quarta-feira, 21 de julho de 2021

Guiné 61/74 - P22393: As (des)venturas da CART 6552/72, desviada para o sul da Guiné, em maio de 1973 - Parte I: Entrei no avião, em Figo Maduro, a chorar de revolta (Manuel Domingos Ribeiro, ex-fur mil, grã-tabanqueiro nº 844)


Guiné > Região de Tombali > Cameconde > CART 6552/72 (1973/74) > O Manuel Ribeiro com um pequeno "jacaré", apanhado na bolanha de Cassomo (, em rigor, trata-se de um crocodilo juvenil, já que não há jacarés na Guiné, nem em toda a África, apenas no Novo Mundo e na China).


Guiné > Região de Tombali > Cameconde > CART 6552/72 (1973/74) >  O quartel de Cameconde, em 1973


Guiné > Região de Tombali > Cameconde > CART 6552/72 (1973/74) > O Manuel Ribeiro, junto ao bar, num momento de descontração.


Fotos (e legendas): © Manuel Domingos Ribeiro  (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de Manuel Domingos Ribeiro (ex-fur mil at art, MA, CART 6552/72, Cameconde e Cabedú, 1973/74):

Date: terça, 20/07/2021 à(s) 17:00
Subject:  As (des)venturas da CART 6552/72

Boa tarde Luís,

Falando um pouco sobre o desvio da CART 6552/72,  de S. Tomé para a Guiné, quando se encontrava a aguardar embarque na carreira na de tiro de Espinho, embarque que já tinha sido adiado duas vezes, eu que me encontrava em casa de licença fui convocado por telegrama para me apresentar na unidade para seguir de imediato para o ultramar, mas não mencionava o destino final-

Apresentei-me a uma sexta feira ao fim da tarde e tive de imediato fazer o espólio de algum fardamento para de seguida o pagar pois,  como te deves de lembrar,  recebíamos um valor monetário para compra de todo o fardamento e demais artigos necessários ao serviço militar, artigos esses que foram comprados no casão militar em Bissau.

Como me apresentei à última da hora só levei a farda que tinha vestida,  algum fardamento que tinha no quartel e uma muda de roupa que transportava numa pequena mala de mão, foi nessa altura que nos foi comunicado que tínhamos sido desviados para a Guiné pelo nosso Comandante de companhia e encarregues de comunicar aos nossos militares e por pelotão o nosso destino.

Nós, os graduados,  ainda ponderámos não embarcar, alguns ainda se deslocaram ao Porto já ao princípio da noite para falar com familiares e pedir algum conselho. Fomos aconselhados a embarcar pois as consequências seriam de certeza graves-

Depois de todos regressarem,  reunimo-nos já ao principio da madrugada, explicámos a nossa situação e informámos que partiríamos ao início da madrugada em autocarros, com destino à Base Aérea de Figo Maduro, em Lisboa,  onde embarcaríamos ao princípio da manhã de sábado. 

Na altura de embarque surgiu alguma resistência por parte alguns soldados e graduados em embarcar por não nos terem alterado a nossa mobilização e não nos terem explicado por que razão estávamos a ser deslocados para a Guiné. Alguns elementos foram isolados da restante companhia e postos à guarda da policia aérea responsável pela segurança do aeroporto, foram confrontados por elementos civis e militares se não iam  embarcar e as consequências de uma resposta negativa... Responderam, por fim,  que embarcavam e seguiram para a pista, saindo o avião com cerca de uma hora de atraso.

Lembro-me de ver alguns familiares no aeroporto militar mas da parte de fora da rede, de ter entrado no avião a chorar de revolta por não nos terem dito a razão da nossa ida para a Guiné, da nossa chegada que foi cerca do meio dia,  hora de muito calor, da saída do avião, o cheiro característico a que depois me habituei, o embarque quase de imediato em viaturas militares com destino ao Cumeré.

Entretanto fomos colhendo alguma informação e ficámos a saber que as coisa não estavam fáceis tanto a Norte como a Sul, ficámos a saber que um aquartelamento no Sul, Guileje,  tinha sido abandonado dias antes, fomos para o Cumeré e logo nos dois dias seguintes chegaram mais duas companhias de cavalaria,  também desviadas de Angola para a Guiné. 

Fizemos uma IAO de forma acelarada e logo na primeira semana de Junho partimos de LDG junto com uma companhia de paraquedista com destino a Cacine. Eu não segui nessa LDG pois fui encarregue de comandar uma secção para fazer segurança de um batelão que transportava combustiveis para a nossa companhia, não foi uma viagem fácil pois, quando cheguei no outro dia a Cacine, ao tirar a camisa a pele saía junto:  toda a viagem fora feita ao sol por não existir proteção para todos, 

Junto connosco também viajava uma secção de fuzileiros que tambem tinham a missão de fazer segurança ao batelão.

Dois dias depois chega a Cacine uma das companhias de cavalaria que tinha sido desviada de Angola junto com mais uma companhia de paraquedistas, sabendo depois que a outra companhia também desviada de Angola tinha sido enviada para o Norte, pois Guidaje continuava ferro e fogo.

Em Cacine era o caos com tantos militares concentrados no mesmo local, houve uma reunião de comandos em Cacine e foi dado a escolher ao nosso capitão, por ser o mais velho, o local para sermos colocados:  Gadamael Porto ou Cameconde. O nosso capitão escolheu  Cameconde para aí rendermos um grupo de combate da  CCAÇ 3520 mais um grupo de combate da companhia de milícia da tabanca Nova que ficava entre Cacine e Cameconde.

Como Cameconde não tinha capacidade para alojar uma companhia inteira,  um grupo de combate ficou em Cacine para apoio e segurança às colunas de reabastecimento ao pessoal de Cameconde, e a partir daí começou a nossa aventura por terras do Sul da Guiné.

Cameconde era o aquartelamento mais a sul na Guiné, mesmo junto à fronteira e ao Quitafine que era considerado pelo PAIGC como área libertada.

Junto algumas fotos, uma com vista parcial de Cameconde, outra tirada junto de um abrigo com um pequeno jacaré capturado na bolanha de Cassomo e outra tirada junto do bar num momento de descontração.   

Guiné 61/74 - P22392: Historiografia da presença portuguesa em África (272): O pensamento colonial dos fundadores da Sociedade de Geografia de Lisboa (9) (Mário Beja Santos)

Sociedade de Geografia de Lisboa > Pormenor da Sala Portugal no decurso de uma exposição


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 23 de Novembro de 2020:

Queridos amigos,
Não foi ao acaso que aqui se traz à colação um relato apresentado pela geógrafa Suzanne Daveau referente à expedição científica à Serra da Estrela organizada pela Sociedade de Geografia de Lisboa em agosto de 1981, ela não deixa de referir que a Sociedade, fundada em 10 de novembro de 1875, tinha por finalidade "promover e auxiliar o estudo e progresso das ciências geográficas e afins em território português". Acontece que a finalidade acabou por ser praticamente direcionada para as explorações africanas e a geógrafa deplora que a Sociedade continuava a maltratar os propósitos iniciais, quanto ao território português. E daí passamos para 1900, dentro em breve este período que envolve epopeias de ocupação e pacificação deixará de ser tratado em atas de sessões, elas vão desaparecer com a morte de Luciano Cordeiro e vamos nos próximos textos apresentar o relato dos últimos acontecimentos de 1900, fazendo a súmula de alguma da bibliografia existente sobre este período.

Um abraço do
Mário


O pensamento colonial dos fundadores da Sociedade de Geografia de Lisboa (9)

Mário Beja Santos

Não se pode perder de vista que na génese fundacional da Sociedade de Geografia se cruzam o entusiasmo emergente pelos conhecimentos geográficos dentro do país e na abordagem recente do III Império, a África que se está a descobrir, a ocupar, a pôr administração e a constituir negócios. Volta-se atrás exatamente porque se encontrou um texto de Suzanne Daveau, eminente geógrafa, casada com aquele que é considerada a figura proeminente da Geografia em Portugal no século XX, Orlando Ribeiro. Ela revelou num artigo o que foi a expedição científica à Serra da Estrela organizada pela Sociedade de Geografia de Lisboa, em agosto de 1881. Saem de Lisboa 42 membros, vão de comboio, foram aclamados por numerosa assistência, está lá o Presidente do Conselho de Ministros. Passam por Coimbra e a Mealhada e no dia seguinte tomam o comboio da linha da Beira Alta, vão até Celorico da Beira. Almoçaram em Santa Comba e quando chegaram a Carregal do Sal foram saudados por alguns dos cavalheiros e os artistas da Filarmónica da terra. Celorico a expedição toma a estrada para a Guarda. Vão fazer o resto do trajeto a cavalo, no dia 4, com almoço em Manteigas e chegam pelas dez da noite ao lugar do acampamento, no planalto superior da Serra da Estrela, a 1850 metros de altitude. De que trata a expedição?

