quarta-feira, 24 de março de 2010

Guiné 64/74 - P6042: Tabanca Grande (209 ): Jacinto Cristina, natural de Ferreira do Alentejo, CCAÇ 3546 (Piche e Caium, 1972/74): Foi soldado atirador, mas a guerra fê-lo padeiro...


Guiné > Zona Leste > Piche > Destacamento de Caium &gt CCAÇ 3546 (Piche e Camajabá, 1972 / 1973) > Foto de de meados de 1972 (*). O destacamento ficava na estrada que ligava Piche a Buruntuma. Foi nesta foto que se reconheceu,, por mero acaso, o Sold Jacinto António Grilo Cristina, natural de Figueira de Cavaleiros, Ferreira do Alentejo, pai de uma amiga minha...

Não imaginam a alegria dele quando eu, ao abrir o portátil e pesquisar no blogue postes sobre Piche e Caium, deparei com esta foto que nos foi enviada pelo Henrique Castro (e depois com a foto da ponte, da autoria do Luís Borrega, que o antecedeu em Piche e em Caium)... O Jacinto, com olho de lince, disparou logo:
- Mas este sou eu!

A minha amiga Cristina fazia anos, veio de propósito da Madeira com o marido para estar com os pais (é filha única), e convidou-nos, a mim e à Alice, para ir jantar à casa paterna nesse dia,  9 de Janeiro transacto... Há dias perfeitos: esse foi porventura um deles... A felicidade do Jacinto e da esposa era notória (devido à presença da filha, do genro, da neta e dos amigos de Lisboa)... Além o jantar foi uma delícia (estão a imaginar um borreguinho assado no forno do padeiro, com as ervinhas especiais do Alentejo, e acompanhado com um fabuloso tinto da região, sem falar do pão, do queixo e das azeitonas da nossa perdição!)... A nossa amiga  mais emocionada ficou ao ver, com a lágrimazinha ao conto do olho, o pai ao recuar, assim, 40 anos na sua vida e voltar de novo a  Caium, ao destacamento de Caium, onde penou 14 meses da sua vida, num total de 27 meses de comissão na Guiné!...

Dias mais tarde, a nossa amiga Cristina confidenciou-nos:
- Amigos, foi o aniversário mais feliz da minha vida!- E prometi-lhe que ia pôr o Jacinto (que eu conheci pela primeira nessa noite) em título de caixa alta no nosso blogue, logo que ela me mandasse duas ou três fotos do Jacinto em Piche e em Caium... Há dias ela cumpri a sua parte, no nosso acordo,  e eu agora estou a cumprir a minha...

Bom, e é caso para se voltar a dizer que o mundo é pequeno e o nosso blogue é ... grande! (É uma força de expressão, não levem à letra, nem me julguem mal).

Na foto acima, o Jacinto é o militar que está no meio, sentado no banco de detrás do Unimog. Tinha chegado a  Piche há poucos meses...(Partida para a Guiné em 23/3/1972; regressso, 27 meses depois, em 23/6/1974).

Foto: © Henrique Martins de Castro (2008). Direitos reservados



Guiné > Zona leste > Piche > Destacamento da ponte de Rio Caium visto da margem direita do Rio Caium. Foi aqui que o sold Jacinto Catarino viu morrer, à sua frente, o furriel da sua secção, numa armadilha montada pelas nossas próprias tropas... [ Fur Mil Op Esp Amândio de Morais Cardoso, natural de Valpaços, morto em acidente, em Piche, a 19 de Fevereiro de 1973, rezarão as crónicas...].

"Passei um ano em Piche, e o resto do tempo,  14 meses,  em Caium. As nossas instalações eram uns bidões cheios de areia, uns em cima dos outros, com um chapa de zinco por cima.  Todas as noites o furriel fazia uma armadilha com uma granada de mão junto do rio. Dava um jeio à cavilha de modo a ela soltar-se facilmente se alguém ou um animal tropeçasse no fio. Podia ser uma gazela que ia ao rio beber água ou podia ser um turra. Tantas vezes a bilha foi à fonte que partiu-se"...

O Cristina assistiu, horrorizado, à morte imediata do furriel (de que já não se lembra o nome) bem como de um camarada que ficou gravemente ferido, cego de um olho, e que foi helievacuado. Nunca mais teve notícias dele. Isto terá sido em 1973, em data que ele já não pode precisar. O pelotão não tinha alferes.

Em Caium, o Cristina entretinha-se a fazer o pão. "Ajeitou-se, quando era mais moço via a mãe amassar a massa  e a enfornar"... Aliás, a sua profissão hoje é padeiro. Faz o o melhor pão de Figueira de Cavaleiros. Trabalha de noite para que os seus clientes tenham o pão fresquinho e saboroso pela manhã. Posso-vos jurar que é uma maravilha de pão. Dorme de tarde até às oito. É um homem disciplinado e trabalhador. Antes da tropa, foi assalariado agrícola. Casou para se tornar independente da casa do pai, como qualquer jovem alentejano do seu tempo.  Antes de ir para a Guiné, já tinha a seu cargo mulher e filha. Tem muito orgulho em ter-lhe dado, à filha,  o curso de engenheira. Conhecemo-nos há largos anos, quando ela casou com um amigo meu, médico, o Dr.Rui Silva.

Foto:  © Luís Borrega (2009). Direitos reservados




Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Piche > CCAÇ3546 (Piche e Camajabá, 1972 / 1974) > Em primeiro plano, o Cristina; atrás, a meio, o Charlot, do seu grupo de combate, o 3º pelotão. O Charlot morreu em combate. 

O Cristina fez a recruta no RI 14, em Viseu, e especialidade no RI 2, Abrantes. A CCAÇ 3546 pertencia ao BCAÇ 3883, mobilizado pelo RI 2. A CSS estava sedeada em Piche. O comandante era o Ten Cor Inf Manuel António Dantas.  O comandante da CCAÇ 3546 era o Cap QEO José Carlos Duarte Ferreira (o Cristina já não se lembrava do nome).

As outras companhias do BCAÇ 3883 era a CCAÇ 3544 (Buruntuma e Piche; teve dois comandantes: Cap Mil Inf Luís Manuel Teixeira Neves de Carvalho; Cap Mil Inf José Carlos Guerra Nunes) e a CCAÇ 3445 (Canquelifá e Piche; comandante, Cap Mil Inf Fernando Peixinho de Cristo).

Pela informação de dispomos, estas quatro subunidades partiram para a Guiné, possivelmente de avião, com um dia de diferença: o comando e a CCS/BCAÇ 3883, em 19/3/1972; a CCAÇ 3544, a 20; a CCAÇ 3545, a 22; e a CCAÇ 3546 a 23.



Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Piche > CCAÇ3546 (Piche e Camajabá, 1972 / 1974) >  Destacamento da Ponte Caium > Da esquerda para a direita: O 1º Cabo Pinto, e os soldados Ramos, Cristina (segurando granadas de morteiro 60), o Wolkswagen, o Fernando, de pé (outro que morreu em combate) e o Silva (que percorreu 18 km com um tiro no pé!)...

Em data que o Cristina já não pode precisar, a sua companhia sofreu uma violenta emboscada, entre Piche e Buruntuma, montada por um grupo "estimado em 400" elementos IN (ou "turras, como a gente lhe chamava")...Um RPG 7 atingiu a viatura da frente da coluna, que ia relativamente distanciada do grosso da coluna, e que explodiu...Houve de imediato 4 mortos: O Charlot e o Fernando foram  dois deles... Dos outros dois o Cristina já não se lembra.

Com as granadas de mão dos mortos, o Wolkswagen conseguiu aguentar o ímpeto da emboscada, mas chegou a ter uma Kalash apontada à cabeça... Ninguém sabe como ele  se safou... O Silva por sua vez levo um tiro no pé, fugiu, e mesmo ferido fez 18 km até ao aquartelamento...

Tempos bem duros que o Cristina recorda com emoção... Não é muito dado a convívios, e além disso é homem de fracas letras. Quem lhe vai emprestar o endereço de email é a filha Cristina (nome próprio)... Mas aqui fica o telemóvel para algum camarada do seu tempo de Piche e de Caium o poder contactar (sempre de manhã): 964 346 202.

 Prometi-lhe, a ele e à filha,  que o poria na galeria da nossa Tabanca Grande. Em contrapartida, ele prometeu-me contar-me mais histórias do soldado que a guerra obrigou a fazer-se padeiro...(Além de padeiro, era o municiador - e às vezes  apontador - do morteiro 81, no destacamento de Caium; é outra história que ele tem para nos contar...).



Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Piche > CCAÇ3546 (Piche e Camajabá, 1972 / 1974) > O Cristina abrindo valas em meados de 1973




Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Piche > CCAÇ3546 (Piche e Camajabá, 1972 / 1974) > O 3º pelotão... O Cristina é o terceiro da primeira fila, a contar da esquerda para a direita...

Fotos: © Jacinto Cristina (2010). Direitos reservados

____________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 30 de Setembro de 2008  > Guiné 63/74 - P3252: Tabanca Grande (90): Henrique Martins de Castro, ex-Sold Cond Auto da CART 3521 (Piche, Bafatá e Safim, 1971/74)

(...) Já em Piche, a malta da Companhia fazia colunas a Canquelifá, Buruntuma, Nova Lamego, Bambadinca, Bafatá, Galomaro, etc., operações, patrulhas e psíco - que,  para quem não sabe, era dar um certo apoio e levar medicamentos (mesinho).

Estivemos em Piche mais ou menos até Agosto de 1972, só o primeiro Gr Comb ficou em Piche adido ao BCAÇ 3883. A Companhia seguiu para Bafatá com o segundo, terceiro e quarto Gr Comb.

A Companhia ficou com terceiro e quarto Gr Comb adidos ao BCAÇ 3884 em Bafatá, o segundo foi reforçar para Galomaro o BCAÇ 3872. (...)


(**) 27 de Abril de 2009> Guiné 63/74 - P4252: Os Bu...rakos em que vivemos (7): Destacamento de Rio Caium (Luís Borrega)

(...) Era uma ponte estreita em pedra e cimento com 59 metros de comprimento sobre o Rio Caium, na estrada Piche – Buruntuma. Estava situada a 17,5 km de Piche, a 3,5 Km do Destacamento de Camajabá (pertença da CCav 2747,  sediada em Buruntuma) e a l8,5 Kms de Buruntuma.



O aquartelamento estava instalado no tabuleiro da ponte. Dois abrigos à entrada e dois abrigos à saída. Estes eram feitos de bidões de gasóleo de 200 litros, cheios de terra, uns em cima dos outros, cobertos com troncos e cimento por cima. Ao meio do tabuleiro a cozinha, o depósito de géneros e o refeitório. Eram uns barracos, cujo telhado eram chapas de zinco. Havia ainda um nicho com uma santa e do lado esquerdo (sentido Buruntuma) estava o forno.


Como armamento pesado tínhamos um Canhão sem recuo montado num jeep e um morteiro 81 mm num espaldão apropriado. O restante do armamento era HK21 e RPG 7,  apreendidos ao IN. Dilagramas, morteiro de 60 mm e G3 distribuídas pelo Grupo de Combate.


Para nos reabastecermos de água (para beber, cozinha e banhos) tínhamos que nos deslocar a 2 km do aquartelamento, a um poço cavado no chão, com um Unimog a rebocar um atrelado carregado com barris de vinho (50 litros) vazios, que eram cheios com latas de dobrada liofilizada, adaptadas para o efeito.


Como era de difícil solução a localização de um heliporto, foi decidido superiormente, manter sobre a estrada, uma superfície regada com óleo queimado, para a aterragem de helicópteros.


Como se pode imaginar, nas horas de lazer o tempo era preenchido a jogar cartas, ler, escrever à família. Quase todos os dias tínhamos saída à agua, patrulhamento às áreas em redor, etc.


Os dias e as noites eram passados nos limites do espaço, do tempo, na expectativa dum ataque – e quando este começasse, já estaríamos cercados por todos os lados, porque ali não havia milícias, nem tabanca, nem pista de aviação ou possibilidade de retirada (só saltando o parapeito da ponte e atirarmo-nos ao rio uns bons metros mais abaixo).


A desvantagem da área diminuta tinha contrapartidas benéficas: era mais difícil ao PAIGC acertar com os morteiros e a nossa artilharia tinha mais à vontade nos tiros de retaliação, nos limites do alcance das peças de 11,4 instaladas em Piche. (...)

25 comentários:

Anónimo disse...

