1. Mensagem de José Brás(1), ex-Fur Mil da CCAÇ 1622, Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68, com data de 13 de Março de 2009:
Luís
Este texto, sai assim, a saber a barroco, porque me saiu quase inteiro imediatamente depois de ler o do Juvenal Amado(2).
Só publicarás se entenderes que vale a pena ou pode (podes?) “entregá-lo apenas e pessoalmente ao destinatário.
Um abraço
José Brás
Pois
Pois!
Quem me dera poder nesta palavra só, pequena, circular e cheia de som, quem me dera nela apenas, sem necessidade sequer de uma sílaba mais, de uma intenção, de um gesto, de um olhar, quem me dera poder nela dizer tudo o que me enche depois de te ler, Juvenal.
Mas não posso. Não posso, pronto, não sou capaz.
Não somos capazes.
Passámos séculos às voltas com a necessidade de justificar grandezas e misérias. De buscar razões e fins. De penetrar a essência.
Construímos a ideia de Deus, inventámos os caminhos para lhe chegar e gastámos os pés em vão.
Criámos espelhos e estilhaçámo-los na raiva da imagem reflectida.
Despedaçámo-nos em cada vez que descobrimos o quase como limite.
Mil vezes nos erguemos com a última esperança, mil vezes recuperámos o folgo no repicar dos sinos.
E agora?
Sim, e agora?
Agora, somos o quê?
Somos o quê, se nem conseguimos meter toda a alma numa palavra e nos perdemos em muitas para dizer o que nem uma, sequer, deveria ser necessária. Um olhar, um gesto da mão, sei lá, seriam suficientes para garantir a fraternidade.
Vês?
Para te dizer que as lágrimas me enchem os olhos lendo-te, as voltas que já dei à palavra.
E não é a palavra. Não são as palavras que usas, a música que me trazes nelas, a linear vontade de dizê-las, que me animam.
São as memórias que carregas, o testemunho do que viste e a certeza de que não poderia eu deixar de as sentir, se as sentiste tu e as trazes agora sem queixumes, como quem diz apenas, era assim, o que é que querem.
E o problema do eu, do tu, do nós, quem o resolve?
Eles não são eles, apenas, perdidos no redemoinho da confusão com que misturamos tempos, lugares, o verbo e os sujeitos.
Diremos, prestando contas…
Cego sou, e surdo, porque passas tão perto e não te vejo, nem oiço, fazendo o teu caminho no poema de Machado, prolongamento apenas de ti próprio.
Mas gente como tu, se não me enganas, devolve-me a esperança, a certeza que uma chispa qualquer, seja onde for, poderá trazer o fogo que há milénios perseguimos.
Gente como tu é que mantém querendo continuar.
Também tu, como eu, te sentes melhor pensando homem em vez de IN, te agrada mais falar de braço que de aço. Em Alcobaça, no Alentejo, na Guiné,
Um pequeno senão, apenas.
Assim… não falamos na primeira pessoa.
Obrigado e um abraço.
José Brás
2. Comentário de CV
Quem sou eu para, perante dois textos tão bonitos, tão tocantes, tecer qualquer comentário.
Quero só aproveitar este espaçozinho para agradecer a estes dois camaradas por escreverm tão bem e por saberem despertar em nós sentimentos tão bonitos que quase nos fazem roçar a lágrima. Sim porque não é mariqiquice um homem comover-se. E a nossa idade já nos permite deixar transparecer todas as manifestações da alma.
Obrigado Juvenal Amado pela tua homenagem à(s) mulher(es)
Obrigado José Brás. Este teu texto não podia ficar só no conhecimento do Juvenal Amado. Tivemos que o partilhar com toda a Tabanca e com os demais leitores do nosso Blogue.
__________
(1) Vd. poste de 3 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3972: Blogoterapia (93): O que é difícil é ficar calado (José Brás)
(2) Vd. poste de 13 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4027: As nossas mulheres (8): A uma mãe, a todas as mães, a todas as mulheres da nossa vida (Juvenal Amado)
Vd. último poste da série de 10 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4009: Blogoterapia (96): Não chorarei a morte do Nino (Zeca Macedo, ex - 2º Ten DFE 21, Cacine, 1973/74)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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4 comentários:
Começamos a ter camaradas no blogue que escrevem como príncipes.
Um abraço ao Juvenal, ao José Brás e ao Luís Faria, este pela deliciosa estória das abelhas, escrita de um só fôlego,à Saramago, quando Saramago está no seu melhor.
António Graça de Abreu
Pois!
Semana cheia, cinzenta e não deixar muito tempo para o blogue.Erro meu.
Abri e vi a jaqueta do José Brás, e fui por aí abaixo...
Pois. Aí estão belos textos para ler e reler.
Pois, na primeira pessoa ou não, de rajada sem pontuação e a dar mais emoção ou numa leitura de transporte a passado sofrido, passado por todos vivido, conhecido e, a um pequeno clique vira presente.
Pois!
Pois é um blogue que está cada vez mais abrangente. De quando em vez parece que não...É natural - Pois então! Um abraço a todos do Torcato
É como diz o Torcato, de vez em quando o Blogue parece perfilhar uma visão, uma postura, mais "estreita", mas depois reergue-se e lá aparecem estas "pérolas" que nos deixam enternecidos. Refiro-me não só ao texto do Zé Brás como ao do Juvenal que o motivou, como também aos comentários "postados".
Hélder S.
Serei redundante, mas não consigo deixar de também vir aqui dizer de como este blogue cria situações (deixem passar a expressão) de quase plenitude. Sem nenhum intuito de menosprezar outros excelentes textos que por aqui têm passado,este "acaso" que pôs aqui, em sequência, Juvenal Amado, Luis Faria (ah, homem do caraças, 1.200 ou 1.300 e não sei quantas minas levantadas, é coisa que não vejo condecoração que o mereça..!)e José Brás, merece destaque, forte destaque. Eu que vos vi chegar nos DC-4 e DC-6 da FAP ao AB1, na Portela, durante 2 anos - de 64 a 66 - muitos feitos em merda,que me arrepiava só de pensar na mobilização (que, felizmente, nunca chegou) venho, mais de 40 anos depois, encontrar aqui a confirmação de que, apesar de tudo, vale a pena acreditar nos homens.
Bem hajam!.
João Coelho
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