terça-feira, 29 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21705: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (78): CoBrA - Operação Goa: novo álbum de Banda Desenhada: testemunhos precisam-se sobre a Invasão de Goa em 1961, nomeadamente dos ex-prisioneiros de guerra


Anexo B: exemplo de página já desenhada  
do novo álbum de BD (Banda Desenhada) / novela gráfica


CoBrA: Operação Goa

"Esta é uma obra de ficção, em forma de novela gráfica, 
que narra as manobras e artimanhas do CoBrA, 
agência secreta liderada pelo controverso Jorge Jardim, 
que eventualmente levam à resolução da situação 
dos prisioneiros Portugueses detidos em Goa 
após a derrota no conflito militar de 1961 com a India."


1. Mensagem de Marco Calhorda < mcalhorda@gmail.com >

Date: segunda, 28/12/2020 à(s) 16:00
Subject: CoBrA: Operação Goa


Boa tarde,

Antes de mais, espero que tenham tido um bom natal.

Neste preciso momento, eu e o meu parceiro criativo (Daniel Maia – https://danielmaia-art.blogspot.com/) estamos na fase de pré-produção de uma novela gráfica sobre a Invasão Indiana de Goa de 1961 - https://cobraop.com/

Junta-se sinopse [Anexo A] mais  exemplo de página já desenhada [Anexo B]  e gostaríamos de adicionar testemunhos de pessoas que tenham vivido a situação "na pele" [Anexo C].

Eu já me socorri imensas vezes do vosso blogue para fazer pesquisas, incluindo a invasão de 1961, operação Mar Verde, etc., e gostaria de saber se era possível fazer-se um post a solicitar testemunhos (diretrizes em  Anexo C) sobre a Invasão de Goa.

Alguns desses testemunhos seriam posteriormente incluídos no livro como material de apoio e contexto. O fator humano faz com que o publico sinta a história de uma forma mais vivida, real.

Como eu não sou militar, nem participei na Guerra Colonial, assumi que não podia seu eu próprio a fazer tal post. Posso solicitar a vossa assistência por favor?

Fico, desde já, grato pela vossa atenção. Se precisarem de mais esclarecimentos, coloco-me a disposição para vos enviar mais informação ou fazer um zoom/WhatsApp.

Com os melhores cumprimentos,

Marco Calhorda

Anexo A > CoBrA: Operação Goa > Sinopse

Goa, 1961.

Os ventos da descolonização começam a soprar. Portugal está presente na India há mais de 450 anos mas tem uma crescente dificuldade em defender um território situado a mais de 8 mil quilómetros de distância da Metrópole. 

Por um lado, os recursos materiais e humanos são escassos. Por outro, um governo sob uma orgulhosa administração Salazarista que se recusa a adaptar aos novos tempos.

Suportado pelo sentimento internacional do pós-guerra que promove a
autodeterminação de múltiplas nações e, consequentemente, a desintegração dos velhos impérios, o governo nacionalista de Jawaharlal Nehru dispõe de um contexto favorável para anexar Goa à India e assim terminar o processo de integração territorial que havia começado em 1954 com a anexação de Dadra e Nagar Haveli, até então também territórios Portugueses. 

Acresce também o facto de que a India tinha sofrido uma humilhação militar com a China na disputa da zona fronteiriça de Ladakh, pelo que a anexação de Goa serviria o propósito de recuperar algum prestígio político junto da população Indiana.

É neste contexto que o CoBrA (Comissariado contra a Brutalidade Animal) entra em ação nos momentos que antecedem a invasão de Goa pelas forças da União Indiana.

Agência secreta de cariz fortemente Lusitano, leia-se com escassez de meios e
recursos sofisticados, mas abundante em criatividade e técnicas pouco ortodoxas, ao jeito do desenrascanço Português, o CoBrA é responsável pelo planeamento e execução de uma série de atividades clandestinas extremamente audazes em 3 distintos continentes, tudo com o intuito de fortalecer a fraca posição negocial do estado Português nas futuras negociações com a India para definir o futuro de Goa.

Baseada em eventos históricos sobre a invasão de Goa, esta é uma obra de ficção que narra a intervenção do CoBrA, agência secreta liderada pelo controverso Jorge Jardim, para forçar a abertura de canais de comunicação entre os vários intervenientes desta estória, na coação dos poderes políticos, incluindo os Portugueses, a abandonarem considerações imediatistas e oportunismos cínicos em prol do bemestar dos seus cidadãos e, finalmente, no engendrar do repatriamento dos prisioneiros Portugueses detidos em Goa.


Anexo C > Notas para testemunho

Guiné 61/74 - P21704: Boas Festas 2020/21: Em rede, ligados e solidários, uns com os outros, lutando contra a pandemia de Covid-19 (34): Moncorvo resiste; os Moncorvenses resistirão (Paulo Salgado, ex-Alf Mil Inf)

Moncorvo > Ano da graça de 2020 > Taberna do Carró > Cabrito com feijão e vagens e cogumelo também ajuda a resistir os moncorvenses,  garante o Paulo Salgado, nesta bela crónica que serve igualmente para ele (e a São) fazer a "prova de vida"...


Fotos (e legendas): © Paulo  (2020) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do nosso camarada Paulo Salgado (ex-Alf Mil Op Esp da CAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72), autor dos livros, "Milando ou Andanças por África", "Guiné, Crónicas de Guerra e Amor" e "7 Histórias para o Xavier", com data de 27 de Dezembro de 2020:


Meus Caros Camaradas,

Moncorvo resiste; os Moncorvenses resistirão

Ao ler o belo trecho do Mário Beja Santos sobre Lisboa resiste[1], mas também nós resistiremos: Mil alegrias natalícias para todos vós, numa prosa escorrida, como é seu timbre, coberta de sentimentos e de intensas vivências, senti-me um pouco lisboeta, talvez o da arraia-miúda de Fernão Lopes, o do palaciano Eça, o do oriental Cinatti, também o do austero Herculano, o do criativo Garrett, o do imenso Pessoa bebendo o seu café e fazendo de poetas muitos, com os seus heterónimos, e revejo o Teatro Nacional onde o Tiago Rodrigues faz um papel de elevado nível, e ouço as castanhas quentes e boas cantadas pelo Carlos do Carmo, e relembro os bons malandros do Zambujal, e faço a subida, a pé, ao Castelo, e a ida à outra margem num cacilheiro com a minha mulher – decerto pouco é para quem vai a Lisboa pouquíssimas vezes e, quando passam três quatro dias, logo me apetece meter no alfa, de regresso. Cá em cima, depois e de novo, a necessidade de respirar Lisboa. Um provinciano é o que sou…

E vieram-me à ideia, em catadupa, tantas peripécias e tantas sensações e percepções. Com o Beja Santos, algumas de grande intensidade emotiva, as que tivemos na nossa deslocação ao Olossato em 1991, o reencontro do Mário com o Jaquité, o seu arqui-inimigo em Missirá – ali, num abraço, mais de vinte anos depois. Assistimos a este encontro, a minha mulher, Maria da Conceição, a minha filha, de quinze anos, a Paula, e eu…Inolvidável. 

Dava um poema, para além do que já escreveu o Mário Beja Santos. Mas hoje, como tentativa de resposta, falo de Torre de Moncorvo. Torre de Moncorvo resiste. E os moncorvenses resistirão. Encostados à Serra do Reboredo, hematítica e sobranceira, e protegidos pela igreja, monumental igreja, enriquecida por uma figueira que teima em manter-se na fachada, presa pelas raízes, matriz cuja história está prenhe de episódios, os moncorvenses ainda se passeiam e conversam na praça, a oval Praça. 

Resistirão às manobras deste bitcho carêto (este vírus, assim lhe chamo em homenagem aos carêtos da aldeia de Podence), agora travestido, como resistiram às investidas dos castelhanos em tempos da crise de 1383-85, fazendo o mais belo alardo das tropas de João I, e como resistiram às migueladas contra os pedristas.
Vista parcial do Castelo
Vista da Praça (na alturas das festas)
Igreja matriz

O que ajuda os moncorvenses? A releitura do poeta Campos Monteiro com os seus versos fora de moda e romances vários – ele, cujo busto espreita a Praça, poeta, romancista, médico, jornalista e político, a subir do Pocinho para riba. 

Também a obra de Martins Janeira, um dos mais eminentes japonólogos e romancista. 

Também, para mim, sobretudo, a poesia do grande jornalista Rogério Rodrigues, nosso conterrâneo, com quem tive o privilégio de conviver e de trocar ideias tantas, e que, ele, o Lelo Brito e o Fernando Assis Pacheco construíram um excelente documento sobre a Vila. 

Também relembrar os amigos que comigo andaram no Colégio Campos Monteiro, fundado por Ramiro Salgado em 1936, o primeiro colégio misto no distrito, porventura do País, não sei.

E o que nos ajuda mais? Sim, passear pela Vila, pela parte velha, mirar a porta do Castelo, o que foi a sinagoga, ir Rua da Misericórdia abaixo, e passar na Porta da Vila, espreitar a Casa da Roda, visitar o museu de fotografia, o museu de arte sacra. E, particularmente, a igreja da Misericórdia, medieval, imponente na sua singeleza. Volver ao centro, descendo as escadas do Castelo, caminhar até à igreja (que era para ser sé), entrar e ouvir o Nelson Campos contar a história do monumento nacional e, tendo vagar, dar uma espreitadela, demorada deve ser, para olhar a história do ferro no respectivo museu, que o mesmo historiador conta meticulosamente. Tempo de encher a ‘alma’.
Poeta Campos Monteiro no Largo do Castelo
Igreja - interior

Mas há mais, meus amigos: a partição da amêndoa, a visita ao museu da oficina vinária. Também é imperioso degustar as amêndoas cobertas da D. Dina (um dos 7 doces de Portugal) e, sendo hora do almoço, ficar pela Taberna do Carró ou ir ao Lagar. Tempo de temperar o corpo. Mens sana in corpore sano.
Partição da amêndoa
Fabrico manual da amêndoa coberta

Haverá tempo de, à tarde, subir à Serra do Reboredo e, junto à Santa Leocádia, avistar uma paisagem deslumbrante sobre o Vale da Vilariça, estendendo a vista até Bornes. Descansar a vista pelos lagos do Baixo Sabor é valiosa alternativa.
Vista dos Lagos do Baixo Sabor

Um abraço. Quando puderdes, por ausência do bitcho carêto, vinde a Torre de Moncorvo. Sereis bem recebidos. Avisado, serei cicerone. E o Mário Beja Santos tirará, se lhe der a vontade, que dá, algumas fotos que emoldarão a sua prosa sobre esta Vila.

Entretanto, Boas Festas para todos. Neste ano de pandemia. E resiliência.
Paulo Salgado
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Notas do editor:

[1] - Vd. poste de 15 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21647: Boas Festas 2020/21: Em rede, ligados e solidários, uns com os outros, lutando contra a pandemia de Covid-19 (8): Lisboa resiste, mas também nós resistiremos: Mil alegrias natalícias para todos vós (Mário Beja Santos, ex-Alf Mil)

Último poste da série de 27 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21700: Boas Festas 2020/21: Em rede, ligados e solidários, uns com os outros, lutando contra a pandemia de Covid-19 (33): Desde o ar fresco do Círculo Polar Ártico... (José Belo, régulo da Tabanca da Lapónia)

Guiné 61/74 - P21703: Álbum fotográfico de José Carvalho (2): A CCAÇ 2753, ”Os Barões”, e o K3 (Parte I)



Foto nº 7 > Guiné > Região do Oio > Farim > CCAÇ 2753 >  Destacamento do K3 > Em finais de Abril de 1971, estava concluída a ligação, por estrada alcatroada, Farim-Mansabá... Finalmente, a população podia   deslocar-se de Farim (ao fundo), para vários destinos,  até Bissau, com maior segurança


Foto nº 6 >  Guiné > Região do Oio > Farim > CCAÇ 2753 >  Destacamento do K3 > Asfaltagem  da estrada Farim-Mansabá, à entrada do K3. Heliporto, edifício do comando, zona dos chuveiros, enfermaria


Foto nº 5 > Guiné > Região do Oio > Farim > CCAÇ 2753 >  Destacamento do K3 >   Construção da estrada Farim - Mansabá > Centenas de trabalhadores no final do dia de trabalho, recebendo géneros alimentícios (sal e arroz) antes de serem transportados para Mansabá.


