segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Guiné 63/74 - P12669: Notas de leitura (559): "Guerra Colonial - Uma História por contar", edição da Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, Externato Infante D. Henrique (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 30 de Agosto de 2013:

Queridos amigos,
É de todos sabido que o silêncio ou indiferença perante uma patranha de contornos revoltantes é manifestação de cobardia ou de espírito acomodatício a quem conhece o fundo e a forma da realidade infamada.
O assunto que vos ponho à reflexão é de como agir e denunciar uma declaração ignóbil, daquelas que serve de rastilho para olhar com preconceito o que foi a vida de um combatente em África.
A indignação, por si só, não leva a ponto nenhum. O que talvez fosse útil debater é como agir perante uma barbaridade como aquela que aqui vos conto.

Um abraço do
Mário


Guerra colonial: dissociar o fidedigno da patranha

Beja Santos

A Biblioteca da Liga dos Combatentes e a sua entusiasta responsável, a Teresa Almeida, é um local de grandes surpresas. Como esta publicação editada, em 1992, pela Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão.

Na época, uma das linhas de modernidade da reforma educativa passava pelos projetos didático-pedagógicos que contribuíssem para cimentar uma relação mais estreita entre a escola e a comunidade.
Como se pode ler na apresentação do Presidente da Câmara:
“A memória de uma comunidade não pode ser apagada. Tem de ser permanentemente redescoberta para que o futuro do progresso e bem-estar que desejamos esteja isento de traumas, dramas… e tragédias”.
O trabalho foi desenvolvido por alunos de Antropologia Cultural do Externato Infante D. Henrique.
O professor diretamente envolvido esclarece:
“Muitos dos alunos são filhos de ex-combatentes que viveram e conheceram situações particulares de verdadeiro drama, são descortinarem com clareza as razões deste corredor cinzento da nossa História (…) Este trabalho traduz uma perspetiva vivida pelos protagonistas e figurantes de um acontecimento que marcou a nossa memória coletiva recente”.

Foram inquiridos ex-combatentes, entregaram aos alunos fotografias das suas vivências e comentaram-nas. Escolhi exclusivamente as três imagens que se referem explicitamente à Guiné.

A primeira tem a ver com a ida de um contingente que ia construir um novo quartel em S. João, em frente a Bolama. No decurso de uma flagelação, um soldado deixou cair o capacete, na ânsia do apanhar desceu da viatura e uma granada de mão feriu-o gravemente da cintura para baixo.


A segunda refere o ataque de 17 de Outubro de 1968 à base de Bissalanca. O inquirido refere que se encontrava no centro de mensagens do quartel-general. Chegara uma mensagem zulu da região de Bafatá, estava ali a decorrer um grande ataque inimigo, foi necessário ir à base de Bissalanca. Quando aqui se dirigiu, assistiu ao forte ataque à base aérea. Refere que houve sete vítimas mortais, do nosso lado, que houve feridos graves.



A terceira imagem reproduz-se na íntegra, tal é o desconchavo do que ali se diz. O inquirido refere que atacaram uma base inimiga junto ao Senegal e que despacharam milhares de inimigos. Como é evidente, num trabalho desta natureza um professor não pode confrontar a verdade das afirmações, se se ia fazer um quartel em S. João, se houve um ataque à base aérea de Bissalanca. Mas, creio eu, não pode ficar insensível à afirmação de “despachámos milhares de inimigos”, coisa que nunca aconteceu em nenhum teatro de operações nem podia acontecer, atendendo à natureza daquela guerra. Vamos supor que ninguém deu pela barbaridade ou aceitou a informação como plausível. É de questionar como tal declaração é percecionada pela opinião pública e os preconceitos que pode suscitar a patranha ou farronca de quem, entrevistado por gente inocente, se julga à vontade para proferir pesporrência. Vamos admitir que se trata de um caso isolado. Mas ninguém leu esta brochura que foi distribuída por uma autarquia, ninguém reagiu, ninguém se consternou com a gravidade da declaração ofensiva?



