segunda-feira, 13 de julho de 2020

Guiné 61/74 - P21165: Notas de leitura (1293): “BC 513 - História do Batalhão”, por Artur Lagoela, edição de autor, Junho de 2000 (3) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Abril de 2017:

Queridos amigos,
Desta edição de autor, com uma tiragem de 300 exemplares, e havendo tanto esquecimento de que a região Sul conheceu a subversão em força a partir do segundo semestre de 1962, conta-se uma saga que muitos desconhecem, é a história de um batalhão que permaneceu no Sul a desbravar terreno, a fundar quartéis, como os de Guileje e Mejo, a confrontar-se com forças bem posicionadas no terreno, deram luta, foram à luta, intimidaram, e tudo isto se passou numa altura em que a guerra evoluía do abatis e da possibilidade de deslocar pelotões de reconhecimento FOX e Daimler até à chegada de armamento mais sofisticado, como os canhões sem recuo e a colocação de minas anticarro por todos os itinerários.
Documento indispensável para o estudo da guerra da Guiné numa região onde tudo nos foi acontecendo desfavoravelmente, sobretudo em 1973, muitas daquelas posições foram sendo abandonadas pela lógica da concentração de recursos, a partir de Spínola.

Um abraço do
Mário


BCAÇ n.º 513, a divisa era “Ceder Nunca” (3)

Beja Santos

BC n.º 513: uma unidade militar destinada a Moçambique, desviada à última hora para a Guiné. Primeiro constituída por uma CCS a que se juntaram Companhias de Artilharia, e depois outros, como Pelotões FOX e Daimler, de artilharia, de morteiros, e algo mais. Coube-lhes o Sul, um Sul ao Deus dará, estamos em 1963, é tudo difícil em Aldeia Formosa e nos seus amplos arredores, há regiões ricas em arroz cobiçadas pelo PAIGC, em Incassol, na região de Forriá, em Campeane, na orla de Cacine, por exemplo. Lê-se esta História do Batalhão BC 513, de Artur Lagoela, edição de autor, 2000, e fica-se com muitíssimo respeito pela sua atividade operacional: reocupação do Chão Fula e captação da população civil, já ocorreu a desarticulação daquela região Sul, com subversão, com instalação de corredores, com assaltos armados às casas comerciais, uma região totalmente controlada (Ganturé, Sangonhá, Cacoca, Cameconde e Campeane) abastecedora do Cantanhez. Ocupa-se Gadamael, cria-se da raiz Guileje, abrem-se itinerários, alguns em condições verdadeiramente épicas, como Cacine – Cameconde. Mas não só, montam-se emboscadas, uma delas dará brado, ocorreu na estrada Aldeia Formosa – Fulacunda no cruzamento de Buba, em Junho de 1964, afugentou-se a força inimiga e capturou-se muito material.

Instalados em condições precárias, conhecedores do modo como o PAIGC opera com agressividade, usando fornilhos e diferentes minas, procura-se intersetar transporte de material, patrulha-se Guileje – Gadamael, reconstroem-se pontões, reocupa-se Mejo, patrulha-se as estradas Mejo – Salancaur e Mejo – Bedanda. Fazendo o ponto da situação de ataques e flagelações entre Novembro de 1963 e Maio de 1965, desde a mais fustigada posição (Cameconde) até aquelas que esse momento tiveram a vida mais aliviada (como Guileje, Mejo, Gadamael-Porto, Cacoca e Colibuia) houve 53 de que resultaram 4 mortos e 15 feridos na tropa e 2 mortos e 10 feridos na população. São tempos irrepetíveis, em Maio de 1964 reage-se em Sangonhá a um ataque potentíssimo, a força atacante retira deixando material. Será assim em Cumbijã, aí viveram-se horas angustiantes. Escreveu-se no relatório: “Cercando a povoação de Cumbijã havia ainda vários grupos IN com metralhadoras e pistolas distribuídos por cerca de 10 grupos colocados na mata cerrada. O IN espalhava-se em leque desde Sul até Oeste. Cerca das 3h20 o ataque diminuíra intensidade até às 4h20. A esta hora recomeçou de novo, com maior intensidade com grandes gritos do IN dizendo: ‘É hoje que entramos, Cumbijã é nossa’. O inimigo proferiu ainda injúrias e asneiras sem fim ditas em português corretíssimo".

