quinta-feira, 13 de janeiro de 2022

Guiné 61/74 - P22902: (Ex)citações (398): Topónimos de origem árabe: Missirá, Amedalai, Medina, Meca... Curiosidades, controvérsias (Cherno Baldé, Bissau / Fernando Ribeiro, Porto)


Guiné > Região de Bafatá >  Sector L1 (Bambadinca)  > Regulado do Cuor >  Missirá > Pel Caç Nat 52 > c. 1968/69.

"Um momento de Missirá: à esquerda. Madiu Colubali, baixo de corpo, grande de coragem. Grande conhecedor do Corão e da escrita marabu; à direita, o régulo Malã Soncó, em perfeito traje de chefe mandinga - figura bíblica, bravura sem igual. Atrás, o pequeno monumento que os rebeldes destruíram e nós reconstruímos. Ao fundo, à esquerda, a mesquita. À direita, cubata destruída no ataque de [6 de ] setembro [de 1968]. Tudo tão belo"...

Foto (e legenda): ©  Mário Beja Santos (2006). Todos os Direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné] 


1. Comentários ao poste P22891 (*):




Caros amigos,

Com a partida do "Alfero" Jorge Cabral, o unico, o Blogue, os Veteranos da Guerra da Guiné e todos nós, perdemos um Homem bom e invulgar, um excelente Humorista e Comediante nato. Aproveito esta oportunidade para endereçar os meus sentimentos de pesar à familia enlutada e aos amigos mais próximos.

Sobre o Poste de hoje (*), gostaria de apresentar algumas notas, a titulo de curiosidades, que, certamente, o "Alfero" e todos os que passaram pela região, gostariam de saber.

No último parágrafo do seu Conto de Natal o "Alfero" Cabral escreve: 

"Foi em Novembro, estava calor, o Menino era Braima e não Jesus, nenhuma estrela iluminava o céu, e o Alferes não se parecia com os Reis Magos. Porém ainda hoje, ele acredita, que ali no meio do mato, naquela tarde, aconteceu Natal".

Num comentario a um dos Postes anteriores escrevi, mais ou menos isto: Não era o menino Jesus, mas estava o menino Braima que é o maior dos Profetas das trés religiões conhecidas. Braima ou Ibrahima vem do Árabe "Ibrahim" e que corresponde ao Abrão ou Abraham dos Cristãos.

O topónimo Missirá (nas línguas dos povos muçulmanos da Senegâmbia) vem, também, do Árabe "Misr" ou "Misra", ou seja o nome dado, pelos árabes, ao Egipto. 

São da mesma origem topónimos como Hamdalaye (cidade de Allah), Keruane ou Quereuane (cidade de Cairo), Madina (Medina, cidade do Profeta, na Arábia Saudita onde foi enterrrado o Profeta Mohammed) e muitos outros. 

Curiosamente, não tenho ouvido nenhuma localidade com o nome de Maca (Meca) que, mesmo sendo considerada a cidade santa, não merece muita reverência, provavelmente devido ao facto da sua longa resistência e luta tenaz movida pelo clã dos Kuraisitas (Clã do proprio Profeta) contra a religião islâmica e ao próprio Profeta,  obrigando-o a fugir e refugiar-se na região mais ao Norte onde encontrou apoio entre os clãs de Medica.

Na região da Africa Ocidental, especialmente nos paises de maioria muçulmana, são muitos os topónimos de origem Árabe devido  influência da religião islâmica que aconteceu nos séculos anteriores à colonizaçao europeia, e fundamentalmente no século XIX com a entrada em cena dos povos Fulbés ou fulanis (fulas, em português) e a fundação de importantes reinos teocráticos que alteraram radicalmente o cenário politico, demográfico e sócio-cultural da região, desde o Oceano Atlântico (Senegal/Mauritânia) até à África Central (Camarões e RCA). 

Estes movimentos e reinos nascidos das "Djihads" de letrados Fulbhées da região foram depois vencidos ou subjugados através de politicas de Protectorados pelas potências coloniais. Todavia, assistimos de novo ao recrudescer do fenómeno "Djihadista" sob outras roupagens e caracteristicas, fundamentalmente fruto de políticas erradas e de governos exclusivos e a marginalização de povos inteiros que não se reconhecem nos governos e lideranças nascidos das independências precipitadas e mal geridas, cujas consequências e impactos ninguém pode prever, por enquanto.

