1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Julho de 2011:
Queridos amigos,
A diferentes títulos, a análise que o Marechal Costa Gomes faz aos acontecimentos da Guiné, em 1973, são de um inquestionável interesse, tanto para o leigo como para o historiador. Pela primeira vez se ficou a saber em que consistia a alteração do dispositivo que retiraria as forças colocadas nas fronteiras, onde deixariam de ficar à mercê dos morteiros 120. Não dá para entender como os historiadores não analisam as consequências que tal dispositivo acarretaria, sobretudo para o moral das tropas. É um olhar perpassado por uma inteligência fulgurante, está aqui um registo de que mais significativo ocorreu durante a guerra e o seu depoimento sobre o turbulento período que se viveu entre 1974 e 1976 é incontornável.
Um abraço do
Mário
Marechal Costa Gomes e a Guiné em 1973
Beja Santos
“Costa Gomes, O Último Marechal” (Círculo de Leitores, 1998) é uma longa entrevista que o antigo presidente da República concedeu a Maria Manuela Cruzeiro, do Centro de Documentação 25 de Abril, é um olhar sobre toda a sua vida, desde que ingressou no Colégio Militar até às ocupações que teve depois de abandonar Belém, em 1976. Uma longa trajectória de actuação, recheada de controvérsia em que pessoas como Spínola, cuja amizade com Costa Gomes foi sólida até aos acontecimentos do Verão quente e posteriores, não tiveram rebuço em dizer que o seu papel foi determinante para evitar uma guerra civil, nem os seus adversários mais acérrimos esconderam que foi o oficial general português mais prestigiado do século XX.
A análise que faz dos acontecimentos da Guiné, em 1973, e que constam desta entrevista, é da maior importância. Começa por referir que a acção de Spínola na Guiné foi muito contraditória, ou seja, ao perceber que a guerra não se podia ganhar pela força das armas quis conquistar as populações e, em simultâneo, concebeu operações militares absolutamente condenáveis, incluindo o ataque a Conacri.
Perguntado sobre a visita que efectuara à Guiné após o aparecimento dos mísseis Strella e da resposta que dera a Marcello Caetano de que “no estado actual” a Guiné era defensável e devia ser defendida, respondeu que era defensável se se modificasse o dispositivo e se o PAIGC não utilizasse os Mig que dizia possuir. E explicou em que consistia a alteração do dispositivo: “Significava a retirada de todas as forças colocadas nas fronteiras para um espaço onde não fôssemos vítimas dos morteiros 120 e pudéssemos perseguir os guerrilheiros do PAIGC. Na altura, com o dispositivo utilizado, as forças no interior estavam muito enfraquecidas, porque demasiado concentradas nas fronteiras. E, a meu ver, com enorme desvantagem, já que não há nada pior do que combater para a retaguarda. Por variadíssimas razões, sobretudo morais, as tropas são capazes de actos heróicos quando perseguem o inimigo na direcção que elas consideram lógica, ou seja, do interior para a fronteira. A operação Mar Verde foi um desastre e a invasão do Senegal pelos Comandos foi outro. Melhor: ainda que, tacticamente, a operação levada a efeito no Senegal tenha registado algum sucesso, a questão fundamental centrou-se nas Nações Unidas, onde fomos ameaçados de sanções graves se voltássemos a violar as fronteiras dos países limítrofes. De facto, a extensão da fronteira terrestre (enorme para o tamanho da Guiné) desmoralizava as tropas e dava uma vantagem fantástica ao inimigo: é que ele atacava-nos quando queria, tinha a iniciativa das operações e nós não podíamos ripostar a não ser com armas de fogo”.
