sábado, 12 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18625: Os nossos seres, saberes e lazeres (267): De Estremoz para as Termas de S. Pedro do Sul (4) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 1 de Março de 2018:

Queridos amigos,
O fito para termo da viagem era mesmo estacionar nas termas de S. Pedro do Sul, o que havia a farejar era no mundo termal, o viandante portou-se como um aquista, deambulou pelas margens do Vouga, repimpou-se na biblioteca do Palace e andou de câmara na mão à procura dos seus regalos.
Ficará para outra oportunidade visitar Manhouce, subir às alturas para contemplar as serras de Montemuro, Estrela e Caramulo e até pôr os pés em Viseu e Lamego, são museus inescapáveis, há para ali arte sacra do melhor, desta vez era a satisfação de uma lembrança por causa dos bilhetes postais que o viandante recebera na Guiné, nestas termas, enquanto procurava aliviar os tormentos das artroses, escrevera-lhe bilhetes postais com votos de boa saúde e que regressasse bem para reiniciar a sua vida, escrevia como se estivesse a fazer promessas e o viandante veio aqui recordar a gratidão que deve a tais lembranças.

Um abraço do
Mário


De Estremoz para as termas de S. Pedro do Sul (4)

Beja Santos

As termas de S. Pedro do Sul são o termo da viagem. Uns vieram à busca de tratamento para os seus males respiratórios, o viandante vem à procura de lembranças, como explica. Durante aqueles anos em que andou a fazer guerra pela Guiné, a sua mãe meteu-se ao caminho e veio aqui fazer cura balnear para os seus joelhos carregados de artroses. Enviou-lhe em agosto de 1968, setembro de 1969 e junho de 1970 postais marcados pela esperança no alívio do seu sofrimento, que tudo estava a correr bem na companhia do neto mais velho, que se banhava nas águas do Vouga, e que estava cheia de saudades do filho, rezava permanentemente para que nada de mal lhe acontecesse. O viandante guardou esses postais e aqui está à cata de lembranças. Resta dizer que se sair de Monsanto e se andou por quilómetros de terra calcinada, paisagens lunares, o grotesco de alturas destemidas e granitos furibundos contrastando com solos enegrecidos, ainda será pior no regresso quando o viandante regressar sozinho de autocarro, logo Vouzela e Oliveira de Frades pareciam ter levado com uma bomba de neutrões em cima, eram florestas derribadas, aquele violento contraste entre o casario de pé rodeado dos vestígios do fogo adormecido. Pois bem, chegou-se às termas, olhou-se especado para este Titanic em terra e o viandante disse com fé: daqui não saio, é só ler e passear aqui à volta, daqui não saio, daqui ninguém me tira.



O escritor Alain Robbe-Grillet escreveu o argumento do filme “O Último Ano em Marienbad” de Alain Resnais, e o viandante nunca esqueceu aquele ambiente alucinante com misturas de tempo incríveis; também guarda lembranças do sanatório em que decorre uma das obras-primas de Thomas Mann, “A Montanha Mágica”, os temas bailam pela cabeça do viandante. Começa a itinerância passeando-se pelo Inatel Palace Hotel, o gigante data do início da década de 1930, conheceu maus momentos e teve que ser remodelado anos depois de aqui terem vivido famílias de retornados. Nos anos 1990 foi alvo de obras e aqui está, sumptuoso e confortável. O viandante anda à volta e procura dimensionar o que a região das termas oferece.



O ciclópico hotel tem quartos para todas as dimensões e bolsas, vai da suíte ao turístico, é acolhedor na sala de jantar e no bar, oferece biblioteca e um conjunto de jogos, tem piscina, solário e jardins. S. Pedro do Sul está a escassos quilómetros, tem a fama o Vale de Lafões e a Serra de S. Macário de onde se avistam as serras de Montemuro, Estrela e Caramulo, pormenores que nesta viagem não provocam qualquer aliciante ao viandante, veio para bisbilhotar, matar a curiosidade, cheirar águas sulfurosas, ouvir conversas dos termalistas, captar pormenores, anda atento aos elementos Arte Deco, são discretos, leves e muito bem enquadrados.



Quem desenhou a traça deste hotel ciclópico sabia da poda, rasgou corretamente os pontos de luz, estabeleceu para esses espaços comunitários uma boa relação na escala, desenhou bons truques, lambris, sugeriu dimensões palacianas para o restaurante e adjacências, os aquistas podem aqui entrar alquebrados mas rendem-se à majestade do lugar.



Quando o viandante foi pagar a primeira refeição teve a agradável surpresa de ver uma rutilante aguarela de Sofia Areal, artista que muito aprecia, vejam como assenta como uma luva, ainda bem que convocam as belas-artes para estes espaços.



No chamado período laboral, ruído não falta à volta desta região termal, andam a fazer obras em frente do hotel, são as ruínas romanas e uma igreja porventura medieval que são alvo dos trabalhos. Porque o local é antigo, a nascente de água termal de S. Pedro do Sul é explorada desde o século I da nossa era. Os romanos construíram um balneário (o que dele resta é hoje monumento nacional), sobre cujas ruínas D. Afonso Henriques mandou edificar um novo balneário. Passeia-se pelas ruas e sentem-se os odores das águas sulfúricas, o viandante descansou, passeou, teceu planos para próximas viagens, daquilo que tem em agenda irá em breve à Provença, mais tarde aos Pirenéus franceses, recebeu um convite para passar uns dias entre Haia e Roterdão com o inevitável regresso a Bruxelas e depois uns dias não muito longe de Oxford. Se Deus nosso Senhor lhe der vida e saúde, 2018 será sulcado por passeios europeus, ficará para mais tarde outros passeios mais alentados.
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Nota do editor

Poste anterior de 5 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18606: Os nossos seres, saberes e lazeres (265): De Estremoz para as Termas de S. Pedro do Sul (3) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 10 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18621: Os nossos seres, saberes e lazeres (266): VI Encontro de Teatro Sénior, de 11 a 13 de Maio de 2018, na Academia de Instrução e Recreio Familiar Almadense, em Almada (António José Pereira da Costa)

4 comentários:

António J. P. Costa disse...

Olá Camarada
Se bem vi, aquele cache-pot que está na 5ª foto foi feito na Viúva Lamego, que ainda existe.
No palácio de Queluz há alguns já um bocado velhotes e na residência oficial do CEME, em Queluz há um ou dois bastante bons.
Um Ab.
António J. P. Costa

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Antº Rosinha disse...

Terras tão interessantes, como esta, e como deu retornados!

Mas que sina!

Carlos Vinhal disse...

Senhor anónimo, esta série chama-se Os nossos seres, saberes e lazeres, se não gosta, passa à frente.
Por favor repita o seu comentário, identificando-se.
Carlos Vinhal
Co-editor