Assunto que nos devia fazer pensar, tanto quanto me parece.
A quem de direito.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 31 de Janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12659: Notas de leitura (558): "Ideia Geral do Valor Estratégico do Conjunto Guiné-Cabo Verde e da Ilha de São Tomé", por Luís Maria da Câmara Pina (Mário Beja Santos)

22 comentários:

Carlos Vinhal disse...

Fiz algumas pesquisas na internete, inclusive na página dos Especialistas da BA12, encontrando apenas leves referências a um ataque à Base Aérea em 19 de Fevereiro de 1968. Não encontrei registos de vítimas, o que não quer dizer que não houvesse, mas por não serem do Exército não fazem parte Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África, editada pelo Estado-Maior.
Que eu tenha conhecimento, houve mais dois ataques a Bissau, um em 9 de Junho de 1971 e outro em Março de 1972.
Agradece-se toda e qualquer colaboração para completo esclarecimento do ataque a Bissalanca, ocorrido em 19 de Fevereiro de 1968. Quantos mortos e de que Arma.
Carlos Vinhal
Co-editor

JD disse...

Aqui temos um bom exemplo de irresponsabilidade. Um determinado presidente de uma Câmara Municipal decide patrocinar um folheto informativo sobre "estórias" da guerra colonial, para memória colectiva dos feitos portugueses.
Um professor, sabe-se lá com que formação, recolhe os testemunhos que os pais dos alunos lhe apresentaram, sem cuidar de confirmar os relatos, e os pais das crianças, quais heróis de bancada, vão de se candidatar à admiração pública com relatos que dificilmente traduzem realidades (com excepção do acidente com a granada), ou são mentirosos na dimensão relatada (como o do ataque à base IN, já que o do relato da entrega da mensagem noutra base aérea revela alguma baralhação).
Isto é do piorio que pode acontecer a uma sociedade, e questiono, se os relatos foram para traumatizar as criancinhas? as mães e mulheres de antigos combatentes? ou para suavizar a imagem de um alucinado, ou prepotente autarca? Sobre o professor, nossa senhora, deve entrar rapidamente em retiro espiritual pelo mal que ajuda a causar à Nação.
Abraços fraternos
JD

José Marcelino Martins disse...

Muito provavelmente, este "autor", inspirou-se nas histórias que o Correio da Manhã deu ou dá à estampa (em pelo menos deixei de ler), na revista domingueira.

Não sei se ainda continua a publicar. Eu deixei de ler porque tinha de, no caso da Guiné, corrigir muitas das "verdades adquiridas" e publicadas.

Conto apenas um caso:

O General Spinola deslocou-se, em heli, a um aquartelamento no interior para, no dia seguinre a uma operação, condecorar com a Medalha da Cruz de Guerra, um militar que se havia notabilizado na operação do dia anterior.

Este episódio passou-se em 1967 quando o ComChefe ainda não tinha sido nomeado para a Guiné, o que aonteceu em Abril ou Maio 1968.

Anónimo disse...

Se não fosse esta estória existir numa biblioteca onde seria suposto encontrar informação fidedigna, dava vontade de rir...
-Junto ao Senegal, num quartel general, um pelotão da nossa tropa despachou milhares de inimigos.

António Eduardo Ferreira

Fernando Gouveia disse...

Continuam a dar crédito a irresponsáveis da escrita.
Nessas datas não houve ataques a Bissalanca e muito menos à "minha" Bafata.

Anónimo disse...

Olá Camaradas
Agora é que é caso para dizer "milhares de mortos" feitos por um só pelotão...
F***-se! Caganda vitória!
Desculpem, mas passei-me dos carretos.
Um Ab.
António J. P. Costa

Anónimo disse...

Póis é!!!

Há heróis do caraças!!
Que seja pelas alminhas do purgatório!
Muitas destas e... está feita HISTÓRIA!
Alberto Branquinho

Anónimo disse...

Quando os gajos do IN souberam que eu tinha chegado à Guiné..ficaram todos "borrados".

Uma vez com um só tiro de obus "limpei" 4000 "turras", 30 gazelas,50 macacos, 3 rinocerontes e uma vaca que andava a monte,julgo que sofria de melancolia.