Questionado se não devia ter dado um apoio mais explícito a Spínola, que procurava a resolução do problema militar por via política e se conhecia essas intenções declarou o seguinte: “Nunca me apercebi essa intenção com a clareza que afirma. É claro que várias vezes discutimos a questão da guerra colonial, concluindo sempre que a solução não seria militar, mas sim política. Essa era, aliás, uma posição constantemente assumida por mim, como ele o sabia muito bem, nas reuniões do Conselho Superior de Defesa Nacional”. Mais adiante, quando o entrevistador lhe pede um comentário sobre a afirmação de Spínola de que considerava praticamente esgotadas as hipóteses de uma vitória militar, exactamente na sequência dos mísseis Strella, depois de tecer considerações sobre as desigualdades de armamento, as insuficiências dos contingentes metropolitanos e os erros que ocorriam na instrução dos batalhões, Costa Gomes declara ter estado de acordo com Spínola de que militarmente se tinham esgotado todas as possibilidades.
E chegamos ao derradeiro ciclo, a saída de Spínola e a chegada de Bethencourt Rodrigues. Teria havido, reflecte Costa Gomes, uma viragem no relacionamento entre Spínola e Marcello Caetano, quando este recusou novas reuniões com o presidente Senghor, em 1972. Ao chegar a admitir uma derrota militar pensando que deste modo podia salvar Angola e Moçambique, Caetano não só praticou um erro político como gerou o spinolismo. Havia, recorda o Marechal, uma profunda interligação entre os movimentos africanos, é escusado encontrar paralelos entre a queda da Índia e querer presumir que a queda da Guiné não tornaria inevitável a queda das outras colónias. Perguntado se Bethencourt Rodrigues levava como missão acabar com a guerra ou continuar com a guerra, emitiu o seguinte juízo: “Só podia ser para continuar a guerra. A primeira pessoa indicada para substituir na Guiné o general Spínola foi o general Diogo Neto, na altura comandante da Força Aérea de Moçambique. Bethencourt Rodrigues apenas aceitou lugar (disse-mo pessoalmente) por ser muito amigo do professor Marcello Caetano”. E faz a seguinte avaliação do desempenho do general na Guiné: “Ele era um oficial excelente, mas foi encontrar uma situação quase caótica. Fez o que pode. Mais de uma vez veio a Lisboa, dizendo-me que, além da situação militar ser bastante má, enfrentava ainda outras grandes dificuldades administrativas, já que não conseguia obter verbas idênticas às concedidas ao general Spínola. O facto prejudicava a parte social e um certo bem-estar das populações que o general Spínola tinha conseguido e que ele queria manter, convencido de que, numa terra como aquela, se consegue muito mais através de uma actuação junto das populações do que com acções militares”.
A seguir a conversa envereda sobre a formação do Movimento dos Capitães, tema desajustado às finalidades do blogue e por isso paramos por aqui.
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 25 de Julho de 2011 > Guiné 63/74 - P8599: Notas de leitura (259): No Pincha, por Vasco de Castro (Mário de Beja Santos)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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23 comentários:
Não costumo intrometer-me na "guerra" da guerra ganha ou perdida, dúvida que parece só se pôr para o TO da Guiné.
Gostava no entanto que algum dos oficiais generais, superiores, capitães ou subalternos me dissessem com verdade se alguma vez, entre eles, se pôs a hipótese de se vir a ganhar a contenda.
Tanto quanto sabemos, uma guerra subversiva, como era o caso, vai-se aguentando até aparecer uma solução política. Até lá ganham-se umas quantas batalhas, a guerra nunca. Infelizmente Portugal não soube conduzir os destinos daqueles povos até uma independência programada e faseada de modo a salvaguardar também a posição dos nossos metropolitanos residentes naqueles territórios e dos militares naturais que lutaram pelo nosso lado.
Para mal deles e nosso, foi necessário derrubar o regime e, em pleno PREC, resolver tudo à pressa, pois não havia ordem lá, como cá.
Os militares não perderam a guerra, mas o regime sim.
Um abraço e bom fim de semana
Carlos
“Significava a retirada de todas as forças colocadas nas fronteiras para um espaço onde não fôssemos vítimas dos morteiros 120 e pudéssemos perseguir os guerrilheiros do PAIGC. Na altura, com o dispositivo utilizado, as forças no interior estavam muito enfraquecidas, porque demasiado concentradas nas fronteiras."
