sábado, 9 de julho de 2011

Guiné 63/74 – P8533: Armamento (6): As caixas de madeira ou de metal que nos causavam muito respeito (Luís Dias)


1. O nosso Camarada Luís Dias*, ex-Alf Mil At Inf da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872, Dulombi e Galomaro, 1971/74, enviou-nos mais uma mensagem desta série:

AS CAIXAS DE MADEIRA OU DE METAL QUE NOS CAUSAVAM MUITO RESPEITO

Camarigos,

Da leitura atenta do Post P8507 do Camarada Pereira da Costa, sobre a problemática das minas, voltou-me à memória algumas histórias sobre um dos maiores “terrores” que tínhamos quando saíamos para o mato ou para uma escolta em coluna auto. Era um aperto no coração, um respeito do caraças, se pensássemos naqueles bocados de madeira ou de metal que nos podiam ceifar a vida ou, pior ainda (conforme a maioria dos meus soldados referiam), deixar-nos estropiados para sempre.

A nossa zona de intervenção na Guiné (Zona Leste/Frente Bafatá Gabú Sul - como referia o IN), não seria daquelas onde a implantação de minas por parte do PAIGC fosse das mais intensas, mas iam-nas pondo e, no caso do nosso batalhão tiveram sucesso em três situações. A primeira na picada Cancolim – Galomaro com a morte de um elemento da CCAÇ3489 (Fevereiro de 1972), a segunda na picada Galomaro – Samba Cumbera (Novembro de 1972), com a morte de um elemento do Pel. Rec. da CCS e a terceira na picada Galomaro – Dulombi (Fevereiro de 1973), com ferimentos graves num condutor da CCS. Nas outras vezes e no caso da CCAÇ3491, tivemos a sorte de as detectar e levantar (minas AC e AP).

No caso das minas por nós colocadas em defesa de aquartelamentos e falando da minha companhia (CCAÇ3491), no seguimento do que fora deixado pela companhia dos velhinhos (CCAÇ2700), optou-se por colocá-las, em linha, a cerca de 600/700 m do aquartelamento (Dulombi), na denominada frente IN (ou seja donde normalmente aconteciam as flagelações do PAIGC), onde não existiam quaisquer áreas cultivadas pela população e por onde esta não transitava. As minas foram postas em cima de ferros apropriados, colocados a 1m de altura do chão e ligadas por arame de tropeçar. Para controlo das mesmas existia um trilho que corria paralelo à sua colocação e ao quartel e a cerca de 10/15 m destas, com sinalização que julgávamos suficiente e adequada para os nossos peritos em minas e armadilhas.

De vez em quando lá rebentava uma mina, normalmente de dia e era dada ordem para, passada uma meia hora, uma secção do Grupo de Combate que estivesse de serviço (com um dos furriéis de minas e armadilhas) sair para a zona, para verificação do que acontecera. Na maior parte das vezes as minas rebentavam por causa da passagem de animais, que eram aproveitados para um petisco para a companhia (especialmente impalas e gazelas). Em certa vez, até uma ave de grande porte, foi a vítima de uma mina, mas só serviu para tirar umas fotos, porque a malta não conseguiu identificar o bicho e ninguém quis degustar a peça. Assim, já era quase uma rotina, quando se dava um rebentamento e se não era seguido de algum ataque (o que nunca aconteceu), a secção do GC de serviço lá ia verificar o que se passava e repor o sistema existente. Se o rebentamento acontecesse de noite, é claro que só se lá ia no dia seguinte.

Numa destas vezes, em meados de 1972 e após mais um rebentamento oriundo da zona onde as minas anti-pessoais tinham sido implantadas, uma Secção do 3º GC, comandada pelo Furriel Castanheira (infelizmente já falecido), dirigiu-se para o local. Passado algum tempo, o pessoal do quartel foi alertado por uma segunda explosão e, segundos depois, uma outra. O quartel entrou em alvoroço e quase desorganizadamente um grupo formou-se e arrancou para a zona, onde todos temíamos o pior. Ao aproximarem-se da área minada, com todo o cuidado, deram com quatro feridos, entre eles o furriel, que foram rapidamente levados para o quartel, onde eram aguardados pela equipa de enfermagem e, face aos cuidados que inspiravam, foram evacuados por helicóptero para o HM de Bissau.