Caro Camarigo
Aguentar 14 meses na Ponte Caium é obra. O máximo de tempo em que lá estive foi à volta de 3 meses e já custou muito, especialmente na parte psicológica.
Após pesquisa minuciosa conclui o seguinte:
O acidente com a granada na P.Caium deu-se no dia 19 de Fevereiro de 1973 e a vítima mortal foi o Fur. Mil. OP Amandio de Morais Cardoso da CCaç 3546/BCaç 3883
Abraço
Luís Borrega
Fur.Mil.Cav.MA CCav.2749/BCav.2922
Piche 1970/72

Anónimo disse...

É de ficar louco só de imaginar 14 meses em cima daquela ponte.

O lugar, é de um isolamento num raio de quilómetros.

A vegetação a caminho de uma desertificação inevitável.

O rio que se vê com água na foto, seca completamente no tempo seco, portanto a foto deve ser no tempo das chuvas.

Dizer que são 18 km para buruntuma, mas é numa picada contornando os arbustos, em que se o motorista se se desorienta até pode perder o trilho.

Aquilo é uma paisagem tão pobre, com uma vegetação tão feia, tudo tão plano, que se subir acima de quaquer árvore, não se consegue ver qualquer vida se não a de nós próprios.

É arrepiante só de imaginar um mês, quanto mais 14 meses.

Antº Rosinha

Luís Graça disse...

Obrigado, Luís Borrega, por essa preciosa informação (*). Vou transmiti-la ao Jacinto Cristina, que não acesso directo ao nosso blogue. Mas ele este fim de semana vai a casa do seu antigo camarada, o Cercal. E lá poderá ver o poste...

Também me disse que, além de padeiro, era o municiador (e às vezes apontador) do morteiro 81, no destacamento... Confirma-me que o rio secava, só ficava água junto à ponte...

O Amândio tinha por hábito armadilhar o trilho das gazelas que vivem beber ao rio...

Mas concordo contigo: a ponte Caium durante a guerra e depois da guerra (o António Rosinha confirma-o, andou por lá, entre 1979 e 1993) era um sítio desolado e desolador...

Um abração. Luís

_______________

(*) O nome do infortunado Cardoso consta da lista dos "rangers" mortos na Guiné, publicada pelo nosso co-editor Eduardo MR, na sua página pessoal.

http://coisasdomr.blogspot.com/2009/04/m91-memorial-aos-rangers-mortos-em.html

Descobri também, na página do nosso camarada e amigo António Pires, que o Amândio era natural de Santa Maria de Emeres, Valpaços:

ttp://ultramar.terraweb.biz/03Mortos%20na%20Guerra%20do%20Ultramar/LetraV/MEC_275n.pdf

Luís Dias disse...

Caro Camarada

Aquilo em Ponte Caium era terrível, uma solidão. Estive de intervenção em Piche, alguns meses com o meu GC (2º GC da CCAÇ3491),colaborando na escolta e segurança aos trabalhos da estrada Piche-Buruntuma (Maio-Agosto, ao que creio, de 1973). A emboscada que é relatada passou-se nesta altura e, julgo que um dos atiradores mortos vivia em Alfama-Lisboa, andou na escola comigo e era conhecido pelo alcunha do "Manjerico". Foi terrível! Como os outros conseguiram escapar!
Um abraço ao Cristina que passou um mau bocado naquele buraco.
Luís Dias

JD disse...

Camaradas,
Conforme os depoimentos anteriores, a Ponte Caium foi um horrível lugar de exílio. Tive a sorte de só passar por ela, quando escoltei colunas para Buruntuma.
O ar dos exilados era de grande curiosidade relativamente aos passantes, como se nós é que tivessemos uma vida inopinada. As viaturas deslocavam-se quase a roçar o telhado de zinco.
Só visto!
Quem ali viveu 14 meses, correu o risco de ficar estrambulhado para sempre. Nem se compreende como é que o comando do Batalhão não controlou mais equitativamente as estadias do pessoal. Pimente no cú do outro!...
Abraços fraternos
JD

Sotnaspa disse...

Luís Dias

A quem chamas manjerico, quase que posso garantir que também conheci, fomos apresentados pelo meu amigo e hoje compadre, Graça. Era um rapaz de baixa estatura e tinha regressado de férias, passadas em Lisboa ha poucos dias, e na sua passagem por Nova Lamego quer na ida quer no regresso, estivemos juntos a beber uns copos, quando soubemos da noticia eu e o meu compadre ficamos passados de todo, especialmente ele que o conhecia da infancia.
Um abraço.

