quarta-feira, 20 de setembro de 2006

Guiné 63/74 - P1092: Programa da RTP1 de hoje faz-me recordar camarada morto no Rio Geba e enterrado em Bambadinca (Sousa de Castro, CART 3494)

Guiné > Bissau > 1966 > Cemitério onde ficaram sepultados os primeiros combatentes da guerra colonial. Há placas funerárias de militares de origem metropolitana que vão, pelo menos, até 1968. O estado de abandono do cemitério faz doer oc oração, diz-nos o Marques Lopes, que esteve lá recentemente, em Abril de 2006, com o Xico Allen (LG).

Foto: © Virgínio Briote (2005)


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Xime > 1972 > O Sousa de Castro, 1º cabo radiotelegrafista da CART 3494 (Xime e Mansambo, 1972/74).

Foto:© Sousa de Castro (2005)

Mensagem acabada de enviar pelo nosso camarada de Viana do Castelo:

Foi com grande emoção que vi o programa minúsculo [Em Reportagem, de menos de 15 minutos], que a RTP1 apresentou hoje às 21,00 horas sobre os nossos mortos nas colónias, que por lá ficaram em cemitérios completamente abandonados.

Num dos cemitérios em Bambadinca, existe actualmente novas moranças, conforme disse o narrador, mas, num outro, apareceram vestígios de uma campa de um soldado da CART 3494 que aí ficou. Revi, como se fosse hoje, a situação pela qual passámos nesse período: foram dias de grande consternação, muito difíceis de superar. Veio-me as lágrimas aos olhos.

Junto em anexo um documento de como a estória se passou.


Situação de risco elevado provocado pelo Major de Operações

Xime, CART 3494 > 10-08-1972.

A companhia neste dia recebeu instruções para uma operação no Mato Cão, seguindo através do rio Geba em lanchas, e depois por terra à ao Mato Cão. O Major de Operações teimou em levar a cabo a operação, mesmo depois de ter sido avisado - por quem conhecia as marés naquele rio - que aquela hora não seria a mais indicada indicada para sair devido a que, dentro em pouco, passaria o Macaréu (*).

Mesmo assim, fazendo orelhas moucas, entendeu que ainda haveria tempo de passar o rio antes da chegada do Macaréu. Os pelotões envolvidos nesse patrulhamento não tiveram outra alternativa senão obedecer. Os soldados, pela experiência adquirida, sabiam que uma desgraça iria acontecer e dá-se aquilo que todos esperavam, não se pôde evitar, são apanhados pelo Macaréu.

A embarcação virou e então cada qual tenta desenrascar-se como pôde do perigo de morrerem afogados. Muitos não sabiam nadar, depois com todo peso de armamento que transportavam, para além da farda que envergavam, viram-se e desejaram para se safarem, mas nem todos o conseguiram. Assim, morreram afogados dois camaradas, sendo um da Póvoa de Varzim, casado e com uma filha, e outro de Famalicão, este solteiro.

Nesse mesmo dia todo pessoal da companhia desdobrou-se em esforços tentando encontrar os que desapareceram. Só apareceu o de Famalicão no dia seguinte, já com sinais de decomposição. Creio que este ficou enterrado em Bambadinca (1).

Sousa de Castro
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(*) Macaréu, Sm. Sublevação brusca das águas que se produz em certos estuários no momento da cheia e que progride rapidamente para as nascentes sob forma violenta, capaz de fazer estragos em pequenas embarcações.

Nota de L.G.:

(1)Vd., entre outros, o post de 30 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCCXIX: Do Porto a Bissau (23): Os restos mais dolorosos do resto do Império (A. Marques Lopes)

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