Por um lapso de orientação do comandante de secção, quando a equipa iniciava a contagem das minas, através de uma marcação existente e previamente sinalizada, cruzou a linha do sistema, tropeçando num dos arames que as ligavam, dando origem ao rebentamento de outra mina (accionada pelo próprio furriel). Após o rebentamento, um outro elemento da secção desorientou-se com a explosão e fugiu tropeçando noutro arame e rebentando uma segunda mina.

Felizmente e por qualquer milagre (!!!), não obstante terem sofrido diversos ferimentos, produzidos por muitos estilhaços, ficando, como se diz, feitos num crivo (o furriel foi inclusive atingido no escroto), uns tempos depois estavam de volta à companhia, depois de uma estadia em Bissau, para recuperação.

O sistema de sinalização foi revisto, mas também nunca mais houve saídas para ir controlar os rebentamentos daquela forma. Os procedimentos tiveram de ser alterados.

Os cuidados que as minas nos causavam intensificavam-se quando estivámos de intervenção em outras áreas do Leste, nomeadamente quando estivemos de reforço em Piche, Nova Lamego e depois em Pirada (aqui por poucos dias).

Em Pirada, eu tinha referido aos elementos do meu GC que o IN aqui colocava minas pessoais diferentes das utilizadas na nossa zona de origem e tinham tácticas diferenciadas de colocação das mesmas (mormente as denominadas viúvas negras) e que, aquando de colunas, em caso de paragem, deveriam ter cuidado em não sair da picada, procurando abrigarem-se junto das mesmas, porque eles colocavam minas com frequência junto de árvores que pudessem servir de abrigo.

Numa coluna auto, perto de finais de Dezembro de 1973, que pretendia abastecer Copá com munições (tinha sofrido um forte ataque já quase não tinham granadas de morteiro 81 mm, por exemplo), a partir de Pirada, na picada iam surgindo diversas minas AC semeadas em profusão, sendo que em muitas delas o IN nem se dera ao cuidado de as cobrir com terra, ou seja estavam bem à vista. As equipas de sapadores da CCS do batalhão iam fazendo o seu trabalho, procedendo ao levantamento das mesmas, mas já estavam a ficar cansados do esforço (suavam em bica) e possivelmente a pensarem que a qualquer momento algo podia correr mal. Com esta situação a coluna avançava devagar e era obrigada a parar inúmeras vezes. A determinada altura o comandante do batalhão deu ordem para regressar ao quartel, pois verificou que dificilmente conseguiríamos atingir Copá ainda de dia ou sem sofrer algum dissabor grave. Quando uma das berliets que estava atribuída ao meu GC iniciou a manobra de inversão de marcha, saindo da picada e indo passar junto a uma árvore, rebentou uma mina AP que lhe destruiu o pneu da frente (lado contrário ao do condutor). Aqui estava a situação que eu previra, o que não previra é que um dos meus soldados não tenha ligado nenhuma ao que eu havia dito e face ao calor fora colocar-se debaixo da mesma árvore procurando abrigo na sombra da mesma. Por sorte dele, colocou-se do lado contrário onde estava a mina AP e por isso, por esse acaso da sua sorte, não sofreu nada com o rebentamento, nem a pisou. É que estávamos no fim da comissão (aliás já tinha terminado o tempo em Outubro, mas só sairíamos da Guiné em finais de Março de 1974) e mesmo no fim ele poderia ter sofrido ferimentos graves ou a morte.

Luís Dias
Alf. Mil da CCAÇ3491/BCAÇ3872 (Dulombi/Galomaro)
____________
Nota de M.R.:

Vd. poste anterior desta série em:

20 comentários:

Juvenal Amado disse...

caro Luís

Tens razão ao medo que nos provocavam as minas. A Berliet que eu conduzia normalmente andava atulhada de sacos de areia, mas mesmo assim temia-mos as minas reforçadas com projecteis não rebentados, que eles punham junto de uma simples mina anti pessoal.
Essas destruíam completamente a viatura.
Falas nas minas do nosso sector que infelizmente não foram detectadas e fizeram estrago.
No caso da que rebentou na nossa coluna para o Saltinho para recolhermos para quedistas, o nosso camarada que accionou o engenho ficou quase destruído da cintura para baixo, o que nos dá a ideia da violência do explosivo que lá estava.
Em Cancolim haviam fornilhos comandados à distância. Uma noite que estivemos à espera de sermos atacados, um trovoada fez explodir uma dessas armadilhas e o resultado foi o mergulho nas valas cheias de água barrenta.
Em Galomaro depois do ataque, foram montadas minas que ficavam à superfície viradas para a frente. A forma de as accionar era por meio de fio ligado a baterias, que ficavam no abrigo da ferrugem. Felizmente não chegaram a ser utilizadas, mas lá está o ditado que diz «depois da casa assaltada põem-se trancas na porta».