É um historial de flagelações, emboscadas sem descanso até ao fim da comissão, na região Sul: Guileje conhece a sua primeira grande prova de fogo de 29 para 30 de Novembro de 1964, o PAIGC ataca em Nhala, em Canturé, tem muita população aderente, como se escreve no relatório: “A população Beafada da região de Antuane desde cedo se ligou ao PAIGC e os Balantas que cultivam arroz nas bolanhas do rio Cumbijã seguiram-lhe os passos. Assim se estabeleceu e foi consolidando um grande conjunto de acampamentos na região de Antuane, apoiado logisticamente nas ricas tabancas existentes ao longo do rio Cumbijã. Tornou-se sempre muito difícil às nossas tropas atingir essas regiões, não só pelas grandes distâncias a percorrer como pela facilidade em impedir os movimentos, bloqueando o ponto de passagem obrigatória de Galo Bobola. Enquanto foi possível circular livremente as viaturas, confiou-se às unidades de reconhecimento da Cavalaria o patrulhamento destas áreas. Depois do aparecimento de minas em larga escala as tropas passaram a andar a pé. De igual forma a região Injassame – Incassol, foi ficando fora de controlo das nossas tropas por os acessos serem muito limitados e facilmente controláveis e a distância a percorrer foi sempre para cima dos 40 quilómetros, ida e volta”.

O histórico enfatiza a operação “Gira” que tinha por missão atacar as bases inimigas na região de Bantaela Silá – Bulel Samba – Dalael Balanta, seriam seguramente poderosas por requereram três colunas, decorreu entre 13 e 15 de Fevereiro de 1965. Temos meios aéreos alvejados, desde helicóptero a T6. No seu relatório o Comandante do BC 513, o Tenente-Coronel Luís Gonçalves Carneiro louva-se no notável comportamento de todos os Comandantes de Companhia, pela abnegação, sacrifício, serenidade e destemor exemplares de todos os militares. Com o BC 513 colaborou o Grupo de Comandos “Fantasmas”, numa operação deslocaram-se de Nhala para Incassol, percorreram a região de Canconté e Bojol Balanta, destruíram casas de mato e grandes depósitos de arroz.

Exerceram a ação psicossocial por intermédio das subunidades do Batalhão, com destaque para o setor de Buba, procurando dar confiança aos Fulas do Forriá, conquistar a confiança dos Nalus de Cacine e das populações dos regulados de Guileje e Gadamael, deu-se assistência a cidadãos da República da Guiné que passaram a procurar regularmente os postos de socorros de Cacoca e Sangonhá. Escreve-se no relatório que foram recuperados cerca de 580 indivíduos até Maio de 1965, estavam refugiados na República da Guiné.

Os últimos meses deste Batalhão foram passados na região de Nhacra, entre Maio e Agosto de 1965. Agradece a colaboração de muitos: às Companhias do BCAV n.º 705, na região de Buba, ao apoio dos paraquedistas em Guileje, aos comandos “Fantasmas” em Buba e Cacine. E assim termina o relatório: “Mas o BC 513 não poderia anunciar todos os êxitos que constam da sua história sem o extraordinário e valoroso auxílio que lhe foi prestado pela Força Aérea. Também as Forças Navais prestaram uma valiosa colaboração, tanto em ações de combate como nos reabastecimentos. A sua presença constante na fiscalização dos rios foi importante para se manterem as possibilidades de acesso a todas as Companhias do Batalhão, cuja ligação por terra foi durante muito tempo impossível”.
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Nota do editor

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