sábado, 9 de março de 2019

Guiné 61/74 - P19566: Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (2): domingo de carnaval

Luís Mourato Oliveira

1. Segunda crónica do Luís Mourato Oliveira, nosso grã-tabanqueiro nº 730, que foi alf mil inf, de rendição individual, na açoriana CCAÇ 4740 (Cufar, 1973, até agosto) e, no resto da comissão, o último comandante do Pel Caç Nat 52 (Setor L1 , Bambadinca, Mato Cão e Missirá, 1973/74): é bancário reformado, foi praticante e treinador de andebol; lisboeta, tem fortes ligações à Lourinhã,  Oeste, Estremadura...

Acabou de chegar a Bissau onde vai estar 3 meses como voluntário  na Escola Privada Humberto Braima Sambu, no âmbito de um projeto da associação sem fins lucrativos ParaOnde, que promove o voluntariado em Portugal e no resto do Mundo. (*)




Guiné-Bissau > Bissau > Carnaval 2019. 

Vídeo de Luís Oliveira (2019)

Domingo de Carnaval

por Luís Oliveira



Após o sono reparador que apagou completamente a imagem da viagem e do local onde me encontrava (*), acordei em total conflito com a rede mosquiteira e tive a desagradável sensação do carapau quando traiçoeiramente cai nas redes que o trazem para o nosso prato.

Após a breve luta para me libertar da confusão do tecido, abri finalmente os olhos para a realidade. Este não é o meu quarto! Afinal estou mesmo na Guiné-Bissau. E agora?

Primeiro esfregar os olhos, fazer o reconhecimento do terreno, identificar as malas... onde estarão as cuecas? Na mala de porão ou na dos cento e cinco euros da TAP? As t-shirts estão na verde, de certeza. Os comprimidos para quase tudo,  que fazem parte do pequeno almoço,  estavam naquele saco de plástico da farmácia, disso tenho a certeza,  o único problema é encontrá-lo.

Cinquenta voltas ao quarto de treze metros quadrados, mas enorme dado o único mobiliário ser a cama.




Guiné >Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Mato Cão > Pel Caç Nat 52 (1973/74) > Natal de 1973 > Agestão (complexa) de um destacamento, isolado,no mato, na margem direita do Rio Geba Estreito.  No foto, o Luís Mourato Oliveira, que era o "dono da tasca"...


Foto (e legenda): © Luís Mourato Oliveira (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].



Há quarenta e tal anos também não havia mobiliário para arrumos mas o bricolage transformou uns cunhetes de munições em armários que fariam inveja aos dos dias de hoje no Ikea. Agora toca a reciclar o que aparecer para arrumar e organizar.

Depois dos vinte minutos do exercício de orientação,  estava pronto e junto com as minhas companheiras de missão e da casa, a Leonor, a partir de agora Nôno, e a Sílvia. A nossa veterana é a Nonô que abancou sozinha na casa, serviu na escola com sucesso e demonstrou grande coragem e capacidade de adaptação. O mesmo sucede com a Sílvia, mulheres do Porto são assim, afirmo eu, mesmo sendo do Oeste.

A Nonô dirigiu as operações. Deslocação ao centro, levantar moeda local, comprar um cartão de dados que são comercializados e carregados em plena rua ou em contentores adaptados a quiosques ou até numa cadeira de praia sob um chapéu de sol com a marca da operadora. A tecnologia não conhece fronteiras nem estados de desenvolvimento social e por essa razão esta compra até antecedeu as nossas necessidades de abastecimento no supermercado.

Qualquer cidadão desprevenido, acabado de chegar da Europa, corre grave risco de síncope cardíaca, confirmei imediatamente se trazia o kit de comprimidos SOS Nitromint (0,5 mg de Nitroglicerina). Estão no bolso felizmente, mas a garrafa de água de Penacova continua marcada por quinhentos francos! 

Estou a falar a sério quinhentos francos! Só após um raciocínio complicado para o dia me lembrei que um euro vale cerca de seiscentos e cinquenta francos [, CFA,] e portanto a coisa não estava assim tão feia e não corria o risco de desidratação.

Regresso a casa, almoço com o professor Humberto [Braima Sambu]  num restaurante de portugueses onde foi servido “arroz de pato”... Se não lhes der a minha receita do verdadeiro Arroz de Pato ou se decidir eu próprio abrir uma tasca ao lado, vão perder clientela...

Por fim, o Carnaval. Um divertido desfile constituído por diversas associações e onde são representadas as diversas etnias com seus cânticos usos e costumes. Gostei imenso e foi deveras divertido. Apesar de tudo,  não consegui deixar de lembrar Torres Vedras e as inimitáveis Matrafonas.

Bissau, 3 de Março de 2019.

Luís Oliveira

___________

Nota do editor:

(*) Poste anterior da série > 6 de março de 2019 > Guiné 61/74 - P19554: Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (1): a ansiedade da partida e o calor humano da chegada, em 2 de março de 2019

7 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Luís, estou a gostar das tuas curtas mas saborosas crónicas "from Bissau with love"... Vou-te incumbir de uma missão diplomática, que é trazer o professor Humberto Braima Sambú até à nossa Tabanca Grande!... Temos o lugar nº 785 para ele se sentar à sombra do nosso poilão.

Acho que temos que dar a conhecer e levar a reconhecer o trabalho dele em prol da educação dos miúdos e miúdas da Guiné... Espero que as tuas crónicas nos ajudem a perceber melhor o que este guineense tem feito, na sua escola...

Por outro lado, já sabemos que o nosso querido amigo e irmãozinho Cherno Baldé, é teu vizinho, mora a 500 metros da tua morança... É o tema da tua 3ª crónica... É caso para dizer "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande!"... Dá-lhe um especial abraço meu, quando voltares a estar com ele... LG

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Luís:

Mais um "recado": Procura também o Patrício Ribeiro, aí em Bissau, bem como a nossa amiga Catarina Schwarz, dois dos nossos outros grã-tabanqueiros aí de Bissau, tal como a Isabel Levy, a mãe da Catarina, e viúva do nosso muito querido amigo Pepito (1949-2012)...

Se o tempo te sobrar, pois claro... Afinal, estás para trabalhar na Escola Privada Humberto Braima Sambú... Mas também tens direito descanso... Imagino que ainda queiras, num fim de semana destes, voltar aos teus "locais do crime": Mato Cão, Missirá, Bambadinca, Cufar... Até ao fim de abril, ainda podes dar um salto até ao sul... Depois, com as chuvas, é mais complicado andar por essas picadas fora... Vai escrevendo.

Cherno AB disse...

Caro amigo Luis Graça,

Efectivamente, o Luis já está a colaborar na escola do Humberto aqui no Bairro, esteve também numa visita rápida na minha morança, onde vivem 12 pessoas permanentes e sempre, entre 3/4 pessoas de passagem ou em convalescência e, onde eu sou o Chefe e provedor. Em Africa é assim. A casa/morança é uma especie de Embaixada dos conterrâneos que vêm para a Capital por diversas razões.

Esta tarde visitei o local onde estão alojados e conversamos um pouco e descobrimos que, também, somos adeptos do mesmo Clube, o Sporting CP e que hoje vai defrontar o Boavista.

Com um abraço amigo,

Cherno Baldé

Anónimo disse...

Luis Oliveira
sábado, 9/03/2019, 23:30

Boa noite Luís

Acabei de assistir ao prelio entre o Boavista e o Sporting em relato que farei oportunamente.

Quando me preparava para sair tive a visita do Cherno acompanhado pelo professor e pelo Braima, um jovem professor que trabalhou com o Sambu.

Foi muito gentil e convidou-me para o visitar sempre que quiser para continuarmos as nossas conversas.

Pedi-lhe o e mail e, como não havia forma de registo, autorizou que tu mo facultasses.

Espero que as cronicas sejam divertidas e que consigam dar um cheirinho desta terra tão mal tratada.

Abraço

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Bom dia, Luís, aqui tens o email do Cherno Baldé (...).

Ele tem 180 referências no nosso blogue, é mais antigo do que tu na nossa Tabanca Grande...

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/search/label/Cherno%20Bald%C3%A9

Ainda gostava de ver as suas "memórias de menino e moço" publicadas...em livro!...

É um grande ser humano, já falei com ele ao telefone, mas não nos conhecemos pessoalmente... Trato-o por "irmãozinho"... Não sabia do vosso "sporinguismo"...

Vou tentar publicar, com regularidade, as crónicas que nos mandares... Como sabes, a maior parte da malta não cortou o "cordão umbilical" que a liga a essa terra e a essa gente, que merece muito mais do que tem... E o pouco que tem, sabe partilhá-lo com a grande generosidade dos africanos.

Um alfabravo, Luís

Antº Rosinha disse...

A propósito de escolas ou falta delas, na Guiné-Bissau, vem nos jornais que há Crianças guineenses exploradas por religiosos no Senegal.

Religiosos que ensinam o corão, penso que não acontece com os que ensinam o catecismo.

Já se espera de tudo, hoje em dia.

Talvez antigamente já aconteceria o mesmo.

patricio ribeiro disse...

Boas

Eu como sempre, nestas alturas,
há espera dos resultados das eleições, que foram hoje em Varela.

Com ostras e alguns peixes que vem parar as minha velhas canas de pescas, que já estão ensinadas...

Espero se esta semana estar em Bissau para beber uma cerveja, com o pessoal da nossa grande tabanca.

Abraço, desde o frio de Varela, que é o que já se faz sentir a esta hora