Um abraço

Torcato Mendonca disse...

Era uma arma "cobarde" e muitas vidas e feridos graves causou.

Levava ,geralmente,nas colunas e não só material para as rebentar. Fácil, simples e barato. A dois contos a peça...AC e um a AP.

Só montei, a ultima vez que estive em Candamã seis fornilhos de disparo eléctrico ...eram comandados de dois abrigos por mim e por um Furriel.
Má sorte, em dia de forte trovoada, 13 de Outubro 69 (diz a Agenda), forte trovoada com caída de raio na antena horizontal, por simpatia mandou tudo ao ar...uns dois ou três atordoados, o rádio para a sucata e final de armadilhas. Tínhamos o final da comissão a mês e meio...

Ab T

Torcato Mendonca disse...

Era uma arma "cobarde" e muitas vidas e feridos graves causou.

Levava ,geralmente,nas colunas e não só material para as rebentar. Fácil, simples e barato. A dois contos a peça...AC e um a AP.

Só montei, a ultima vez que estive em Candamã seis fornilhos de disparo eléctrico ...eram comandados de dois abrigos por mim e por um Furriel.
Má sorte, em dia de forte trovoada, 13 de Outubro 69 (diz a Agenda), forte trovoada com caída de raio na antena horizontal, por simpatia mandou tudo ao ar...uns dois ou três atordoados, o rádio para a sucata e final de armadilhas. Tínhamos o final da comissão a mês e meio...

Ab T

paulo santiago disse...

Luís
Tu que és perito em armamento,
explica-me uma dúvida que tenho:a
diferença entre mina e armadilha.
Em comentário no post do Pereira da
Costa,escrevi que no PELCAÇNAT 53
não havia nenhum graduado com o
curso de MA,mas isso não obstou a
termos montado dezenas de minas(?)
ou armadilhas(?)na defesa do Reord.
de Contabane.Essencialmente,
utilizámos granadas instantâneas
(aquelas que exteriormente eram
rodeadas por uma espiral em aço
encarnado)essas,de que falas,
colocadas num suporte metálico
(verde?)e,em pequena quantidade,
granadas defensivas.Em todos estes
casos,era utilizado arame de tropeçar.Estas armas são minas?ou
são armadilhas?Para mim,posso estar
errado,são armadilhas,minas seriam
engenhos enterrados no solo,e destes nunca montei nenhum.
Curiosamente,a 1ª vez que vi e ouvi
minas foi lá perto do teu Dulombi,
no tempo da 2700.Uma operação,a
nível de companhia,2GrCom da 2700,
1GrCom da 2699(Cancolim)e o Pel 53.
Pouco tempo passado,após saída do
Dulombi,em coluna auto,os picadores
detectaram uma mina AC,que foi
levantada juntamente com seis AP
próximas daquela.Reatada a marcha,
a viatura da frente,desviando-se
do buraco onde estivera a AC,
acciona,com a roda traseira direita
uma AP,junto a uma árvore.Ía mais
atrás,mas disseram-me,enquanto se
procedia ao levantamento,um ou dois militares da 2700,estiveram
protegidos atrás da tal árvore,não
imaginando que tinham uma AP a
poucos centímetros...quando rebentou,estavam todos nas viaturas,para além da nuvem de terra,só a roda do Unimog ficou inop...sorte!

Abraço

António Rodrigues disse...