Vão-se dedicar a observações científicas variadas, estão sempre a ser visitados por um arraial de pessoas. Os expedicionários são geralmente lentes de diversas escolas, oficiais superiores do Exército, há até mesmo clínicos distintíssimos. E fica-se a saber que a expedição foi muito dispendiosa, talvez a razão principal por que não se voltou a repetir.

Recorda a geógrafa a tal finalidade da Sociedade de Geografia, “promover e auxiliar o estudo e progresso das ciências geográficas e afins em território português”. A Direção da Sociedade, numa representação ao rei D. Luís, declarou: “Entre os graves problemas que as Ciências Geográficas e a economia comercial têm modernamente posto a caminho da civilizadora e humanitária solução […] avulta, Senhor, a exploração científica, o estudo geográfico na sua mais lata aplicação do grande sertão africano”. A representação da Sociedade junto do monarca destinava-se a apoiar o projeto da Expedição Portuguesa ao Interior da África Austral, expedição que será efetivamente levada a cabo de 1877 a 1879, por Serpa Pinto, Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens.

Voltemos à Serra da Estrela. Tudo começara com a iniciativa de Marrecas Ferreira, Capitão de Engenharia e professor da Escola do Exército, proposta que foi apresentada em 5 de julho de 1880 por Luciano Cordeiro. Mas como explicar que a Sociedade de Geografia tenha excecionalmente tomado interesse e gasto um ror de dinheiro numa expedição de índole caseira?

Pretendia-se com esta expedição científica conhecer a geologia, a fauna e a flora da região, o seu relevo orográfico, formação das torrentes e sua influência nos vales adjacentes, particularmente sobre os do Mondego e Zêzere; possibilidade e vantagens do estabelecimento de um posto meteorológico; sondagens das lagoas, temperatura e densidade das suas águas; riqueza mineralógica e potencialidades da sua exploração; por fim, encontrar vestígios arqueológicos e conhecer as tradições locais. Saber-se-á mais tarde que um dos promotores da expedição foi Sousa Martins, tinha concebido o projeto de montar na Serra da Estrela sanatórios para os tísicos portugueses. Nos preparativos da expedição organizaram-se doze secções científicas, cada uma com o seu programa de trabalho. A expedição foi inconclusiva, Suzanne Daveau refere apreciações críticas duras de que a Sociedade de Geografia ignorara praticamente os temas da Geografia Portuguesa, e diz-se mesmo que o Boletim da Sociedade de Geografia se ocupava primordialmente da História e descrição das colónias portuguesas. Os geógrafos queixavam-se da longa demora em serem aceites como sócios da Sociedade de Geografia. E voltemos ao virar do século XIX. Curiosamente logo em 8 de janeiro de 1900, é pedida a revisão das matérias e conteúdos de Geografia Colonial. Em fevereiro, a Comissão Americana propõe a celebração do Centenário do Descobrimento da América do Sul, prestando-se assim homenagem a Pedro Álvares Cabral. E um sócio propõe uma visita à Igreja da Graça, em Santarém, seria assim uma respeitosa homenagem aos restos de Pedro Álvares Cabral.

O Conselheiro Ferreira do Amaral é reeleito na presidência, o Banco Nacional Ultramarino apoia a participação portuguesa à Grande Exposição de Antuérpia, tida como a mais brilhante e notável representação colonial portuguesa que se tem apresentado em exposições internacionais. Aliás, como vem em várias atas das sessões, passa a ser intensa a participação da Sociedade em encontros internacionais. Retira-se da ata de 5 de março as razões do louvor ao Major Sousa Machado, através do requerimento do Sr. Domingos de Oliveira, que tem o seguinte teor:
“Senhores e Consócios. A vossa Direção considerando os relevantes serviços prestados ao país e à civilização pela intrépida exposição militar organizada em Moçambique, e cometida à inteligente e patriótica direção do ilustre oficial do nosso Exército, o Major Manuel de Sousa Machado, seu comandante;
Considerando quanto representa de esforço e decidida coragem, conduzir uma coluna de soldados europeus, auxiliares e carregadores, muitas léguas pelos adustos sertões africanos que circundam Quelimane, e se prolongam pelo alto Ruo, margens de Chirua até à lagoa Chiuta, e depois pelo vale de Lujenda em direção ao Muembe, quartel principal do destemido e poderoso Mataca, rebelde e revoltado;
Considerando quanto era importante o prestígio do nome português, abatido naquelas paragens pelo desastre que vitimou ali o tenente Valadim, que infligíssemos severo castigo àquele tão audacioso régulo, contra o qual o governo inglês nos fazia sucessivas reclamações em virtude das suas incessantes razias;
Considerando que um tal facto, realizado por forma tão brilhante, deve ser-nos de legítimo orgulho e incentivo, quando notamos outros mais poderosos deterem-se ante dificuldades iguais às que a expedição venceu; o que é para nós prova, aliás desnecessário, de que ainda não se apagou nos portugueses, nem o fogo, nem o génio, nem o valor daqueles que foram dilatando a fé e o Império por terras de além-mar;
Considerando ainda que foi devido à habilidade verdadeiramente tenaz do Major Sousa Machado, auxiliado por todos os seus companheiros de armas, que o País, o Exército e o seu bravo Regimento 5 de Infantaria, puderam inscrever no seu livro de ouro, mais este assinalado feito das armas portuguesas, digno do galardão de todos nós;
E tendo em atenção que os altos poderes do Estado concederam ao nosso prezado consórcio e brioso Major Machado o mais ambicioso prémio que pode ornar a farda do soldado português, o fulvo cordão da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito; a Sociedade de Geografia, sempre pronta a devidamente considerar os patrióticos e relevantes serviços dos seus consócios, prestados na causa colonial, concede ao seu sócio o Major Manuel de Sousa Machado a mais elevada distinção que a sua lei orgânica lhe permite usar”
.

E o Major Sousa Machado passou a ser sócio honorário sem que o Sr. Renato Batista tivesse referido a nota de serviços do Major Sousa Machado, falando da região dos lagos da África Central, é uma narrativa histórica muitíssimo curiosa para culminar no desempenho brilhante de Sousa Machado.

Nesta mesma sessão é apresentada uma proposta para a ereção dos Jerónimos como Panteão Nacional. E como veremos adiante, em 5 de maio realiza-se uma sessão solene comemorativa do Centenário do Brasil, preside o rei D. Carlos.

(continua)

Imagem da Serra da Estrela
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Nota do editor

Último poste da série de 14 DE JULHO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22371: Historiografia da presença portuguesa em África (271): O pensamento colonial dos fundadores da Sociedade de Geografia de Lisboa (8) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P22391: Agenda cultural (776): RTP Play, "A Herança de Aristides", documentário francês de 52 mm, que passou na RTP1, em 19 de julho, no aniversário do nascimento do "Consul de Bordéus", Aristides de Sousa Mendes (1885 -1954) + exposição na Fortaleza de Peniche, a decorrer até ao fim de outubro: "Candelabro ASM. Aristides de Sousa Mendes: o exílio pela vida".




Peniche > Fortaleza de Peniche > Museu Nacional da Resistência e Liberdade > 13 de julho de 2021  > Cartaz anunciando a exposição "CANDELABRO ASM. Aristides de Sousa Mendes: o exílio pela vida". De 27 de abril a 31 de outubro de 2021. Aberto, de quarta feira a domingo. Entrada livre. 

(...) O Museu Nacional Resistência e Liberdade, na Fortaleza de Peniche, celebra o dia 25 de Abril com homenagem de arte contemporânea a Aristides de Sousa Mendes.

Esta homenagem, no âmbito da programação cultural da Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia, tem a particularidade de unir pessoas e vontades de cinco países – Portugal, França, Alemanha, EUA e Canadá – em torno do justo reconhecimento de um resistente e de um herói.

A Vídeo-Escultura de Werner Klotz é a peça central da primeira exposição internacional do Museu. (...) 
 [Abrir aqui o guia educativo]


Fotos (e legendas): © Luís Graça (2021). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem enviada pelo Luís Graça ao João Crisóstomo, no passado dia 16:

João: Passámos pro Peniche, mas estava fechado, nesse dia, terça-feira, o Museu Nacional da Resistência e Liberdade... Mando-te duas fotos com o cartaz da exposição sobre o Aristides de Sousa Mendes. Lembrámo-nos de ti. E também rezámos por ti e pela Vilma na Ermida da Sra dos Remédios, que tu conheces. Vai lá o círio de A-dos-Cunhados, tua terra natal... Faltaste tu e a Vilma (ela iria gostar)...

