Meus caros amigos e camaradas
Eu não escrevo por compulsão mas por impulso. Assim necessito de uma ignição, dum clique que me desbloqueie e que faça voar e alinhar as palavras.
Por isso eu não sou um escritor mas sim um contador de estórias. E contador porquê? Porque é necessário um facto, uma foto, um risco no chão, um encontro com um amigo, um cheiro, um lugar etc, enfim um momento que faz despoletar a imaginação que dá ordem aos dedos e então escrevo.
Por vezes quando me faltam as palavras e se me embarga a voz, recorro a outro estratagema. Passo a alinhar pensamentos, palavras, emoções, donde saem arremedos de poesia, mais ditados pelo coração do pela razão e pela qualidade.
E foi o que aconteceu ontem na Tabanca de Matosinhos a Tertúlia onde amigos me receberam para além do que eu esperava.
Naquele encontro aconteceu calor humano, amizade, poesia e emoção e pensarão alguns, que é coisa pouca, mas não é, pois nem só de pão vive o homem.
Para acontecer amizade, só precisamos de um amigo e estavam lá tantos!
Comecei este texto a denunciar-me.
Não tenho nenhuma formula mágica, sai naturalmente após o clique, escrevo as “coisas” que evoluem como cozinhado, onde se vai fazendo e provando de sal aqui, ervas aromáticas ali e finalmente, deixando apurar até que o calor manso, faça libertar os aromas e o sabores que estavam escondidos.
Depois disto tudo, leio e digo para comigo, “foi fácil, como é que não me tinha lembrado disto”?
Ontem o José Teixeira leu um poema retirado do meu livro. Ouvi-lo ler, foi das experiências mais maravilhosas que me aconteceram na vida.
O poema não era meu, era de quem o estava a ler, pois ele ao fazê-lo recriou-o, deu-lhe tudo o que lhe tinha faltado até então.
Deu-lhe voz, deu-lhe som, projectou as imagens de frescura e luz, fez-me recordar o rapazola que foi para a Guiné e a pessoa que de lá regressou.
Zé Teixeira ao ler o poema e a amizade demonstrada por todos, fez de mim um homem feliz num dia que não esquecerei nunca.
A todos os camaradas quero agradecer as provas de amizade e na verdade, ir para a tropa e para a Guiné fez de nós homens diferentes.
Está mais que provado.
JA
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2 - Poema lido pelo José Teixeira
UMA PARTE DE NÓS FICOU PARA SEMPRE LÁ
A luz fere-me os olhos
O mar que me embalou na viagem
Quebrou-se manso na barra
Lá está a ponte no seu vai e vem
Ainda guardo a imagem da partida
Para trás ficaram as águas barrentas
O calor sufocante
O cacimbo
O Céu de chumbo
Os dias e noites de insónia
A insanidade afogada num copo
O rosto, que duvido se terá existido
Tão ansioso da partida
Mal posso esperar pela chegada
O Sol resplandece na manhã fria
A maresia invade-me o peito
Voltam os cheiros adormecidos
No cais a molhe de sorrisos cresce
Lisboa maravilha-me
O ar fresco e límpido
Mal posso esperar pelos braços que me aguardam
Haverá lágrimas, serão de alegria
Deito o cigarro fora
Fico a vê-lo rodopiar até tocar na água
Finalmente caminho no passadiço
Vim para ficar
Pensei que o passado ficara para trás
Como pude ser tão cego
Pensar que esquecia tudo
Que uma parte de mim não ficaria lá para sempre
Na ânsia da partida
Neguei-me a olhar para trás
E agora, que a saudade me corrói
Sei que nunca regressei na totalidade
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3 - Algumas fotos da apresentação do livro "A Tropa Vai Fazer De Ti Um Homem", na Tabanca de Matosinhos
É este o ambiente de camaradagem que se vive na Tabanca de Matosinhos, semana após semana, todas as quartas-feiras, desde há muitos anos...
...Onde a música também marca presença. À esquerda, atacando o cavaquinho, o nosso camarada tertuliano João Rebola
Juvenal Amado durante a sessão de autógrafos
Juvenal Amado com o António Tavares e o Manuel Carvalho Passos. Três camaradas da tertúlia do nosso Blogue
Juvenal Amado e Francisco Baptista. Ambos têm em comum o saber falar das suas terras e das suas gentes
Muito bem "intrometido" entre o Juvenal e o Tavares, o nosso contador-mor de belas histórias de amor, o José Ferreira da Silva (o Silva da CART 1689).