ASantos
SPM 2550

Anónimo disse...

Caro Luis Graça
Não te posso confirmar se o rio secava, porque quando lá estive tinha água. No tempo do meu Batalhão os GC rodavam por escala, teoricamente só estariam lá 1 mês, mas na realidade isso nunca aconteceu, eu estive lá 3 meses. Quando era para ir para lá na segunda vez meti férias e vim para Lisboa, que sempre era " um pouco melhor que a Ponte de Rio Caium. Tenho estado a pensar a razão do Cristina ter estado 14 meses lá e só pode ser esta: como era o padeiro, os GC rodavam e ele ficava lá sempre. Seria assim?
Alfa Bravo Fraterno
Luís Borrega

Luís Graça disse...

Vocês não podem não acreditar, mas o nosso camarada Cristina "gramou" mesmo os 14 meses no "presídio" de Caium... Bom, não foram 14, foram 13, já que ele consegiu vir de férias a Portugal para poder estar com a mulher e a filha, a minha amiga Eng. Cristina Silva...

O esquema foi o seguinte: durante um ano esteve lá o 4º pelotão, e o resto do tempo (14 meses) até Maio de 1974 (eles regressaram à Metrópole em 23 de Junho) esteve o 3º pelotão (a que pertencia o Jacinto)...

Durante esse tempo tiveram dois ou três ataques e flagelações. Num deles, os combatentes do PAIGC chegaram a cortar o arame... A malta do destacamento (1 pelotão) defendeu-se à granada de mão e com o morteiro 81 que disparava granadas a pique... O Jacinto tanto era municiador como apontador... (além de padeiro). Por rastos de sangue e roupas ensanguentadas, verificou-se depois que os guerrilheiros retiraram com baixas...

A 1 ou 2 km havia uma tabanca, onde algum pessoal do destacamento ia "descansar a vista"... O Cristina nunca lá pôs os pés...

A morte dos 4 militares, caídos numa emboscada, ocorreu a 3 km de Piche, quando um grupo de voluntários do destacamento ia à sede do batalhão e da companhia buscar correio e mantimentos (Estavam há um mês a seco...). Ele não se lembra do Manjerico, que devia pertencer a outra companhia que integraava a coluna... Os militares portugueses foram cortados em quatro, com centenas de tiros de armas automáticas... Houve tempo tempo para apanhar as armas e retalhar os cadáveres... A viatuira da frente ia um quilómetro das outras duas... O Jacinto,por causa do morteiro 81, não ia na coluna... Aliás, aprendeu que na tropa... voluntário só obrigado...

Isto ter-se-á passado depois (dois ou três dias) de uma grande e célebre operação na região de Buruntuma que mobilizou imensos meios aéreos, artilharia (obuses 14), tropa especial, etc. Ainda no tempo do Spínola...

Luís Graça disse...

O estado em que ficaram os cadáveres, mortos à roquetada, e depois cravejados de tiros (o Jacinto Cristina não estava lá, não viu, ficara em Caium a tom,ar conta do morteiro 81, mas contaram-lhe depois...) é porventura revelador da mudança de atitude e comportamento dos guerrilheiros do PAIGC, na sequência da morte de Amílcar Cabral... (À medida que ele me vai falando, vai-se lembrando de muita coisa que estava metida nos arquivos da memória, isto, é, "recalcada"...).

É uma hipótese de trabalho, para investigação, que ponho aqui... Tinha a ideia de que a violência desnecessária, gratuita, patológica, contra o inimigo (as NT) não fazia parte da cultura do PAIGC que, no tempo de Amílcar, "lutava contra um regime, não contra um povo"...

Que vos parece ?

Joaquim Mexia Alves disse...

Lembro-me sempre de em Mansoa, C. Caç. 15 se contar que teria havido emboscadas no "carreiro da morte", Morés, em que alguns cadáveres de portugueses teriam sido violentados, inclusivé com corte e exposição dos testiculos.

Se isto é verdade não sei, mas era contado insistentemente por aqules lados e que não teria sido apenas uma vez.


Abraço camarigo para todos

Anónimo disse...

