sábado, 17 de agosto de 2013

Guiné 63/74 - P11948: Bom ou mau tempo na bolanha (27): A velha diligência (Tony Borié)

Vigésimo sétimo episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66.



No velho Oeste Americano, passava a célebre diligência, puxada por três parelhas de cavalos, conduzida por um homem com umas grandes botas, um casaco feito de peles, grandes barbas e um grande chicote, que além do seu assobio, fazia esse mesmo chicote estalar no ar umas tantas vezes, servindo de meio de comunicação com os cavalos, que ao ouvirem o assobio e o estalo do chicote, aceleravam a sua marcha, ou única e simplesmente paravam. Eram o meio de comunicação entre diversas localidades, às vezes isoladas. Havia a “West Fargo”, a “Ponny Express”, a “Stage Coach Company”, a “Overland West Line” e muitas mais.

Enquanto o Cifra prestou serviço militar, na nossa então província da Guiné Portuguesa, havia alguns meios de transporte que poderiam ser: canoa, que os naturais moviam com um enorme remo, que quase sempre viajava a favor da maré, barco movido a diesel e outros combustíveis, da marinha portuguesa, uns barcos construídos em madeira e pintados com cores garridas, que quase sempre viajavam à vela, a favor do vento, alguns também tinham um pequeno motor fora de borda que, entre outros locais, faziam a ligação às ilhas dos Bijagós, de helicóptero e avioneta do correio, da força aérea, e a célebre “Coluna Militar”, do exército de Portugal, que era a mais popular, pelo menos para os naturais.




Uns dias antes perguntavam no aquartelamento quando havia transporte para o norte, ou para o sul, davam o nome, dizendo o que queriam levar, nunca em dia certo, pois a data alterava-se sempre por causa das possíveis surpresas dos guerrilheiros, e avisados com algumas horas de antecedência, lá se apresentavam, com galinhas, gaiolas, animais, trouxas de roupa, balaios de arroz, bicicletas, caixotes, mulheres com filhos amarrados com um grande pano às costas, já falámos em animais, mas alguns levavam o seu cão, preso com uma corda muito bonita feita de tiras da casca de uns arbustos que o referido cão, às vezes coberto de moscas e outros insectos, se entretinha a roer durante a viajem, de o “homem grande”, com uma bengala feita de um pau muito grande, que parecia que era para bater em alguém, e mais um amalganhado de coisas sem fim.


Quando a coluna chegava ou partia, era uma azáfama com o transbordo de pessoas e bens, tal e qual como num posto avançado da fronteira. Nessa ocasião, o Pastilhas, que era o cabo enfermeiro, que às vezes fazia de doutor, aparecia sempre com uma mala à tiracolo, para ver se alguém precisava de curativos, e era uma boa oportunidade para se lhe roubar o frasco do álcool, que quando via o grupo do Cifra a aproximar-se, logo dizia:
- Queres o frasco do álcool, toma lá uma “pica”! - Que era uma injecção, com dose de cavalo, com que às vezes injectava o Cifra, quando este estava com uma simples constipação e andava com o ranho no nariz.

Os militares, aceitavam toda esta companhia, de pessoas e bens, de bom humor, pois era uma espécie de protecção durante o percurso, pensando que os guerrilheiros não iriam atacar os seus próprios conterrâneos, até se fazendo amizades durante a viagem. Só houve notícia de um ataque a uma coluna militar que transportava pessoas naturais, portanto quando apareciam no aquartelamento, procurando transporte, todos eram bem-vindos, e às vezes até se aproveitava para se fazer viagens que não estavam programadas, mas que havendo pessoal civil para transportar, os militares faziam deslocações de pessoal militar e abastecimento de unidades, tudo dentro de zona de combate que, de outra maneira, seria mais difícil.

Eram os chamados “escudos humanos”, passe o termo, claro.

Tony Borie,
Setembro de 2012
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Nota do editor

Último poste da série de 13 DE AGOSTO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11936: Bom ou mau tempo na bolanha (26): Os amigos regressados do Vietname (Toni Borié)

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