Caro Luís Dias
Em Dezembro de 1973 eu era um dos que me encontrava em Copá e lembro~me perfeitamente da Coluna que referes, que ia abastecer Copá de munições e a determinada altura retrocedeu caminho e voltou creio que para Bajocunda. Eu tenho ideia que isso se passou nos primeiros dias de Janeiro de 1974, porque no anterior dia 25 de Dezembro de 1973, eu ainda fiz o percurso entre Copá e Bajocunda e viceversa apenas com um Unimogue 411 acompanhado do Alferes que me comandava em Copá e mais meia dúzia de camaradas do pelotão que naquela altura lá se encontrava e isto tem a ver com a história das minas porque, o que nos levou a fazer essa arriscadíssima viagem foi o Capitão comandante da minha Companhia de Bajocunda ter pisado nessa manhã (dia de Natal) próximo de Amedalai uma mina anti pessoal que lhe amputou parte de uma perna e o deixou muito mal tratado, fomo-nos despedir dele mas tivemos muita sorte, aquele (mais tarde) percurso de má memória não estar ainda minado naquele dia. Os retrocessos de colunas haveriam de repetir-se de novo no início de Fevereiro de 1974, o que nos causava em Copá grande desespero, porque estávamos sem munições e sem mantimentos e pior ainda, abandonados à nossa sorte. Mas a 7 de Janeiro de 1974, uma coluna com tropas da minha companhia de Bajocunda que se dirigia para Copá para mais uma tentativa de abastecimento de munições e viveres, cerca das 10.00h da manhã sofreu uma forte emboscada na zona de Massacunda a meio daquele trajecto entre Bajocunda e Copá de que resultaram duas Berliées destruídas, ( uma accionou uma mina anti carro)dois Cmaradas mortos e quase todos os restantes elementos feridos.Um Forte Abraço para todos. António Rodrigues Ex-Condutor Auto em Pirada Bajocunda e Copá.

Luís Dias disse...

Caro Juvenal

No Dulombi também montámos um fornilho (fui eu que o coloquei, por de trás de um baga baga, por sinal o mesmo onde me protegi para passar a noite, quando me deixaram sozinho no mato no início da comissão)que era fundamentalmente para destruir o baga baga onde fora colocado, em caso de ataque, pensando que alguém se podia ali acoitar e alvejar o quartel com algum à vontade. Como, passado um par de meses, nada aconteceu e temendo que aquela treta não funcionasse, decidiu-se accioná-lo. Com toda a malta avisada lá explodimos a "coisa" e aquilo funcionou reduzindo a pó o tal baga baga, mas fazendo tremer todo o quartel, que mais parecia um abalo de terra. O quartel "dançou" mesmo. Pudera, aquele fornilho tinha material velho (granadas, muniçóes, etc.)fazendo cá um ronco do caraças!
As minas de que falas usadas em Galomaro eram as "Claymore", que nós também recebemos, mas não chegámos a colocá-las. Eram óptimas para varrer uma frente/zona, com o inconveniente de que se fossem detectadas pelo IN,este podia virá-las para nós. Os americanos usavam-nas amiúde, quer para defesa de quartéis, quer em combate, quando se instalavam para dormir, colocavam-nas em pontos defensivos e aquilo era pior do que uma descarga de metralha de metralhadora ligeira.

Caro Torcato
Também fizemos o fornilho que já referi em cima, com disparo eléctrico, com um fio enfiado na terra e ligado a uma pequena bateria própria para minas e armadilhas e resultou.

Caro SAntiago
Os meus conhecimentos são mais virados para o armamento ligeiro e não era especialista em minas e armadilhas, mas dava também uma perninha nesta área, quando era necessário. Ajudei a desmontar uma mina AC e desmontava as granadas apreendidas para as remeter para Bissau.
No entanto, devo dizer-te o seguinte:
Parece-me que minas serão todos os artefactos, sejam eles terrestres, aéreos ou aquáticos, com cadeia de accionamento própria (entende-se que a cadeia de accionamento de uma mina ou armadilha possui cinco elementos básicos: carga principal, carga secundária,espoleta, accionador e acção de iniciação) enquanto uma armadilha não contém, necessariamente,estes elementos com ela, precisando de recorrer a elementos exteriores para que se dê o efeito desejado. O exemplo que referes, as denominadas granadas instantâneas de fragmentação, eram usadas como armadilhas, pois necessitavam sempre de um arame de tropeçar, para despoletar o seu efeito. No caso de uma mina, esta explode por pressão ou descompressão, podendo, contudo, como sabemos, ser também armadilhada e passar a explodir com recurso, por exemplo a arame de tropeçar ou recurso a explosivos laterais. Por outro lado, as armadilhas são um mundo de imaginação. Eu tenho algures uns apontamentos sobre minas e armadilhas do In "Casos do ultramar" e lá vem uma panóplia de cenas feitas com minas e outros explosivos respectivas armadilhas. As armadilhas podem ser feitas com qualquer explosivo, com recurso a granadas de vários tipos (morteiros, bazucas, de mão, de avião, etc.). Caso nenhum camarada, daqueles que foram de minas e armadilhas, apareça a explicar isto melhor, eu irei procurar os tais apontamentos e ainda nos livros que nos eram fornecidos no curso de oficiais milicianos para melhor satisfazer a tua e já agora a minha curiosidade.
Um abraço para todos.
Luís Dias