Foto nº 1 > Guiné > Região do Oio > Farim > CCAÇ 2753 >  Destacamento do K> Auto tanque do BENG 447 que accionou mina anti-carro, colocada na facha lateral da nova estrada, utilizada para a circulação de viaturas, envolvidas nos trabalhos do novo troço.



Foto nº 2 > Guiné > Região do Oio > Farim > CCAÇ 2753 >  Destacamento do K3 > Edifiício do Comando


Fotos (e legendas): © José Carvalho (2020) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Mensagem, com data de 28 do corrente,  do camarada José Carvalho [, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2753 (Brá, Bironque, Madina Fula, Saliquinhedim e Mansabá, 1970/72); médico veterináruio, a residir no Bombarral]:
 
Caros Amigos Luís e Carlos,

Os meus votos de Boas-Festas e um Ano Novo, que nos devolva a normal vivência, com Paz e Saúde, para vós e Família. São igualmente os meus votos, para todos membros da Tabanca Grande.

Envio-vos em anexo um texto, complementado com fotos do tempo em que os “Barões” passaram por Saliquinhedim / K3 e que poderá ter algum interesse para os que antes, durante e depois, por lá passaram.

Deixo ao vosso inteiro critério a sua publicação.

Com amizade, abraço do
José Carvalho


2. Álbum fotográfico do José Carvalho  > CCAÇ 2753 - ”Os Barões” e o K3  (Parte I )


No 3º dia de Março de 1971, a CCAÇ 2753 deixa o destacamento provisório de Madina Fula (*) e ocupa as instalações militares de Saliquinhedim, mais conhecidas por K3, por se situarem ao Km 3 da margem sul do Rio Farim, afluente do Rio Cacheu, ficando Farim na margem oposta.[Há 100 referências ao K3 no nosso blogue,]

Nessa mesma data, uma mina A/C, destrui um autotanque do BENG 447, causando quatro feridos, sendo dois graves.[Foto nº 1, acima].

As novas instalações onde permanecemos cerca de um ano, eram de “muitas estrelas”, face às que a companhia desfrutou, nos anteriores três meses.

Contudo as construções eram bastante precárias, com telhados de zinco, muito ondulados e esburacados, que se repartiam por vários locais em redor de uma edificação dita do Comando (secretaria, quartos dos oficiais e posto de transmissões). [Foto nº 2, acima]



Foto nº 3 >   Guiné > Região do Oio > Farim > CCAÇ 2753 >  Destacamento do K3 > Memorial ao Cap Mil Inf Corte - Real, cmdt da CCAÇ 1422, 
morto em combate, em 12/6/1966


Em frente da referida construção, a parada, com um memorial ao Capitão  [Mil Inf Dinis] Corte-Real, Comandante da CCaç 1422, que terá sido o primeiro  Capitão,  vítima da guerra na Guiné, a poucas centenas de metros do quartel. [Foto nº 3].



Foto nº 4 >   Guiné > Região do Oio > Farim > CCAÇ 2753 >  Destacamento do K3 >   Telheiro/cozinha, com o forno ao lado esquerdo


A estrada Mansabá - Farim dividia o quartel, ficando o edifício do comando, o heliporto, as casernas, a enfermaria, a cantina e a messe de oficiais e sargentos de um lado e um telheiro com um forno de lenha
apelidado de cozinha, a escola, a zona de oficinas auto, e um terreiro com balizas de futebol, do outro lado.

A primeira noite no K3, jamais saiu da minha memória, pois foi com grande satisfação que voltei a dormir numa cama, com a sensação de alguma protecção, que nos era dada pelas frágeis paredes e cobertura com troncos de palmeiras, encimada por folhas de zinco.

O telheiro que cobria o forno, na realidade o local onde se preparava a alimentação para quase duas centenas de seres humanos, era aterrador. Quem nos sucedeu encontrou condições muito mais aceitáveis. [Foto nº 4]

A CCAÇ 2753, integrada no COP 6, toma a responsabilidade do Sub - Agrupamento B, que englobava outros efectivos;

1 Pelotão da CCAÇ 2549
1 Sec AML/ERec 2641
1 Pelotão Milicias  (nº 282)
1 Sec Mort./ Pel Mort 2116
1 Sec Sap./ Pel. Sap/BCaç 3832

A missão da CCaç 2753 mantinha-se com a segurança próxima e imediata dos trabalhadores e máquinas, envolvidas nos trabalhos de reabertura da estrada, até à margem do rio Cacheu e a protecção da população de Saliquinhédim, na maioria Fula, que rondava as 200 pessoas.


Foto nº 5 >  Guiné > Região do Oio > Farim > CCAÇ 2753 >  Destacamento do K3 > Centenas de trabalhadores no final do dia de trabalho, recebendo géneros alimentícios, (sal e arroz) antes de serem transportados para Mansabá

Missão da CCÇ 2753:

(i) Ocupa, organiza e defende a povoação e quartel de Saliquinhedim:

(ii) Executa e apoia a Autoridade Administrativa de Farim, no sub-sector atribuído;

(iii) Intersecta com carácter de continuidade, por acção combinada de patrulhamentos ofensivos e emboscadas, os movimentos do IN do Biribão para o Morés, entre o Bironque e Colimansacunda;

(iv) Executa à ordem do comando do COP  6, em coordenação com outras forças, acções ofensivas em áreas fulcrais de intervenção (Biribão - Ionfarim - Irabato - Colimansacunda - Madina Fula – Madina Madinga - Tiligi, etc.) e também segurança a frequentes colunas auto, dada a grande
movimentação das populações no itinerário Farim - Mansába, depois de cinco anos inactivado;

(v) Garante o funcionamento do Posto Escolar Militar de Saliquinhedim.

Em finais de Abril de 1971, a estrada chegou à margem sul do rio Farim / Cacheu,  ficando restabelecida a ligação Mansabá - Farim. [Foto nº 7, acima]

A partir da conclusão dos trabalhos de construção da estrada, a CCAÇ 2753, passou a ser a única força militar no K3.