Juvenal Amado veio a Matosinhos também para saborear o belo bacalhau do Milho Rei. Aposto.
Juvenal Amado e o seu colega escritor António Marques Lopes, autor do livro "Cabra Cega - Do Seminário para a Guerra Colonial".
Juvenal em conversa com o Manuel Passos, combinando talvez outra visita a Matosinhos. Quem sabe?
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Selecção e legendagem das fotos da responsabilidade do editor
Fotos enviados por Juvenal Amado
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Nota do editor
Último poste da série de 13 de março de 2016 Guiné 63/74 - P15851: Agenda cultural (468): Juvenal Amado apresenta o seu livro "A Tropa Vai Fazer de Ti um Homem! (Guiné 1971-1974)", na sua terra, Alcobaça, na Biblioteca Municipal, sábado dia 19 deste mês, às 16h00. Além do alcobacense José Alberto Vasco, o livro será apresentado também por Belarmino Sardinha, nosso grã-tabanqueiro
3 comentários:
Meu caro Juvenal!
Aprendi muito, no pouco tempo que tive o prazer de partilhar contigo, mais um almoço na "minha" tabanca.
Ali, todas as quartas feiras, aprendo algo de novo e vivêncio momentos lindos de amizade, fraternidade e convívio... e desejos de regresso a um passado que teimávamos em esconder, talvez por medo... talvez por receio da incompreensão...talvez porque querermos esconder aquilo que não pode ser escondido, porque faz parte intrínseca de nós e como tal por mais que queiramos, não pode ser abafado, sob o risco de ficarmos doidos e stressados.
Explode-se, fala-se de coisas há muito abafadas na mente e pronto! respiramos fundo. Ali onde alguém passou por cenas muito próximas, nos compreende e partilha, nos estimula a continuar porque nos compreende como ninguém.
Ali, se dá vida à própria vida, se dá alento para o caminho que queremos percorrer, sem apoios, porque fomos "carne para canhão" no período mais fértil da nossa vida e esquecidos no momento seguinte, quando já não precisavam de nós.
Gritos como o teu, " A tropa fez de ti um homem!" vão se ouvindo agora que estamos a caminhar para a velhice- a verdadeira - e ecoam na Tabanca de Matosinhos para nos fazer retornar ao tempo do sonho que muitos dos nossos camaradas não tiveram tempo para pôr em prática porque a morte chegou mais cedo, no sopro de uma granada ou no estilhaço que lhe penetrou o coração.
O teu poema, que comovido li, espelha o sentimento de tanta gente que esteve na Guiné, cultivou o sangue, o suor e as lágrimas... e o medo. Que regressou com juras de não mais voltar e hoje tem sonhos perturbados que lhe gritam, volta! Apaga a sede que te devora!
Apenas tentei dar voz e vida às tuas palavras que tão bem espelham esse sonho que sinto em tantos camaradas que passam pela Tabanca de Matosinhos.
Obrigado Juvenal.
Zé teixeira
Caro Juvenal
É com muita alegria, que vejo o modo como foste recebido na Tabanca de Matosinhos.
O, que para mim, não é de estranhar. Respira .. fundo, até breve, um forte abraço, do teu "camarigo",
Jorge Rosales
Vou poucas vezes à nossa Tabanca de Matosinhos. Não sei bem porquê, mas quando tenho que atravessar Gaia e Porto duma assentada, fico meio stressado e menos desmotivado para avançar. Para mim, ir a Matosinhos, é mais "difícil" do que ir a Aveiro ou a Amarante.
No entanto, não posso andar muito tempo sem ir à Tabanca. A malta é alegre, come-se bem e também se alimenta ali boa camaradagem.
Sabendo da vinda do Juvenal, para promoção do seu livro "A TROPA VAI FAZER DE TI UM HOMEM", arranjei tempo mais que suficiente para merecer a sua companhia e a sua simpatia. Gostei de o ter conhecido melhor e gostei da forma como ele foi recebido e acarinhado.
Parabéns Juvenal.
Obrigado pela visita.
Esperamos mais sucessos.
Abraço do José Ferreira (Silva da Cart 1689)
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