1. Mensagem do nosso camarada José António Viegas (ex-Fur Mil do Pel Caç Nat 54, Guiné, 1966/68), com data de 22 de Dezembro de 2012:
Não podia deixar passar o dia de hoje ao fazer 46 anos do ataque em força a Missirá.
Aqui vai a pequena história.
O Capitão Pires da 1439 querendo juntar o máximo da Companhia para passarem o ultimo Natal juntos, enviou o nosso Pelotão 54 para Missirá, todo o pessoal dizia que íamos passar umas férias, pois aquele destacamento não tinha problemas de ataques há muito.
Instalámo-nos e fizemos o respectivo reconhecimento. No dia 22 recebemos o correio via Bambadinca, com algumas encomendas de Natal e preparávamos o nosso primeiro Natal na guerra.
Depois do jantar, e depois de verificar os postos, fomo-nos deitar. Na nossa palhota dormíamos os três furriéis. Enquanto o sono não vinha íamos falando até que, por volta das 10 horas da noite, começa a entrar pela nossa palhota uma metralha de fogo: explosivas, tracejantes e iluminantes de arma pesada, por sorte o fogo passava todo a um metro acima das nossas camas, foi agarrar nas armas como estavámos, já com a palhota a arder, e tentar organizar a defesa.
Eu fui municiar o meu cabo com a MG para o abrigo e tentar pôr o pessoal a fazer fogo o mais rasteiro possível, o destacamento parecia Roma a arder e a pontaria deles era tão grande que conseguiram meter uma morteirada no bidão do azeite no depósito de géneros. O rebentamento deste parecia fogo de artifício.
No meio da gritaria e dos impropérios de um lado e de outro, ouve-se um grito de agarra-lo á mano pois de certeza que vinham com cubanos.
Depois de quase uma hora de fogo, as morteirada estavam a cair junto ao refeitório onde estava o Unimog debaixo do embondeiro, o soldado condutor da 1439 foge e consegue pôr a viatura a funcionar, que estava com escape livre, para o retirar daquela zona de fogo. Julgo que eles pensaram que vinham reforços e debandaram, foi uma sorte porque as munições não eram muitas, principalmente as de morteiro 60 e bazooka.
Tentou-se a seguir ver se havia feridos, não havendo nada a registar entre os militares, mas acho que na população houve dois mortos e três feridos.
Hipótese de ajuda não tínhamos, nem de Finete, que era o destacamento mais perto, nem de Bambadinca, pois tinham que atravessar o rio. Só aguardando o pessoal do Enchalé.
Logo pelo nascer do dia veio o heli fazer as evacuações, o piloto era o Faísca, moço conhecido do Algarve. Assim que o heli levantou começamos a ouvir metralha, era o pessoal da 1439 e o pessoal do Pelotão 51 que estava a ser emboscado entre Mato Cão e Missirá, o In retirou mas ficou emboscado, era lógico que viria ajuda.
Começámos então a olhar para a realidade, palhotas ardidas e grande destruição, dos nossos pertences só tínhamos a roupa vestida no corpo, o resto era tudo cinza. Guardo a única coisa que encontrei, uma moeda de 10 pesos toda queimada. No reconhecimento que fizemos, encontrámos bastante sangue e uma pistola. Era triste ver o destacamento com tanta destruição.
Com o depósito de géneros completamente destruído, pouco tínhamos para comer, fomos a Bambadinca buscar algumas coisas e tentar arranjar roupa.
Chega o dia de Natal, a comida não era muita, vem o meu cabo Januário e outro cabo Ananias dizer que iam dar uma volta para arranjar carne. Chegada a hora do almoço apresentaram um repasto de carne com arroz de xabéu , que estava uma delicia, findo o almoço o cabo africano Ananias chamou-me à parte e deu-me as caveiras dos macacos que tínhamos acabado de comer. Guardei uma como talismã que perdi quando vim da Africa do Sul em 1978.
Vou tentar meter algumas fotos de ataque .
Voltarei a falar mais tarde sobre Missirá para rebater algumas coisas do romance do Beja Santos sobre nós.
UM SANTO NATAL
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 5 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10623: Efemérides (112): Cerimónias do 94.º aniversário do Dia do Armistício, 89.º aniversário do Dia da Liga dos Combatentes e 38.º aniversário do Fim da Guerra Colonial, e convívio do S. Martinho do Combatente, dia 17 de Novembro de 2012 em Matosinhos (Carlos Vinhal)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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1 comentário:
A mensagem está muito explicita, mas as fotos deviam estar legendadas.
Um alfa bravo
Colaço.
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