 (Continua)



Guiné > Região do Oio > Carta de Farim (1954)  > Escala 1/50 mil) >  Pormenor: localização de Saliquinhedim / K3, entre o Olossato e Farim. (Não confundir com o verdadeiro Olossato, que fica a sudoeste de Farim, e que está localizado na carta de Binta.)

Infografia; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2011)

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segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21702: (De)Caras (167): o ten inf Esteves Pinto (1934-2020), que foi instrutor de alguns de nós no CISMI, em Tavira, e que morreu no passado dia 18, com o posto de cor inf ref



Tavira > CISMI > Parada > Outubro de 1968 > Atiradores de infantaria > 6º Pelotão, 3ª Companhia  > Da esquerda para a direita, de pé: Eduardo Estrela (, futuro fur mil. CCAÇ 14, Cuntima, 1969/71), Fonseca, Pereira, João, Torres, Chichorro (já falecido)  e Joaquim Fernandes (futuro fur mil, CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71). Na primeira fila, tambémda esquerda para a direita: Santos, Chora, Salas, Paulo , Loureiro e Saramago.

Foto (e legenda): © Eduardo Francisco Estrela (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Tavira > Quartel da Atalaia > Antigo CISMI, hoje RI 1 > 1 de fevereiro de 2014 > Belo exemplar da nossa arquitetura militar, fica situado na Rua Isidoro Pais. Imóvel classificado como de interesse público, segundo o excelente síio da Câmara Municipald e Tavira

 O Quartel da Atalaia, um dos mais antigos do país, foi começado a construir em 1795, sob o reinado de D. Maria I. Mas a sja construção foi entretanto interrompia e só retomada em 1856 devido á conjuntura nacional desfavorável (ida da corte para o Brasil, invasões napoleónicas, revolução liberal de 1820, guerra civuil de 1828-1834, etc.). Com a extinção das Ordens Religiosas, é entregue ao exército o antigo Convento de Nossa Senhora da Graça, que alguns de nós também conheceram. O Quartel da Atalaia, ainda por concluir, serviu ainda de hospital das vítimas de peste de cólera que se abateu sobre a cidade (e grande parte do país, a começar pela capital) em 1833, em plena guerra civil. Em boa verdade o edifício só ficará concluído  nos primeiros anos do século XX, sendo  então para lá transferida a guarnição de Tavira. Sofreu alguns alterações funcionais em 1950, 1954 e 1970.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2014). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Tavira > CISMI > Julho de 1968 >   A chegada ao quartel da Atalaia dos novos instruendos do 1º Ciclo do CSM, vindos de todo o país.  Fila do pessoal para receber fardamento, Foto do Fernando Hipólito, gentilmente cedida ao César Dias e ao nosso blogue.

Esta rapaziada de finais da década de 1960 já tem um outro "look", a começar pelo vestuário... Presume-se que as belas cabeleiras, à moda dos "Beatles", já tinham ficado ingloriamente no chão do barbearia lá da terra ou de Tavira... Muitos fotam tosquiados à máquina zero, suprema humilhação para um jovem da época!... Não, já não é a mesma malta que parte, de caqui amarelo e mauser, para defender as Índias & as Angolas, uns anos antes ... O velho Portugal onde tínhamos nascido,  estava a mudar, lenta mas inexoravelmente.  E a nossa geração já não estava disposta a suportar os mesmos sacrifícios dos seus pais.


Foto (e legenda).  © Fernando Hipólito (2014). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: logue Luís Graça & Camaradas da Guiné]]

 


1. Através do nosso leitor e camarada cor inf ref Manuel Bernardo tivemos a triste notícia  do falecimento do cor inf António Rebordão Esteves Pinto, instrutor no CISMI, em Tavira, no tempo em que alguns de nós, membros da Tabanca Grande, lá fizemos a recruta e/ou a especialidade. (Estou-me a lembrar de camaradas como o César Dias, o António Levezinho, o Humberti Reis, o Eduardo Estrela, o Joaquim Fernanses, o José Fernando Almeida, o Manuel  Carvalho, o Carlos Silva, u próprio e tantos outros.)

O cor inf ref  Esteves Pinto faleceu no dia 18 do corrente mês. Nunca esteve no TO da Guiné. Mas queremos lembrá-lo aqui, na qualidade de nosso antigo instrutor e comandante de companhia no CISMI, Tavira. À família enlutada a Tabanca Grande apresenta as suas condolências. (****).

De acordo com o seu currículo militar, o cor inf Esteves Pinto:

(i) era natural do Fundão;

(ii)  estudante na Faculdade de Medicina Veterinária de Lisboa,  em 1957, foi  chamado a cumprir o Serviço Militar Obrigatório, tendo assentado praça em Mafra;

(iii) fez uma primeira comissão de serviço (1961/63), em Angola como o posto de alferes miliciano;

(iv) foi condecorado em 1963 com a Cruz de Guerra de 4ª classe, por atos de bravura em combate;

(v) de regresso à Metrópole, foi convidado a frequentar a Academia Militar,. tendo seguido a carreira militar:

(vi) tenente do quadro, foi  colocado, em 1965 (e até 1969), juntamente com o ten Fernando Robles, em Tavira, como instrutor do CISMI - Centro de Instrução de Sargentos Milicianos;

(vii) foi mobilizado, de novo  desta vez para Timor, terra que ficou no seu coração, como comandante da CCAÇ 2682 (1970-1972);

(viii) terminou a sua carreira militar com o posto de coronel, não sem ter passado ainda por Angola, em 1975.

Uma nota biográfica mais detalhada está disponível no portal UTW - Dos Veteranos da Guerra do Ultramar, 1954-1975.


2. Da notícia do falecimento do cor Esteves Pinto demos conhecimento de alguns camaradas que o conheceram, em Tavira, e que comentaram, em resposta ao meu mail de 26 do corrente:

(i) César Dias (ex-Fur Mil Sapador da CCS/BCAÇ 2885, Mansoa, Maio de 1969 / Março de 1971)

Luis, lembro-me do Esteves Pinto (Tenente), foi o nosso comandante da 2ª companhia, tentava moralizar as tropas, " O militar é a parte válida do povo", daí ter que ser forte, "não há fim de semana para ninguém",,, ,  isto na formatura de 6ª feira após o almoço.