Abraços da malta toda, Até para ano!... Luís

http://www.museunacionalresistencialiberdade-peniche.gov.pt/pt

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2021/07/guine-6174-p22374-tabanca-do-atira-te.html

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2021/07/guine-6174-p22373-tabanca-do-atira-te.html


2. Parte de uma extensa mensagem do João Crisóstomo, recebida ontem, dia 20,  às 3h58:

(...) Quando chegou o teu E mail a dizer que tinhamos sido lembrados na Ermida e depois ao passares pelo "Museu da Resistência e Liberdade" onde esperavas ver a Exposição sobre o nosso Aristides, disse para os meus botões que já que não podia estar com vocês, pelo menos tinha de vos enviar a todos um abraço e uma palavra de agradecimento. É sempre bom sabermos que mesmo longe não estamos sós. E isso aplica-se a todas as situações, incluido aqueles que por qualquer motivo não têm possibilidade de partilhar pessoalmente momentos assim.

(...) Esta manhã enviei um e mail a familiares e amigos de Aristides de Sousa Mendes mundo fora, juntando-me a eles na memória do aniversário do seu nascimento (19 de Julho de 1885). E de tarde, cerca das 8.30 PM de Lisboa, recebi uma chamada do Rui Chamusco, meu irmão em tudo o que estou envolvido recentemente, que me alertou para um programa que ia passar na televisão às 5.15 PM ( 10.15 PM em Portugal) .

Logo liguei a televisão para a RTP , único canal português que recebo em minha casa e fiquei contente que estivesse a dar o mesmo programa em Portugal e aqui nos US. Mas logo o desapontamento foi grande: na dita hora enquanto esse programa sobre Aristides começou a ser passado em Portugal, a emissão para os US continuou no programa de petiscos e cozinhados que estava a dar havia mais de meia hora…Por mim não consigo perceber !

Uma vez que se falava em Portugal sobre este nosso grande humanista, ele devia ser lembrado pela nossa RTP mundo fora também. Ao fim e ao cabo Aristides viveu e prestou serviço diplomático em muitos países onde chegam hoje os programas da nossa RTP : embora o nosso Aristides seja agora mundialmente conhecido pelo seu acto de coragem humanitário em França, antes disso ele tinha estado na Guiana Britânica; em Zanzibar, capital da então África Oriental Britânica , no Brasil (Curitiba, Maranhão e Porto Alegre); nos Estados Unidos, na Espanha e na Bélgica.

Era especialmente pertinente que esse programa fosse visto aqui nos Estados Unidos: importa não esquecer que,  depois do reconhecimento de Aristides de Sousa Mendes por Israel em 1966, logo seguido por uma cerimónia de entrega da medalha à família no Consulado israelita de Nova Iorque em outubro de 1967, Aristides voltou ao quase completo esquecimento, especialmente em Portugal. 

 Embora houvesse algumas isolada vozes de vez em quando a pedir alguma atenção, a posição era de ignorar e esquecer. Foi aqui e também no Canadá que a partir de 1986 Aristides de Sousa Mendes recomeçou a ser a reconhecido e homenageado. Foi-o, oficialmente, mesmo pelo Congresso Americano. E foi só depois de uma delegação de 69 Representantes do Congresso Americano, chefiada pelo luso-americano Tony Coelho, durante uma visita a Portugal ter pressionado o governo português a seguir o exemplo dos Estados Unidos, é que o nosso governo, não podendo mais resistir à pressão dos Estados Unidos, decidiu reconhecer, reabilitar e homenagear Aristides de Sousa Mendes.

Quando depois houve um "interregno longo" em que Aristides parecia voltar ao esquecimento, foi a partir de 1996 que o nome de Aristides começou de novo a ser badalado: foi nesta altura que tive conhecimento do grande trabalho de reconhecimento de Aristides a partir de França, dirigidos por Jacques Riviére e Manuel Dias com quem passei a estar em contacto frequente. E que o reconhecimento de Aristides nos Estados Unidos e mundo fora “recomeçou a sério”, facto de que, sem intenções nem presunções de autopromoção, sei que o meu papel também não foi insignificante.

Logo em Abril de 2000 a grande exposição “Visas for Life” abria nas Nações Unidas e Aristides era o “homenageado" especial : a abertura, feita a coincidir com o dia do aniversário da sua morte teve lugar na sala da Assembleia Geral da ONU em que o Nobel da Paz Elie Viesel foi o orador principal; e logo os acontecimentos de memória e reconhecimento não pararam mais, lembrado todos os anos, várias vezes por ano ; e em 2004, no 50º aniversario da sua morte, nascia o projecto “Dia da consciência” , celebrado nesse ano com acontecimentos simultâneos em 21 países.

Em 2010 nascia a “Sousa Mendes Foundation US” sob a direção da prof. Lissy Jarvik e de Olivia Mattis, e o trabalho magnificente que esta organização logo começou a desenvolver.

Paralelamente esforços para um reconhecimento maior e generalizado continuaram: no ano 2010, entre outros acontecimentos mundo fora, houve uma concelebração de quatro cardeais em Roma, evento largamente noticiado; e no mesmo ano era introduzida no Parlamento Canadiano uma moção de reconhecimento e apoio a uma proposta para designar 17 de junho como o “Dia da Consciência”. 

Estes esforços persistentes continuaram nos anos seguintes e culminaram com a declaração do Papa Francisco no dia 17 de junho de 2020 lembrando Aristides de Sousa Mendes e o Dia 17 de junho como “Dia da Consciência”.

Bom: desculpem este meu longo “discurso”; quando me ponho a falar por vezes não sou capaz de parar… mas , "o saber não ocupa lugar”!… e talvez alguns destes “pormenores”não sejam do conhecimento de todos ainda.
 
Quem sabe, de repente aparece uma situação em que alguém pode contribuir para que haja melhores prioridades na nossa RTP na emissão de programas para fora de Portugal; francamente é frustrante ver dar prioridade a comentários ou ensinos de cozinha sobre lembrar o nosso grande humanista Aristides de Sousa Mendes no dia do aniversário do seu nascimento.

Um grande abraço a todos,

João Crisóstomo, Nova Iorque

3. Resposta do editor LG, ontem, às 12h49;

João, bom dia...Tens aqui o programa que deu ontem na RTP, "A Herança de Aristides"... Está já disponível da RTP Play... Tens mais de 150 mil filmes, vídeos, etc. na RTP Play!!!!... 

Ainda não vi, a Alice viu e gostou muito...Carrega aqui no link:

https://www.rtp.pt/play/p9092/a-heranca-de-aristides

Depois falamos, tenho que ir para Lisboa, para fazer exames...Ab, Luis

PS - Sobre o programa: documentário da televisão francesa, de 2020, com a duração de 52 m,  "A Herança de Aristides", RTP1, 19 de julho de 2021.

Sinopse: O legado deixado por Aristides de Sousa Mendes... Todos conhecemos a história da lista de Schindler, mas será que conhecemos a ação excepcional do português Aristides de Sousa Mendes que, em junho de 1940, em Bordéus, salvou dezenas de milhares de judeus e não judeus com a emissão de vistos para Portugal?

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Nota do editor;

Último poste da série > 10 de julho de 2021 > Guiné 61/74 - P22356: Agenda cultural (775): "No mato ninguém morre em versão John Wayne: Guiné, o Vietname português" (Livros Horizonte, Lisboa, 2021, 192 pp.): livro de Jorge Monteiro Alves, jornalista e repórter de guerra... Uma biografia não autorizada de Marcelino da Mata, o último herói do império.

terça-feira, 20 de julho de 2021

Guiné 61/74 - P22390: "Lendas e contos da Guiné-Bissau": Um projeto literário, lusófono e solidário (Carlos Fortunato, presidente da ONGD Ajuda Amiga) - Parte III: Lendas bijagós





Lendas bijagós - ilustrações do pintor guineense Ady Pires Baldé, p´p. 17 e 19

In: Lendas e contos da Guiné-Bissau / J. Carlos M. Fortunato ; il. Augusto Trigo... [et al.]. - 1ª ed. - [S.l.] : Ajuda Amiga : MIL Movimento Internacional Lusófono : DG Edições, 2017. - 102 p. : il. ; 24 cm. - ISBN 978-989-8661-68-5



1. Transcrição das págs. 15 a 22 do livro "Lendas e contos da Guiné-Bissau", com a devida autorização do autor (*)


J. Carlos M. Fortunato  > Lendas e contos 
da Guiné-Bissau

[Foto à esquerda: o autor, Carlos Fortunato, foi fur mil arm pes inf, MA, CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71, é o presidente da direcção da ONGD Ajuda Amiga]



Lendas bijagós (pp. 15-22)


Segundo uma das mais populares lendas bijagós, Deus ao criar o Mundo criou primeiro a ilha de Orango, e depois colocou ali uma mulher,  Acapacama, e o seu marido.

