sexta-feira, 27 de janeiro de 2023

Guiné 61/74 - P24014: "Una rivoluzione...fotogenica" (7): Roel Coutinho, médico neerlandês, de origem portuguesa sefardita, cooperante, que esteve ao lado do PAIGC, em 1973/74 - Parte VI: O quotidiano dos guerrilheiros na base de Hermacono (Senegal)...


Guiné > Região Norte, fronteira com o Senegal  > Hermangono > PAIGC > 1974 > Comandante militar / Foto: ASC Leiden - Coutinho Collection - D 11 - Hermangono, Guinea-Bissau - Military commander of Hermangono, Northern Guinea-Bissau - 1974


Guiné > Região Norte, fronteira com o Senegal  > Hermangono > PAIGC > 1974 >  Camas dos combatentes escavadas no chão / Foto: ASC Leiden - Coutinho Collection - D 13 - Hermangono, Guinea-Bissau - Military trench beds - 1974


Guiné > PAIGC > Região Norte, fronteira com o Senegal >  Soldado com a sua mulher / Foto: ASC Leiden - Coutinho Collection - D 14 - Hermangono, Guinea-Bissau - Soldier with wife - 1974.tif

Guiné > Região Norte, fronteira com o Senegal  > Hermacono > PAIGC > 1974 > Combatentes em frente a uma palhota /Foto: ASC Leiden - Coutinho Collection - D 18 - Hermangono, Guinea-Bissau - Soldiers in front of a hut - 1974


Guiné > Região Norte, fronteira com o Senegal > Hermacono > PAIGC > 1974 > Dois combatentes em frente a uma palhota, com uma criança / Foto: ASC Leiden - Coutinho Collection - D 21 - Hermangono, Guinea-Bissau - Soldiers in front of a hut with a child - 1974


 
Guiné > Região Norte, fronteira com o Senegal  > Hermacono > PAIGC > 1974 >  Combatentes e carregadores num momento de descanso./ Foto: ASC Leiden - Coutinho Collection - D 22 - Hermangono, Guinea-Bissau - Soldiers and carriers relaxing - 1974


Guiné > Região Norte, fronteira com o Senegal  > Hermacono > PAIGC > 1974 > Dois combatentes "à volta do tacho"/ Foto; ASC Leiden - Coutinho Collection - D 17 - Hermangono, Guinea-Bissau - Soldiers cooking - 1974


 Guiné > Região Norte, fronteira com o Senegal  > Hermacono > PAIGC > 1974 >Dois combatentes, no intervalo da guerra, fazendo o seu TOC escolar... / Foto: ASC Leiden - Coutinho Collection - D 15 - Hermangono, Guinea-Bissau - Military learning to read and write - 1974


Guiné > Região Norte, fronteira com o Senegal > Hermacono > PAIGC > 1974 > A formatura da alvorada / Foto: ASC Leiden - Coutinho Collection - D 19 - Hermangono, Guinea-Bissau - Morning roll call in Hermangono - 1974


 Guiné > Região Norte, fronteira com o Senegal  > Hermacono > PAIGC > 1974 > Inspeção às "tropas" (i) ... / Foto: ASC Leiden - Coutinho Collection - D 16 - Hermangono, Guinea-Bissau - Military inspection in Hermangono - 1974


 Guiné > Região Norte, fronteira com o Senegal  > Hermacono > PAIGC > 1974 > Inspeção às "tropas" (ii) ... / Foto: :ASC Leiden - Coutinho Collection - D 20 - Hermangono, Guinea-Bissau - Morning roll-call in Hermangono - 1974


Guiné > Região Norte, fronteira com o Senegal  > Hermacono > PAIGC > 1974 > Uma saída  / Foto: ASC Leiden - Coutinho Collection - D 12 - Hermangono, Guinea-Bissau - Military on the way - 1974



Fonte: Wikimedia Commons > Guinea-Bissau and Senegal_1973-1974 (Coutinho Collection) (Com a devida vénia...) . Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2023)
 
1. Roel Coutinho é um prestigiado médico, epidemiologista e professor, hoje jubilado, de epidemiologia e prevenção de doenças transmissíveis,  nascido em 1946, nos Países Baixos, em Laren, perto de Amesterdão, província da Holanda do Norte. Licenciou-se em medicina em 1972, esteve no Senegal e na Guiné-Bissau em 1973/74 em visita ao PAIGC, em missão sanitária. Especializou-se depois em microbiologia médica, doutorou-se em 1984, em doenças sexualmente transmissíveis; é um especialista mundial em HIV/Sida, com mais de 600 artigos publicados em revistas científicas. 

Tem ascendência portuguesa, e judaica: os antepassados, marranos ou cristãos-novos, devem ter saído de Portugal para a Holanda  no séc. XVII.  Os portugueses, cristãos novos, e de novo reconvertidos ao juadaísmo, constituíam uma comunidade prestigiada, pela cultura, o dinheiro e o poder. Sempre uaram os seus apelidos portugueses.  Prova doo seu estatuto, é a "Esnoga", a monumental Sinagoga Portuguesa, em Amsterdão, que chegou a ter 3 a 4  mil fiéis; hoje a comunidade está reduzida a umas escassas centenas de pessoas: espantosamente o edifício da "Esnoga Portuguesa", do séc. XVII, escapou à destruição da II Guerra Mundial e à ocupação nazi; é visita obrigatória para os portugueses que forem a Amesterdão.

Da coleção Coutinho, relativa à sua visita ao PAIGC na Guiné e no Senegal, entre março de 1973 e abril de 1974, apresentamos hoje uma seleção de imagens, editadas por nós, relativas ao quotidiano dos combatentes do PAIGC em Hermangono, na "região Norte,  junto à fronteira do Senegal".  

Como fotógrafo (amador), Coutinho não se deixou deslumbrar pelas armas nem pela guerra... Não são muitas as fotos dos combatentes, privilegiou antes outros aspectos da vida no "mato" (para usar um termo caro às NT):  a prestação de cuidados de saúde, a educação, a população, etc.

2. Não conseguimos, até hoje, localizar este lugar, Hermangono (ou Hermacono, segindo a 2ª Rep QG/CC/FAG.  

Segundo a instituição a quem foi doada a coleção de mais de um milhar de fotos e "slides", o African Studies Centre (ASC), Leiden, Hermangono seria "uma pequena aldeia na Guiné-Bissau, a um dia de distância da fronteira senegalesa", mas não se sabe a sua exata localização... 

Também não encontrámos este topónimo, nem na "Crónica da Libertação", do Luís Cabral (Lisboa, O Jornal, 1984), nem no Arquivo Amílcar Cabral / Casa Comum, nem nas nossas antigas cartas militares.

Pergunta-se a quem sabe: Hermangono (ou Hermacono)  seria no corredor de Sambuíá, que tinha início em Cumbamori?

3. Alguns pormenores interessantes sobre os combatentes do PAIGC aqui fotografados:

(i) não viviam nem dormiam em "resorts" turísticos de "luxo": os nossos, apesar de tudo, sempre eram melhores; 

(ii) não há estruturas edificadas, de alvenaria, nem propriamente abrigos ou trincheiras, e a camuflagem não era "famosa"; 

(iii) quase todos calçam sandálias de plástico, provavelmente "made in China"; 

(iv) o fardamento é de diferentes tipologias e cores;

(v) parte deles estão à civil; 

(vi) alguns tinham família (uma ou mais esposas, filhos); 

(vii) não tinham "rações de combate", tinham que fazer a sua própria "bianda" (não há messe nem cantina...);

(viii) aparentam ser jovens, alguns deviam ter sido recrutados recentemente, apesar das crescentes dificuldades do PAIGC em renovar as suas fileiras; 

(ix) as formaturas têm todo o ar de terem sido feitas para a "fotografia", para o "jovem amigo e médico holandês";

(x) botas, relógios de pulso e rádios portáteis deviam ser um privilégio (isto é, só para alguns, o comandante de bigrupo, o comissário político); 

(xi) não se veem armas pesadas;

(xii) Hermangono parece ser mais um "barraca" do que uma base (como Morés ou Sara) (e, pelo aparente à vontade dos seus  habitantes podia estar já situada em território senegalês, com menos riscos de ser bombardeada pela aviação ou pela artilharia dos "colonialistas"); 

(xiii) estamos, de resto, numa altura, 1.º trimestre de 1974 (as fotos devem ser de março / abril), em que o PAIGC já tinha carta branca do Senghor para poder circular pelo Senegal, com "armas e bagagens" (os primeiros anos não nada foram fáceis, segundo o testemunho do Luís Cabral nas suas memórias).
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Nota do editor:

Último poste da série > 13 de janeiro de 2023> Guiné 61/74 - P23977: "Una rivoluzione...fotogenica" (6): Roel Coutinho, médico neerlandês, de origem portuguesa sefardita, cooperante, que esteve ao lado do PAIGC, em 1973/74 - Parte V: os "hospitais" do mato e o pessoal de saúde cubano

quinta-feira, 26 de janeiro de 2023

Guiné 61/74 - P24013: Álbum fotográfico do Coronel Inf Luís Carlos Cadete, ex-Cap Inf, CMDT da CCAÇ 1591 (Fulacunda, Mejo, Aldeia Formosa e Buba, 1966/68) (Parte I)




Álbum fotográfico do Coronel Inf Luís Carlos Cadete, ex-Cap Inf, CMDT da CCAÇ 1591 (Fulacunda, Mejo, Aldeia Formosa e Buba, 1966/68), autor do livro "Noites de Mejo - Histórias Singulares da Guerra na Guiné", obra recenseada pelo nosso camarada Mário Beja Santos.[*]


Foto 1 > Mejo > Mulher Fula
Foto 2 > Fulacunca, 18AGO66 > A LDG Montante preparada para abicar no "Porto de Fulacunda" com a CCAÇ 1591 e respectiva carga regulamentar
Foto 3 > Descarga em Gadamael Porto, 20OUT66 > Os batelões estão em seco à entrada do aquartelamento
Foto 4 > Mussa Colubali,  Fula de Mejo com traje de cerimónia. Guia da Companhia, exímio caçador e de uma dedicação extrema (15JAN67)
Foto 5 > Mejo > Oração colectiva do final do Ramadão. À frente, o Chefe da Tabanca, Sori Sufa, Fula-Forro (1967)
Foto 6 > Uma bajuda de Mejo (1966)
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Notas do editor

[*] Vd. postes de:

26 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23917: Notas de leitura (1536): "Noites de Mejo", por Luís Cadete, comandante da CCAÇ 1591; edição de autor, com produção da Âncora Editora, 2022 (1) (Mário Beja Santos)

2 DE JANEIRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P23938: Notas de leitura (1539): "Noites de Mejo", por Luís Cadete, comandante da CCAÇ 1591; edição de autor, com produção da Âncora Editora, 2022 (2) (Mário Beja Santos)
e
9 DE JANEIRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P23965: Notas de leitura (1541): "Noites de Mejo", por Luís Cadete, comandante da CCAÇ 1591; edição de autor, com produção da Âncora Editora, 2022 (3) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 9 de Janeiro de 2023 > Guiné 61/74 - P23964: Álbum fotográfico do Padre José Torres Neves, ex-alf graduado capelão, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) - Parte VII: Tabanca e destacamento de Braia, na estrada Mansoa-Bissorã

Guiné 61/74 - P24012: (De)Caras (193): Histórias de "desempanadores" precisam-se!... Para já, temos fotos do Francisco Candeias Cardoso, da CART 1525, "Os Falcões" (Bissorã, 1965/67)


Foto nº 1 > O Francisco Candeias Cardoso, sentado no capô do jipe


Foto nº 2 > O Francisco Candeias Cardoso,  montado no burro de Bissorã


Foto nº 3 > O Francisco Candeias Cardoso, na ponta esquerda, apoiando-se nos varais da carroça do burro de Bissorã (uma espécie seguramente em vias de extinção)


Foto nº 2 > O Francisco Candeias Cardoso é o primeiro a contar da direita, junto ao memorial da CART 1525 em Bissorã


Foto nº 5 > O Francisco Candeias Cardoso,  desempanador, a exercer a sua função...

Guiné > Região do Oio > Bissorã > CART 1525 (1965/67) > O 1.º cabo  (ou soldado?) desempanador Francisco Candeias Cardoso... PelaS fotoS (18, sem legenda) que divulgou na página dos "Falcões", vê-se que o Cardoso era um tipo brincalhão e divertido, e que alinhava nas jogatanas de futebol... Aparece nos convívios,  vive em Armação de Pera, no Algarve. A companhia tinha mais dois desempanadores: Arménio da L. Branco e José C. G. Sampaio... 

Fotos alojadas na página da CART 1525, na seção "Páginas Pessoais".  Reproduzidas aqui com a devida vénia...ao autor (Francisco Candeias Cardoso) e ao editor (Rogério Freire).
 
Fotos: © Francisco Candeias Cardoso / Rogério Freire (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. No Pelotão de Manutenção, da CCS/BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70), constituído por 33 militares, havia:
  • 1 oficial de manutenção (o alf mil Ismael Augusto);
  • 7 mecânicos auto (o 2º srgt Daniel, o fur mil  Herculano José Duarte Coelho, os  1ºs cabos João de Matos Alexandre e António Luis S. Serafim, mais três soldados (Amável Rodrigues Martins, Rodrigo Leite Sousa Osório e Virgílio Correia dos Santos);
  • 1 bate-chapas (o 1º cabo Otacílio Luz Henriques, mais conhecido por "Chapinhas");
  • 1 correeiro estofador (1º cabo Norberto Xavier da Silva);
  • 1 mecânico electro auto (1º cabo Vieira João Ferraz);
  • 22 condutores auto: 2 cabos  e 20 soldados...
O que será feita desta gente toda, a começar pelo Ismael Augusto, que é o nosso grã-tabanqueiro nº 609 ? (*). E o "Chapinhas" ? Faço votos para que estejam bem, e de saúde. 

Estranho não existir um "desempanador" na CCS/BCAÇ 2852... Mas não faltava um correeiro estofador, mesmo que eu nunca tivesse visto burros, machos ou cavalos em Bambadinca, nem carros de tração animal, os principais clientes do correeiro estofador...(O correeiro faz obras de couro, como arreios; o estofador  faz móveis ou peças de móveis estofados.)

Mas vou encontrar esta especialidade de desempanador nas subunidades de quadrícula deste batalhão (CCAÇ 2404, 2405 e 2406)... Estas companhias, numa reduzidíssima equipa de mecânicos autos,  tinham pelo menos um ou dois desempanadores... (em geral, um 1º cabo, podendo haver também um soldado "mecânico auto desempanador").

Não sei muito bem o que os desempanadores faziam ou podiam fazer no "mato", em caso de avaria   ou  "atascanço" de uma viatura (coisa frequente, sobretudo no tempo das chuvas). Confesso que não me lembro de ver nenhum em funções... Na prática, eram os condutores autorrodas, que tinham que resolver ou remediar o problema, como a ajuda dos militares das escoltas,  longe do aquartelamento mais próximo (no caso das colunas logísticas, que podiam durar dois dias, com distâncias até 60 km)... 

Também não tenho ideia de ver, no CTIG, o pronto-socorro em ação... a não ser talvez nalguma estrada alcatroada (só conheci uma  a sul do rio Geba: Bambadinca-Bafatá). Nem me lembro sequer de ver um pronto-socorro em Bambadinca, mas devia haver...
 

2. Creio que na Tabanca Grande só temos um desempanador, o Alberto Sardinha, da CCS/ BCAÇ 1877 (Teixeira Pinto e Bafatá, 1966/67) (**). 


(...) "Fui Mecânico Desempanador Auto da CCS/BCaç 1877. Cheguei à Guiné em 1966, fiquei em Bissau no Quartel da Amura durante 9 meses, de seguida fui para Brá, perto do Aeroporto de Bissau, dali para Teixeira Pinto, dali para Bafatá. (...)

É de Ponte Sor, mora no Seixal, o Carlos Vinhal desafiou-o a  "abrir o livro", na altura em que o apresentou ao pessoal da tertúlia: 

(...) "Esperamos que as tuas próximas mensagens venham mais compostas. Há sempre uma história para contar, já que todos nós guardamos na nossa memória peripécias várias. Terás por aí fotos que te lembrarão situações boas e más. Como desempanador foste muitas vezes ao mato recuperar viaturas avariadas ou atoladas? Nos quartéis improvisavam quando não havia sobressalentes à mão? Como vez já te sugeri assuntos para desenvolver" (...)

Mas o camarada Alberto Sardinha, infelizmente, ficou por aqui, ou seja, "empanado". Por isso tem apenas uma referência no nosso blogue (e com este poste, duas)... Tem página no Facebook desde janeiro de 2019. Mas pouco ou nada fala da tropa e da guerra.  Lá vai "facebook...ando",   com  familiares e amigos, como bom alentejano que é, e de uma bela terra, Ponte Sor.

Ora nós queríamos histórias de desempanadores... Fomos encontrar um camarada com esta especialidade, pertencente à CART 1525, os Falcões (Bissorã, 1965/67): o Francisco Candeias Cardoso, algarvio, segundo cremos... Não tem  "estórias", mas tem algumas fotos, que reproduzimos acima (cinco ), com a devida vénia ao autor e ao editor da página... 

Pode ser que o Cardoso nos veja e fique com vontade de se juntar a nós... Dos "Falcões" só temos o Rogério Freire, sentado à sombra do poilão da nossa Tabanca Grande... De qualquer modo, aqui fica também a nossa homenagem a estes camaradas da "ferrugem", que eram poucos mas tinham que ser bons... (***)

A CCS / BCAÇ 2852 não tinha "desempanadores" mas tinha "corneteiros / clarins",  eram nada mais nada menos do que cinco: 1 sargento, 2 cabos, 2 soldados... Deviam-se fazer grandes paradas de honra em Bambadinca, mas já não me lembro... ou então devia andar distraído ou desenfiado no "mato".

3. O "desempanador", "o que desempana", do verbo "desempanar" 

desempanar
desempanar | v. tr.
 
de·sem·pa·nar  
(des- + empanar, avariar)

verbo transitivo

Resolver a avaria de (ex.: desempanar um motor). = CONSERTAR, REPARAR ≠ AVARIAR, EMPANAR

"desempanar", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2021, https://dicionario.priberam.org/desempanar [consultado em 25-01-2023].
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Notas do editor

(*) Vd. poste de 14 de março de 2013 > Guiné 63/74 - P11249: Tabanca Grande (390): Ismael Augusto (ex-alf mil manut, CCS/BCAÇ 2852, Bambadinca, 1968/70), novo grã-tabanqueiro, nº 609

(**) Vd. poste de 13 de março de  2012 > Guiné 63/74 - P9603: Tabanca Grande (324): Alberto Sardinha, ex-Soldado Mecânico Desempanador Auto da CCS/BCAÇ 1877 (Teixeira Pinto e Bafatá, 1966/67)

(***) Último poste da série > 10 de janeiro de  2023 > Guiné 61/74 - P23967: (De)Caras (192): Os bravos comandos cap Maurício Saraiva e fur mil Joaquim Morais (morto em combate, no Quitafine, em 7/5/1965) (Virgínio Briote)

quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

Guiné 61/ 74 - P24011: Recortes de imprensa (125): Partida para o CTIG das CCAÇ 2381, 2382 e 2383, em 30 de abril de 1968 (Jornal do Regimento de Infantaria n.º 2, Abrantes, nº 30, maio de 1968) (José Manuel Samouco, ex-fur mil, CCAÇ 2381, "Os Maiorais", 1968/70)


Abrantes > RI 2 (Regimento de Infantaria n.º 2) > 30 de abril de 1968 > Despedida das CCAÇ 2381, 2382 e 2383, a caminho do CTIG





Notícia de 1.ª página do jornal do RI 2, n.º 30, maio de 1968 > Partida das CCAÇ 2381, 2382 e 2383 para o CTIG. Estiveram a frequentar a CIE e o IAO. Cerimónias presididas pelo cor Roldão, com missa na Parada de Honra. (O Comandante Militar do RI 2 na altura seria o cor art José Ventura Roldão?)


Fotos (e legendas): © José Manuel Samouco (2023). Todos os direitos reservados.

 [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Documentos que nos foram enviados hoje pelo José Manuel Samouco, ex-fur mil, CCAÇ 2381, Os Maiorais (Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada , 1968/70).





Temos referências a estas três companhias: CCAÇ 2381 (184), CCAÇ 2382 (53), CCAÇ 2383 (3). 

Além do Samouco, temos mais cinco camaradas da CCAÇ 2381 inscritos na Tabanca Gande: José Teixeira, José Belo,  Arménio Estorninho, Eduardo Moutinho Santos, Raul Rolo Brás... Têm sido os três primeiros camaradas os mais ativos como colaboradores do blogue. 

Destaque para o emblema, a divisa e a figura do "Zé do Olho Vivo",  da CCAÇ 2382, que, imaginem!, é da autoria do seu comandante,  o ex-cap mil Carlos Nery, que fez tábua rasa da heráldica militar... Divisa: "Por estradas nunca picadas, Por picadas nunca estradas"...Um achado de humor pouco castrense...

Da CCAÇ 2382 (Bula, Buba, Aldeia Formosa, Contabane, Mampatá e Chamarra, 1968/70), temos o José Manuel Cancela, o Carlos Nery, o Manuel Traquina e o Alberto Sousa e Silva.


Da CCAÇ 2383 (Cabuca, 1968/70) temos apenas um camarada, o ex-1º cabo apontador arm pes inf Armando Gomes.

Oxalá apareçam mais, está em curso a campanha de angariação de novos membros da Tabanca Grande: queremos atingir os 900 no fim do ano, o que é um objetivo temerário... E precisamos de fotos e estórias... como de pão para a boca (este blogue é glutão, temos de publicar no mínimo 3 postes por dia, 90 por mês...).
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Nota do editor:

Último poste da série > 3 de novembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23760: Recortes de imprensa (124): Homenagem a Fernando Cepa e inauguração de obras de requalificação do Pavilhão Gimnodesportivo de Mar, com a devida vénia aos jornais; Farol de Esposende e Correio do Minho

Guiné 61/74 - P24010: Historiografia da presença portuguesa em África (352): Actas do Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné: Uma fonte documental que não se deve ignorar (6) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Abril de 2022:

Queridos amigos,
Detetam-se substanciais diferenças entre o mandato de Sarmento Rodrigues e o de Raimundo Serrão, o primeiro é sempre atravessado por obras, fala-se permanentemente em desenvolvimento, em cultura, na estrutura viária, na continuação dos projetos habitacionais já incrementados por Ricardo Vaz Monteiro, a que o capitão-tenente Sarmento Rodrigues não só deu seguimento como ampliou, é um mandato frenético de visitas científicas, produz-se literatura como jamais acontecera na colónia, aqui chegaram visitantes como o jornalista Norberto Lopes, o geógrafo Orlando Ribeiro, o combate contra a doença do sono e o conhecimento do potencial dos solos, a zoologia e outros domínios científicos entraram em franco desenvolvimento; lendo estas atas, fica-se com a ideia de que o Eng.º Raimundo Serrão pretendeu pôr ordem administrativa e completar o trabalho de Sarmento Rodrigues, mas perpassa nesta documentação de que não só se cingiu aos regulamentos, aos créditos, à preocupação com os orçamentos anuais, o sistema educativo ganhou forma.Sublinhe-se que há lacunas apreciáveis nesta documentação, salta-se de 1951 para 1955, já estamos no mandato de Diogo de Mello e Alvim. Esta documentação, mesmo com grandes lacunas, chegará até ao governador Spínola, mas não abrangerá todo o seu mandato.

Um abraço do
Mário



Atas de Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné:
Uma fonte documental que não se deve ignorar (6)

Mário Beja Santos

Pode julgar-se à partida que estas reuniões em que se discutiam requerimentos, taxas e emolumentos, em que funcionários da administração se pronunciavam sobre salários e infraestruturas, num órgão consultivo em que compareciam chefes de serviços, comerciantes, profissionais liberais, em reuniões presididas pelo Governador, ou pelo Governador Interino, ou pelo Encarregado do Governo, eram suficientemente enfadonhas para não acicatar quem anda à procura de outros ângulos do prisma que nos ajudam a formar uma visão mais abrangente da História da Guiné. Muitas vezes sem interesse para o historiador/investigador, atrevo-me a dizer, mas há ali casos de tomadas de posição ou declarações que nos ajudam a melhor entender a mentalidade, as iniciativas seguramente generosas que ali se formularam e que não tiveram seguimento, ou mesmo o aproveitamento daquele palco para que um Governador tecesse, em forma de sumário, o que se procurava fazer durante o seu mandato.

É bem curioso o termo de comparação do que foram as sessões do Conselho durante o mandato de Sarmento Rodrigues e as do seu sucessor, o Eng.º Raimundo António Rodrigues Serrão, ele preside à sessão de 22 de agosto de 1949, depois de um interregno depois da partida de Sarmento Rodrigues e a presidência do Encarregado de Governo, como vimos no texto anterior. O presidente é saudado efusivamente, é lembrado o seu antecessor e procede-se a uma citação de Honório Pereira Barreto, extrai-se de uma carta que o tenente-coronel dirigiu ao ministro da Marinha e Ultramar em que apelava à criação de escolas primárias e à formação e oficiais mecânicos os parágrafos alusivos, e depois o orador recorda a premência de se criarem postos móveis de ensino, de se restabelecer o ensino profissional, de se criar uma escola agropecuária e dar um maior apoio ao ensino missionário. O governador Serrão agradece os cumprimentos e toda a sessão é preenchida pelo projeto do Orçamento para 1950.

Não quero cansar o leitor com as minudências da generalidade destas sessões: crédito para a conclusão das obras de centros de saúde e escolas destinadas às populações indígenas; créditos para outros melhoramentos públicos; discussão de matérias alfandegárias; reforma pautal; telegrama enviado ao Governo pela reeleição do Marechal Carmona; orgânica da Caixa de Aposentações; abonos de ajudas de custo devidas a funcionários por deslocações em serviço oficial aos territórios vizinhos; mais emolumentos, créditos. E subitamente entramos em assuntos educativos, o regulamento do Colégio Liceu de Bissau, estabelecimento do ensino particular que passou a ter existência legal. Retenho um comentário do governador: “Quanto às escolas técnicas, nada justifica a sua existência sem que haja liceu; quanto ao Liceu, já expus para o ministro das Colónias a conveniência de vir o júri do Liceu de Cabo Verde examinar os alunos, como se faz em Timor e em diversos liceus de Angola”. A tónica educativa é retomada em 13 de abril de 1950, consideram-se oficialmente válidos os exames do curso geral dos liceus a realizar em Bissau, a que hão de ser submetidos os alunos do ensino particular e temos uma novidade: estava resolvido o problema liceal da Guiné com o Diploma legislativo 1/179, finais de março, 1950. Registo, ao longo de 1950 e 1951, ainda outras iniciativas: projeto do Regulamento das Indústrias da Guiné, mais créditos, imposto de justiça, prossegue a discussão sobre as indústrias na Guiné, Orçamento da Guiné para 1951, Regulamento das Armas; projeto regulamento sobre o horário de trabalho dos não-indígenas e Regulamento de Identificação dos Indígenas; alteração da tabela geral do imposto de selo; queixas sobre o mau funcionamento da Central Elétrica de Bissau; proposta de construção de uma leprosaria para o internato de leprosos; criação de serviços administrativos; telegrama de consternação pelo falecimento do Marechal Carmona.

E estamos em maio de 1951 e discutem-se as matérias dos horários de trabalho. Justifica-se uma breve análise: o período de trabalho diário do pessoal não-indígena dos estabelecimentos comerciais industriais não poderá ser superior a 8 horas; definem-se tais estabelecimentos; o número total de horas de trabalho semanal dos empregados de escritório nunca poderá ser superior a 36 horas e meia e dos empregados comerciais industriais a 48 horas; nos estabelecimentos comerciais dos pequenos centros e nos estabelecimentos industriais que revistam caráter marcadamente rural poderão os respetivos empregados ser isentos do horário de trabalho mediante autorização dada pelo chefe dos serviços de administração civil; é isento de horário de trabalho o pessoal em serviço doméstico; são também dispensados de horário de trabalho as obras de construção civil de caráter doméstico ou agrícola que não estejam localizadas em povoações de categoria igual ou superior a sedes de Concelho; a construção e a reparação de vias de comunicação pode ser dispensada da observância das disposições deste diploma; a idade mínima de admissão ao trabalho nos estabelecimentos comerciais ou industriais é fixada, para qualquer dos sexos, nos 14 anos completos e os menores nestas condições deverão saber ler, escrever e contar corretamente, sem o que não poderão ser empregados; o período de trabalho diário deve ser interrompido pelo menos por um descanso que não poderá ser inferior a 2 horas, depois de 4 a 5 horas de trabalho consecutivo; o domingo é o dia de descanso semanal em toda a colónia e o trabalho prestado ao domingo deverá ser sempre pago pelo dobro; os feriados nacionais serão equiparados, para todos os efeitos, ao domingo ou ao dia excecionalmente destinado ao descanso semanal; excetuam-se destas disposições, além dos estabelecimentos industriais de laboração contínua, dos serviços urbanos de transportes em comum, as farmácias, fotografias, hospitais, casas de saúde, balneários, hotéis, restaurantes e similares, estabelecimentos de venda de géneros alimentícios, tabacarias, agências funerárias, agências de navegação, padarias, etc. Trata-se de um diploma bastante detalhado, envolve os horários de trabalho, menciona a intervenção dos organismos corporativos, interrupções e laboração contínua bem como o trabalho por turnos e o trabalho noturno, hora de abertura e encerramento, o papel das autoridades, as multas por incumprimento.

As publicações respeitantes às atas do Conselho de Governo da Guiné, que estou a analisar na biblioteca da Sociedade de Geografia de Lisboa, têm imensas lacunas, salta-se de 1951 para 1955, a Ata N.º 1, com data de 1 de outubro, é presidida pelo Governador Diogo de Mello e Alvim, o padre Cruz Amaral sublinha a circunstância de ser a primeira vez, desde 1935, que um elemento missionário tem lugar neste Conselho.

(continua)
Imagem do então Liceu Honório Barreto, Arquivo Histórico Ultramarino (por volta de 1960), com a devida vénia
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Nota do editor

Último poste da série de 11 DE JANEIRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P23972: Historiografia da presença portuguesa em África (351): Actas do Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné: Uma fonte documental que não se deve ignorar (5) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P24009: Memória dos lugares (448): a "Esnoga", a sinagoga portuguesa de Amesterdão (séc. XVII) e a história incrível da sua comunidade

 


Amsterdão > Interior da Esnoga / Sinagoga Portuguesa. Gravura do séc. XVII. (Cortesia de:

https://www.esnoga.com/en/history-of-the-community/ )

 1. Visitei a Esnoga (ou Sinagoga) Portuguesa de Amesterdão, no início dos anos 90. E fiquei deveras impressionado com a monumentalidade do edifício, em especial o seu interior e sobretudo a história da comunidade judaica, de origem portuguesa, que a construiu e manteve até aos nossos dias. Aliás, foi um "milagre" ter escapado à destruição, durante a II Guerra Mundial, bem como todo o preciosíssimo recheio (incluindo a fabulosa biblioteca Ets Haim - Livraria Montesinos, considerada a biblioteca judaica mais antiga do mundo, em funcionamento). 

A Esnoga é de há muito monumento nacional neerlandês Vale a pena visitá-la (bem como conhecer o histórico bairro  judeu, onde também se situa  a casa de Anne Frank). 


Roel Coutinho, 2016, foto de
Patrick Sternfeld / capa da revista "Benjamin",
junho 2016, ano 28, nº 104.
Com a devida vénia...

Já aqui  falámos, no nosso blogue, do médico neerlandês Roel Coutinho, de origem judaico-portuguesa, que em 1973/74 esteve no Senegal (nomeadamente em Ziguinchor)  e nalgumas bases do PAIGC,  da região Norte (como Sara). O seu espólio fotográfico dessa visita está disponível, por doação,  na Internet (Wikimedia Commons > Guinea-Bissau and Senegal_1973-1974 (Coutinho Collection)

 A família de Roel Coutinho, embora não pertencesse à comunidade religiosa de Amsterdão, a congregação Talmud Tora, foi igualmente vítima das perseguição aos judeus nos Países Baixos durante a II Guerra Mundial. 

Roel Coutinho, nascido em 1946  (em Laren, a sudeste de Amesterdão) e hoje reformado, é uma figura mediática no seu país, com grande prestígio científico e profissional, tendo-se destacado na luta e prevenção do HIV/SIDA, mas também na pandemia  de gripe A (H1N1) em 2009 e mais recentemente 
na pandemia de Covid-19.

O texto que se segue é uma condensação, feita pelo nosso editor LG, a partir de várias fontes.


História da comunidade judaico-portuguesa

 de Amesterdão  (*)


Kahal Kados Talmud Tora, a comunidade judaica portuguesa, é a comunidade judaica mais antiga dos Países Baixos. 

A comunidade foi fundada em 1639 por judeus espanhóis e portugueses que foram forçados a deixar Antuérpia, na Flandres (hoje Bélgica) depois que a cidade ficou sob o domínio espanhol (em 1585) (**). 

Eles já haviam fugido da Espanha e de Portugal para escapar à sanha da Santa Inquisição. Esses sefarditas encontraram um refúgio seguro na tolerante cidade de Amesterdão.

Num curto período de tempo, três comunidades sefarditas foram estabelecidas emAmesterdão: Bet Jacob em 1610, ou 1602, Neve Salom entre 1608 e 1612 e Bet Israel em 1618. As comunidades fundiram-se em 1639 no Talmud Tora, mais tarde conhecido como comunidade judaica portuguesa. (Talmud Tora quer dizer "o estudo da Lei".)

Na época, a Holanda estava a lutar para sair do domínio  espanhol, a razão pela qual  muito provavelmente os sefarditas (e nomedamente os de origem espanhola) abandonaram a designação 'espanhola'.

Muitos dos recém-chegados eram descendentes de judeus que haviam sido batizados à força. Eles eram conhecidos como “marranos” ou “conversos”. Os sefarditas usavam o português para a sua conversação do dia-a-dia, enquanto o espanhol (estamos no séc. XVII)  era usado para publicações científicas, prosa e poesia. 

Inicialmente, os rabinos permitiram o uso do português no culto para facilitar o retorno. à sinagoga, dos "cristãos novos". Quando a maioria dos membros aprendeu o hebraico, o culto foi novamente realizado inteiramente em hebraico. Até hoje os anúncios sobre assuntos profanos são feitos em português.

Rabinos e Hazanim foram inicialmente trazidos da Itália e, às vezes, de Salónica (então parte do império otomano) e Marrocos. 

Mais tarde Amesterdão tornou-se um centro de aprendizagem, e estudos judaicos. Yesiba Ets Haim (escola "Árvore da Vida") foi fundada e logo adquiriu uma extensa biblioteca. A Ets Haim-Livraria Montezinos existe até hoje e é uma das mais importantes bibliotecas judaicas do mundo. Um dos bibliotecários foi David Montezinos (1828-1916) que doou a sua já de si valiossíma biblioteca particular à comunidade, com a condição de que estivesse aberta ao público duas vezes por semana. Sucedeu-lhe Jacob da Silva Rosa (1886-1943) que, infelizmente, iria morrer num campo de concentração. A biblioteca foi levada em 1943 pelos nazis para a Alemanha para guarnecer o "Alfred Rosenberg Institut zur Erforchung der Judenfrage", em Frankurt. As tropas americanas acabaram por resgatar a biblioteca Ets Haim em Offenbach e devolvê-la à comunidade judaico-portuguesa de Amsterdão.

Durante séculos, Amesterdão foi o centro do mundo sefardita ocidental, gerando muitos rabinos, cientistas, filósofos, artistas, comerciantes e banqueiros, que fizeram uma enorme contribuição para a prosperidade da Holanda a partir do Século de Ouro.

Essa proeminência e riqueza encontraram a sua expressão máxima na Esnoga, também conhecido como Snoge, no coração do antigo bairro judeu. ("Esnoga", é um termo arcaico, corruptela de sinagoga, tempo ou assembleia de judeus).

Até hoje, a Esnoga está no coração desta comunidade. A Esnoga, juntamente com a Antiga-Nova Sinagoga em Praga, é a sinagoga em funcionamento mais antiga do mundo.

A construção foi iniciada em 1671 no que era, na altura,  a periferia da cidade. Foi construída em estilo classicista, popular entre a elite da cidade. A sinagoga foi projetada por Elias Boumanque também construiu a Casa De Pinto,  na vizinha Sint Antoniebreestraat.

A comunidade portuguesa inspirou a fundação de comunidades semelhantes em Nova Amesterdão (atual Nova York), Londres e Curaçao. Isso pode ser visto claramente na sinagoga Mikvé Israel-Emanuel em Willemstad, cujo interior é quase uma cópia exata da Esnoga.

Até à Segunda Guerra Mundial existiam também comunidades portuguesas em Den Haag, Naarden, Roterdão e Middelburg.

A perseguição aos judeus naquela época sombria, da ocupação nazi, foi um duro golpe para a comunidade: 3.700 dos 4.300 judeus portugueses (mais de 85%) pereceram. 

No entanto, em 9 de maio de 1945, quatro dias após a libertação da Holanda, os serviços foram retomados na Esnoga, como pode ser visto claramente numa famosa fotografia tirada por Boris Kowadlo. Mostra o parnassino,  o diretor da sinagoga, carregando um rolo de Tora, quase como se nada tivesse acontecido. A Esnoga e seus objetos cerimoniais permaneceram intocados. (Vd. foto à esquerda: reabertura ao cuto da "Esnoga", em 9 de maio de 1945, foto de Boris Kowadlo, cortesia de https://www.esnoga.com/en/history-of-the-community/

Os sobreviventes e seus descendentes trabalharam duramente para reconstruir a comunidade. Hoje, o seu número está a crescer, embora lentamente. Cerca de 250 famílias estão inscritas na comunidade e há cerca de 630 membros.

Os valiosos bens da comunidade, o magnífico edifício, os riquíssimos objetos cerimoniais e a biblioteca Ets Haim-Livraria Montezinos, foram transferidos para uma fundação separada, chamada CEPIG, em 2003. Isso facilitou a arrecadação de fundos e a obtenção de subsídios para a restauração e a manutenção da sinagoga e dos bens da comunidade. Desde janeiro de 2009, o CEPIG é administrado e operado pelo Museu Histórico Judaico, permitindo que a comunidade se concentre nas suas tarefas religiosas e sociais.

Sobre alguns líderes históricos da comunidade, vd. aqui:

(i) Menasseh Ben Israel (1604-1657), também conhecido como Manoel Dias Soeiro, nasceu em 1604 na ilha da Madeira. A família refugiou-se em Amesterdão em 1610. Fundou a primeira tipografia hebraica de Amsterdão. Convivia com a elite cultural da cidade. (...)

(ii) Jacob ben Aaron Sasportas (1610-1698): nasceu em 1610 em Oran (que hoje faz parte da Argélia). Chegou a Amesterdão em 1646...Foi rabi, diplomata, fez oponente do falso Messias (Shabtai Tzvi) (...)

(iii) Irmãos De Pinto:

Isaac, Aron e Jacob nasceram no séc. XVIII, no seio de uma das famílias mais ricas, de comerciantes e banqueiros, de origem judaico-portuguesa. O pai, David de Pinto, figurava na lista dos dez mais ricos portugueses de Amesterdão. A família possuia uma casa senhorial nas margens do rio Amstel, Tulpenburg, e outra em Sint Antoniesbreestraat, conhecida com a Casa De Pinto, desenhada pelo mesmo arquitecto da Esnoga.

Até 1760, os três irmãos alternaram no papel de líderes da comunidade. Jacob de Pinto foi também um conhecido filósofo das Luzes, tendo-se correspondido com Diderot e entrado em polémica com Voltaire (na defesa dos judeus pobres expulsos de Bordéus). (...)

(iv) Samuel Sarphati (1813-1866)

Nasceu no seio de uma família de comerciantes de tabaco. Frequentou a escola médica de Leiden. Doutorou-se em 1839. Estabeleceu-se em Amesterdão como médico de clínica geral. Em contacto com os graves problemas de saúde do emergente proletariado industrial , desenvolveu uma série de projetos que contribuiram em muito para a melhoria da saúde pública e o planeamento urbano de Amesterdão (...)


(v) Num foto dos líderes da comunidade, em 1925, por ocasião do 250º aniversário da Esnoga, podem ver-se 8 personalidades, todas com apelidos bem portugueses

  • A. J. Mendes da Costa (secretário);
  • N. de Beneditty;
  • Dr. E.H. Vaz Nunes;
  • M. Rodrigues de Miranda;
  • M. Álvares Vega;
  • M. Vaz Dias;
  • J. Milhado; e
  • M. Cortissos 

(Fonte:  Judith C. E. Belinfante et al. - The Esnoga: a monument to Portuguese-Jewish culture. Amsterdam, D'Arts, 1991, il, pág. 61). (Capa à direita)

2. Informação adicional sobre a Esnoga (***)

Fica situada próxima do centro histórico de Amesterdão, em frente ao Museu da História Judaica. Endereço: Mr. Visserplein 3, 1011 RD Amsterdam. Horário: segunda e quarta-feira, das 10h00 às 15h00; sexta-feira. das 10h00 às 13h00.
 
O imponente edifício escapou milagrosamente à destruição pelos nazis (a maioria das sinagogas alemãs foram incendiadas). Diz-se que o regime nazi queria fazer naquele local o museu da "raça judaica",  cuja extinção estava planeada com o  Holocausto ou Solução Final...

Em finais do séc. XVI, haveria apenas uma  centena de portugueses em Amesterdão. Em 1610 seriam perto de 200. Por volta de 1725 seriam já 2 500Os sefarditas, os judeus ibéricos,  em breve se tornariam uma minoria, com o afluxo de judeus dos territórios da Europa de Leste (os chamados asquenazes), mais numerosos mas normalmente mais pobres. Os portugueses eram considerados gente culta e bem sucedida, com  dinheiro e influência política. Ainda hoje, os nomes de família portugueses na Holanda   detêm um aura de prestígio.

 A comunidade judaica portuguesa produziu muitas figuras de renome nacional e internacional, como rabinos, escritores, filósofos, banqueiros, médicos, comerciantes, empresários, tais como  Gracia NasiIsaac de PintoDavid RicardoMenasseh ben IsraelIsaac Aboab da FonsecaUriel AcostaBaruch de Espinoza, etc. (****)

[Seleção / Adaptação / Revisão e fixação de texto / Negritos / Notas / Subítulos: LG]
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Notas do editor:

(*) Adaptação de Portugees-Israëlietische Gemeente - Amsterdam (https://www.esnoga.com/en/



(**) Sobre Antuérpia > Wikipedia (excerto):

(...) "Quando os portugueses abriram a rota marítima para a Índia, Antuérpia se tornou um centro de comércio ainda mais proeminente, porque o rei de Portugal para lá enviava quase tudo que chegava a Lisboa, vindo da Ásia; as corporações da cidade compravam carregamentos inteiros que daí seguiam para o resto do mundo ofuscando o brilho comercial de Veneza. Transferiram dessa forma a feitoria que na Idade Média mantinham em Bruges. Este facto revelou-se da maior importância para a cidade.

"Com os portugueses, instalou-se igualmente forte colónia mercantil espanhola, passando os negócios das coroas ibéricas a fazer-se maioritariamente por aqui. Assim, ao longo do século XVI, Antuérpia tornou-se um centro da 'economia do mundo'. O volume de negócios financeiros era de tal monta que em 1519 a sucursal alemã, a empresa Fugger, emprestou mais de meio milhão de florins de ouro a Carlos V para patrocinar sua campanha a Imperador do Sacro Império Romano Germânico.

"A prosperidade desta cidade prosseguiu ao longo desse século, atraindo assim inúmeros judeus, expulsos de Portugal, - na sequência da implementação de política antissemita desencadeada pelo governo português, - que buscavam nessa cidade livre grandes oportunidades de enriquecimento. Essa comunidade de exímios mercadores e artesãos enriqueceu o negócio da indústria dos diamantes e, consequentemente, a própria cidade, que passou a contar com a colaboração de artífices especializados no trato comercial.

"Para além de ser um centro económico, Antuérpia era igualmente centro cultural e intelectual. Por exemplo, ali nasceu em 1599 o pintor Anthony van Dyck. No entanto, a sua pujança foi irremediavelmente abalada por problemas religiosos depois de 1567, data em que tropas espanholas saquearam a cidade. Antuérpia foi de novo atacada em 1584, sendo, dessa feita, forçada a render-se aos espanhóis em 1585.

No século XVII, mais precisamente em 1648, foi mais uma vez lesada na sequência da Guerra dos Trinta Anos. Em questão estava o Tratado de Paz de Vestefália, que determinou o encerramento do rio Escalda à navegação, o qual foi reaberto somente em 1795 
pelos franceses" (...)

(***) Vd. Wikipedia > Sinagoga Portuguesa de Amesterdão
 
(****) Último poste da série > 14 de janeiro de 2023 > Guiné 61/74 - P23980: Memória dos lugares (447): Poortugaal, antigo município de origem portuguesa, nos arredores de Roterdão (Valdemar Queiroz)