Apenas me quero centrar sobre esta frase, que já conhecia de outras leituras, e colocar a seguinte questão:
Se as nossas forças recuassem até onde não fossem atingidos pelos misseis, qual é essa distância?
Ao recuarmos, eles avançavam, e seria assim indefinidamente até nos concentramos todos num único ponto.
É isto que se aprende nos manuais militares, ou só foi uma "saída airosa para uma questão que não tinha (nem tem) resposta?
Esta conversa foi entre GENERAIS, que foram honrados com a patente de Marechal, não é o caso do militar de baixa patente que propôs, como solução única de acabar a guerra, que era cercar a Guiné com redes de arame, e electrificadas com potências altas, para o inimigo não entrar.
...
blá-blá, coisa-&-tal, [...] «inteligência fulgurante».
Para além de estarmos 'carecas' de saber o que "O Rolha" disse nas longas conversas com... aquela grã-mestra maçónica – e, no mesmo registo, ao longo dos dias se desdisse e contradisse... está lá tudo, há muito foi lido/relido e quem tenha pachorra faça o favor de confirmar –, ficámos agora a saber, em primeira mão, a opinião do recensor quanto à «inteligência fulgurante» do deponente...
Quais "fulgurante", quais carapuças! À pala de tais traiçoeiras propostas, e de outras inconfessáveis, aquele indivíduo veio pós-1976 a ter assento no CMPC (para quem não saiba, Comité Mundial para a Paz e Cooperação), uma das "sombras" da Comintern (transformada em meados da década de 50 na Cominform).
Apenas se pode entender a classificação de «inteligência fulgurante», no sentido de o citado oficial do QP do Exército Português, desde 1957/58 ter encabeçado uma das 5ªs colunas que bem trabalhou para desestabilizar o Estado Português.
E, como "les bons esprits se rencontre"...
Julgava que estes comentários se iriam cingir ao assunto Guiné.Mas,para possuidores de registos de frustracöes,o desempenho de funcöes muito para além de passear botas polidas por paradas de quartéis,ou polir secretárias em casaröes perdidos algures na poeira da memória,acabam sempre por fazer explodir incontidas frustracöes,ódios e invejas primárias.Não preparados para diálogos em liberdade,acabam sempre,em desespero,por cair ao nível das tais "alcunhas" de sarjeta.Só que,nessas cloacas em que tão bem se sentem,as tais "rolhas" acabam por flutuar sempre.Salazar,Caetano,Spínola,Comunas,meios-comunas,3/4 de comunas...foram muitos a nadar na cloaca.Alguém,mais inteligente (talvez) que tantos génios...não se afundou.Sobreviveu para contar a História.E,como se afundavam ,rápida e inexoravelmente,as verdadeiras "PEDRAS" que foram tantos dos Excelentíssimos Senhores Generais d'antanho.Costa Gomes,ao contrário de muitos deles, NUNCA falou de "cócoras" com os capitães ,na tão curta e passageira "hora de glória"... (A deles!).Era inteligente demais para isso.E,os outros sabiam-no.Ou,pior ainda....sentiam-no!
Li neste momento na m/mailbox, o "comentário" (?!) supra, ao qual não posso deixar de publicamente replicar...
... citando:
- «Julgava que estes comentários se iriam cingir ao assunto Guiné.»
Subscrevo; sem qualquer ponta de sarcasmo.
Quanto ao mais, e sem quaisquer subterfúgios, apenas se entende como frustre tentativa, de achincalhamento pseudo-político do comentarista que o antecedeu; para não classificar um tal arrazoado, como refinada ordinarice.
Acaso o co-editor se sinta na obrigação de eliminar este meu à parte, deverá em boa ética do mesmo modo proceder expeditamente quanto à precedente provocação, que - na sequência de outras com idêntico teor e tortuosos objectivos -, aquele mesmo indivíduo persiste em bolsar acobertado por presumidos "diálogos em liberdade"... restrita, seja, a dele próprio e demais saudosistas... do "prec".
Para prosseguir eventuais picardias, está sempre disponível o email.
Que Deus Nosso Senhor tenha piedade de nós, os pobres de espírito, face
a tão brilhantes e fulgurantes recensões! Mesmo em segunda dose, repetidas, porque agora MBSantos volta a recensear no blogue
o mesmos livro que recenseou há ano e meio atrás.
Maravilha, encantado!...
Quanto ao Rolhas, ou Cortiça, marechal Costa Gomes, a História começa a ser feita. Por outra gente.
Corto no comentário e nos adjectivos, não quero magoar ninguém.
Abraço a todos.
António Graça de Abreu
Reportanso-me ao meu comentário (o segundo da ordem) e, obviamento aos assunto em questão, a GUINÈ, o texto que refiro está no livro PAIS SEM RUMO ´de António de Spinola, edição de SCIRE de 1978, páginas 53 a 59.
Pontos de vista.
Carlos Vinhal. Permite-me subscrever teu comentário.
Sucinto, claro e simples.
Conhecendo-se o que é um exército regular, e/ou um 'exército' de guerrilha, mais ou menos profundamente, se poderá partilhar dessa opinião, quase conclusiva.
Um abraço.
Cumprimentos para todos e para cada um.
ex-soldado Carlos Filipe
BCAÇ3872 - CCS - Galomaro/71
Peço muita desculpa ao Mário Beja Santos e aos camaradas do blogue por, creio, uma incorrecção no meu comentário anterior. A recensão de agora do MBSantos não é do mesmo livro, como referi. A recensão de há ano e meio atrás terá sido feita à biografia do Costa Gomes,
por Luís Nuno Rodrigues, Lisboa, Esfera dos Livros, 2008.
De qualquer modo, recordo que o conteúdo do texto do recensor, então e agora é muito semelhante.
Renovo as minhas desculpas ao recensor.
Abraço,
António Graça de Abreu
Caros camarigos
Esta recensão originou algumas coisas interessantes, a saber:
- há quem persista na ideia que o MBSantos veicula opiniões pessoais em que induz determinadas conclusões em defesa das suas teses(?);
- parece começar a haver algum entendimento quanto à magna questão da 'guerra ganha', da 'guerra perdida', da 'guerra quase ganha', da 'guerra militarmente perdida', da 'guerra assim-assim';
- revela quanto melindrosa e fracturante é esta forma de abordagem à guerra na Guiné, já que suscita sempre empolgadas e assanhadas intervenções;
- mostra também que as recensões de livros, embora necessária porque se trata de uma parte importante da 'memória da guerra', talvez necessite de uma 'pausa de verão' para possibiliytar que as sucessivas declarações de contenção se possam consolidar;
- permitiu verificar que alguns amigos e seguidores, embora alegadamente aborrecidos por necessidades de intervenção moderadora em anteriores situações, conseguiram superar esse eventual 'estado de alma' e apareceram também a intervir;
- mostra também como deve ser seguido religiosamente o conselho do nosso editor no sentido de se criar 'distanciamento' entre a leitura e a escrita do comentário para evitar certas situações...
Enfim, bem vistas as coisas, é sempre educativo, seja lá qual for o ponto de vista pelo qual se aprecie a evolução do texto e das intervenções.
Abraço
Hélder S.
Ao falarmos dos "nossos" generais, velhos ou auto-promovidos no 25 de Abril, deviamos impôr-nos a todos os portugueses a pergunta: "Porque continuámos a manter um exército numerosíssimo de oficiais durante mais de uma dezena de anos, como se continassemos em guerra"?
Será que era para defender a Madeira, Açores e Alem-Cacilhas?
E como é que esses oficiais todos iam lutar se já tinham mandado para casa os milicianos e praças que eramos nós (o povo)?
Para mim, os generais e oficiais, fizeram o que puderam durante os 500 anos de guerra colonial, incluindo Alcácer Quibir, o maior falhanço foi sempre "o dia seguinte", que se seguiu às diversas batalhas.
Parece que é cá dentro dos pequenos limites que os generais nunca se entendem.