Eles tiveram quatro filhas. A primeira foi Orácuma, a seguir nasceu Ominca, e depois Ogubané e Orága.

Cada uma delas teve vários filhos, dando origem a quatro grandes famílias, às quais foram transmitidos os privilégios da avó. Orácuma recebeu a terra e a religião. Foi ela quem fabricou o primeiro Irã, e permitiu que as suas irmãs o reproduzissem.

Ominca recebeu o mar e a sua família dedicou-se à pesca. Contudo os hipopótamos eram muito ferozes, pelo que tiveram que fazer várias cerimónias, para conseguirem ir para o mar. Ogubané recebeu o poder de controlar o vento e a chuva, o que lhe permitiu gerar boas colheitas. rága recebeu as plantas, as árvores e os animais, o que lhe trouxe muita riqueza.

Cada família passou a viver à sua maneira.

Esta é a lenda (5) das gerações, e à semelhança de outras, explica a origens das quatro famílias a que pertencem todos os bijagós, mas mostra também o importante papel que a mulher desempenha no mundo bijagó.

As origens dos bijagós não são claras e existem muitas versões. Algumas são fantasiosas e sensacionalistas, chegando a colocá-los como tendo origem na Atlântida (6), mas provavelmente estes seriam escravos de beafadas que para ali fugiram (7).

O navegador, André Alvares d´Almeida, foi o primeiro a dar uma descrição das Ilhas Bijagós em 1594, e com base nos relatos dos seus habitantes, refere que antigamente não eram ilhas, pois faziam parte do continente, “parece que antigamente eram terra firme” (8), escreve Alvares d´Almeida, o que foi depois confirmada por investigações científicas (9).

Entre as mulheres bijagós que fizeram história, destaca-se a famosa “Rainha” Oquinca Pampa, ou Oquinca Pampa Kanjimpa (reinou de 1910-1930). Embora seja referida como Rainha, na verdade não existem rainhas entre os bijagós, Oquinca Pampa era uma sacerdotisa que ascendeu ao poder.

***

Oquinca não é um nome, mas uma palavra da língua bijagó, que significa sacerdotisa, é um título, do mesmo modo que Oronhom significa rei, mas na voz do povo, ela é a “Rainha” Oquinca Pampa.

Oquinca Pampa faz parte da linhagem Orága, e está ligada ao Reino de Orango.

Segundo os costumes bijagós, apenas os homens podem ser reis, mas quando morre o rei e enquanto não se realiza a sua sucessão para um homem, o reino pode ter uma mulher no seu lugar como regente, a Oquinca, sendo aconselhada pelo Conselho dos Grandes (10).

Na tradição dos Orága, esta regência pode ser prolongada, e pode ir até à morte da regente. Foi isto que aconteceu com Oquinca Pampa. Quando o Rei Issor, que era seu pai, faleceu, ela ficou como Regente do Reino.

A regência de Oquinca Pampa destaca-se pela sábia forma como soube governar, nomeadamente por ter conseguido manter intacto o seu Reino, por manter a paz, pelo seu espírito humanitário, e por ter conseguido manter a “independência” (11).

Num tempo, em que o poder colonial tudo queria submeter ao seu domínio, conseguir negociar uma governação independente desse poder, apenas contra o pagamento de um imposto, é também um reconhecimento do Governo da Colónia, à inteligente governação que Oquinca Pampa fazia.

A luta de Oquinca Pampa pela paz não foi fácil. Por um lado tinha a ameaça do poder colonial e a sua vontade de dominar totalmente o seuReino, e por outro lado muitos bijagós queriam revoltar-se, e desencadear uma guerra, pois não aceitavam pagar impostos.

Uma das situações de maior tensão que Oquinca Pampa enfrentou, foi quando um grupo (no qual se incluíam membros da sua família) se revoltou, decididos a enfrentar o exército colonial.

Os revoltosos fizeram uma vala de um quilómetro, ao longo da estrada do porto de Orango, para que ali escondidos e protegidos, pudessem emboscar as forças coloniais, quando estas desembarcassem. Mas Oquinca Pampa, com a sua influência, conseguiu acabar com a revolta.

A ilha de Canogo encontra-se separada de Orango apenas por um rio, equando os seus habitantes decidiram não pagar qualquer imposto, preparando-se para a guerra, Oquinca Pampa interveio mais uma vez, pagando o imposto de Canogo com o seu gado, evitando assim a guerra.

Interessante e original, foi o sistema de comunicações que Oquinca Pampa criou para comunicar com os comandantes dos barcos, que chegavam ao porto de Orango para negociar, colocando um homem de cinco em cinco metros, para através deles falar com o comandante do barco, de modo a assegurar que tudo decorria sem incidentes.

Ao contrário de seu pai, que era um rei cruel, Oquinca Pampa revelou-se uma rainha com um elevado espírito humanitário, acabando com práticas desumanas e com algumas situações de escravatura, que ainda existiam no seu Reino, restos de um passado em que os prisioneiros de guerra eram vendidos como escravos.

Oquinca Pampa, apesar de ser de pequena estatura, é considerada a grande “Rainha”, e é sem dúvida a mais popular, pois a memória da sua regência contínua viva entre os bijagós, que contam a sua história à volta da fogueira, e os artesãos bijagós continuam a fazer estátuas suas.
Os restos mortais de Oquinca Pampa estão no mausoléu real em Eticoga, na ilha de Orango, onde repousam outros reis e rainhas. Com ela foi enterrado o seu valioso tesouro, do qual fazem parte muitas peças em ouro, e que desde então ali repousam guardados pelos espíritos.
Quem tocar na porta do mausoléu terá que pagar uma vaca, se não o fizer, os espíritos irão persegui-lo, esteja onde estiver.

***

Outra “Rainha” famosa é a “Rainha” Juliana Canhabaque, do Reino de Canhabaque (ilha Roxa), devido à guerra ali havida em 1925.

Canhabaque  só pagava impostos quando lhe apetecia e pagava pouco, e isso levou ao desencadeamento de uma campanha militar pelo exército colonial. Após alguns preparativos, a 20 de Abril de 1925 uma força militar desembarcou em Inorei e Bine, para colocar definitivamente a ilha sob o seu domínio

Tratava-se de uma força militar numerosa com cinco oficiais, 240 sargentos e polícias nativos, e 1496 auxiliares na sua maioria fulas e mandingas (12), o seu armamento incluía 800 espingardas, três metralhadoras e três canhões hotchkiss.



Guiné-Bissau > 2002 > selo comemorativo do voo Lisboa - Bolama, realizado em 1925, por um avião Bréguet XIV A2, do 1º Grupo de Esquadrilhas de Aviação da República,  o GEAR, antecessor da FAP. A tripulação do "Santa Filomena" (, nome da aeronave,) era constituída pelo tenente Sérgio da Silva, pelo capitão Pinheiro Correia e pelo 1.º sargento António Manuel. Partindo do campo de aviação da Amadora, em 27 de março de 1925,  "Santa Filomena" chegou a Bolama em 2 de abril de 1925, depois de percorrer a distância de 4.070 km em 31 horas e 31 minutos de voo, em 7 etapas:  m 7 etapas: Amadora – Casablanca; Casablanca – Agadir; Agadir – Cabo Juby; Cabo Juby – Vila Cisneros; Vila Cisneros – S. Luís do Senegal; S. Luís do Senegal – Dakar e, finalmente, Dakar – Bolama. (**)

Imagem: Cortesia de Colnect.com


Aproveitando a presença de um avião militar, que tinha realizado pela primeira a viagem aérea Lisboa-Bolama, o governador Velez Caroço pediu 
que este bombardeasse os revoltosos.
Foi assim usado pela primeira vez um avião militar na Guiné. Tratou-se do Breguet XIV A2 do 1º Grupo de Esquadrilhas de Aviação da Republica (GEAR).