Levei uma "porrada" por tal feito..e fui avisado para não repetir a gracinha porque assim não só acabava com a guerra em três tempos como dizimava a fauna autóctone.

O que escrevi merece a mesma credibilidade da "história por contar"..

O mundo está cheio de "mentirosos compulsivos" e imbecis que infelizmente existem entre ex-combatentes ou pseudo-combatentes e normalmente são estes que dão esta triste imagem.

Lamentável.

C.Martins

Luís Graça disse...

1. Com a devida vénia reproduz-se o texto introdutório sobre o "Museu da Guerra Colonial", inserida na respetiva página, a qual integra o portal do Munícipio de Vila Nova de Famalicão:

(...) A história do Museu da Guerra Colonial começou a desenhar-se durante o ano lectivo de 1989/90, quando trinta alunos oriundos de várias freguesias dos concelhos de Vila Nova de Famalicão, Barcelos e Braga participaram num projecto pedagógico-didático conjunto a que chamaram "Guerra Colonial, uma história por contar".
Através da metodologia da história contada oralmente, os alunos recolheram o espólio dos combatentes das suas áreas de residência. Surgiram então vários documentos como processos de morte e de ferido, correspondência, [relatórios] de companhia, diários pessoais, diários de acção social e psicológica, relatos e processos confidenciais, objectos de arte, fotografias, bibliografias, objectos religiosos, fardamento e armamento, enfim um manancial de fontes que permitiu, entre outras coisas, organizar uma exposição e nela reconstruir o "itinerário" do combatente português na guerra colonial.
Em 1992, iniciou-se um trabalho de colaboração com a Delegação da Associação dos Deficientes das Forças Armadas de Vila Nova de Famalicão, em que foram efectuados novos estudos regionais com base nos arquivos e membros desta instituição, bem como foi ampliada a exposição com a integração de novos estudos e materiais. Como resultado desta colaboração, a exposição percorreu vários eventos culturais e várias localidades.
Finalmente, em Maio de 1998, foi celebrado um protocolo de colaboração entre a Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, Delegação da ADFA de Famalicão e Externato D. Henrique de Ruilhe de Braga, que serviu de acto solene e formal para a criação do Museu da Guerra Colonial.
O Museu rege-se pela recolha, preservação e divulgação de fontes e estudos, reformulação técnica da exposição permanente, constituição de um centro documental e o alargamento de novos estudos na região. (...)

http://www.vilanovadefamalicao.org/_museu_da_guerra_colonial

(Continua)

Luís Graça disse...

(Continuação)

2. Meu caro Beja Santos:

Cito a tua nota de leitura (que apreciei e mais uma vez agradeço):

(...) “O terceiro inquirido refere que atacaram uma base inimiga junto ao Senegal e que despacharam milhares de inimigos. Como é evidente, num trabalho desta natureza um professor não pode confrontar a verdade das afirmações, se se ia fazer um quartel em S. João, se houve um ataque à base aérea de Bissalanca. Mas, creio eu, não pode ficar insensível à afirmação de “despachámos milhares de inimigos”, coisa que nunca aconteceu em nenhum teatro de operações nem podia acontecer, atendendo à natureza daquela guerra. Vamos supor que ninguém deu pela barbaridade ou aceitou a informação como plausível. É de questionar como tal declaração é percecionada pela opinião pública e os preconceitos que pode suscitar a patranha ou farronca de quem, entrevistado por gente inocente, se julga à vontade para proferir pesporrência. Vamos admitir que se trata de um caso isolado. Mas ninguém leu esta brochura que foi distribuída por uma autarquia, ninguém reagiu, ninguém se consternou com a gravidade da declaração ofensiva?” (...)


Mário, meu amigo e camarada do leste: tens toda a razão. A Guiné e todos nós, que por lá passámos, ficamos mal na fotografia se algum dos nossos filhos, netos e bisnetos um dia folhear o livrinho (48 páginas, ilustrado com fotografias), editado pela Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão…

Dos três depoimentos sobre a Guiné, o terceiro, acima reproduzido, é de fato o mais hilariante…

Tens razão, quando dizes que já não basta indignarmo-nos. Eu sei que ainda estamos, felizmente, vivos e capazes de nos indignarmo-nos. E podemos e devemos fazê-lo aqui, no nosso blogue, o elementar e saudável exercício do direito à indignação

Mas a indignação não chega, como temos visto e sentido nestes últimos anos, tantas ou tão poucas são as tropelias e sacanices a que nós, os combatentes, temos sido sujeitos, desde a demagogia das promessas vãs à tentativa de instrumentalização das associações de veteranos, à discriminação dos combatentes no 10 de junho...

As muitas centenas de combatentes, dos 3 ramos das Forças Armadas Portuguesas, que por aqui já passaram, no blogue, e que viram publicadas as suas fotografias (dezenas de milhares) e os seus textos (já perto de 12700) no espaço de menos de 10 anos, têm todas as razões para se sentirem insultados e indignados pela inqualificável aldradice e pela miserável fanfarronice de um suposto combatente de Vila Nova de Famalicão (ou de um concelho vizinho, Braga, Barcelos…) que, no TO da Guiné, "chegou, viu e venceu", como se aquela guerra fosse uma alegre "coboiada" em que os sete magníficos trucidam os maus da fita, os índios, aos milhares...

Às vezes a ânsia de protagonismo de alguns (, aliada à alarve ignorância de outros) pode levar a resultados, infelizes, como estes... É uma pena que esta nódoa, numa publicação como a "Guerra Colonial: uma história por contar", acabe por manchar o bom nome e a boa imagem do Externato Infante D. Henrique e do seu corpo docente, bem como do município de Vila Nova de Famalicão e dos seus eleitos, sem esquecer a delegação local da ADFA – Associação dos Deficientes das Forças Armadas, três entidades que estão na origem deste “Museu da Guerra Colonial”.

(Continua)

Luís Graça disse...

(Continuação)

De acordo com a Porbase – Base Nacional de Dados Bibliográficos, a brochura que tu recenseastes, é um obscuro opúsculo, condenado ao pó das gavetas, não!... É uma publicação formal, com depósito legal na Biblioteca Nacional, onde foi catalogada da seguinte maneira:

Título: Guerra colonial: uma história por contar... / Org. Externato Infante D. Henrique
Autor(es): Externato Infante Dom Henrique, co-autor
Publicação: Vila Nova de Famalicão : Câmara Municipal, 1992
Descr. Física: 48 p. : il. ; 30 cm
Dep. Legal: PT -- 61549/92. CDU: 355.48 (6=690)
355.48(547).

Uma louvável iniciativa didático-pedagógica deu origem a um livro, de múltiplos autores, em que falhou redondamente o papel do editor literário (presumivelmente, o professor da disciplina de Antropologia Cultural do Externato).

Regras tão elementares como o bom senso, o bom gosto, o uso do contraditório, a confirmação da veracidade dos factos (topónimos, datas, unidades militares, números de baixas, etc.), saturação da informação, triangulação das fontes... foram puramente e simplesmente esquecidas ou escamoteadas....

Mário: eu para já sugiro que exponham aqui os nossos pontos de vista... Afinal, somos parte intereesada nesta "história por contar"...

Não sei se valerá a pena publicar uma "carta aberta" ao representante da autarquia, de contestação e de protesto, exigindo aos autores (ou editor literário) que façam uma adenda… “pedagógico.didática” ao tal livrinho...

De qualquer modo, por favor, respeitem, os mortos e os vivos… de um lado e do outro da guerra!

Carlos Pinheiro disse...

Acho que estas faltas de cuidado devem ser comentadas e desmontadas as “originais “ invenções de alguém. Por isso aqui estou a dar a minha melhor colaboração para o esclarecimento da verdade dos factos
Refiro-me somente ao caso do ataque à BA 12 Bissalanca que, segundo o autor desconhecido, mas que disse trabalhar no Centro de Mensagens do Q.G., disse a determinada altura que dado o ataque à Base de Bissalanca se dirigiu a outra Base para prestarem o apoio aéreo que Bafatá pedia. Mas que outra Base? Onde? Por amor de Deus!
A publicação de livros e muito especialmente livros publicados com dinheiros públicos, como foi o caso em análise, deveriam, sempre, pautar-se pela verdade dos acontecimentos. Não foi o caso e foi pena.
Carlos Pinheiro

https://cart3494guine.blogspot.com/ disse...