Luís Dias disse...

Caro Santigo
As minas de que falo que instalámos em cima de um ferro eram mesmo minas do tipo terrestres,anti-pessoais e de fragmentação e não granadas instantâneas, ao que julgo.
Um abraço
LD

Luís Dias disse...

Caro António Rodrigues

Se a memória não me atraiçoa eu julgo que essa coluna terá sido depois do Natal, mas pode ser que esteja errado. Isto porque em Janeiro, já não sei em que data, deixámos o reforço a Nova Lamego (e portanto também já tínhamos deixado Pirada)e voltámos para o quartel do Dulombi, a fim de preparar a recepção aos piras que iriam chegar nesse mês. A coluna de que falo regressou a Pirada. Na véspera eu tinha assistido/ouvido na rádio, um dos ataques que Copá estava a sofrer e lembro-me que o alferes que comandava o destacamento se queixar da falta de munições, em especial para o morteiro 81mm e ao que creio referir que ouviam viaturas do IN no lado da fronteira.
Um abraço
Luís Dias

Anónimo disse...

Camaradas,
Refere o Santiago que, sem recurso a pessoal de M.A., a companhia montou muitad armadilhas e, para o efeito, utilizou granadas de rebentamento instantâneo.
Nossa Senhora! Isso é que foi sorte.
Felizmente que não usaram muito as armadilhas contra nós.
Já aqui relatei como durante a montagem de uma armadilha, a granada descavilhou mesmo por baixo de mim por arrastamento do cordão.
Também quanto ao levantamento de minas anti-carro (AC) houve muita sorte,em resultado da impreparação dos sapadores de ocasião: de facto, como o Luís refere, existe um disparador por descompressão, vulgarmente conhecido por "rato", que é instantâneo e promove o rebentamento da mina sob a qual foi colocado. Não há maneira de certificar sem risco.
Quanto a minas: em colunas era meu costume levar a bolsa de sapador que existia na companhia, e perante o achado, fazia um rasgo que a circundasse, atava a corda e, protegido, puxava-a. Mesmo que não saísse, se confirmadamente tivesse abanado no buraco onde estava colocada, queria dizer que não havia armadilha mecânica, mas ainda podia haver um dispositivo controlado. Para obviar a este efeito, a abordagem à mina devia ser precedida de uma fiscalização ao terreno envolvente, e a uma voltinha para prevenir a presença do IN. Chamo ainda a atenção para o facto de, sob os calores da Guiné, ser possível dissimular uma AC, principalmente, se fosse coberta com uma camada de lama e outra de areia sêca. De um dia para o outro ficava cimento e muito dificil de detectar.
Aconteceu-me uma vez, e espero um dia vir a contar se retomar a História da C.Caç.2679.
Abraços fraternos
JD

paulo santiago disse...

Já não é a primeira vez,que o
camarada JD,mostra a sua "ciência"
e achincalha outros camaradas.Hoje
calhou-me a mim.Aqueles três
primeiros parágrafos são uma
imbecilidade,e também mostra que
leu muito mal o meu comentário,até
inventando uma companhia quando
falo de um pelotão,o meu,PELCAÇNAT
53.

Luís Dias disse...