Apesar de o avião estar com problemas mecânicos, durante dois dias, foi desencadeado um bombardeamento, tendo sido lançadas manualmente granadas de artilharia, depois de adaptadas para o efeito.

Os guerreiros de Canhabaque ficaram surpreendidos com aquele ataque, pois nunca tinham visto um avião, nem conheciam o seu poder destruidor, mas a sua resposta à incursão militar não vacilou, e foi com determinação, que decidiram continuar a combater o invasor do seu Reino.

A “Rainha” Juliana possuía 2.000 guerreiros, que estavam armados com arcos, catanas, lanças e algumas espingardas longas. Alguns possuíam uma longa história de combates, o que fazia deles guerreiros experientes e ferozes.

A ilha de Canhabaque  [também conhecida por ilha Roxa] é pequena, tem nove por 15 quilómetros, o que era uma desvantagem, mas por outro lado tem uma vegetação cerrada e caminhos que apenas os guerreiros de Juliana conheciam bem; alguns eram caminhos estreitos e difíceis, e pouco adequados ao exército colonial, com as suas metralhadoras e canhões.

A “Rainha” Juliana organizou a sua defesa, colocando vigias no alto das árvores, criando zonas de emboscadas, com atiradores com longas nas árvores e construindo covas com tampas cobertas com ervas, para os guerreiros se esconderem e poderem atacar os invasores, quando estes menos esperassem.

Foi travada uma luta feroz com muitas baixas, nomeadamente da parte dos guerreiros da “Rainha” Juliana, mas as tabancas dos revoltosos foram sendo vencidas uma a uma.

A pequena ilha estava isolada nesta luta, não podia contar com reforços ou reabastecimentos.
A 3 de Maio de 1925, os últimos resistentes concentraram-se em Indema, no centro da ilha, e entre eles está a “Rainha” Juliana. Eram poucos para fazerem frente aos invasores e também eram poucas as munições que lhes restavam.
 
Os guerreiros de Canhabaque defenderam Indema enquanto puderam, mas acabaram por se render, pois não tinham meios para conseguirem fazer frente, a uma força militar tão poderosa.

Indema foi incendiada, e a “Rainha” Juliana presa e enviada para Bolama (13) mas não foi o fim da luta dos bijagós, pois em 1935 haveria uma nova revolta e seria necessária uma nova incursão militar.

No século XX o poder colonial deixou de ser algo fraco e vago, tornando- se numa força poderosa e determinada que impunha a sua vontade, foi um novo ciclo que se iniciou.


[Adaptação, revisão/fixação de texto e inserção de fotos e links para efeitos de edição deste poste no blogue: LG]
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Notas do autor:

(5) Lendas bijagós - pag. 34, Danielle Gallois Duquette, no seu livro Dynamique de L´art Bidjago, faz uma descrição desta e de outras lendas.

(6) Bijagós - pag. 145, “A babel negra”, de Landerset Simões.

(7) Bijagós - pag. 15, “Organização Económica e Social dos Bijagós”, de Augusto J. Santos Lima.
 
(8) Bijagós - pag. 81, “Tratado Breve dos Rios de Guiné do Cabo-Verde”, do capitão André Álvares d´Almeida.

(9) Bijagós - pag. 14, “Organização Económica e Social dos Bijagós”, de Augusto J. Santos Lima.

(10) Bijagós - pag. 77, “Organização Económica e Social dos Bijagós”, de Augusto J. Santos Lima.

(11) Oquinca Pampa - pag. 186, “História da Guiné II”, de René Pélissier.

(12) Juliana - pag. 212, “História da Guiné II”, de René Pélissier.

(13) Juliana - pag. 212, “História da Guiné II”, de René Pélissier.

2. Como ajudar a "Ajuda Amiga" ?

Caro/a leitor/a, podes ajudar a "Ajuda Amiga" (e mais concretamente o Projecto da Escola de Nhenque), fazendo uma transferência, em dinheiro, para a Conta da Ajuda Amiga:

NIB 0036 0133 99100025138 26

IBAN PT50 0036 0133 99100025138 26

BIC MPIOPTP


Para saber mais, vê aqui o sítio da ONGD Ajuda Amiga:

http://www.ajudaamiga.com

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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 10 de julho de  2021 > Guiné 61/74 - P22359: "Lendas e contos da Guiné-Bissau": Um projeto literário, lusófono e solidário (Carlos Fortunato, presidente da ONGD Ajuda Amiga) - Parte II A: Comentário adicional sobre os balantas: "Nhiri matmatuc Fortunato. Nhiri cá ubabe. Nhiri god mara santa cá cum boim. Udi assime?"...Traduzindo: "O meu nome é Fortunato. Eu sou branco, não sei falar bem balanta. Percebes o que estou a falar?"... Uma conversa com Kumba Yalá, em Bissorã, a dois dias da sua morte, aos 61 anos

Vd. postes anteriores:

9 de julho de 2021 > Guiné 61/74 - P22354: "Lendas e contos da Guiné-Bissau" : um projeto literário, lusófono e solidário (Carlos Fortunato, presidente da ONGD Ajuda Amiga) - Parte II: Ficha técnica, prefácio de Leopoldo Amado, lendas balantas (pp. 1-14)

8 de julho de 2021 > Guiné 61/74 - P22349: "Lendas e contos da Guiné-Bissau" : um projeto literário, lusófono e solidário (Carlos Fortunato, presidente da ONGD Ajuda Amiga) - Parte I: Vamos dar início a uma nova série, um mimo para os nossos leitores

(**)  Vd. postes de:

26 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18780: Historiografia da presença portuguesa em África (119): O primeiro voo, ligando Lisboa a Bolama, em 1925, e a primeira tentativa de usar a aviação com fins militares naquele território (Armando Tavares da Silva) (Parte I)

Guiné 61/74 - P22389: Consultório militar do José Martins (69): Ainda o Estatuto do Antigo Combatente


Porque a informação nunca é demasiada,  publicamos mais um trabalho do nosso camarada José Martins (ex-Fur Mil TRMS, CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), enviado ao Blogue ontem, dia 19 de Julho de 2021, dedicado ao Estatuto do Antigo Combatente.

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Nota do editor

Último poste da série de 17 DE JUNHO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22292: Consultório militar do José Martins (68): “Companhias de Caçadores Especiais” - Unidades de Infantaria criadas em 1959, que iriam ter como missão principal, a defesa das Províncias Ultramarinas - Parte II

segunda-feira, 19 de julho de 2021

Guiné 61/74 - P22388: Notas de leitura (1366): “História da Unidade - Batalhão de Caçadores 2845", em verso, por Albino Silva (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 19 de Julho de 2021:

Queridos amigos,
Os nossos poetas populares bem podiam um dia fazer uma jornada de convívio e contribuir para o levantamento destas peças que poderiam ajudar os investigadores do futuro a confirmar acontecimentos passados e bem referenciados pelo estro poético. Como é evidente, esta poesia não é isenta, são testemunhos com muitos abraços fraternos, ninguém comparece nos convívios com estas poesias pronto a fazer guerras pessoais. Acresce, como Albino Silva diz no seu livro, socorreu-se, para falar das companhias operacionais, da história da unidade, e como todos nós sabemos nem tudo ficou registado como exatamente aconteceu. Mas o que apraz neste momento realçar e que devíamos fazer um esforço a que haja um inventário dessa poesia popular da guerra da Guiné, uma verdadeira parente pobre, discreta e apagada da nossa atenção, que poderá vir a ter muita utilidade em novas gerações de historiógrafos.

Um abraço do
Mário


História do BCAÇ 2845 em verso

Mário Beja Santos

Ficará para as próximas gerações de investigadores a tentativa de apurar ou esboçar um inventário da história das unidades militares em verso, missão por ora inextrincável, sabe-se aqui e acolá da existência de poetas populares que procederam a tal registo. Guardo a melhor lembrança que tive quando descobri "Missão Cumprida", por António Alberto Santos Andrade, pertenceu ao BCAV 490, e que me catapultou para escrever "Nunca Digas Adeus às Armas".

