Mensagem do Beja Santos (ex-alf mil, Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), sob o título Saudação à Vida:
Camarada Aires Ferreira, recebi com muita emoção o teu esclarecimento (1). A guerra não anda longe da vida: tudo pode acontecer, do mais insólito ao transcendente. Pouco antes de me deitar e de me encomendar a Deus, recordando todos aqueles que já partiram, faço um exercício de rememoração dos primeiros meses em Missirá, de modo a que a Operação Macaréu à Vista seja um folhetim documental digno da nossa tertúlia.
Acredita que o Fernandes veio mesmo por inspiração, já que nos acontecimentos de Missirá ele teve uma passagem fugaz. Creio que faríamos justiça enviando-lhe este texto, e tu farás o favor de lhe dizer que estou cheio de alegria sabendo que ele vive. Vê lá se consegues enviar ao Luís uma fotografia do nosso Atleta, para embelezar o album de memórias.
Aguardo na maior expectativa que nos expliques como é que o Fernandes foi apanhado à mão, como é que vocês reagiram ao seu desaparecimento e ao seu aparecimento, que versão deu ele dos acontecimentos...
Fico inteiramente ao teu dispor para o que der e vier,
Tigre [de Missirá].
_______
Nota de L.G.:
(1) Vd. post de 15 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1075: O soldado desconhecido de Mansoa (Aires Ferreira, CCAÇ 1686, BCAÇ 1912)
(...) "O soldado Fernandes pertenceu à minha Companhia, a CCAÇ 1686. Tinha a alcunha de Atleta e foi sem dúvida o soldado mais conhecido de Mansoa.
"Pelas suas características psíquicas, não devia ter sido apurado para todo o serviço militar e muito menos ter sido enviado para a Guiné integrado numa companhia de Caçadores. Mas foi. Era um homem muito estranho, afável, disciplinado e tinha inteligência embora não parecesse.
"Fez a guerra à sua maneira, ganhou um estatuto especial na hierarquia e teve sorte, muita sorte. Fez todas as Operações, fazia questão de ir sempre na frente e era bom a combater, um pouco temerário, por vezes.
"Nos almoços [de convívio do BCAÇ 1912] que fazemos todos os anos, o Atleta é sempre o primeiro a chegar, seja onde for o almoço, de bicicleta, a pé, à boleia, nunca falta.
"É hoje uma espécie de mascote do Batalhão e fazemos sempre uma colecta que rende algumas centenas de Euros que lhe são entregues, o que o faz muito feliz, pelo menos por uns dias" (...).
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário