Queridos amigos,
Prossegue a viagem no interior do Museu Nacional do Azulejo, houve a preocupação de voltar um pouco atrás e ver conjuntos azulejares de um maior interesse, visitar o Panorama de Jerusalém, uma pintura flamenga que comporta a narrativa visual das 76 passagens da Paixão de Cristo e onde aparece a Rainha D. Leonor, pelo Coro Baixo visita-se a admirável igreja do convento, os tetos, o altar-mor, o púlpito, a riquíssima azulejaria holandesa, para quem entra aqui pela primeira vez é quase um atordoamento. Mas vamos continuar, o andar superior reserva-nos grandes surpresas e temos toda a história da azulejaria por contar, espera-nos um espectáculo fora de série que é o silhar de azulejos Grande Vista de Lisboa.
Um abraço do
Mário
Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (33):
A Arte Religiosa também conta neste portentoso Museu Nacional do Azulejo
Mário Beja Santos
Já se recordou ao leitor que este Museu nos revela Portugal com uma potência mundial do azulejo, depois de muita vicissitude aqui chegou ao Convento de Madre Deus este formidável acervo que é uma das manifestações artísticas identitárias da arte Portuguesa. Só que o convento, por si só, é um dos monumentos chave do barroco nacional. Se já visitou o restaurante-cafetaria com um conjunto representativo de azulejos da “cozinha de fumeiro”, ou espaireceu na estufa, pode agora contemplar o claustro, altamente depurado, obra de Diogo de Torralva (cerca de 1551), pode voltar de novo ao percurso didático da evolução do azulejo, só tem a ganhar em contemplar de novo o retábulo de Nossa Senhora da Vida, os padrões de enxaquetado, brações, panos de frontal de altar, percorrer o Coro Baixo, há tudo a ganhar em ver o azulejo da esfera armilar, divisa de D. Manuel I, executado em técnica hispano-mourisca. Pode agora contemplar uma obra extraordinária chamada Panorama de Jerusalém, veio da Flandres e data 1517. Foi oferta do Imperador Maximiano de Áustria à Rainha D. Leonor, é uma bela síntese do espírito de religiosidade mística do seu tempo. Ao fundo e à esquerda temos a imagem da Rainha D. Leonor, reza a tradição que a obra chegou a Portugal estando por pintar uma pequena área. Trata-se de uma narrativa visual de 76 passagens da Paixão de Cristo, que decorrem numa paisagem cujo eixo fundamental é o templo de Salomão. Para as freiras clarissas da Madre de Deus, esta pintura funcionaria como um substituto da peregrinação à Terra Santa, elas participariam de forma mística na Sua Paixão.
Estamos agora na Igreja do Convento da Madre de Deus, construída no reinado de D. João III e de D. Catarina de Áustria, substituiu a igreja primitiva. O seu esplendor deve-se às campanhas de obras empreendidas nos sucessivos reinados de D. Pedro II, D. João V e D. José, vejam-se os revestimentos azulejares encomendados à Holanda. Nos painéis, da autoria de Jan van Oort, completados por Willelm van der Kloet, há representação de palácios e jardins, um ermitério onde diversos religiosos se ocupam a orar. Era esta a moralidade: recordava-se aos fiéis as duas escolhas possíveis na época, um caminho de prazer e frivolidade ou um percurso de despojamento e virado para o Divino. O conjunto provoca-nos uma sensação de serenidade e harmonia, fruto do equilíbrio das proporções da arquitetura maneirista do século XVI. Acede-se pelo Coro Baixo através de uma imponente escadaria aqui colocada no século XIX. É igualmente impressionante a talha dourada, e olhando a toda à volta até se ganha quando se tem uma visita guiada, pois há complexos programas simbólicos barrocos nestes espaços à volta do teto e no altar-mor. Visite-se com tempo, e se necessário regresse-se a esta igreja antes de sair do museu
Avisa-se o leitor que há muitíssimo mais para ver, há os painéis extravagantes, com aves e macacos, silhares para escadarias, a capela de Santo António com o fabuloso presépio, há as figuras de convite, a história do chapeleiro António Joaquim Carneiro, iremos até ao século XX e depois sobe-se a outro andar para termos a apoteose, o extraordinário conjunto chamado Grande Vista de Lisboa que veio da sala do Palácio dos Condes de Tentúgal, um autêntico diaporama com uma visão de 360º. Por tudo isso vamos prosseguir a visita.
(continua)
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Nota do editor
Último poste da série de 8 DE JANEIRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P22889: Os nossos seres, saberes e lazeres (486): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (25): O Museu que mostra como nos transformámos na potência mundial do azulejo (Mário Beja Santos)