Albino P. da Silva foi maqueiro, pertenceu à CCS do BCAÇ 2845, com sede em Canchungo (Teixeira Pinto) e com um conjunto de destacamentos envolvendo Bissorã, Olossato, Jolmete, Pelundo, Bachile e algo mais. Conta o seu itinerário que começou em Braga, esteve depois em Coimbra no Regimento de Serviço de Saúde, foi formar batalhão em Chaves no BCAÇ 10 e daqui partiram para Teixeira Pinto. Ficamos a saber que viveu em Angola, passou-lhe pela cabeça fugir, repensou e fez o serviço militar. Trabalha com quadras, e vê-se que não faz grande esforço para alcançar as rimas. Fora para Angola trabalhar, queria ser comerciante, assustou-se com o início da guerra, fugiu para França e lembrava-se daqueles sete soldados em Camabatela (Angola) que protegiam e guardavam a vila. Lembrava-se que esses sete soldados não tinham medo, e assim veio cumprir o serviço militar, chegam no princípio de maio de 1968 e partem imediatamente para Teixeira Pinto. Gosta de contar as suas brejeirices, o serviço de enfermaria abriu-lhe muitas portas para certas ternuras de ocasião. Aproveita para nos dizer que a CCS era composta por maqueiros e doutores, enfermeiros e eletricistas, mecânicos e condutores, sapadores e analistas, escriturários e cantineiros, cozinheiros e transmissões, SPM e padeiros. Seria incomum que não se queixasse da comida, mas não deixou de exultar as ostras e o camarão.

A sua poesia dirige-se inicialmente para a vivência da CCS, distribuição de muito mezinho, muita bajuda a consolar, dá-nos uma descrição de Teixeira Pinto, inevitavelmente o comércio de comes e bebes e em cada trecho de rapsódia deixa a sua marca de água, Albino Silva maqueiro da CCS. Lembranças não faltam, tanto das morteiradas como das batucadas, e põe a CCS num grande ecrã, de oficiais a praças, faziam as transmissões, os cozinheiros, os quarteleiros, o vagomestre, os mecânicos, não esquece os pintores nem o carcereiro, recorda todos com emoção.

Percebe-se que afina a sua mestria e a sua veia poética a propósito dos convívios, “tiramos fotografias/ alegres também cantamos/ prometemos uns aos outros/ que para o ano voltamos”. Destaca a enfermaria e maternidade em Teixeira Pinto, uma palavra muito especial para o médico, Maymone Martins, alvo de várias imagens. É certo e seguro que os convívios o estimularam a passar da CCS para as outras unidades, as operacionais, sabe exaltar quem mesmo na CCS tinha o corpo mais exposto, caso dos condutores e dos sapadores, manda um abraço ao sacristão militar que era um bom pregador e tudo quanto fazia era apenas por amor, sintetizando todos tinham um fraquinho pelas bajudas pacatas e que se não fosse a tropa também não haviam mulatas. Parece que Portugal inteiro esteve representado neste batalhão, ele vai elencando quem e como e a sua proveniência geográfica. E saudades da Guiné não lhe faltam, quando dela se fala na televisão sente sempre emoção e lança uma saudação e um pedido de cuidados: “O Governo agora é vosso / o território também é / por isso sois vós agora / a governar a Guiné. / Governai bem a nação / nós a malta não esquece / pois só queremos p’ra Guiné / o que de bom ela merece. / Nunca mais andei aos tiros / percam lá essa mania / combatam só os maldosos / que usam a cobardia”.

Chegou a vez de pôr em verso as companhias operacionais (CCAÇ 2366, CCAÇ 2367 e CCAÇ 2368). Agora sim, fala-se de valentia, armamento às costas, emboscadas, operações, citam-se os nomes, seguem-se os louvores, enumeram-se os efetivos, referem-se localidades como Olossato, Ponte de Maqué, Pelundo, Có, Jolmete, exaltam-se façanhas e bravuras. Não deixa de mencionar que houve recompletamentos das companhias, das milícias, das tabancas, o nome de todas as operações, deu-se ao cuidado de ler a história da unidade. E para todos chegou a hora do regresso. Fala de uma África que lhe atravessa o coração, de partilhas, de intensa camaradagem. “Sonhando contigo Guiné / creio ser bom e não mau / Assim se lembrarei sempre, da Guiné e de Bissau. / Guiné foi castigo / Guiné foi verdade / Guiné foi juventude / Guiné hoje saudade”. Agradece a ajuda que lhe deu o Comandante Aristides Monteiro, embora inicialmente tenha aparecido o Tenente-Coronel Martiniano, creio tratar-se do oficial-inquiridor que desceu de um helicóptero em Missirá, ele fora alvo de um processo de inquérito para se apurar como é que aquela mexeruca em duas grandes flagelações perdera 45 camas, centenas de lençóis e cobertores e fronhas, dezenas de pás e picaretas, correias de várias utilidades, até capacetes. Não houve para ali meias verdades, disse ao Sr. Coronel Martiniano que me tinham pedido da CCS para ali descrever nos relatórios das flagelações tudo quanto tinha desaparecido das arrecadações de Bambadinca e que o batalhão anterior descurara de dar baixa. O coronel riu-se e o inquérito foi arquivado. Aqui encontrei uma associação com as recordações poéticas do Albino Silva com o que a vida me ensinou a ser camarada de infortúnios de uma nova CCS, fi-lo com gosto, quem se interessaria em trazer cobertores fedorentos e arreios da I Guerra Mundial como recordações daqueles trópicos onde tudo apodrece?

E desejo ao Albino Silva que nos continue a dar conta de todos os seus convívios, já que a saudade é muita que também deseje melhor sorte à nossa querida Guiné.
Destacamento de Jolmete com a sua pista de aviação
Rua Principal de Olossato, fotografia da CCAÇ 2367 (1968-1970), com a devida vénia
Festa dos Manjacos em Bachile, do site Conversas ao Acaso, com a devida vénia
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Nota do editor

Último poste da série de 12 DE JULHO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22366: Notas de leitura (1365): “Oito Viagens, Uma Voz”, por Sérgio Matos Ferreira; Edições Vieira da Silva, Lisboa, 2018 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P22387: Blogoterapia (298): "Safety, first"?... Então eu não posso partilhar os meus "contactos pessoais" com aquele ou aqueles camaradas que deles precisam? (João Crisóstomo, Nova Iorque)


Fonte: Cortesia de Luso-Americano, 19 de janeiro de 2018


 1. Mensagem de  João Crisóstomo [Foto à direita: o nosso camarada e amigo luso-americano, natural de Torres Vedras, que, como ativista social, tem, dado a cara por muitas e boas  causas, como a da autodeterminação de Timor Leste, gravuras de Foz Coa, Aristides Sousa Mendes... Régulo da Tabanca da Diáspora Lusófona, foi alf mil, CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): vive desde 1975 em Nova Iorque; é casado, desde 2013, com a nossa amiga eslovena, Vilma Kracun]
 
Date: domingo, 4/07/2021 à(s) 12:00
Subject: contactos pessoais

Caro Luís Graça,

Às voltas, "visitando" pelo computador os nossos "camaradas da Guiné", fui dar com duas frases, comentários teu e do Valdemar Queirós. Dizes tu, a 6 de Abril deste ano, Post 22078,  em comentário a outro comentário do Valdemar que dizia  "Sem o computador que faz de livro, jornal de notícias, sala de cinema e teatro, troca de conversas com familiares, amigos e camaradas da Guiné, e sem poder sair de casa"... Etu respondeste: "se alguém quiser telefonar-lhe, que me peça o número: dá-lo-ei, com todo o gosto... Sabe tão bem ouvir uma voz amiga quando se está doente e sozinho, em casa!"... (*)

Em resposta, vou-te já telefonar para me dares o número dele. Para mim, mais do que uma simples "acção benfazeja" de estender a mão a quem quer dela necessita, é uma obrigação fazê-lo quando as circunstÂncias o permitem fazer. E mais razão ainda quando estes por qualquer motivo fazem parte do nosso círculo de amigos, como são todos aqueles a quem as mesmas experiências e vivências na Guiné e outros TO fizeram deles meus / nossos irmãos.

Para mim, pessoalmente , eu sinto que, apesar de todos os facebooks, blogues, twitters e tantos meios digitais, nada chega a uma chamada telefónica em que se ouve do outro lado da linha a voz de alguém, seja um familiar ou mesmo alguém que até nem se conhece, mas que naquele momento é o melhor amigo a dar um abraço tão preciso e apreciado em momentos de solidão e quem sabe de sofrimento físico e mental?

Puxa vida, Luís. Não haveria maneira de, sem prejuízo da privacidade de ninguém, podermos ter os contactos telefónicos daqueles camaradas que não se importam, e até gostariam, de receber uns telefonemas pessoais e directos , especialmente quando estão por qualquer razão confinados, "sem poder sair de casa"?

Por mim, já mais do que uma vez deixei os meus contactos, de email e telefónicos. Não hesites em os partilhar, pessoalmente ou mesmo no blogue se assim entenderes. Eu sei - várias vezes tenho sido avisado - que é preciso cuidado etc.,  etc.,  mas por outro também sei que de "amigos" eu não preciso de ter medos. 

E se alguém que não é amigo meu mas apenas "amigo da onça" quiser os meus contactos?… Hoje em dia é possível encontrá-los. Eu não sei encontrar contactos sem ser por meios directos e pessoais, mas por muitas experiências já vividas pessoalmente, verifico que os meus contactos foram parar a indivíduos que não são meus amigos nem o são de ninguém. E não são estes cuidados e precauções nossas que os impedem de obter as nossas informações e contactos pessoais.

Abraço grande,
João
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Nota do editor:

Guiné 61/74 - P22386: (Ex)citações (389): Caminheiro, peregrino, pagador de promessas...(Jaime Bonifácio Marques da Silva, ex-alf mil prqd, BCP 21, Angola, 1970/72)




Peniche > Santuário de Nossa Sra dos Remédios > Terreiro > 13 de julho de 2021 >  Jaime Silva e a mana Esmeralda Silva Costa, dois "pagadores de promessas"...

Fotos (e legendas): © Luís Graça (2021). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


I. Mensagem de 18 do corrente, enviado pelo Jaime Silva (ex-alf mil paraquedista, BCP 21, Angola, 1970/72, membro da nossa Tabanca Grande, nº 643, desde 31/1/2014, tendo já cerca de 7 dezenas de referências) (**):


Caro Luís, obrigado pela tua excelente reportagem e pela forma carinhosa como nos acompanhas com a tua Alice. Obugado também a todos os camaradas e amigos/as que se lembraram de mim, no dia do meu aniversário, e me felicitaram, por telemóvel, ou por escrito no blogue ou no Facebook  (*).

Gostaria de acrescentar dois pontos relacionados com a minha história “peregrina” (***):

1. Quando a minha mãe me diz, de uma foram convicta: - Tens de ir comigo a pé à Senhora do Remédios pagar a promessa que eu fiz.

Eu, ainda “meio cacimbado da cabeça” (e, tolo, claro!),  disparei:

– Então vá a mãe. Eu não prometi nada!

Devo ter lançado pela boca fora, ainda, mais alguns disparates alusivos à circunstância, a tal ponto que aminha irmã Esmeralda, perante a minha blasfémia, de pronto diz:

– Não faz mal, mãe, eu pago a promessa por ele e vou a pé consigo!

Mas, eu, perante a generosidade de minha irmã – Esmeralda–  disponibilizei-me logo para as acompanhar e disse:

- Eu também vou,  de carro e atrás de vocês, e levo o farnel para a viagem.

E assim foi!

Mas, duas décadas depois, a minha irmã diz-me:

–  Jaime, lembras-te da promessa que eu paguei por ti à Senhora dos Remédios? Eu tenho um problema: fiz uma promessa e tenho que ir a pé a Senhor Jesus do Carvalhal. Não encontro ninguém para ir comigo e para não ir sozinha, podias, agora, ir comigo?!

–  Claro, mana, já “estou no ir”!

E lá fomos. (****)

2. Quanto ao Santuário de Fátima, centro de peregrinação:

Os Paraquedistas, também organizam todos os anos a - Peregrinação Nacional dos Paraquedista a Fátima.

Esta Peregrinação foi iniciada há cerca de 15 anos, por um paraquedista de Leiria que esteve em Angola no BCP 21, o Fialho, também editor, na altura, da revista “ Os Paraquedistas”, entretanto desaparecida.

Há cerca de seis anos  coordenação da Peregrinação foi assumida pelo João Caldeira (Furriel miliciano que esteve em Moçambique no BCP 32, em Nacala).

A próxima Peregrinação Nacional dos Paraquedistas a Fátima será realizada a 25 de julho,  com as restrições impostas pela DGS e Direção do santuário de Fátima.

Abraço

Jaime
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Notas do editor:


(**)  Vd. poste de 17 de julho de  2021 > Guiné 61/74 - P22379: Parabéns a você (1979): Jaime Bonifácio Marques da Silva (ex-alf mil paraquedista, BCP 21, Angola, 1970/72)


Guiné 61/74 - P22385: Parabéns a você (1980): Francisco Baptista, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616 e CART 2732 (Buba e Mansabá, 1970/72)

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Nota do editor

Último poste da série de 17 DE JULHO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22379: Parabéns a você (1979): Jaime Bonifácio Marques da Silva (ex-alf mil paraquedista, BCP 21, Angola, 1970/72)

domingo, 18 de julho de 2021

Guiné 61/74 - P22384: (In)citações (191): Todos iguais mas uns mais iguais do que outros ?!... O caso dos futebolistas e outros "atletas de alta competição" a quem Pátria isentava do "imposto de sangue"


O Lemos, do FC Porto, "carrasco" do SL Benfica na época de 1970/71,
mobilizado para a Guiné com a CART 6552/72 
(Cameconde e Cabedú, 1972/74).

Cortesia do blogue Estrelas do FCP, do Paulo Moreira (Gondomar)


1. Não falamos no nosso blogue,por uma questão de princípio (e de pudor e de "higiene mental"...), de futebol, política e religião (futebol clubístico, política partidária, religião apolegética, entenda-se). 

Mas podemos, concerteza, falar dos nossos camaradas que foram capelães (caso do Arsénio Puim, por exemplo), ou futebolista (como, por exemplo, o Lemos, do FC Porto) ou de alguns políticos que foram nossos contemporâneos  (como James Pinto Bull, guinense, que foi eleito deputado à Assembleia Nacional em 1969, tendo sido membro da chamada Ala Liberal, que defendeu reformas políticas do regime, e que encontrou a morte na sua própria terra natal).

Mas hoje é dos futebolistas  que queremos falar. Dos futebolistas profissionais, craques da bola dos principais clubes e da seleção nacional... Não terão sido muitos, por certo,  os que fizeram a guerra do ultramar / guerra colonial. Eu, pelo menos, não conheci nenhum...

Um dos casos já aqui falados foi do  Lemos [, António José de Lemos, nascido em  Angola, em  1950],ex-jogador do F.C.Porto, que foi nosso camarada na CART 6552/72 (Cameconde e Cabedú, 1972/74). Ou, mais exatamente, camarada do novo membro da Tabanca Grande, o Manuel Domingos Ribeiro (*). Ao que parece, acabou a
 comissão a jogar no UDIB em Bissau, "não deixando de ter alinhado no mato até à sua transferência", como  garante o Ribeiro. (**)

2. Sobre o Lemos, lê-se no blogue  Estrelas do FCP, este detalhado apontamento biográfico, da autoria de Fernando Moreira (que reproduzimos com a devida vénia e as necessárias adaptações);

António José de Lemos:

 (i) nasceu no dia 2 de Fevereiro de 1950 em Luanda, Angola;

(ii) começou por jogar futebol nos juniores do Clube Ferroviário de Luanda até que em 1966 vem para Portugal;

(iii) ingressou nos juniores do Futebol Clube do Porto até passar a sénior, o que aconteceu em 1968;

(iv) por empréstimo dos portistas, ingressou no Boavista FC onde estve esteve durante duas temporadas,  tendo disputado 25 partidas oficiais e apontado 12 golos;

(v) em 1970/71 regressa ao FC Porto;

(vi) na tarde de 31 de Janeiro de 1971, o nome de Lemos "soou alto e soou longe, pela rádio":  marcou, no Estádio das Antas, os 4 golos da vitória do FC  Porto sobre o SLB; 

(vii) os benfiquistas jamais se esqueceram dele; é que, também na Luz, ainda na época 1970/71, Lemos fez o gosto ao pé e desfeiteou as "águias" por mais duas vezes no empate (2-2) no reduto encarnado;
 
(viii) ele recordou, mais tarde,  com precisão e com orgulho, cada pormenor dessa partida que foi um marco na sua carreira de futebolista:

(...) "No primeiro golo, o falecido Pavão fez-me uma assistência primorosa e só tive de empurrar a bola. O meu segundo golo foi espectacular! Quando ninguém acreditava que chegasse à bola, quase na linha de fundo, desferi um pontapé que surpreendeu o Zé Henriques. No terceiro, o Bené fez um lançamento lateral, apanhei a bola e fiz um chapéu ao guarda-redes. E no quarto, estava com um problema num joelho e o Humberto Coelho não acreditou que eu chegasse a tempo mas ultrapassei-o e toquei a bola à saída do guarda-redes." (...)