Antº Rosinha
optar, a seguinte questão:
-- A Guiné é defensável e deve ser defendidÀs vezes fervo em pouca água, do que me penitencio e peço desculpa. De quando em quando serei injusto.
Mas não gosto do Costa Gomes (sempre me pareceu certa a alcunha que lhe deram, uma bóia de "cortiça" a flutuar conforme o vento) nem tenho afinidades (a não ser a Guiné) com o camarada recensor do blogue.
Agora com a cabeça fria, recordo a citação completa referida parcialmente pelo recensor.
Ora segundo Marcello Caetano, era o general Costa Gomes, e não ele, quem considerava a Guiné “defensável”, a dever “ser defendida.” Vejamos as palavras do sucessor de Salazar:
“Em meados de 1973, a situação militar podia considerar-se satisfatória. (…) Pus ao General Costa Gomes que recentemente visitara a Guiné, inspeccionara as tropas e acertara os dispositivos a ada? Se sim, vamos escolher o melhor general (em substituição de António de Spínola) disponível para a governar, vamos fazer o esforço de lá manter os homens necessários e de procurar dotá-los do material necessário. Se não, prepararemos a retirada progressiva das tropas para não prolongar um sacrifício inútil, designando um oficial-general, possivelmente um brigadeiro, para liquidar a nossa presença.
A resposta do General Costa Gomes foi categórica:
-- No estado actual, a Guiné é defensável e deve ser defendida.” Marcello Caetano, em Depoimento, Rio de Janeiro, Ed. Record, 1974, pag.180.
Então quando é que fomos derrotados
militarmente, repito, militarmente,
pelos guerrilheiros do PAIGC? Claro
que não íamos ganhar militarmente aquela guerra, nem o PAIGC tinha a capacidade para ganhar militarmente aquela guerra. Claro que havia o cansaço das NT e dos guerrilheiros,claro que aquela guerra parecia não ter solução. O problema era político. Daí o 25 de Abril.É assim tão difícil compreender tudo isto?
Ando a prometer meter a viola no saco e deixar-me de comentários.
E acho que vou cumprir.
Que cada um distorça a nossa História como muito bem (ou muito mal) entende. Não pretendo endireitar o mundo nem corrigir quem quer que seja.
Eu, com os meus trabalhos e livrinhos sobre o mundo chinês, tenho coisas muito mais bonitas para fazer. Já chega.
Forte abraço,
António Graça de Abreu
O meu comentário saiu gralhado.
Este é que me parece o texto certo.
Podem eliminar o anterior.
Às vezes fervo em pouca água, do que me penitencio e peço desculpa. De quando em quando serei injusto.
Mas não gosto do Costa Gomes (sempre me pareceu certa a alcunha que lhe deram, uma bóia de "cortiça" a flutuar conforme o vento e as marés) nem tenho afinidades (a não ser a Guiné) com o camarada recensor do blogue.
Agora com a cabeça fria, recordo a citação completa referida parcialmente pelo recensor.
Ora segundo Marcello Caetano, era o general Costa Gomes, e não ele, quem considerava a Guiné “defensável”, a dever “ser defendida.” Vejamos as palavras do sucessor de Salazar:
“Em meados de 1973, a situação militar podia considerar-se satisfatória. (…) Pus ao General Costa Gomes que recentemente visitara a Guiné, inspeccionara as tropas e acertara os dispositivos a ada? Se sim, vamos escolher o melhor general (em substituição de António de Spínola) disponível para a governar, vamos fazer o esforço de lá manter os homens necessários e de procurar dotá-los do material necessário. Se não, prepararemos a retirada progressiva das tropas para não prolongar um sacrifício inútil, designando um oficial-general, possivelmente um brigadeiro, para liquidar a nossa presença.
A resposta do General Costa Gomes foi categórica:
-- No estado actual, a Guiné é defensável e deve ser defendida.” Marcello Caetano, em Depoimento, Rio de Janeiro, Ed. Record, 1974, pag.180."