Camaradas
Já que falam de barbaridades cometidas pelos guerrilheiros do PAIGC sobre os nossos soldados, numa operação denominada Operação Mabecos, fomos emboscados ao cair da noite, foi o fim da macacada, de manhã encontrámos tres camaradas nossos mortos despojados da roupa, das botas, armamento, tinham sofrido vários cortes à catanada, um tinha o pénis metido na boca, outro tinha o crucifixo (não era de ouro) metido num buraco do peito e o terceiro tinha o dedo anelar decepado. E para azar meu foi o meu GC que os descobriu na bolanha, e eu vi-os ali mesmo à minha frente. Ainda hoje estou a vê-los à minha frente.
Ainda hei-de falar sobre esta operaçao que começou com um rebentamento duma granada de RPG2 na caserna da minha Companhia e provocou três mortos e vários feridos. Eu era o único graduado que lá estava dentro e só fui ferido superficialmente por dois estilhaços, um no braço e outro junto ao olho esquerdo. Nem sei como escapei e quatro horas depois estavamos a "embrulhar" no Rio Corubal.
Luís Borrega

Anónimo disse...

Esqueci-me de referir que deceparam o dedo anelar ao meu camarada da Cart.3332, para levarem a aliança ou o anel que teria valor, não levaram o crucifixo do outro porque não era de ouro.Os mortos sofridos e o desaparecido (foi libertado após o 25 de Abril) pertenciam à Cart.3332.
Luís Borrega

Anónimo disse...

Sobre a violência (gratuita) do PAIGC, durante a luta e após a mesma, analisemos apenas a morte dos seus dirigentes.

E podemos em seguida ficar pela imaginação.

Embora sobre os cico tiros sobre Amilcar, na presença da esposa, é de bom tom continuarmos (nós os portugueses) com a versão da intervenção da PIDE.

Tudo em nome do politicamente correto.

Antº Rosinha

JD disse...

Camaradas,
Num dos comentários verifico referência a uma grande operação na região de Buruntuma, no tempo do Spínola, por iniciativa das NT.
Só me ocorre uma acção de retaliação, da nossa iniciativa, levada a cabo no inicio de Março de 1970, com um bombardeamento a Cadinka, e que mobilizou equipamento e tropa, que durante três dias deram grande movimentação à picada Piche/Buruntuma.
Participou no perímetro de segurança o 1º.pelotão da minha companhia, mas não houve tropa especial.
O IN, ou a tropa de ConakrY, respondeu durante treze horas com bombardeamentos.
Não tenho conhecimento de outra acção de grande envergadura naquela região.
Abraços
JD

Hélder Valério disse...

Caros amigos

No comentário do Luís Dias refere-se "escolta e segurança aos trabalhos da estrada Piche-Buruntuma (Maio-Agosto, ao que creio, de 1973)", o que me deixa intrigado porque estive em Piche, de Dezembro de 1970 ao final de Maio de 1971 e nessa ocasião já circulei em estrada asfaltada de Bambadinca, Bafatá, Nova Lamego até Piche. A continuação da construção da estrada asfaltada de Piche para Buruntuma estava a ser feita pela Tecnil durante o tempo em que lá estive, não sabendo dizer agora em que ponto ia quando vim, como disse no final de Maio de 1971, daí a minha admiração de em Maio-Agosto de 73 ainda estar 'em trabalhos'.

O Zé Dinis mostra estranheza por "Num dos comentários verifico referência a uma grande operação na região de Buruntuma, no tempo do Spínola, por iniciativa das NT.
Só me ocorre uma acção de retaliação, da nossa iniciativa, levada a cabo no inicio de Março de 1970, com um bombardeamento a Cadinka, e que mobilizou equipamento e tropa, que durante três dias deram grande movimentação à picada Piche/Buruntuma."
Na realidade, o comentário do Luís Borrega não refere Buruntuma, mas sim Piche, que sabemos ser, a partir de certa fase do desenvolvimento do 'teatro de operações', a sede dos Batalhões que tinham Companhias em Buruntuma (e também em Canquelifá).
A operação a que o Luís Borrega se refere ocorreu no Carnaval de 1971 e que, ao recordá-la, motivou um artigo meu que deu origem a um 'post' a que dei o título de "Carnaval, nunca mais".
Foi muito complicadinho lidar com aquilo tudo. Se se derem ao trabalho de reler podem ver que no rescaldo dessa atribulada operação o então Sr. Major Mendes Paula (já falecido) fechou-se no seu quarto, depois de arrancar os galões e tê-los deitado para o caixote do lixo, recusando-se a sair de lá até que o General Spínola em pessoa fosse lá falar com ele, o que de facto aconteceu.

Como as presenças de diferentes pessoas nos mesmos locais ocorreu, neste caso, em tempos diferentes, tomo a liberdade de dizer ao Zé Manel que o facto de ele "não ter conhecimento de outra acção de grande envergadura naquela região" não quer dizer que não possa ter ocorrido..., é mais correcto dizer que 'no meu tempo' ou 'enquanto por lá andei', não tive conhecimento de ter havido qualquer coisa.

Um abraço
Hélder S.

Anónimo disse...

Camaradas
Buruntuma era flagelada dias e noites inteiras debaixo de fogo dos morteiros 120mm . Retaliavam com os nossos morteiros 107mm (os maiores existentes nas NT). O maior ataque deu-se a 25 de Novembro de 1971.No dia 27 o Gen. Spínola aterra numa DO na pista de Buruntuma. Manda juntar todo o pessoal,milícias e população. Nesse momento chegam seis FIAT G-91
razam Buruntuma e Kadinca. Logo a seguir ouviram-se enormes rebentamentos em Sofá, a base do PAIGC, fazem nova passagem largam o resto das bombas e regressam a Bissau. Então o Gen. Spínola disse às populações locais: Viram o que aconteceu? Agora vão dizer aos do lado de lá que se tornam a fazer outro ataque com morteiros, mando o dobro dos aviões e o dobro das bombas! Era assim o Gen.Spínola. E foi a única acção digna de registo na zona de Buruntuma durante a permanência do meu Batalhão(BCav.2922) 1970/1972. Não tomei conhecimento de acções com tropas especiais
Abraço
Luís Borrega

Anónimo disse...

Caro Helder Valério
Desculpa dizer-te mas a estrada Piche-Buruntuma só começou com o BCaç 3883 e não no meu tempo. Quanto à estrada Piche-N.Lamego,em 29/11/71 o meu GC (3º) e o 1º GC da CCav.2749, fomos reocupar o Destacamento de Bentém para as maquinas da Tecnil ficarem recolhidas dentro do arame farpado para não serem destruídas pelo PAIGC. Só voltámos a Piche em 1 de Abril de 1972, data mais ou menos em que a estrada Piche-N.Lamego ficou concluída. Por isso deves estar a fazer confusão
Abraço Camarigo
Luìs Borrega

Anónimo disse...

Caro Helder Valério
Desculpa dizer-te mas estás a fazer confusão. A estrada Piche-Buruntuma só foi iniciada no tempo do Batalhão (BCaç 3883)que nos rendeu. Em relação à estrada Piche-N.Lamego, dois GC da minha Compª (o meu que era o 3º e mais o 1º) em 29Nov71 fomos reocupar o Destacamento abandonado de Bentém, para apoio à construção, para guardar as máquinas dentro do arame farpado para evitar a sua destruição, regressando a Piche em 01Abr72, data em que mais ou menos ficou concluída a estrada.
Abraço Camarigo
Luís Borrega

Anónimo disse...

Do meu amigo Rui Silva:

"Meu Amigo

"Estou a passar um bom bocado com o meu sogro e as suas histórias de Piche, motivadas pela leitura dos seus magníficos comentários. Estou deslumbrado pelo gigantesco trabalho e sensibilizado pelas alegrias que, estou certo, tem proporcionado aos camaradas da Guiné. O realismo e a emoção das descrições quase me faz pertencer ao grupo. Só não concordo com o titulo de Dr., ao referir-se, simpaticamente, à minha pessoa. Logo que puder, retire-o.

2Amanhã vamos para Andorra, fortalecer as coxas e arejar os pulmões.

"Um grande abraço, Rui"

_____________

Transcrito por Luis Graça (que aproveita para desejar ao Rui e à Cristina umas retemperadoras férias de Páscoa na neve...)

Hélder Valério disse...

Caros amigos

Isto do tempo (afastamento da data)e da idade (que vai avançando)....

De facto havia uma estrada em construção quando estava em Piche, todas as manhãs os obuses 'batiam a zona' onde os trabalhos se iam retomar, mas certamente que era a de Nova Lamego a Piche que não estava completa.

As minhas desculpas pelo lapso.
Um abraço
Hélder

Anónimo disse...