Caro Santiago

Daquilo que consegui apurar sobre a diferença entre minas e armadilhas, em que altera algo do que eu te disse anteriormente, coloco aqui seguidamente:

MINAS E ARMADILHAS
Segundo a Wikipédia parece não existir uma divisão bem clara entre minas e as armadilhas. O que substancia a diferença é a possibilidade de quem utiliza a armadilha recorrer a formas (dependendo da imaginação de cada um) de utilizar o/s engenho/s disponíveis, apostando no desconhecimento ou ignorância do adversário. Há numa armadilha uma grande capacidade para o improviso o que lhe dá maior possibilidade de ser eficaz. A colocação de uma mina terrestre anti-carro, cujo normal accionamento será por pressão, pode substancialmente ainda ser mais eficaz se for reforçada por uma granada de roquete, por exemplo, (continua no entanto a ser uma mina). contudo, se a mesma for detectada e se alguém iniciar a sua remoção sem os cuidados de que se deve rodear e o inimigo, colocar por debaixo, por exemplo, uma granada descavilhada, mas com a alavanca presa debaixo da mina. Esta ao ser levantada (puxada) liberta a referida alavanca e em poucos segundos a granada rebenta e, naturalmente, por simpatia a mina AC. Dizemos então que a mina estava armadilhada. Uma armadilha encontra-se normalmente disfarçada, encoberta, de difícil reconhecimento, mesmo para pessoal experiente. Tipicamente a armadilha está escondida por detrás de um outro objecto e actua explorando alguns comportamentos humanos, como a curiosidade, a atracção por “souvenirs”, o conforto, a falta de cuidado etc. Existem muitos tipos de disparadores que podem ser utilizados numa armadilha, consoante o emprego táctico a dar-lhes.
No Manual do Oficial Miliciano do Exército Português e sobre armadilhas podemos ler:
“Aos disparadores das minas contra pessoal podem juntar-se, em quantidade variável, minas, granadas, petardos e substâncias incendiárias. Nas armadilhas assim constituídas, o disparador pode ou não estar directamente ligado à carga explosiva. A ligação faz-se por cordão lento, cordão detonante ou por circuito eléctrico. Ainda que improvisadas, a sua construção e colocação requerem treino e habilidade( pág. 160).”
E sobre armadilhas mais nada dizem.
Esclareço ainda que a granada instantânea de fragmentação a que tu aludes é referida, segundo os manuais estrangeiros da especialidade, como uma mina, com o rebentamento a ser efectuado, habitualmente, por tracção. Cheguei a vê-las, mas não me recordo de as termos usado. Eram semelhantes a granadas ofensivas, mas tinham, como tu dizes, uma espiral em aço, mas não me recordo da referência do modelo e da sua origem. Sei que os belgas usavam uma mina semelhante, com recurso a três arames de tropeçar, colocando-a a encimar uma estaca ou um ferro, alargando a possibilidade de a mesma rebentar mais facilmente. Também os chineses possuíam dois tipos de minas desse tipo.
Como curiosidade refiro que a CIA e os Boinas Verdes no Vietname chegaram a armadilhar granadas de morteiros, com origem chinesa, que eram usadas pelos guerrilheiros, que explodiam quando eram largadas pelo cano e batiam no percutor, bem como granadas que eram lançadas por espingardas e que rebentavam no lançamento, etc. lançando as culpas para a China por lhes fornecerem material detiorado.

Um abraço
Luís Dias

Anónimo disse...

Meu Caro Santiago,

Reli o teu 1º. comentário e constato que se refere ao âmbito de um Pelotão, ao contrário do que escrevi. Lamento e peço desculpa.
Quanto aos meus três parágrafos iniciais que referes, tenho que me referir ao meu 3º., que não é nada explicito e pode ter originado essa tua revolta.
De facto, o que eu queria dizer, é que, felizmente, o PAIGC não utilizou muitas armadilhas contra nós. Mas compreendo que tivesses compreendido outra coisa, face a redacção inexplicita. Por isso volto a pedir-te desculpa.
Já quanto à expressão ciência achincalhante, não a posso aceitar senão como uma revanche do momento, que me parece contraditória com o anterior. Não vem mal ao mundo.
Abraços fraternos
JD

Anónimo disse...