Então quando é que fomos derrotados militarmente, repito, militarmente,pelos guerrilheiros do PAIGC? Claro que não íamos ganhar militarmente aquela guerra, nem o PAIGC tinha a capacidade para ganhar militarmente aquela guerra. Só se fugíssemos todos.
Uma derrota militar não houve, nem nossa, nem deles. Claro que havia o cansaço das NT e dos guerrilheiros,claro que aquela guerra parecia não ter solução. O problema era político. Daí o 25 de Abril.É assim tão difícil compreender tudo isto?
Ando a prometer meter a viola no saco e deixar-me de comentários.
E acho que vou cumprir.
Que cada um distorça a nossa História como muito bem (ou muito mal) entende. Não pretendo endireitar o mundo nem corrigir quem quer que seja.
Eu, com os meus trabalhos e livrinhos sobre o mundo chinês, tenho coisas muito mais bonitas para fazer. Já chega.
Forte abraço,
António Graça de Abreu
Mas será possivel estarem para aqui a discutir e a argumentar uma data de tretas.
Pela disposição das NT,especificamente no sul, julgo poder afirmar que as chefias não estariam muito interessadas em melhorar a situação militar que não era "desesperada",antes pelo contrário.
Senão vejamos;QUITAFINE ( Cameconde-- 1comp...Cacine--1 pelart (14)..1 comp...1 pelt.mort.. 1 def.--Gadamael.. 1 pelart (14).. 2 pelt.milicias..3 comp.. 1 pelt.mort..1 pelt. canhões s/r..
Depois, bem depois era o deserto, perdão,mata até Mampatá e Aldeia Formosa, nesta área,era a zona de infiltração por excelência do paigc,tendo como primeira barreira Bedanda,digo bem, Bedanda...(é só olhar para o mapa).
Mas que "merda" de dispositivo.
Porque é que se ocupou Gandembel apenas com uma companhia?
Porque é que Guilege tinha tão pouco pessoal e porque é que não se reocupou ?
Porque é que se fez a retracção do Mejo?
Porque é que eu tinha tanta granada em "stock" que dava para rebentar com 10 tubos de obus( a cada mil tiros tem que se substituir o tubo e recarregar os hidráulicos).Só em cada espaldão tinha em média 300 granadas(made in USA) prontas a disparar.
Admitindo que o paigc conseguia por operacionais os Migs(em 74 ainda não os tinham)..de onde é que operavam ?
O próprio Luis Cabral disse que não era para bombardear a Guiné..então eram paraquê?Só se fosse para por em sentido a aventesma do sekou touré, o que duvido.Penso que foi uma das melhores acções de propaganda do paigc.
Não entro em cosiderandos de natureza política,nem da situação política e militar em que se encontrava o paigc..que isso daria para um livro com muitas folhas.
Cada um que tire as conclusões que quiser.
C.Martins
Só me resta concordar inteiramente com o caríssimo Camarada Graca de Abreu.Fora eu um pseudo-saudosista de um mito-logicamente poético PREC,"gritava-lhe ,desde aqui:"A poesia para os poetas...já!".Como de saudosista,(e infelizmente),de poeta pouco tenho, lá acabo por ter que ir mugir as minhas renas.Quanto ao livro de Costa Gomes,porque não lê-lo pelo que é?Uma análise, e opiniões,por parte de quem teve o privilégio de observar,e participar nos acontecimentos desde o próprio "centro do furacão".Divergimos de algumas das análises,ou mesmo de todas elas?Porque não?Mas näo ficamos mais pobres por ouvir as perspectivas de quem....participou,ao contrário das de outros que....ouviram contar. Um abraco.
Camaradas,
Não li o livro, mas do que sei, passo a referir:
Costa Gomes ganhou nomeada em 1958 quando foi designado Sub-Secretário de estado para o Exército, por sugestão de Santos Costa (ministro da defesa durante 20 anos) a Salazar. Era tenente-coronel. Foi demitido em 1961 por associação ao golpe do gen.Botelho Moniz.