Para mim este trabalho publicado em Famalicão, é de facto muito infeliz. O OP de MSG contou algo que lhe contaram, o chamado jornal de caserna é o "diz que disse", por outro lado não há, em TRMS, msg "muito urgentes" há 4 tipos de msg as Relampago (Z) Imediato (O) urgente (P) e as Rotina (R)para além doutros procedimentos.

Sousa de Castro

Anónimo disse...

Caros amigos e camarada,
Acabei de enviar correio electrónco ao Sr. Presdidente da Câmara de Vila Nova deFamalicão.
Julgo que é o mínimo que posso fazer nas circunstâncias. Mas há mais formas de de demonstrarmos o nosso desagrado. Neste e em tantos outros casos de lesa verdade.


"Senhor Paulo Cunha,
Presidente da Câmara Municipal de
Vila Nova de Famalicão

Sr. Presidente,

Abaixo encontrará as devidas hiperligações para o assunto em epígrafe. A verdade dos factos tem que ser resposta. Compete-lhe a si, como Presidente da Edilidade, tomar os devidos passos para que assim seja.

Os Famalicenses e toda uma sacrificada geração que serviu na Guerra do Ultramar merecem que a verdade dos factos, nada mais que isso, tenha o seu lugar na divulgação da história.

Os jovens alunos de hoje, homens de amanhã, não devem ser confrontados com o facto da sua Câmara Municipal e a sua escola lhes terem mentido. Porque é disso que se trata, na medida em que a responsabilidade da publicação desta patranha é da sua responsabilidade.

Sem outro assunto, apresento-lhe cumprimentos.

José A Câmara
Furriel Mil
CCaç3327/BII17
Comissão: Guiné, 1971/1973

Mario Tito disse...

Incrível. Se tal sucedeu, foi tudo camuflado porque, eu, como membro da BA12 – embora destacado em Bissau na Messe de Oficiais, lidando diariamente com muitos oficiais, nunca ninguém me disse que tinha havido mortos. Incluso, recordo ter participado numa parada de informação, onde militares como eu, tentamos que nos dessem armas, por se acaso as coisas piorassem. Foi-nos negado peremptoriamente e que não devíamos de nos assustar porque nada de grave tinha sucedido.

Concerteza que a mesma “patranha” poderia ter sido dita quando uns quantos misseis caíram em Bissau, - já eu na vida civil - lá para os lados dos depósitos da Sacor. Estava eu a jantar no Solar do 10 porque, apesar de eu trabalhar no Pelicano, gostava de visitar os meus “rivais”. Questão de saber conviver com o inimigo.

Creio que, no minimo, uma irresponsabilidade de quem dewconhece por completo a realidade, por muito dura que possa ter sido. Abraco a todos.

Luís Paiva disse...