(ix)   Nas épocas de 1970/71 e 1971/72 marcou, respectivamente, 18 (melhor marcador da equipa) e 8 golos no Campeonato Nacional;

Em 1973 (decorria a época de 1972/73) Lemos – que não obtivera o estatuto de "Atleta de Alta Competição", imprescindível para o subtrair à guerra do Ultramar – foi mobilizado para Cabo Verde pelo Exército Português....

Mas o inesperado aconteceu: o avião, que transportava Lemos e a sua "Companhia de Operações Especiais" (, leia-se: a CART 6552/72), fez um "desvio" na rota e aterrou em… Bissau (Guiné). 

(...) "E todos aqueles soldados que julgavam ir para uma "guerra" branda no arquipélago das belas mulatas e da romântica morna, lá ficaram naquela que era a colónia portuguesa com a conjuntura militar mais difícil e perigosa. Acresce que, no início do ano de 73, o PAIGC (movimento independentista) incrementara as acções de guerra criando muitas dificuldades às tropas portuguesas que combatia desde Janeiro de 1963. A Guiné estava a 'ferro e fogo' e, talvez por isso, a "Companhia" de Lemos tenha sido desviada para aquele território." (...)

Diz o Fernando Moreira que o Lemos "voltou da Guiné em 1974 ainda a tempo de participar na época de 1974/75, a última que faria pelo FC Porto", (...) teno jofadao" ao lado de grandes futebolistas como Rolando, Custódio Pinto, Nóbrega, Pavão, Bené, António Oliveira, Flávio, Abel, Seninho, Heredia, Rodolfo, Fernando Gomes e o extraordinário Cubillas.  Contudo não logrou qualquer título pois, desafortunadamente para ele, esteve nos últimos anos de um período em que as agruras do futebol passaram pelas Antas. (...) Em quatro temporadas no FC Porto, nos 92 jogos do campeonato em que interveio, marcou 47 golos."

Depois veio a inevitável "curva descendente": Em 1975/76 ingressou no SC Espinho, na temporada seguinte rumou ao USC Paredes, em 1977/78 jogou no AD Sanjoanense, passou na época seguinte pelo Académico de Viseu FC e, entre 1979/80 a 1983/84, defendeu a camisola do FC Infesta...

3. No mesmo blogue, Estrelas do FCP, do Paulo Moreira, de Gondomar,  escreveu o seguinte comentário o Ludgero Lamas, companheiro do Lemos no FC Porto:

(...) Joguei futebol com o Lemos no FC Porto. Devo dizer que o jogo com o Benfica 4-0, foi delirante. O meu Amigo Lemos, ganhou nesse dia, um camião TIR cheio de tintas, electródomesticos, e outros, sendo que um televisor Grundig foi por mim comprado, sendo o dinheiro apurado na venda distribuido por todo o plantel. Uma atitude de grande nobreza. 

Devo referir que na altura não existia o estatuto de alta competição, a menos que fosse só para atletas do Benfica, dado que eram os únicos que não eram mobilizados para as Províncias, pois no nosso clube, ainda tivemos os casos de Séninho, e o falecido Chico Gordo, mobilizados para Angola, onde jogaram, e foram campeões (no Moxico), para onde também fui mobilizado, e posteriormente desmobilizado.

Do Lemos, devo referir a sua semelhança com o alemão Gerd Muller, e que se não chegou mais longe, o mesmo se deve às vicissitudes da vida." (...)

4. Até o circunspecto "Diário de Lisboa", que era veepertino,  perdeu... a cabeça,  dando em título de caixa alta, na 2ª edição de domingo, dia 31 de janeiro de 1971, o resultado do jogo nas Antas,  que foi conhecido como "Lemos, 4 - Benfica, 0", com desenvolvida notícia na 1º página e na página 23. Era então presidente do FC Porto o banqueiro Afonso Pinto de Magalhães.







Citação:
(1971), "Diário de Lisboa", nº 17281, Ano 50, Domingo, 31 de Janeiro de 1971, Fundação Mário Soares / DRR - Documentos Ruella Ramos, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_6022 (2021-7-18)


4. A propósito deste tema ("todos iguais mas uns mais iguais do que outros"), num depoimento já aqui em tempos publicado, escreveu o nosso camarada Mário Gaspar (***):
 
(...) "Discute-se um facto, e é a verdade que flui da minha boca, e os filhos dos ricos e poderosos de então – do nosso tempo de guerra, que não é nunca foi uma brincadeira de criança – falo por mim como Miliciano, esses filhos de ricos e poderosos que andaram na Escola da Câmara e mais tarde num Colégio Sousa Martins, em Vila Franca de Xira,  estiveram na Recruta na "minha tropa", mas na Especialidade de Atirador não vi nenhum.

Dei os meus primeiros passos no Serviço Militar no dia 3 de Maio de 1965 no Curso de Sargentos Milicianos (CSM), no RI 5, em Caldas da Rainha.

No mesmo Curso estiveram Rui Rodrigues e Gervásio, entre outros, jogadores da Académica de Coimbra. E Peres, este julgo também ser já jogador do Sporting Clube de Portugal, e o "famoso", "poderoso" de facto, Simões, do Benfica, Campeão Europeu, e que fez parte dos heróis do Futebol na Seleção Portuguesa, terceira classificada no Campeonato do Mundo de Futebol, em 1966.

Este acontecimento se dá quando eu – nunca fui voluntário – tive de "prestar provas para o Curso de Rangers, em Lamego".

Muitos os Milicianos recusaram frequentar o mesmo, ainda fiz parte da Equipa de Natação que representava o RI 14, em Viseu, no Campeonato da Região Militar, na Piscina, em Tomar. O Comandante deste Regimento que chefiava os nadadores era o conhecido também ex-futebolista da Académica de Coimbra, que venceu uma Taça de Portugal, o então Tenente-Coronel Faustino.

Nadei contra "nadadores civis federados", militares que representavam as suas Unidades. Julgo que também esses estavam no grupo dos "poderosos". Continuei por não ser voluntário, e por sorteio da vida, saiu-me ir frequentar o XX Curso de Minas e Armadilhas, na Escola Prática de Engenharia, em Tancos. 

Aí há a excepção, encontra-se o Aspirante Miliciano Oliveira Duarte, outro dos "poderosos". No meu conceito incluo estes que falei, nunca os culpando por estarem no grupo. Oliveira Duarte, jogador já do Sporting Clube de Portugal,  foi vítima de um jogo de "poderosos", estes sim "poderosos e «cunhas»", destes mesmos Militares que se livraram da guerra. 

Oliveira Duarte teve de partir para Angola, mas sendo "poderoso", frequentou o Curso de MA e lá foi para o grupo de futebol, livrou-se da guerra – perdeu, como nós todos, tempo – e nós não só tempo – lembrar que nos ofertavam por estarmos em zonas de guerra.

Ainda outros Desportistas, e não só do Futebol, caiu-lhes na sorte terem frequentado outras Especialidades, e atractivas e não foram à guerra.

Curioso, e é bom lembrar que os Milicianos na Guiné recebiam, julgo que ate fins de 1968 ou 1969 inclusive, menos verba mensal que os dos mesmos postos em Angola e Moçambique. Dizem estarmos mais junto à metrópole.

Estive na frente de um outro grupo que lutou para que o aumento de tempo que consta nas Cadernetas Militares ou Documentos que referissem o mesmo. E esse aumento é de 100%. Considerando que as horas de trabalho normal é de 8 horas, se nos encontrávamos de Serviço 24 horas, seriam 400%. Pois eu nem me contaram os 100%.

Nós somos, neste caso os não poderosos. Senhores com o nome de baptismo Cunha conheço… Mas esses "poderosos cunhas", vi por aí. Até na entrada em alguns "lares" e incluo todos, os "poderosos cunhas" estão presentes.

Quero lembrar um outro grupo que bem podia servir para dar a opinião, desconheço se foi ou não analisado: o caso dos nossos Capitães Milicianos que,  após terem cumprido o Serviço Militar e terem regressado a casa e frequentarem finais de Cursos Académicos,  são chamados e foram Camaradas não só, como nós na Guiné como noutras frentes de guerra. (...) (****=
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Notas do editor:



(***)  Vd. poste de 5 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16564: Inquérito 'on line' (71): Os Filhos dos Ricos e Poderosos, incluindo os jogadores de futebol... (Mário Gaspar, ex-Fur Mil At Art, Minas e Armadilhas, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68) 

(****) Último poste da série > 18 de julho de 2021 > Guiné 61/74 - P22383: (In)citações (190): Saudando uma decisão amadurecida, de oito anos, a entrada do Manuel Domingos Ribeiro para a Tabanca Grande: é o único representante , até à data, da CART 6552/72 (Cameconde e Cabedú 1972/74)