E daí, passou a maior parte da carreira em Angola e Moçambique onde exerceu diversas funções de comando até ascender ao generalato.
Incongruência? Atendendo aos costumes de Salazar, parece que sim. Mas a progressão de Costa Gomes derivou de uma reconhecida competência pelos seus pares no âmbito militar e politico.
Essa alcunha de rolha, do tempo do Prec, terá sido atribuída por aqueles que gostariam que ele tivesse incitado os comunas contra a reacção, e a reacção contra os progressistas, numa previsivel salganhada de que correria sangue.
Face às sem-razões de uns e outros, até parece que a sua acção terá sido importante no caminho da sociedade portuguesa para o que poderia ter sido uma oportunidade democrática.
Refere a certo passo o meu amigo António Graça de Abreu: "O problema era político. Daí o 25 de Abril. É assim tão difícil compreender tudo isto?"
Em correspondência particular que trocámos, já lhe apontei fartura de argumentos de outro sentido, apresentei-lhe inúmeras perguntas a que não respondeu. Mas continua com o catecismo da guerra que os portugueses não perderam militarmente.
Teria havido uma solução política se, como intuíu o alm. Pereira Crespo que refere: "... tínhamos que adoptar uma solução política, baseada numa guerra de desgaste de longa duração, que levasse o inimigo, pela fadiga, pelas divisões internas e pela descrença na vitória, a afastar-se das potências que o apoiavam e a procurar, de novo, integrar-se nas estruturas portuguesas." E considerava ser necessária "uma vontade firme de resistir e de vencer", associada à aceleração do "desenvolvimento económico e social dos territórios ultramarinos". Mas o almirante ainda disse:"...numa guerra de desgaste, só pode haver solução militar quando um dos adversários, num dado momento e por qualquer razão, alcança a superioridade militar. Quando tal solução não se verifica, será derrotado aquele que primeiro desistir de lutar."
Ora o 25 de Abril traduz essa desistência, e em vez de ter proporcionado boas soluções políticas, gerou uma quantidade de problemas, de que, neste âmbito, apenas recordo as muitas mortes provocadas entre os que combaterem por Portugal, e o total abandono dos milhares de portugueses residentes em África depois de incendiada a questão das independências. Outra incongruência do MFA, foi ter-se desenvolvido sob o beneplácito de Spínola e ter ignorado as teses de Portugal e o Futuro. Terá sido da pressa.
Uma pergunta que fiz ao AGA, foi como considerava históricamente o 1de Dezembro de 1640, e que similitude histórica pode ter em relação ao 25 de Abril. A primeira data celebra uma vitória portuguesa, a segunda lembra-nos um golpe gerador de confusões e contradições entre os golpistas, tornada comemorativa por ser travestida de movimento democrático.
Abraços fraternos
JD
Meu caro Zé Dinis
Fico encantado com as tuas teses. 1 de Dezembro de 1640, 25 de Abril de 1974. Que maravilha de similitude!
Eu disse: "O problema era político. Daí o 25 de Abril. É assim tão difícil compreender tudo isto?"
Falo de 1973/74, das guerras em África.
Citas o almirante Pereira Crespo: "Será derrotado aquele que primeiro desistir de lutar."
Então fez-se o 25 de Abril para quê?
Também para acabar com as guerras em África. Não foi uma derrota militar, foi uma derrota das teses do regime de Salazar e Marcelo, foi uma derrota de todos quantos acreditavam num Portugal do Minho a Timor. Tudo isto é política, tem a ver com o entendimento do mundo, e não com a derrota militar, no terreno, nas bolanhas e florestas da Guiné, dos 40.000 militares portugueses que lá se encontravam, em Abril de 1974. Se quiseres, depois de Abril 74, a derrota militar é evidente. Já ninguém queria a guerra, queríamos era todos voltar para casa. Mas chama-se a isto uma derrota militar? Uma derrota militar verifica-se quando os militares são derrotados no campo militar, o senhor de La Palisse não diria melhor. Ora até 25 de Abril 74 não houve nenhuma derrota militar, no terreno, armas contra armas. Nem nossa, nem do PAIGC.
