quinta-feira, 25 de março de 2010

Guiné 63/74 – P6047: Estórias avulsas (29): Encontros imediatos com IN na picada de Jumbembem (Manuel Marinho)

1. Mensagem de Manuel Marinho* (ex-1.º Cabo da 1.ª CCAÇ/BCAÇ 4512, Nema/Farim e Binta, 1972/74), com data de 10 de Março de 2010:


DESNECESSÁRIOS ENCONTROS COM O IN

Mês de Abril de 1973 – Dia 24

Nema/Farim

Protecção descontínua à coluna de Jumbembem e Cuntima

1.º GComb


Não muito distante do aquartelamento de Nema na picada para Jumbembem havia numa zona do mato uns frutos que nos abriam o apetite sempre que por aí passávamos, começava a ser uma obsessão, porque não sendo em muita quantidade desafiava a nossa vontade, mas os nossos afazeres não permitiam a colheita dos mesmos e eram os macacos a tratar deles.

Como era hábito, saímos ao alvorecer para mais uma protecção descontínua às colunas, que vinham a Farim abastecer e depois regressavam aos seus aquartelamentos.

Depois da picagem até perto do corredor de Lamel feita sem incidentes, lá ficamos a aguardar a sua passagem, que era saudada com algum alvoroço de parte a parte, e algumas “bocas” à mistura, já que era malta do nosso Batalhão, já nossa conhecida.

O que era normal acontecer nessas protecções era ficarmos a emboscar até ao regresso das mesmas, normalmente toda a parte da manhã e às vezes pela tarde dentro, dependia da rapidez da malta da manutenção, e já agora das batatas fritas com bifes ou frango, que o “Pedro Turra” servia em Farim, e que os nossos camaradas aproveitando a viagem, tiravam a barriga de misérias.

Mas nesse dia e para fugir da rotina enquanto esperávamos, mais uma vez tentamos convencer o alferes a irmos apanhar os ditos frutos, afinal seria rápido porque aproveitávamos o facto de termos as viaturas, e de o terreno já estar picado.

Depois sempre podíamos dizer que fizemos um pequeno patrulhamento, porque havia algo de suspeito e para tirar dúvidas tínhamos recuado quase até à partida, este argumento era o mais sustentável por isso fica a possibilidade de ser este o motivo que convenceu o alferes, que foi sempre muito rigoroso e pouco dado a “passeios”.

Naqueles três meses até nem tinha acontecido nada de especial naquela picada, o que nos dava a ilusão de já sermos uns tipos experientes, enfim só levando porrada se aprende….

Então lá fomos, não se perdeu tempo pois só recuamos um bocado com as viaturas, e lá chegados, apanhamos as respectivas “mangas”(?) que nos souberam muito bem, e voltamos onde era nosso dever estar.

Voltamos a ocupar os nossos lugares ainda faltava tempo, e descontraímos, era pouco provável haver problemas com o IN. nos dias em que havia colunas, o mais que se esperava eram minas, e mais adiante, havia malta de Jumbembem também a fazer protecção.

Eis senão quando um nosso camarada fica estarrecido ao avistar uma coluna IN encabeçada por um indivíduo branco provavelmente cubano, a preparar-se para atravessar a picada, só tem tempo de avisar de forma precipitada o alferes:

- Alferes vêem aí “turras”!

Nessa ocasião estava eu ao lado do camarada da bazuca, ele faz pontaria quando eu me apercebo que estou debaixo da zona de fogo atrás da dita bazuca no momento do disparo, dou um berro:

- Cuidado! Ao mesmo tempo que me lançava ao chão.

O resultado foi ficar um bocado enfarruscado e a perguntar aos meus camaradas se estava “queimado”, porque a distância foi muito curta e eu apanhei ainda com uma espécie de fuligem e o fumo quente da bazuca.

Rapidamente e com alguma precipitação abrimos fogo sobre o IN que perante a surpresa de nos encontrarem ali, puseram-se em fuga disparando na retirada tiros de metralhadora, nós ainda esboçamos a perseguição mas de imediato foi pedido fogo de Artilharia sobre o itinerário da fuga que foi prontamente atendido, e aí acabou a escaramuça.

Batida a zona mais tarde, encontrou-se uma mochila com materiais diversos, sendo de prever que o IN teve feridos.

A coluna por essa altura estava retida em Farim esperando o desenrolar dos acontecimentos, pois tinham sido avisados que tivéramos contacto com o IN.

Depois de serenados os ânimos tudo seguiu o curso normal, a coluna passou e os camaradas que nela seguiam perguntavam o que tinha acontecido, nós dissemos que nada de especial, apenas uma troca de tiros, e nada mais.

A conclusão que tiramos foi a de que enquanto retiramos para ir à fruta, o elemento de vigia IN provavelmente caiu no engano de que já teríamos abandonado o local e daí mandar avançar que o caminho estava livre.

Felizmente não houve problemas de maior mas foi uma lição que aprendemos, até porque mesmo a não se dizer nada sobre a nossa ausência do local que originou o avanço do IN tudo se sabe, e houve mais trabalho nos dias seguintes.

Um grande abraço
Manuel Marinho

Marinho ainda pira


Em Nema/Jumbembem
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste com data de 27 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5893: O 6º aniversário do nosso Blogue (8): Como é que se consegue pôr centenas de ex-combatentes a falar? (Manuel Marinho)

Vd. último poste da série de 21 de Março de 2010 > Guiné 63/74 – P6033: Estórias avulsas (78): O meu álbum de fotos 2 (Alfredo Dinis)

3 comentários:

Anónimo disse...

Meu Caro Marinho.Aqui estou simplesmente para te agradecer e dizer-te,que gostei imenso da tua estória avulso.A 27 de Março 71,passei pela 1-vez essa zona,mas na condição de turista porque nem arma levava comigo.Ia para Cuntima recompletar a cart 3331.A ponte Lamel tinha então muita nomeada.
Como condutor ainda fiz colunas durante 3 meses Cunt/Farim sem/problemas Flismente. Abraço do tamanho de Cuntima.Caetano

Hélder Valério disse...

Caro Manuel Marinho

Como tudo e sempre na Vida, é aprender, aprender, aprender...

Um abraço

Hélder S.

Anónimo disse...

Manuel Marinho
Gostei de ler esta tua passagem.
Pois,quando menos se esperava...aconteciam coisas.

Uma noite diluviana,sabendo que não devia, facilitei e passaram-me a um metro uma serie de galfarros armados.Para alem de tudo o mais só tinha a "walter" e o posicionamento era mau!Seguiram o seu caminho!
Talvez um dia conte o episódio,

Um abraço
Luis Faria