um impacto no corpo. Leva as mãos ao corpo e retira-as cheias de sangue.

Após um período de semi-inconsciência, lembra-se de ter aberto os olhos e ver uma senhora com uma T-shirt branca e calças de camuflado, não sabendo se tinha morrido e se era o seu anjo da guarda que ali estava. Recorda ainda a evacuação no DO-27 para a BA 12 e o transporte para o Hospital. Refere-me ainda ter a plena consciência de que hoje não estaria aqui se não tivesse sido evacuado naquele momento.

Afastando a hipótese do anjo da guarda, devo concordar com ele no restante. O Zé teve a oportunidade de utilizar o único avião que nesse dia conseguiu ter êxito na evacuação de feridos do Guidaje. A gravidade do seu estado não aconselhava de modo nenhum a sua permanência no aquartelamento. O avião, em que pouco tempo depois regressei ao local, acabou por ter de aterrar de emergência em Bigene, depois de alvejado por um Strela, e não poderia tê-lo evacuado. O avião que substituiu este na missão, embora tendo aterrado no Guidaje e descolado com um ferido a bordo, desapareceu após a descolagem, nunca mais se sabendo nada do avião e das pessoas que lá seguiam. Se o Zé tivesse seguido também nesse avião, seria hoje mais uma baixa a lamentar.

O Zé deve a sua vida em grande parte à sorte, embora possa ter tido uma pequena ajuda de alguém que, não sendo anjo da guarda, estava ali precisamente para o apoiar.

Giselda Pessoa (****)

______________

Notas de L.G.:

(*) Vd. último poste desta série > 8 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3999: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-quedistas (5): Justamente recordadas no Dia Internacional da Mulher

(**) Vd. poste de 9 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3859: FAP (6): A introdução do míssil russo SAM-7 Strela no CTIG ( J. Pinto Ferreira / Miguel Pessoa)

(...) 5. Em 6 de Abril de 1973, agora no Norte do território da Guiné, a fortuna foi ainda mais madrasta para o Grupo Operacional 1201 da Guiné. Nesse dia, muito cedo, um DO-27 pilotado pelo Furriel Baltazar da Silva partiu de Bissalanca para uma missão de apoio a um sector de Batalhão, a norte do rio Cacheu. Numa das movimentações, transportando um médico e um sargento de Bigene para Guidaje, o avião não chegou ao destino.

Tendo-se perdido o contacto com aquele avião, de Bissalanca descolaram meios aéreos para tentar localizá-lo e, quase em simultâneo, descolou outro DO-27 incumbido de proceder a uma evacuação sanitária pedida pelo aquartelamento do Guidaje. O avião era pilotado pelo Fur Carvalho e levava a bordo a enfermeira pára-quedista Giselda Antunes.

Também este avião não chegaria ao seu destino: alvejado por
um míssil Strela, que o não alcançou por muito pouco, os comandos
do DO-27 ficaram tão danificados pela acção da onda de choque, que teve de regressar à base de origem. [Giselda Antunes e Miguel Pessoa vieram a casar mais tarde, tornando-se, com toda a probabilidade, num casal único em todo o mundo: ambos foram alvejados por mísseis terra-ar Strela, e escaparam os dois à morte.]

Entretanto, para substituir o avião danificado partiu de Bissalanca outro DO-27, pilotado pelo Fur António Carvalho Ferreira.

Tendo embarcado em Bigene o Major Mariz, comandante do Batalhão ali estacionado, este avião aterrou por fim em Guidaje, donde descolou mais tarde com quatro pessoas a bordo: o piloto, o major, um militar ferido e um enfermeiro para o assistir durante a viagem para Bissau. Apenas se sabe que, dadas as características da pista, descolou para norte, entrando por território do Senegal. Nunca mais foi visto!

O primeiro DO-27 desaparecido acabou por ser localizado algures no mato, entre Bigene e Guidaje. Transportado de imediato para o local em helicópteros, um pelotão de pára-quedistas limitou-se a constatar a morte dos quatro ocupantes. Nessa altura, voando na área em protecção da acção terrestre, o T-6 do major Mantovani foi abatido por outro míssil Strela, tendo o piloto morrido na queda do aparelho.

Manuel dos Santos, o homem que chefiara o grupo do PAIGC enviado à União Soviética para aprender a operar os mísseis, e que então acumulava as funções de comissário político da Frente Norte com as de comandante dos mísseis em todo o território, podia dar-se por satisfeito: naquelas poucas semanas do primeiro semestre de 1973, os seus homens desferiram um duro golpe na capacidade operacional do inimigo. (...)


(***) Em Agosto de 2007, o The History Channel [ O Canal História, ] exibiu um documentário dedicado à história destas mulheres intitulado "Entre o Céu e o Inferno - As Enfermeiras Pára-quedistas"... No You Tube > Terraweb podem ser visionados os 6 seis vídeos correspondentes a esta reportagem.

Enfermeiras Pára-quedistas - Parte 1/6 (9' 18'')

Enfermeiras Pára-quedistas - Parte 2/6 (9' 18'')

Enfermeiras Pára-quedistas -Parte 3/6 (8' 57'')

Enfermeiras Pára-quedistas Parte 4/6 (8' 56'')

Enfermeiras Pára-quedistas - Parte 5/6 (6' 39'')

Enfermeiras Pára-quedistas - Parte 6/6 (3' 41'')

Vd. também Wikipédia > Enfermeiras Pára-Quedistas


(****) Sobre a grafia Guidaje/Guidage (a Giselda escreve, como toda a gente... Guidage):

Vd. poste de 29 de Abril de 2008 >Guiné 63/74 - P2800: Em bom português nos entendemos (1): Guidaje e não Guidage (Luís Graça / Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa)

5 comentários:

Miguel disse...

Caro Luís
Perdoarás a nossa confusão com a grafia de Guidaje/Guidage, pois se nem os cartógrafos se entendemm... Reparaste certamente que a carta1/500.000 que a Força Aérea utilizava naquele tempo indicava o Guidage com "g", e posso garantir que era nesse que nós aterrávamos...
Um abraço... do tamanho da Guiné! (que nestas coisas os aviadores têm sempre a mania de ser diferentes...)
Miguel Pessoa

Miguel disse...

Uma pequena correcção ao meu comentário: "entendem" só leva um "m" no fim! (problemas de dedo gordo...)
Miguel Pessoa

Luís Graça disse...

Miguel:

Não faço finco-pé... Nem quero ser o guardião da pureza da língua... É verdade que nem os nossos, aliás, excelentes, cartógrafos militares se entendem... Na Carta de 1/50 000 consagra-se a grafia Guidaje...

http://www.ensp.unl.pt/luis.graca/guine_guerracolonial52_mapa_Guidaje.html


Fiz questão, no respectivo sítio, de deixar a minha/nossa homenagem aos valorosos cartógrafos militares portugueses. "Esta e outras cartas da Guiné resultam do levantamento efectuado em 1954 pela missão geo-hidrográfica da Guiné – Comandante e oficiais do N.H. Mandovi. A fotografia aérea é da aviação naval (Março de 1953). Restituição dos Serviços Cartográficos do Exército. Fotolitografia e impressão: Bertrand (Irmãos) Lda, Lisboa, s/d. A edição é do da Junta das Missões Geográficas e de Investigações do Ultramar, do antigo Ministério do Ultramar, s/d. Digitalização efectuada na Rank Xerox (2006)".

Em contrapartida, na carta geral da província, de 1/500 000, já tens Guidage...

http://www.ensp.unl.pt/luis.graca/guine_guerracolonial10_mapageral.html

Mas inclino-me mais para a explicação dada pelos especialistas do Ciberdúvidas, ou seja, sou a favor de Guidaje, Guileje... (Em Português europeu).

Enfim, temos aqui um pequeno conflito a resolver... Vamos admitir as duas grafias...

Anónimo disse...

D. Giselda
Sou e serei um leitor atento a todas as suas histórias, sublinho aqui o que foi dito pelo Zé de Guidaje, bem dito e crescento~lhe um S.
...AnjoS da Guarda...
Anjos que desciam do Céu ao Inferno, para de lá retirar quem necessitava.
Guarda, que pela eficácia e pericia que as caracterizava,pelo amor a carinho que tinham na sua profissão e pelo próximo, com suas mãos afugentavam a morte para lhes guardar a vida.
Sabemos que nem sempre assim pode ser, mas, milagres... só Deus.

Um abraço
António Paiva

Anónimo disse...

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