Desta forma se subverte o rigor histórico. Dentro de alguns anos, quando a totalidade dos ex-combatentes já não pertencer ao mundo dos vivos, os testemunhos que deixarmos poderão confundir quem os lê! Tornar-se-á na altura mais complexo separar "o trigo do joio" dado que nessa altura as fontes estarão exclusivamente reduzidas a escrito e/ou material vídeo ou audio, cuja credibilidade poderá ser posta em causa em muitos casos. Daí que seja útil, e até necessário, em nome da verdade desmontar a fanfarronice de que o mundo está aliás cheio. Os verdadeiros heróis -que sem dúvida os houve- não precisam de se autopromover e são na sua maioria reconhecidos pelos seus pares, muitas vezes através do seu silêncio ou genuína humildade. Este é um dos motivos pelos quais não se deve acreditar em tudo o que se lê! As megalomanias quixotescas, valem pelo que valem e por quem as produz ou proclama! Sempre assim foi, não apenas em relação aos conflitos armados, mas em relação a tudo na vida. A herança escrita que nos foi deixada também pelos nossos antepassados sobre os diversos acontecimentos históricos pelos quais a humanidade passou também deve ser pois filtrada sendo primordial ter um conhecimento mínimo dos autores que a veiculam para o domínio público. Quando o assunto é deste jaez -guerra- seja de natureza mais limitada seja de âmbito mais amplo, há que redobrar cautelas e neste caso a prudência é indubitàvelmente uma virtude que de alguma forma pode ou deve ser subestimada, seja por quem escreve seja por quem tem a responsabilidade pela sua difusão. Infelizmente hoje tornou-se um lugar comum a distorção da verdade (deliberada ou não), a manipulação, a mentira, o exagero do relato, sem que os seus autores pareçam perceber como isto se pode revelar de uma extrema perversidade. "In extremis" poderá mesmo "virar-se o feitiço contra o feiticeiro". Quando existe uma entidade pública envolvida num processo desta natureza, a situação assume contornos de muito maior gravidade, aínda que não deva ser minimizada a responsabilidade dos diversos intervenientes, desde logo o(s), autore(s) mas também, no caso vertente, o docente e, em instância última, a própria autarquia.

armando pires disse...

O que eu ia para comentar, já toda a gente comentou.
O que eu ia sugerir que, em nome do nosso blog, o Luís Graça fizesse, o camarada José A Câmara já fez.
Assim sendo, quero apenas emprestar uma nota à nota à foto que "ilustra" aquele desvario dos "milhares que foram despachados".
Aquele documento tem tudo para que se possa garantir ser uma fotografia do inicio da luta armada, em Angola, uma foto mostrando a carnificina levada a cabo pela FNLA no norte daquela antiga colónia, nos alvores do ano de 1961.
E mais não digo.
armando pires

Antº Rosinha disse...

De uma maneira ou outra serão contadas as mentiras necessárias e muitas meias verdades à mistura.

Mesmo muitos classificados historiadores e intelectuais não contam a realidade do que se passou desde o dia 4 de Fevereiro de 1961.

É tudo intencional.



Anónimo disse...

Quero deixar aqui os meus parabéns ao Historiador com tão bela imaginação para este começo de História.
NOITE DE TERROR
17 de Outubro de 1968 NOITE SANGRENTA.
Depois de ler o que a seguir estava escrito, no dia de hoje, pensei estar louco ou a sofrer de amnésia por ter batido com a cabeça em algum candeeiro mal iluminado.
Vi-me forçado a contactar telefonicamente alguns camaradas do meu tempo, que estavam na mesma Unidade que eu.
Nessa noite de 17 de Outubro de 1968, não recebemos mortos nem feridos, sendo por obrigação a unidade prioritária para os receber. A 8 Km de distância devíamos ser prevenidos e estar de prevenção.
Para onde foram os mortos e os feridos.
Talvez tenha sido uma tentativa, que não obteve os seus resultados.

António Paiva

Carlos Vinhal disse...

Mensagem do nosso camarada Orlando Silva de Ovar:

Estimado amigo e ex-camarada de armas Luís Graça,
Sou um regular frequentador do seu blog, o qual considero de grande importância.
Cheguei à Guiné no dia 7 de Maio de 1968, 12 dias antes de lá chegar o lendário Brigadeiro Spínola. Desenvolvi a actividade de mecânico de armas ligeiras na região de Teixeira Pinto, integrado na CCS do Batalhão de Caçadores 2845.
Recordo que todas as segundas-feiras e ao longo da minha Comissão de Serviço, cinco ou dez minutos antes das 13 horas, corria do refeitório para os meus parcos aposentos onde tinha um receptor de rádio da marca National Panasonic, a esferográfica e agendas, com a intenção de escutar a Rádio Bissau que, logo após o toque de finados, relatava as actividades da nossa tropa - assim como os ataques desencadeados por elementos do PAIGC às nossas colunas e aquartelamentos. O Boletim Informativo difundido via rádio a partir de Bissau, demorava menos de 5 minutos.
No meu diário não consta qualquer relato, referente ao alegado ataque ocorrido em 17 de Outubro de 1968 ao aeroporto de Bissalanca. Igualmente o livro de José Brandão, «Cronologia da Guerra Colonial», também nada diz. Houve sim, algumas bojardas atiradas por elementos da guerrilha sobre o referido aeroporto, no dia 19 de Fevereiro de 1968. O ataque foi conduzido por André Gomes, destacado elemento do PAIGC. O que vem no tal livro publicado pela Câmara de Famalicão, é pois uma completa atoarda sem pés nem cabeça.
Um abraço com saúde.
Orlando Silva
Ovar