Com um abraço amigo,

Cherno Baldé

9 de janeiro de 2022 às 13:51

(ii) Fernando de Sousa Ribeiro

Caro amigo Cherno Baldé e restante pessoal

Existe em Portugal uma localidade chamada Meca. É uma pequena aldeia situada a norte de Alenquer. Fui lá uma vez há muitos anos e deparei-me com uma grande e imponente igreja, grande e imponente demais para uma aldeia tão pequena, o que não é caso único em Portugal. Todos os anos realiza-se no adro fronteiro à igreja uma cerimónia de bênção do gado. Os criadores de gado da região reunem as suas ovelhas, cabras e bois no largo, para que o padre abençoe os animais, aspegindo-os com água benta.

Embora a igreja e o ritual sejam católicos, o nome Meca pode ter origem muçulmana, pois os árabes ocuparam a região durante cerca de quatro séculos e deixaram numerosos vestígios. O topónimo Alenquer, por exemplo, é de origem árabe. Por outro lado, um vulcão extinto existente nas proximidades da aldeia poderia ter sido um local para rituais pagãos realizados muitos séculos atrás, dos quais a bênção do gado poderia ser um sobrevivente.

4 comentários:

Valdemar Silva disse...

No dicionário da Porto Editora encontramos:
Meca = lugar para onde afluem pessoas, por motivos específicos, objectivo.
popular mulher atrevida, brejeira.
do árabe Makka.

Vendo bem, já em 1240 confluía para aquele lugar próximo de Alenquer, muita gente por causa da veneração, agora, de Santa Quitéria, para orações contra a raiva e, provavelmente, com acompanhamento de animais domésticos.
Resta saber se, anteriormente, passados apenas cem anos de práticas árabes, havia a prática das pessoas confluir para aquele local que por isso lhes chamariam Makka ...Meca.
Não acredito que o lugar fosse conhecido por haver por lá uma mulher brejeira que depois passou a ser a nossa Santa Quitéria.

Isto são constatações da minha parte, que nada têm de conhecimentos superiores sobre práticas muçulmanas, que para o caso temos o nosso entendido Cherno Baldé.

Abraço e saúde da boa
Valdemar Queiroz

ps Passei mais uma noitada no Hospital, mas já estou em casa e na conversa com a rapaziada.

Valdemar Silva disse...

Queria dizer "constatações".

Valdemar Queiroz

Cherno Baldé disse...

Caro Valdemar,

Pequeno mas excelente texto o teu, com o pouco que cada um Deus lhe deu, somos todos um pouco sábios, todos com um pouco do António Homem de Melo (como costumas dizer) cada um a sua maneira, privilégio do tempo e da experiência. Os fulas dizem que: "Não é que Deus goste dos homens grandes, o facto é que convivem há muito tempo".

Não seria de estranhar se a Santa Quitéria fosse mesmo uma brejeira, pois as religiões sempre combinaram bem com a brejeirice feminina, senão vejamos: O Moisés teve a sua Cusita (negra) Tzípora que os europeus não gostam muito de fazer referência; o Judá (Chefe da tribo) teve a sua Cananeia Tamar, O Jesus teve as suas Magdalenas que tais e o Profeta Mohamed teve a sua Cadija, 20 anos mais velha, Viva rica e solitária e se calhar não menos brejeira, dentro do seu contexto e a maneira Árabe, claro.

Abraços

Cherno AB

Valdemar Silva disse...

Caro Cherno Baldé
Eu digo não acreditar a localidade se chamar Meca por haver por lá uma mulher brejeira que, depois, passou a ser a Santa Quitéria, mas pode muito bem ser por a brejeira ser outra mulher.
Para se saber sobre Santa Quitéria que teria nascido gêmea mais oito irmãs séc. II para os lados de Braga, apenas no séc.VIII aparecem milagres venerados e ligados às maleitas da raiva.
Na Cultura-Revista de História e Teorias das Ideias, no artigo Quitéria, uma Santa da Lusitânia nas terras entre o Douro e Minho está explicado o que teria acontecido com Quitéria Bracarense.
Julgo referires Pedro Homem de Melo, o poeta que viveu na minha terra e deixou escrito poemas em azulejos, nos muros dos caminhos do interior em Afife.
Eternidade
As águas são para o mar,
As folhas são para o vento.
Só as fragas senão mudam!
Nelas fica o pensamento...
14-08-1939

Abraço e saúde da boa
Valdemar Queiroz Embaló