Meu Caro Luís,
Antes do mais deixa-me referir que, quando leio os teus textos sobre armamento, reconeço neles toda a competência e interesse na explanação
Referes, agora, um texto da Wikipedia sobre armadilhas, que num pequeno aspecto suscita-me dúvidas: é na parte em que uma granada descavilhada é colocada sob pressão debaixo de uma mina, provocando o rebentamento quando esta é deslocada.
A minha dúvida consiste na instabilidade da granada Se ovalizada, ou cilindrica, e na dificuldade de manuseamento na colocação, sem que ela rebentasse inopinadamente com efeitos contrários ao esperado.
No curso que frequentei e de que já não disponho do manual, apenas me mostraram um disparador por descompressão, o tal rato, que fisionomicamente pode ser parecido com um pequeno furador de escritório, e tem uma base de sustentação e estabilidade.
Uma técnica ainda mais arriscada de o aplicar, consiste em fazer uma cama de areia onde ele assenta sob a mina (nunca experimentei, claro), e se houver remoção de terra em redor da mina, provoca o deslocamento da areia e o consequente deslocar do disparador que cumpre o seu papel.
O recurso a esta armadilha, como é fácil perceber, constituía riscos para quem a manuseava.
Um grande abraço
JD

Luís Dias disse...

Caro JD

Eu não tenho o curso de minas e armadilhas e até referi esse aspecto mas, de facto, recordo-me de no curso de oficiais falarem sobre armadilhas e de ver-mos um filme USA sobre armadilhas na IIª GM, em que havia essa hipótese e acho que, infelizmente o IN, não sei na Guiné se nas outras províncias colocou granadas debaixo de minas AC descavilhadas, embora fosse mais natural o seu reforço com esse tipo de material, ou granadas de morteiro e de avião, etc. (Julgo que nos apontamentos que devo ter algures sobre casos acontecidos no ultramar essa situação era focada). Parece-me que tens razão na observação, e se tens o curso sabes muito mais do que eu, mas os especialistas com certeza que deveriam ter uma maneira de prender a granada para a fixar, possivelmente através de escavarem o conjunto lateralmente, embora seja, como dizes um risco claro. Sei que na IIª Guerra Mundial e no Vietname, eles colocavam granadas por debaixo de cadáveres e de armas abandonadas. Eu apenas queria referir isto como exemplo da diferença entre mina e armadilha e, se calhar, não fui muito feliz. Mas a ideia a transmitir era tentar diferenciar uma mina de uma armadilha (que há milhentas de hipóteses).
Um abraço
Luís Dias

António Rodrigues disse...

Caro Luís Dias!

A referida coluna terá sido a 4 ou 5 de Janeiro, porque a primeira de uma série de fortes flagelações a Copá, aconteceu no dia 3 de janeiro de 1974 pelas 23.00 horas e terá sido esse ataque que vocês ouviram em Pirada. Tinha-mos nessa altura em Copá apenas 18 granadas de morteiro 81 e com elas aguenta-mos o referido ataque do dia 3, não fazendo um único disparo para não as desperdiçar, pois sabia-mos que à distãncia a que se encontrava o IN não o conseguia-mos atingir. O facto de termos poupado essas granadas viria a revelar-se decisivo para a nossa periclitante defesa, pois 4 dias depois viria-mos a sofrer em Copá um dos maiores bombardeamentos com que o PAIGC nos brindou, durante 5 horas e 20 minutos na tarde e noite desse dia, durante o qual voltamos a não fazer um único disparo pelas mesmas razões atrás citadas.Pouco depois da meia noite desse dia, já com Copá praticamente destruído, o PAIGC veio junto do Arame farpado fortemente armado, inclusive com dois carros de combate, um dos quais abriu uma entrada no arame e penetrou cerca de 10 metros e se calhar convencido que, depois daquele bombardeamento sem qualquer resposta nossa estaria-mos todos mortos. Aí chegou a vez de tirar-mos o máximo partido das tais 18 granadas de morteiro 81 e repelimos aquele ataque durante 1 hora e 10 minutos o melhor que podemos, causando-lhe pelo menos dois mortos.Só seria-mos reabastecidos de munições seis dias depois a 13 de Janeiro e com a perda de mais uma vida, numa emboscada à coluna no dia seguinte, quando a mesma regressava de Copá para Bajocunda, cuja força militar pertencia a uma companhia de intervenção reforçada com um pelotão de Pára-Quedistas.

A todos um forte Abraço.
António Rodrigues

AntónioRodrigues disse...

Durante a coluna acima referida, depois da emboscada e já com um camarada morto em cima da Berliett, um pouco mais à frente, os sapadores descobriram e levantaram um mina AC reforçada com a cabeça de um foguetão.

Anónimo disse...

