quarta-feira, 6 de março de 2019

Guiné 61/74 - P19554: Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (1): a ansiedade da partida e o calor humano da chegada, em 2 de março de 2019

Luís Oliveira
1. Texto do Luís Mourato Oliveira, nosso grã-tabanqueiro nº 730, que foi alf mil inf, de rendição individual, na açoriana CCAÇ 4740 (Cufar, 1973, até agosto) e, no resto da comissão, o último comandante do Pel Caç Nat 52 (Setor L1 , Bambadinca, Mato Cão e Missirá, 1973/74): é bancário reformado, foi praticante e treinador de andebol; vai estar 3 meses como voluntário na Guiné-Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambuno âmbito de um projeto da associação sem fins lucrativos ParaOnde, que promove o voluntariado em Portugal e no resto do Mundo. (*)

Esta é a primeira crónica que ele nos prometeu escrever para o blogue da Tabanca Grande, e que nos acaba de chegar... 


2. Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (1): a ansiedade da partida e o calor humano da chegada, em 2 de março de 2019


A partida para Bissau, marcada desde Dezembro, parecia nunca mais chegar. Detesto as longas esperas, sobretudo quando a caminhada é uma incógnita e fértil em surpresas que até poderão não ser as melhores.

Depois as conversas com os amigos:

­‑ Tás é tótó, agora o velhadas quer ir para a Guiné! Pensas que tens vinte anos...isso era dantes, agora estás lixado, vais levar com os mosquitos, com a lagartada, pensas que tens a EPAL, estás f…! Tem mas é juizo e passa o bilhete a outro, os guineenses já nem falam português, nem te percebem!

E os dias foram passando lentamente, a ansiedade aumentando até que, tal como há quarenta e cinco anos atrás, chegou aquela tranquilidade que me protege nas alturas mais complicadas, passei a dormir melhor, a obsessão do embarque ficou distante e a partida, e tudo o que surgiu a seguir, passou a ser uma data de calendário com uma nota em agenda: “!Voo TAP TP1479, 17.40 do dia 2 de Março”.

E lá estava eu no aeroporto, convencido a ficar fechado naquele contentor voador durante quatro horas, sem direito a soltura, sujeito ao ar forçado e à simpatia das hospedeiras. Nem quero falar do que chamaram “jantar”, porque por sinal tratou-se apenas de um pormenor. O “pormaior” foi o assalto que a companhia de bandeira nacional fez a todos os passageiros cujas malas de cabine não cabiam na reduzida forma que criaram com o fim sacar cento e cinco Euros a todos os desprevenidos.

A minha mala de cabine que voou para Londres, Barcelona, Madrid, Roma, Milão nunca pagou um Euro e apresentava a medida certa, desta vez ou dilatou com o calor ou a TAP temia a sua dilatação no espaço aéreo Guineense e cobrou a quem podia e a quem não o podia fazer. Passageiros houve que deixaram a bagagem para que a mala apresentasse a elegância exigida pela bitola TAP.


Escola Privada Humberto Braima Sambu >  O novo uniforme dos alunos. 
Cortesia da Página do Facebook da Escola.  21 de novembro de 2018


Chegados a Bissau, digo chegados porque a Silvia Barny, voluntária do ParaOnde, também viajou neste voo e, após recolhidas as bagagens, tivemos a emotiva surpresa da recepção. Além do director da escola, o professor Humberto Braima Sambu e alguns professores, um numeroso grupo de alunos com o uniforme da escola cantaram as boas vindas e proporcionaram um acolhimento extraordinário.

Estava na Guiné das minhas memórias, o mesmo povo, a mesma simpatia daqueles que nunca deixarão de ser irmãos.

Bissau, 5 de Março 2019


__________

Nota do editor;

(*) Vd. poste de 8 de fevereiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19482: Ser solidário (222): O nosso camarada Luís Mourato Oliveira parte dia 2 de março para Bissau, para fazer voluntariado durante 3 meses, através da organização sem fins lucrativos "ParaOnde"... E qualquer ajuda humanitária adicional pode ser encaminhada para (e seguir por conta de) a loja "Paris em Lisboa", no Chiado

3 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Luís Oliveira, és um grande ser humano e a Tabanca Grande deseja-te a melhor estadia possível, aí, nestes 3 meses em Bissau... É uma pequena grande aventura, para ti...E obrigado pela tua primeira crónica!... Da Lourinhã, com um alfabravo do Luís Graça.

PS1 - Quero ainda ver esses miúdos e miúdas guineenses... campeões, daqui a uns anos, da cidadania e da dignidade humana (e porque não, também, de andebol?!...)

PS2 - Se puderes, manda também umas "chapas" de Bissau e arredores...

Anónimo disse...

Foi mais ou menos assim, que se passou comigo, quando lá voltei 15 anos depois, mas em ambiente muito diferente, e lamentavelmente, ia sozinho, sem um destino na mente, apenas apagar os fantasmas.
Nunca me arrependo de lá ter ido, mas agora com a minha idade, já penso mais na saúde, e nas minhas capacidades físicas e mentais.
Boa sorte, e já agora também umas chapas de coisas novas.

Saúde meu amigo,

Virgilio Teixeira

JD disse...

Parabéns! O texto é claro, e descreve situações engraçadas, entre elas, uma que já vivi, quando durante um almoço com amigos referi que gostaria de voltar à Guiné. Foi a risada geral (felizmente não éramos muitos), e libertaram-se os dichotes em tudo semelhantes aos que o Luís Oliveira descreve muito bem. Há uma diferença de dez anos entre os eventos, mas foi como se fosse agora, melhor, o que li, foi como se tivesse sido então. No meio de chinfim gozado, inopinadamente, ouviu-se uma voz grossa: ó Zé, vou contigo! E passámos a ser dois as vítimas daquela malta inspirada e bem disposta. Depois seguiu-se um período de combinações com a organização da coluna, e no dia aprazado lá fomos em fila de pirilau para viaturas, carregados de «morfes», pacotes de vinho, whiskies, e o que mais calhou. Não me recordo se levámos macaco e outras ferramentas, o que estávamos, era desejosos de aventura, que não chegou a ser tanta. Ao entrarmos por Pirada, já a lua ia alta, depois de cinco dias de correrias e surpresas à média de mil quilómetros por dia, já não reconheci o sítio, mas fui abordado pelo chefe da alfândega que pretendia conhecer-me (é o que dá levarmos "bufos" na companhia) e fez ele a sua apresentação. Correu tudo bem e depressa. Junto à parede exterior do edifício, juntava-se uma pequena multidão, que pela janela assistia a um jogo de futebol televisionado na Europa. Acabada a nossa identificação, novamente o chefe do posto veio ao meu encontro, e após uma conversa franca e sorridente, selámos o encontro com um abraço de genuína admiração recíproca. E abalámos rumo ao Gabu, por uma picada que já tinha sido muito mais suave, sempre em direcção a Bissau, onde chegámos tarde e cheios de fome a um alojamento que ignorava as nossas necessidades de esfomeados, mas disso já tínhamos experiência, e o problema resolveu-se com recurso aos enlatados.