quinta-feira, 13 de maio de 2021

Guiné 61/74 - P22197: Usados & Achados: pensamentos para aumentar a nossa resiliência em mais um "annus horribilis" (10): Dia da espiga... para que não nos falte o pão (espiga de trigo), a alegria (videira), a paz (oliveira), a saúde (alecrim), o amor (papoila) e a sorte (malmequer)...






Lourinhã > Tabanca do Atira-te Ao Mar > 13 de maio de 2021 > Dia da Espiga


Fotos (e legenda): © Luís Graça (2021). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Já foi, nos anos 30 e 40 do séc. XX, um mar de searas e de vinhas, o concelho da Lourinhã... E havia meia dúzia de moinhos de vento em cada aldeia. Hoje é difícil encontrar uma seara  de trigo (por muito pequena que seja) ou até uma vinha (, mesmo que seja aqui que se produz a famosa aguardente DOC Lourinhã). 

Mas hoje é Dia da Espiga, 5ª Feira da Ascensão. a ascensão de Jesus Cristo ao Céu, segundo a liturgia cristã, 40 dias depois da Ressurreição...Curiosamente, hoje é também, para os muçulmanos, o fim do Ramadão. Saúdo o Cherno Baldé e nossos amigos da Guiné que são crentes e praticantes.

A 5ª Feira da Ascensão deixou de ser feriado (religioso) há quase 70 anos, em 1952, se não erro. Mas ainda sou do tempo de se ir colher a espiga neste dia... Logo pela manhã, ia-se em alegre passeio pelos campos colher espigas, de modo a formar um ramo que devia  incluir  cereais (, com destaque para o trigo), flores campestres (papoila, malmequer, alecrim...) mas também   um pedacinho de  oliveira e de videira,,, 

Os nossos pais e avós ensinavam-nos que cada elemento do ramo do Dia da Espiga tinha um significado ou simbologia próprios: (i) espiga=pão; (ii) videira=alegria; (iii) alecrim = saúde; (iv) oliveira=paz; (v) papoila=amor; (vi) malmequer= sorte, fortuna...

Os povos, e nomeadamente em meio rural, marcados pelo ciclo do solstício do inverno e o solstício do verão,   precisavam destas "festividades cíclicas"... Hoje, citadinos (e globalizados), o nosso "imaginário" é outro... se é que ainda temos "imaginário".  

Recordo-me ainda, na casa dos meus tios da aldeia do Nadrupe e da Quinta do Bolardo,  de o ramo da espiga ser colocado por detrás da porta de entrada, para dar sorte, devendo ser substituído por um novo no ano seguinte. No campo respeitava-se este feriado, não trabalhando. Nalguns concelhos do País, e nomeadamente na Estrmadura e no Ribatejo, ainda hoje é feriado municipal.

Hoje a Alice Carneiro e a Maria do Céu Pinteus, mulheres grandes da Tabanca do Atira-te ao Mar (... e Não Tenhas Medo!),  no seu passeio matinal, foram colher a espiga da tradição. Para que não falte,  a todos os tabanqueiros das tabancas da Tabanca Grande,  sorte, saúde, amor, alegria, paz e pão neste ano de 2021...e se realize o nosso desejo de voltar à normalidade das nossas vidas depois de um ano e tal de pandemia de Covid-19, que fez estragos na nossa saúde, nas nossas vidas e nas nossas fileiras!... (LG).

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Nota do editor:

3 comentários:

Valdemar Silva disse...

Recordo-me da 5ª feira da espiga em Lisboa, trabalhei na Baixa 35 anos, aparecerem as vendedeiras ambulantes de fruta, agora a vender ramos 'olha a espiga!' junto da Estação do Rossio e a terem de fugir à policia por falta da licença. (esta licença de vendedor ambulante era muito complicada e todos vendiam sem licença, a policia aparecia fugiam e voltavam novamente)
No Minho são as "Maias" ou "Maios" feitos ramos e em coroas de giestas com as flores amarelas "maias" apanhadas no monte e colocadas nas portas ou janelas das casas.

Valdemar Queiroz

Anónimo disse...


João Vinagre (by email)

13 mai 2021 21:23


Olá Luís Graça e restantes amigos . . aproveitando a tua sugestão
Boas tardes e boas colheitas para quem semeou .!

Este é mais um dia em que o Cristianismo colou os seus dias importantes nos ritos pagãos. E fez bem !!! ( Curiosamente o adjectivo pagão vem do "paganus" latino que significa : " da aldeia " ???)

1- No dia 25 de Dezembro festejava-se (a.C.) o renascer do deus SOL e com ele a promessa de mais um ano da vida na terra.

2- A meio da primavera (+ou - em maio ) festejava-se (a.C.) o crescimento de tudo o que a terra nos dava.

Ia-se ao campo colher espigas ( os cereais eram o forte da alimentação , além da carne e do peixe claro ) e com umas flores do campo entregava-se em casa à mulher . O raminho ficava atrás da porta de entrada até ao próximo ano, na esperança de que o ano agrícola fosse bom e farto.

Em minha casa era sempre assim, meu pai NUNCA se esquecia .

Em Lisboa , ( para quem não vivia na tal aldeia, ) lembro-me , há bem poucos anos de nos semáforos venderem esses ramos , para quem , sendo da cidade , não teve oportunidade de ir colhê-los ao campo, mas não queria deixar perder a tradição.

Hoje vivo na cidade ,mas fui colher um ramo de ervas parecidas com as espigas , que aqui não existem . para em casa nos lembrarmos do simbolismo deste dia.

forte abraço
vinagre

Tabanca Grande Luís Graça disse...

João, obrigado pelo teu valioso contributo...

Encontreu aqui a etimologia de "pagão"


(...) Ela vem de paganus, “o que mora no pagus”, o que habita no interior, em oposição ao urbanus, “o que mora na cidade”, de urbs, “cidade”.

E pagus quer dizer “distrito rural”, originalmente “área demarcada”, relacionada com pangere, “apertar, colocar no lugar”, que veio do Indo-Europeu pag-, “colocar no lugar, unir, tornar firme”.

Aquando da crisqtianização de Roma, o pessoal do interior custou mais a deixar de lado a religião antiga. (...)

https://origemdapalavra.com.br/pergunta/paga-pagao/