Caro Luís,
Acabei de ler o teu comentário na caixa do correio, que agradeço.
Tirei o curso MA, recebi e fiquei com um manual de 800/900 páginas, e devo referir que a instrução era uma pobreza franciscana: quase não tínhamos práticas.
Mas a teoria, essa, decorria do manual e dos interesses do comunicador como da audiência. Estive com o "rato" na mão, e aprendi a teoria.
No caso dos corpos armadilhados com granada defensiva descavilhada, tive notícia e éramos alertados para essa possibilidade. Mas colocar uma granada sob um corpo, é infinitamente mais seguro do que sob a superfície lisa da mina, assente numa base irregular, logo, susceptível de deslizamento. Não o contesto, pode alguém ter tido mão para isso. Já a colocação sob o corpo, junto à nádega por exemplo, e numa superfície adequada de terra, até com capim, beneficia do ajustamento e consequente pressão para a manter na posição perigosa que a accionará quando o corpo for mexido. É que ainda dá a oportunidade de fuga e busca de protecção, desde que se larga, por força dos 3/4 segundos necessários para a explosão.
Também nunca pratiquei, só na situação de remoção de corpos e com o recurso à corda.
Não esclarecemos, mas puxámos pela cabeça.
Um grande abraço
JD

Luís Dias disse...

Caro António Rodrigues

Dado o tempo decorrido a memória já me começa a atraiçoar e então em datas. É possível que tenhas razão, até porque viveste com o que se passou em Copá e de certeza essa situação está muito mais presente na tua memória do que na minha. Os factos aconteceram já na ponta final da nossa comissão (que em teoria já terminara em Outubro de 1973 e, no entanto, iríamos ficar na Guiné até 29 de Março de 1974.
O meu GC estava de intervenção em Nova Lamego, depois de ter-mos estado em Piche e fomos enviados para Pirada. Sob o meu comando seguiu também um GC de madeirenses da CCAÇ 3518 (também já velhinhos na Guiné, tinham vindo com o meu batalhão no mesmo barco)e que não tinham alferes por ter sido ferido batalha de Guidage e também tinham estado como companhia residente em Gadamael. O cmdt do Batalhão de Pirada falou comigo e disse-me que nós iríamos para Copá, reforçar o GC que ali estava. Estranhei e disse-lhe que as ordens que recebera do Comdt da CAOP 2 (Agrupamento Operacional do Leste) era, e sublinhei, de defender Pirada e fazer operações em defesa da localidade e eram essas que eu iria cumprir e se alguém tinha de ir reforçar Pirada não percepia porque não era um GC da companhia ali residente. Mandou-me retirar e que depois falaria comigo. Tive uma conversa com os GC sobre o assunto e, de caras, os madeirenses disseram logo que se eu quisesse ir que fosse com o meu GC, porque eles não sairiam de Pirada!!!! Aquilo, pensei eu, iria dar em prisão para alguém!!! Mais tarde voltei a ser chamado ao cmdt, que me referiu ter falado com o CAOP e que as minhas ordens seriam as de escoltar uma coluna que iria abastecer Copá e que regressaríamos a Pirada. Aqui já não havia como fugir e é essa tal coluna que se fez no dia seguinte e de que eu falo.
Um abraço
Luís Dias

Luís Dias disse...

CAro JD

Obrigado pelo teu esclarecimento. E concordo contigo em que deveria ser difícil alguém usar granadas descavilhadas, por baixo da mina AC. Havia uma mina AC de caixa de madeira - a TMD - que, tenho em crer, possuía duas traves de madeira que, eventualmente, poderiam acondicionar a granada. Caso venha a encontrar os tais apontamentos sobre casos acontecidos nos TO do Ultramar, voltarei a falar contigo sobre este assunto.
Um abraço
Luís Dias

António Rodrigues disse...

Olá Caro Luís Dias!

Quanto ao facto de eu me lembrar das datas tens razão, porque para além de como dizes, toda aquela situação de Copá me ter marcado imenso, eu naquele período (para mim e o restante pelotão o mais difícil que vivemos na Guiné)tinha o hábito de tomar nota das datas e dos principais acontecimentos diários e foi a partir desses apontamentos e da minha memória ainda fresca que poucos anos depois de ter regressado escrevi as minhas memórias da guerra, principalmente baseadas nos acontecimentos vividos em Copá.

Um Forte Abraço Amigo.

António Rodrigues.