Hélder Valério disse...

Caros camaradas

Apesar de tardio, também quero manifestar o meu 'direito á indignação'.

Como escreveu o Armando Pires, boa parte do que queria dizer já está plasmado no conjunto dos comentários, pelo que vou tentar não ser repetitivo.

Aquilo que o Beja Santos nos 'ofertou' deve também ser 'visto' por outro ângulo.

Por isso começo por saudar a iniciativa de se fazer esse trabalho. O facto em si é positivo.
Não é verdade que constantemente se ouvem e vêm escritos lamentos sobre a 'esponja do esquecimento' sobre esses tempos por nós vividos? Não é verdade que consideramos que uns, por uns motivos e outros, por outros motivos, parece que fizeram cair uma cortina sobre a nossa 'passagem por África'.
Portanto, o esforço de um professor no sentido de recolher depoimentos de intervenientes nas guerras de África, através dos seus filhos é, para mim, altamente meritório.
Reparem, de uma só vez, era suposto os 'antigos combatentes' falarem das suas experiências e, ao mesmo tempo, os seus familiares tomariam conhecimento disso, quem sabe quantos pela primeira vez!
Depois, há a iniciativa de transmitir o resultado dessa iniciativa, dessa recolha, a toda a comunidade que queira conhecê-lo por intermédio do registo em livro.
Onde está a falha?
Logo de caras no facto que parece que ninguém se deu ao cuidado de 'validar' os depoimentos....
Descuido? Impreparação? Amadorismo? Boa fé?

Recuso aceitar como boas as acusações insinuadas que já li de que 'foi de propósito', para denegrir a 'imagem dos combatentes'. Quando é que nos deixamos de teorias da conspiração? Tanto quanto li, o "Museu", de que o livro é parte integrante, não se resume só ao livro, tem muitas mais coisas.

O que acima escrevi não tem nenhuma intenção de 'conter' as indignações. Apenas e tão só tentar manter as coisas nas dimensões que devem ter.

Agora, as minhas perplexidades.
Qualquer pessoa que tivesse estado na Guiné (e aqui só falamos disso porque é o que conhecemos, admitindo eu que uma leitura sobre 'relatos' de outros episódios passados em outros TO possa também conter afirmações falsas, fantasiosas, deturpadas, etc.) desmonta os relatos que o Mário nos deu a ler.
Assim de repente, consigo 'ver' naquela historieta da ida ao Senegal uma 'recriação' das operações, mais que badaladas, para aliviar (e resolver) o assédio a Guidaje. O homem pegou numa séria de coisas, misturou-as, reformulou-as, deu-lhe uma outra localização no tempo e, já está, um relato dramático, 'à maneira'.

Enfim, como refere o Beja Santos, pode-se aceitar que um professor não possa confrontar a verdade das afirmações. Mas... tentou fazê-lo, como devia? Era até uma boa prática para alunos de "antropologia cultural", já que assim complementavam a actividade de 'recolha' com a confrontação da 'fidelidade das fontes'...

Quanto ao resto, os amigos foram dizendo (e fazendo)tudo.

Abraços
Hélder S.

Mário Vasconcelos disse...

Que ninguém se esqueça do que fez mas, principalmente, nunca se envaideça, para além do admissível.
Estórias conduzem à história, se fundamentadas na verdade, e, se no mínimo forem criveis. Parece-me correcta a reposição da verdade e, o blogue, tem membros com suficiente traquejo para a solicitar.