Fiquei com boa impressão dele, embora os nossos caminhos não se tivessem cruzado mais
Presto-lhe homenagem.. Aos seus familiares e amigos manifesto o meu pesar.


(ii) Eduardo Estrela (ex-Fur Mil da CCAÇ 14, Cuntima, 1969/71)

Morreu o (do nosso tempo no CISMI ) ten Esteves Pinto, que comandava no último trimestre de 1968 a 2ª  Companhia. O homem que, nas marchas finais de Dezembro de 68, perto do Cerro da Cabeça em Quelfes/Moncarapacho , perante o dilúvio que se abateu sobre a zona do acampamento dizia: " o rei manda marchar, não manda chover ".

Á família enlutada os meus pêsames. Que descanse em paz.


3. Algumas referência no nosso blogue ao nosso antigo instrutor ten Esteves Pinto e a outros instrutores do CISMI de Tavira (1965/69), militares que, de uma maneira ou de outra, nos marcaram, tal como nos marcou a passagem por Tavira, na recruta e/ou especialidade. 

Temos meia centena de referências ao CISMI  e sessenta a Tavira


(i) Eduardo Estrela [ fez recruta no CISMI,  e a instrução de especialidade de atirador de infantaria, integrado  no 3º Pelotão da 4ª Companhia, no 2º semestre de 1968; foi fur mil, CCAÇ 14, Cuntina, 1969/71]:

(...) O comandante da 3ª Companhia do CISMI, Tavira, era o cap Eduardo Fernandes, militar íntegro e respeitador.

O ten Madeira era o adjunto e era uma flor sem cheiro. Mau e sádico. Uma vez, levou durante a noite a  
companhia para as salinas (, o capitão estava ausente). Dei-lhe a volta e vim de lá com trampa só até aos joelhos. 

Já tive o privilégio de lhe dizer isso pessoalmente num almoço no CISMI. O homem agora é coronel reformado e mora, como sempre morou, em Castro Marim. (...) (*)

(ii) César Dias:

(...) Concordo com os adjectivos de classificação atribuídos quer ao Capitão Fernandes quer ao seu adjunto nesse terceiro turno de 68, e no caso do Tenente Madeira os adjectivos poderiam ir mais além. 

Também integrei esse grupo nessa noite das salinas,  aproveitando a ausência do Comandante foi uma diversão para ele, já passaram quase 52 anos mas são coisas que não esquecem, apesar de tudo o que se passou na Guiné. 

Já agora digo que era do 7º pelotão do Aspirante Coelho, outro homem integro. (...) (*)

(iii) Eduardo Estrela:

(...) Acabo de ver o comentário do César Dias no blogue, a propósito do agora coronel Madeira e a sua referência ao Aspirante Coelho. O Asp Coelho era realmente um homem íntegro e respeitador. Lembro-me bem dele e da sua já visível falta de cabelo á época. Abraço fraterno a todos. (...) (*)

(iv) Manuel Carvalho (ex-Fur Mil Armas Pesadas Inf, CCAÇ 2366 / BCAÇ 2845, Jolmete, 1968/70):

(...) Também andei por Tavira no verão de 67, 3º turno,  Armas Pesadas.

Tenho algumas memórias do dia em que fizemos fogo para a ilha de Tavira a partir da costa. O comandante de companhoa era o Cap Madeira,  natural de Cabo Verde,  e de Pelotão era o Alf Chumbinho,  exigente mas que nos tratava com respeito,  por 'senhor instruendo'. 

Quando íamos iniciar o fogo de canhão sem recuo 10,6 vimos que estavam na zona dois barcos pequenos com um pescador cada. o Chumbinho disse que resolvia o problema com uma canhoada e resolveu,  embora um oficial superior que lá estava tivesse dito:  não me arranje problemas".

Ainda hoje me rio com a cena dos dois homens a remar cada um para seu lado e nem a recolha do material fizeram. Na ilha havia um silvado que foi incendiado com uma granada de fósforo e depois apagado com uma normal que atirou areia para cima do lume. Alguém pôs um burnal velho atrás do canhão para vermos o efeito e vimos que não é lugar para se estar.

Também fui dos que escolheram Armas Pesadas a pensar que ficaria mais resguardado mas tinha uma secção distribuída como qualquer Atirador e muitas vezes o Pelotão todo, é a vida. (...)

(v) Luís Graça:
 
 (...) Passei pelo RI 5 (Caldas da Rainha) (15 de Julho de 1968) e CISMI (Tavira) (29 de Setembro de 1968)... 

De quem me lembro, [em Tavira,] foi do Tenente Esteves [Pinto], que era o comandante da minha companhia [, a 2º,]  (estava a tirar a especialidade de Armas Pesadas de Infantaria), e do parvo de um alferes miliciano, lateiro, que nos dava instrução, no campo da feira (adorava, o sádico, pôr-nos a rebolar em cima da bosta de boi, enquanto ele passava o tempo a "namorar" à janela, uma das meninas ou coironas lá da terra....). Era algarvio, com sotaque, nunca pusera os pés em África... Deve ter apodrecido nos CISMI...

 (...) Do Esteves recordo-me apenas a sua lengalenga patrioteira e já gasta, lembrando-nos, a propósito e a despropósito, que "nós éramos a fina flor da nação"... Nós: emendávamos, entre dentes: "a fina flor do entulho"...

E, claro, não posso esquecer o inefável comandante do CISMI que me proibiu, a mim e mais um camarada, a inauguração de um exposição documental sobre a II Guerra Mundial (que estávamos a organizar, na caserna, e estava praticamente pronta...) com o argumento, mesquinho, safado, de que "para guerras já bastava a nossa" (...) 
 (**)

(vi) Mário Fitas (ex-fur mil inf op esp, CCAÇ 763, "Os Lassas", Cufar, 1965/67);

(...) Fui para o CISMI em Agosto de 1963 e acabei o curso em Dezembro do mesmo ano. O curso de sargentos milicianos era composto de dois meses de Instrução Básica e mais dois de especialidade.