Já estou cansado de bater sempre na mesma tecla. Eu sou um bocado casmurro, reconheço, mas ainda há quem seja mais casmurro do que eu.
O problema é que não se trata de uma questão de casmurrice, mas de continuar ou não a falsificar a nossa História na fase final da guerra na Guiné.
Abraço,
António Graça de Abreu
"Qui a dit que les poètes sont des gens faciles"? (Leo Ferré)
J. Belo!
Nada mais adequado.
"Na mouche"
E, aviso já, não volto ao assunto,
"Guerras ganhas guerras perdidas, militarmente, políticamente", para mim, guerra só a da vida, e basta-me.
Francisco Godinho
Caro António Graça de Abreu,
Outra questão que te coloquei e não teve resposta: se não fosse por via da guerra, seria que hoje ainda estaríamos em África?
Acredito que sim.
Nem tu, nem eu, afinal nem nenhum de nós, fomos corridos a tiro ou à paulada. Mas perdemos a guerra colonial: inesperadamente, surpreendentemente, porque os capitães claudicaram.
Na História, poderá não ficar um registo contrário ao 1º.de Dezembro de 1640, mas é porque desde logo houve muita manipulação na informação, e criou-se a ideia da vitória popular sobre o fascismo, quando o que motivara os capitães fora só a guerra.
Além dissso, não houve qualquer cautela para uma eventual consulta nos termos da Carta das NU, não houve disciplina transitória, não houve qualquer objectividade esclarecida, não houve consideração por brancos e pretos que foram abandonados ao deus-dará em África, não houve propósitos políticos sérios, porque na pressa de claudicar, não se pensou em mais nada e em mais ninguém.
Assim, além da derrota militar que se consubstanciou no regresso inopinado de parte das NT, também politicamente o 25 Abril foi um golpe que não foi além do regresso já e sem ondas.
Se a descolonização poderia ser um processo político derivado, a "vergonhosa descolonização" prova que isso não foi tido em conta, e que deixaram essa matéria, provavelmente sem importância, ao sabor dos acontecimentos, que por si, também não foram controlados.
Desculpa a minha casmurrice, mas também acho que tem havido processos interpretativos demasiado simplistas. A História carece de sistematização, não é?
Um grande abraço
JD
Escreve um comentador:"quando o que motivou os capitães fora só a guerra". Não se pode (nem deve) esquecer,que o que inicialmente motivou os capitães foram UNICAMENTE interesses corporativos quanto ás suas promocöes na carreira militar.Se o motivo inicial tivesse a "grandiosidade de ideais" como serão os de se desejar terminar com uma guerra....teria sido bem menos...pobre. Foi toda uma longa luta dos democratas portugueses contra a ditadura que,literalmente,veio obrigar estes senhores a vestir,rapidamente,outras roupas,já bem perto,e depois de Abril.E,quanto a mim,ainda bem que o povo português,desde os primeiros minutos da liberdade os obrigou a fazê-lo. Um abraco.
Quanto à descolonizacäo ter sido deixada ao "sabor dos acontecimentos"....Isso já será outra história.É que,*acontecimentos*,também se criam. Um abraço
Refere o José Belo:""...ainda bem que o povo português, desde os primeiros minutos da liberdade os obrigou a fazê-lo."
É duvidoso. Muito duvidoso.
O povo podia incorporar manifestações conforme a simpatia ideológica ou pessoal de quem mexia os cordelinhos. Fosse o povo esclarecido, activo,e determinado, e não se teria assistido a tanta incongruência, arrogância revolucionária e contra-revolucionária, e oportunismos variados.
Quanto à falta da "grandiosidade de ideais", naturalmente, se as classes trabalhadoras concretizassem golpes revolucionários de cada vez que não têem o aumento salarial desejado, este país já tinha desaparecido como entidade autónoma. Sobre a acção corporativa, provavelmente, precisava de motivos superiores para mobilizar os indecisos.
Abraços fraternos
JD
JD
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