Li com toda a atenção os comentários que foram feitos. alguns aproximam-se da realidade.Começo por corrobar a informação do SOTNASPA, o individuo a que se refere está certo. Por nós conhecido por CHARLOT. tinha regressado realmente de férias há relativamente poucas dias quando a sorte o traíu " Há uma frase dele que me soa, quando regressou de férias da metrópole: já posso morrer descansado, já vi o meu filho (ou filha, não me recordo bem). Faleceu em 14/06.73, vitima daquela triste emboscada, juntamente com o 1º.cabo David Fernandes Torrão, do Porto, e os Soldados Herminio Esteves Fernandes, da Guarda,
e José Maria dos Santos, de Castelo Branco, este foi mais tarde juntar-se á Companhia em rendição individual, para substituiçaõ de um outro que havia sido evacuado para a metópole,
ainda no IAO.Ao Anonimo que escreveu no dia 25MAR. também tem uma certa razão 14 meses em PCAIUM era de explodir. O Cristina foi para lá ao fim de um ano em PICHE. A Companhia assegurava dois destacamentos: CAMBOR e PCAIUM.Talvez diferente dos tempos em que se revesavam de 3 em 3 meses. Em FEV74, a CCAÇ3546 sediada em Piche, foi transferida para CAMAJABÁ, substituindo um Pelotao de BURUNTUMA e a partir daí o Pelotao do Cristina foi continuando a aguentar na Ponte. Mas com toda a franqueza, passei duas vezes na Ponte uma na ida outra no regresso, mas a imagem que me ficou é aterradora. (CONTINUA)

Anónimo disse...

CONTINUAÇÃO (31MAR10)
Esclarecendo o Helder Valério, a estrada NOVA LAMEGO-PICHE em ABR72, já se encontrava asfaltada, e estava em construção entre PICHE-BURUNTUMA, pela TECNIL, cuja segurança era feita pela CCAÇ3546, e por vezes por outra Companhias que por alí iam passando temporáriamente. Na contradição quanto ao Zé Dinis, essa grande operação esteve mesmo para ser realizada. Só faltava meter o esparguete nos Obuses e puxar os cordeis. Só que uns dias antes do fatidico 14.06.73, o mestre Spinola deslocou-se ao local e não autorizou que tal operação se efectuasse.era para destruir mesmo. Todo o material pesado recolheu no dia seguinte a Piche. E no dia seguinte por retaliação ou seja 14.06.73 surge a nefasta emboscada em que 4 companheiros perdem a vida, e alguns feridos que já não me recordo. Mas o mais caricato é que saiem dois grupos de combate de Piche em auxilio, são também emboscados. É pedido auxilio aéreo, que é prestado, mas acabando por abir fogo sobre o GC que iam em auxilio, que felizmente o fogo aéreo não chegou a atigir as NT. Era assim que as coisas iam funcionando.(Prometo continuar)

Anónimo disse...

conheço um camarada que esteve na ponte antes do Cristina e que só saiu de lá depois do cristina sair. creio que terá sido o camarada que mais tempo lá passou.

artur aurelio harpa barata disse...

Amigo fiquei feliz poro ter encontrado sendo da companhia 3546 e B.C.3883.
Pois eu também sou um antigo combatente, mas o que me leva a escrever é porque um amigo meu dessa companhia faleceu aí na Guiné no dia 14-06-1973 era o Carlos Alberto Graça Gonçalves natural de Lisboa Alfama entre os amigos era o Magerico.
Ele era amigo de infância, quando ele veio passar férias um pouco antes da sua morte tivemos juntos uns dias, pois eu estava em Santa Margarida a tirar o IAO para ir para Angola por isso não pode ir ao seu funeral ela esta no Auto São João no Talhão dos combatentes já lá fui prestar a minha Homenagem, mas o que eu queria saber e se tem alguma foto dele ou se sabe dar o contacto de alguém que tenha.
Já agora a morte dele foi numa operação ou numa coluna.
Atentamente.
Se quiser ver o site feito por min da minha companhia a 3ª 4515/73 aqui vai o link
http://companhiadecacadores4515.blogspot.pt/

artur aurelio harpa barata disse...

Amigo eu sou da infância do falecido vosso colega Carlos Graça ou Charlot eu pedia se me disse-sem onde posso tirar fotos dele
o meu obrigado Artur Barata
arturbarata18@gmail.com