Não esperava ir parar ao Ultramar, nem tão pouco à Guiné. Pois...só que precisamente em Janeiro de 1964 os cursos passaram a seis meses. Aqui tens como o teu camarada Mário Fitas foi fornicado e ir parar com os costados na Guiné. Fomos os últimos a envergar a célebre farda colonial amarela.

(...) Por curiosidade, o comandante do meu pelotão em Tavira foi o então alferes, hoje coronel Cadete, que esteve em Mejo,  julgo que com o José Brás, já mais tarde em Moçambique o Cadete levou um tiro no ventre. Um dos instrutores de Lamego, o alferes hoje tenente general Rino, que comandou a CCAÇ. 764 em Cumbijã. O mundo é muito pequeno! (,,,)

Hoje em dia o meu amigo coronel Manuel Amaro Bernardo,  dos comandos e escritor, era o comandante da 1ª. Companhia de instrução em Tavira.(...) (**)


(vii) José Brás (ex-Fur Mil da CCAÇ 1622, Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68)

(...) Aqui, neste terraço de que se avista o quadriculado da antepara, vivi eu uma aventura imoderada.

Sexta-Feira, formutura para saída, o oficial de dia, Ajferes Cadete, olha-me na cara e diz que tenho as botas mal engraxadas. 

Formatura desfeita, volto à caserna e, ainda que sabendo da mentira, ponho as botas a brilhar. Nova formatura e lá vou eu de novo e o gajo olha-me para as botas e diz que tenho a barba mal aparada. De novo na caserna, espero por nova formatura para tentar ir passar o fim de semana na Ilha, de novo entro para a revista e o bicho diz-me: 'você é parvo, não viu já que não sai?'

 A minha vontade era mesmo partir-lhe o focinho e, nessa altura, sendo o que era, juro que o machucaria bem. Contive a raiva e puz-me a estudar a forma de sair dali, aparecendo-me o terraço como a única salvação. Disfarcei, andei por alí, subi as escadas, atrás de mim veio um camarada amedrontado mas desejoso de sair também. Passei para fora da antepara, desci para uma das janelas ainda agarrado acima, ajudei o camarada medroso a descer e saltámos correndo de imediato dali para fora. 

No Domingo, na praia, camaradas que sairam nesse dia,  avisaram-me que o Cadete dera pela minha falta e andara de bicicleta a ver os riscos da borracha das botas na parede, jurando que me esperaria na entrada na Segunda de manhã. De facto, apesar da apreensão, entrei sem problemas e ninguém me perguntou por onde tinha andado. Já antes, eu havia tido uma questão com o Cadete que não era o Comandante do meu Pelotão mas tinha metido o bico numa pega comigo. Acabei por reencontrá-lo quando a minha Companhia saiu de Aldeia Formosa e, por troca com a dele, fomos para Medjo onde ele estava antes. (...) (***)
__________

Notas do editor:

(**) Vd. poste de 30 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6496: Controvérsias (79): Os nossos instrutores militares não tinham experiência de contra-guerrilha (Manuel Joaquim)

 (***) 10 de fevereiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12703: CISMI - Centro de Instrução de Sargentos Milicianos de Infantaria, Tavira, 1968: Guia do Instruendo (documento, de 21 pp., inumeradas, recolhido por Fernando Hipólito e digitalizado por César Dias) (1) : Parte I (1-6 pp.)

Vd. também:


21 de fevereiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12750: CISMI - Centro de Instrução de Sargentos Milicianos de Infantaria, Tavira, 1968: Guia do Instruendo (documento, de 21 pp., inumeradas, recolhidi por Fernando Hipólito o digitalizado por César Dias) (3) : Parte III (pp. 13-16)

22 de fevereiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12759: CISMI - Centro de Instrução de Sargentos Milicianos de Infantaria, Tavira, 1968: Guia do Instruendo (documento, de 21 pp., inumeradas, recolhido por Fernando Hipólito e digitalizado por César Dias) (4) : Parte IV (pp. 16-18): Regime disciplinar; Pretensões, dispensas e licenças


Guiné 61/74 - P21701: Notas de leitura (1331): Espaço social e movimentos políticos na Guiné-Bissau (1910-1994), por Philip Havik, na Revista Internacional de Estudos Africanos, n.º 18-22, 1995-1999 (1) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 26 de Abril de 2018:

Queridos amigos,
É tempo de reconhecer o labor investigativo de Philip Havik nas coisas da Guiné. Este ensaio que o investigador publicou na Revista Internacional de Estudos Africanos fazia parte de um estudo de maior amplitude abrangendo a atividade política na Guiné tanto no período pré-colonial como no período colonial e na fase da Independência. Desconheço, por hora, se tal publicação já existe. A importância do ensaio é um modo singular como o investigador aborda e articula espaços sociais e movimentos políticos no período colonial e pós-colonial, entrelaça uma gama de diversidades que vão desde a religião às atitudes culturais de certas etnias, as mudanças económicas operadas pelas novas culturas e a confrontação entre as populações nativas e os representantes das empresas. E assim chegamos à génese dos nacionalismos, às mudanças que nessa fase o PAIGC prometia operar e tudo o mais que veio a acontecer até à sua influência política empalidecer, uma longa história que é de conhecimento obrigatório para quem quer saber porque é que a Guiné continua a viver em impasse.

Um abraço do
Mário


Mundasson i Kambansa:
Espaço social e movimentos políticos na Guiné-Bissau (1910-1994) (1)


Beja Santos

Mundasson, termo crioulo para mudança ou transformação; kambansa, termo crioulo para travessia ou passagem.

Philip Havik
O investigador Philip Havik dá-nos neste artigo publicado na Revista Internacional de Estudos Africanos, n.º 18-22, 1995-1999, uma leitura singular sobre a pluralidade política e social que marcou o território da Guiné durante o século XIX, é uma tessitura composta por termos sociais e geográficos, pela procura de defesa de interesses da região na alvorada republicana, pela ocupação militar, pela luta pela independência, a recriação de um regime monopartidário a que se seguiu a liberalização económica e uma caudalosa abertura política.

O autor recorda que a Guiné com as suas fronteiras traçadas na consequência da Conferência de Berlim vivia mergulhada numa guerra renhida pelo controlo dos “chãos”, espaços geográficos e sociais geridos por linhagens, intervinham nesses episódios bélicos sociedades nativas que se opunham a tropas auxiliares africanas e portuguesas, todos os pretextos eram bons para procurar sacudir o jogo colonial, tanto podiam ser o imposto de palhota como a política comercial da administração portuguesa. Philip Havik considera que no processo de criação de movimentos de caráter político se podem identificar três fases, o período entre 1910-1915, o período de 1955-1965 e de 1986 até às primeiras eleições multipartidárias de 1994.

A ocupação militar saldou-se na perda de controlo por parte dos povos do Litoral sobre os seus próprios “chãos” e a penetração progressiva do Litoral “animista” pelo Leste islamizado. Grupos crioulófonos oriundos dos antigos entrepostos como Cacheu ou Geba foram abrindo espaço em novos centros comerciais no Interior, assim se deu a abertura dos “chãos” e o crioulo tornou-se na língua franca. Os últimos 50 anos foram marcados pela luta anticolonial e o estabelecimento de um regime independente.

Uma lufada de ar fresco foi trazida pela constituição da Liga Guineense (1911), os seus membros iriam assumir um papel de mediadores em diferentes conflitos económicos e sociais no seio do pequeno e restrito meio administrativo e mercantil de Bissau e Bolama. Os estatutos eram claros: fazer propaganda da instrução, estabelecer escolas e empenhar-se no progresso e desenvolvimento da Guiné professando o ideal republicano. À sua testa, a Liga era dirigida por comerciantes das pequenas comunidades crioulófonas, em muitos casos com laços de parentesco em Cabo Verde, tinham também ligações aos deportados políticos, havia grumetes contratados por comerciantes e casas de comércio como intérpretes, pilotos e caixeiros. Cedo começaram a reivindicar a redução de impostos, a nacionalização do comércio para restringir o acesso de comerciantes estrangeiros, a denunciar casos de corrupção no aparelho administrativo e os excessos no plano militar. A Liga foi-se progressivamente politizando, denunciando o papel dos mercenários recrutados por Teixeira Pinto e as suas prepotências nas campanhas militares. Quando foi proibida em 1915 e a sua direção encarcerada, a Liga era uma organização autónoma reunindo pela primeira vez degredados políticos, comerciantes e diferentes estratos profissionais. Falhara a tentativa de reconciliação do projeto português de “nacionalização” da Guiné com o ideário republicano e liberal. O investigador observa que os grupos sociais ditos “civilizados” constituíram um nó de alianças entre comerciantes e proprietários (ponteiros) e trabalhadores dos portos e funcionários públicos. A repressão destes movimentos de contestação criou uma diáspora dos seus associados. Observa igualmente a importância do grande fluxo de imigrantes cabo-verdianos na Guiné, portugueses perante a lei, tal fluxo teve implicações para a vida política e associativa do território.

Os movimentos independentistas irão surgir em finais nos anos 1940, registam-se diferenças entre caminhos nacionalistas guineenses e posições pan-africanas. O grupo de civilizados tinha-se ampliado, recorde-se que era pelo comércio nos chamados centros comerciais mas sobretudo nas lojas de mato que se estabeleciam os contatos entre a população “civilizada” e a indígena, num contexto completamente distinto à situação vivida no tempo da Liga Guineense. Foram razões de ordem económica que ditaram mudanças, primeiro a mancarra e depois o arroz. As populações sentiram o peso desta política encetada a seguir à crise no mercado internacional das oleaginosas. As populações nativas não ficavam associadas às empresas constituídas pelos “civilizados”, exploravam as suas próprias culturas, negociavam depois os preços com os intermediários das grandes e pequenas casas, era uma economia de troca direta e sobressaiam práticas abusivas dos cipaios, agentes omnipotentes e despóticos. E cedo se desencadearam conflitos entre comerciantes e a população, a extorsão aos indígenas iria tornar-se num problema que encontrou por vezes políticos de envergadura pela frente, caso de Sarmento Rodrigues. Os movimentos independentistas atraíram sobretudo operários, artesãos e empregados do comércio, na sua maioria vindos de Bissau e de Bolama. Em 1948 surgiu o Partido Socialista da Guiné. A formação de organizações políticas de cariz nacionalista acontece em 1955 com a fundação do MING – Movimento para a Independência da Guiné, por Amílcar Cabral que no ano seguinte irá apoiar a criação do PAI – Partido Africano da Independência, posteriormente PAIGC, em 1960. Este surto independentista precisa de ser situado no contexto do nacionalismo pan-africano, fortemente inspirado por Kwame N’Krumah, as coligações de forças tiveram vida precária. A FLING – Frente para a Libertação e Independência da Guiné Portuguesa é criada em 1962 por grupos oposicionistas baseados no Senegal, integrava cinco partidos. E diz o investigador que neste ambiente extremamente divisionista reivindicava-se a herança política da Liga Guineense. Um dos maiores pontos de divergência entre movimentos – além da questão da autonomia versus independência total e a melhor forma de lá chegar – revelou-se a questão da ligação entre a luta anticolonial na Guiné e nas ilhas de Cabo Verde. Esta associação estratégica dos destinos da Guiné e Cabo Verde, protagonizada pelo PAIGC, provocaria várias cisões nos vários movimentos e coligações, tudo irá desaguar na secessão do PAICV – Partido Africano da Independência de Cabo Verde a seguir ao afastamento do primeiro presidente da Guiné independente através de um golpe de Estado.

(Continua)
Kumba Yala
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Nota do editor

Último poste da série de 21 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21670: Notas de leitura (1330): A Operação Tridente: Quando o delírio se disfarça de objetividade na reportagem (Mário Beja Santos)

domingo, 27 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21700: Boas Festas 2020/21: Em rede, ligados e solidários, uns com os outros, lutando contra a pandemia de Covid-19 (33): Desde o ar fresco do Círculo Polar Ártico... (José Belo, régulo da Tabanca da Lapónia)


Suécia > Tabanca da Lapónia > 27 de dezembro de 2020 > Ainda se vê o pneu sobresselente  (ou sobressalente, tanto faz...) do jipe do régulo!...


Foto (e legenda): © José Belo (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de Joseph Belo, enviada hoje, 
27 do corrente, às 17h21:

Desde o ar fresco do Círculo Polar Árctico (na noite de ontem 42 graus negativos), os Votos de um Bom Ano Novo para os Amigos e Camaradas.

Problemas?... Nunca!... Do jeep ainda se vê parte do pneu sobressalente [, foto acima].

Portanto... tudo OK !

Um abraço do 
J.Belo

Guiné 61/74 - P21699: História da 3ª Companhia de Comandos (1966/68) (João Borges, 1943-2005) - Parte VI: atividade operacional: Susana (Arame), Jabadá (Flaque-Cibe e Bissilão), novembro de 1966


Guine´> Região do Cacheu > Carta de Susana (1953) Escala 1/50 mil > Posição relativa de Susana e Arame, na fronteira com o Senegal

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné



1. Continuação da publicação da História da 3ª Companhia de Comandos (Lamego e Guiné, 1966/68), a primeira, de origem metropolitana, a operar no CTIG.
Hão de seguir-se lhe, até 1974, mais as seguintes: 5ª, 16ª, 26ª, 27ª, 35ª, 38ª e 4041ª CCmds.

Documento mimeografado, de 42 pp., da autoria de João Borges, ex-fur mil comando, já falecido (em 2005).  Exemplar oferecido ao seu amigo José Lino Oliveira, com a seguinte dedicatória: "Quanto mais falamos na guerra, mais desejamos a paz. Do amigo João Borges". Uma cópia foi entregue ao nosso blogue para publicação.

[O José Lino [Padrão de] Oliveira foi fur mil amanuense, CCS/BCAÇ 4612/74, MansoaCumeré e Brá, 12-7-1974 / 15-10-1974, a mesma unidade a que pertenceu o nosso coeditor Eduardo Magalhães Ribeiro; é membro da nossa Tabanca Grande desde 31/12/2012; tem dezena e meia de referências no nosso blogue; vive em Paramos, Espinho]


História da 3ª Companhia de Comandos 
(1966/68) (*)

3ª CCmds
(Guiné, 1966/68) / João Borges
Parte VI (pp. 16-18)








Guiné 61/74 - P21698: Blogpoesia (711): "Nunca desistir", "Poemas de oiro" e "Concerto n.º 3 de Rachmaninov para piano", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

1. A habitual colaboração semanal do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) com estes belíssimos poemas, enviados, entre outros, ao nosso blogue durante esta semana:


Nunca desistir

Se a obra foi bem concebida e desejada,
Nunca se deve desistir dela.
As coisas perfeitas nunca se conseguem à primeira.
A perfeição está sempre no fim do caminho
Que pode ser longo.
Todas as grandes obras-primas da humanidade tiveram suas histórias de desânimo.
Só porque venceu a resistência elas chegaram ao seu fim.
O abandono é a morte da obra-prima.
Não passará nunca de um esboço mais ou menos avançado.
Passará a vida num canto da oficina
à espera do abandono e sua destruição.
As boas ideias que a mente, gratuitamente, propõe ao seu autor devem ser por ele tentadas e executadas.
Sob pena de ser um ingrato artista, jogando fora o que lhe deu a inspiração.


Berlim, 19 de Dezembro de 2020
9h2m
Jlmg


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Poemas de oiro

Minha eira de oiro
Estendo na eira meus poemas de oiro.
Os banho de sol.
Os lavo de chuva.
Colho-os maduros, caiados de oiro.
Os ordeno por lotes.
Conforme os temas.
Lanço-os ao vento.
Que a sorte os benfazeje.
Não caiam nas pedras.
Brilhem nas mentes
E lhes adocem as vidas.
Não espero as loas.
Só quero as bênçãos.


Berlim, 21 de Dezembro de 2020
9h13m
Jlmg


********************

Concerto n.º 3 de Rachmaninov para piano

O expoente máximo de vilolência.
Um sobe e desce, fugindo aos precipícios.
O piano espuma enraivecido.
A pianista, a jovem Khatya Buniatilis, péga as teclas como às crinas dum cavalo.
O maestro sabe que tem um cancro.
Cláudio Abado.
Veterano e firme na sua carreira.
Seu rosto esmaecido dá nota do roedor.
Que não sabe perdoar.
Apesar de tudo, sobe ao palco, seguro e decidido.
Como se nada haja.
A orquestra se lhe entrega.
Galvanizada.
A plateia cerra os olhos.
Deixa-se levar por aquele rio vigoroso de melodia.
O tempo flui e arrasta furiosamente toda a gente.
Entre suaves açudes e cataratas.
Sem dúvida.
É o concerto expoente do génio que o compôs.


Ouvindo Hélène Grimaud e Cládio Abado

Berlim, 23 de Dezembro de 2020
20h36m
Jlmg

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Nota do editor

Último poste da série de 20 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21665: Blogpoesia (710): "É preciso enfrentar a tempestade", "Originalidade" e "Desgarradas da pandemia", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

Guiné 61/74 - P21697 Boas Festas 2020/21: Em rede, ligados e solidários, uns com os outros, lutando contra a pandemia de Covid-19 (32): Um abraço cordial do cor art ref Morais Silva



É a pena as imagens acima não poderem ser reproduzidas com animação, de acordo com o ficheiro em formato pps que recebemos. A Festa da Vida (1972), interpretada por Carlos Mendes, no Festival da Canção, pode ser visionada aqui, no You Tube.


1. Mensagem, de 19 do corrente, do nosso camarada António Carlos Morais Silva, cor art ref,  professor da Academia Militar, membro da nossa Tabanca Grande;  no CTIG foi instrutor da 1.ª CComandos em Fá Mandinga, Adjunto do COP 6 em Mansabá e Comandante da CCAÇ 2796 em Gadamael, entre 1970 e 1972.

 
Abraço cordial para a “Tabanca” na pessoa do seu “homem grande”

Morais Silva

Guiné 61/74 - P21696: Parabéns a você (1915): José Pedro Neves, ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 4745 (Guiné, 1973/74)

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Nota do editor

Último poste da série de 25 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21688: Parabéns a você (1914): Ismael Augusto, ex-Alf Mil Manut do BCAÇ 2852 (Guiné, 1968/70)