Quadragésimo sexto episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66.
Foi por acaso, estávamos no aeroporto da cidade de Orlando,
no estado da Florida, com destino a Phoenix, no estado do
Arizona, que seria o nosso local de início de uma aventura pelo
deserto do Arizona, pois queríamos ver ao vivo aqueles lugares
que nos encantavam nas
películas a “preto e branco”,
de “índios e cowboys”,
algumas vistas lá em Mansoa,
principalmente ao sábado,
quando o furriel Honório
trazia na avioneta do correio
mais uma bobine com um filme
novo, que era projectado naquela
noite em Mansoa, que eu
considerava um verdadeiro
“posto avançado”, pois era a
partir do nosso aquartelamento que começava a
“verdadeira guerra”, o
verdadeiro “faroeste”, lá para as bandas de Mansabá, Bissorã, Olossato, Bafatá, todos aqueles
aquartelamentos do interior, para onde a bobine do filme seguiria depois para entreter os nossos
companheiros, que já fartos
de tiros, iam ouvir e ver
mais tiros.
Como disse,
foi por acaso, pois não
havia lugares naquele vôo,
para a cidade de Phoenix. A empregada de balcão
muito amável, com aquele
sorriso que vende uma
qualquer marca de “pasta de dentes” nos
diz:
- Não há para Phoenix,
mas há lugares para Tucson,
que fica um pouco a sul, e o
avião sai daqui a trinta minutos.
Aproveitámos e
seguimos para Tucson,
cidade de fronteira,
que dizem que se fundou
por volta do ano de
1775, com o nome de
“Pueblo Viejo” (Povo
Antigo) devido a seu
antigo forte que então delineava
as fronteiras e se
localiza na parte sul
do estado do Arizona,
numa zona conhecida por
Deserto de Sonora. Fica
num vale com cerca de 1300 quilómetros quadrados e está rodeada
por cinco cordilheiras montanhosas, que se aproximam dos 2700
metros de altitude.
Para nós, pois nesta idade o tempo até é um pouco difícil de
passar, pouca diferença fazia, pois o nosso destino era o sul do
estado do Arizona, de onde depois de alugar um veículo automóvel
económico, seguiríamos a deambular pelas pradarias do centro e
norte do Arizona, talvez até ao Parque Nacional do Grand Canyon
ou outras paragens.
Já no pequeno aeroporto de Tucson, logo verificámos que
havia muita publicidade ao lugar de Tombstone, sim o tal
Tombstone dos filmes de cowboys e índios de Hollywood,
protagonizados por aqueles actores, que quase todos nós, naquela
época de jovens
conhecíamos, o tal
lugar das histórias
de fronteira, onde os
bandidos roubavam no
México e fugiam para
os USA, ou vice-versa,
o célebre “O.
K. Corral” e toda a
espécie de aventuras
em que o actor
principal carregava
duas grandes
pistolas, era o mais
rápido no gatilho,
vencia sempre e
depois de matar dois
ou três “foras-da-lei”, que podiam ser “gringos” ou “amigos”,
depois ficava naquela indecisão entre a rapariga e o cavalo, que normalmente passava a mão pela cabeça do cavalo, acariciando-o,
então de seguida agarrava a rapariga pela cintura, que normalmente
era loira, encostava-a ao seu corpo, pregando-lhe um grande
beijo.
Ora nós, que quando jovens apreciávamos aquelas aventuras,
tanto no cinema a preto e branco, como nos livros das histórias
de banda desenhada que o
Carlos nos emprestava. O Carlos era o filho do
Santos dos Correios que tinha vindo dos
lados de Leiria e até
diziam que era “Bufo”,
pois era ele que fazia
a revisão do jornal
que se publicava em
Águeda, e usava uns
lápis com cores azul
ou vermelho, que o
Carlos lhe roubava para fazermos desenhos a cores, depois de toda a classe
ter “cantado” a tabuada.
Continuando, estando tão perto, não perdemos a oportunidade,
abalámos na estrada número 10, depois numa estrada secundária, e
ao fim de mais ou menos uma hora de viajem, deparámos com uma
placa de sinalização que dizia: “Tombstone”.
Tombstone é uma histórica cidade
do antigo oeste americano, situada no
distrito de “Cochise”, cidade de
fronteira, de cowboys, onde chegavam
diligências com todo o tipo de
aventureiros. Por volta de 1890,
durante a prospecção de prata das
diversas minas que havia em redor,
chegou a ter 110 “saloons”, 14 salões
de jogo, dezenas de bordéis com
raparigas oriundas de diversas partes
dos USA e até do oriente, que
chegavam aos USA através do porto de São Francisco. Chegou a
ter um dos famosos teatros de fronteira, que era o “Bird Cage
Theatre”, que era frequentado tanto por cowboys como por
mineiros.
Foi a esta cidade de fronteira, por volta do ano de 1880,
que chegaram os famosos irmãos Earp, que era o Virgil, o Wyatt,
o Morgan e o Warren, que logo entraram em conflito com alguns
cowboys residentes em Tombstone, que deu lugar ao célebre
“Gunfight at the O. K. Corral”, que foi um dos mais famosos
duelos entre cowboys do
oeste americano, que
Hollywood memorizou
em diversas películas
que foram filmadas
neste local.
Tem diversas
atracções, e locais
para se apreciar como
“Boothill Cemitério”,
algumas minas de
prata, o “O. K.
Corral”, onde fazem um
divertimento com muitos
tiros e lutas, alguns sallons, como eram na época, diligências
que dão a volta à área, e se explica a história desta cidade de
fronteira.
Depois de termos sido por algum tempo, John Wayne, Gary
Cooper ou Kirk Douglas, seguimos para norte, seguindo a rota que
antes tínhamos traçado, através das padrarias do Arizona, onde o
terreno é seco, sem vegetação, embora a terra seja vermelha, tal
como lá, na nossa então província da Guiné.
Tony Borie, Fevereiro de 2014.
____________
Nota do editor
Último poste da série de 22 de Fevereiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12760: Bom ou mau tempo na bolanha (45): Combatentes até ao fim (Tony Borié)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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1 comentário:
Olá Tony!
Continuas a dar-nos retratos da América.
Neste caso referes-te a locais que o pessoal "das nossas idades" viram no cinema ou ouviram falar.
Fui um tipo afortunado. Vivia numa terra, Vila Franca, que tinha cinema. Tive a sorte de uma senhora que era minha vizinha e arrumadora no cinema me adoptar como 'sobrinho' de modo que entre os meus doze e os dezasseis anos foram raros os filmes 'para maiores de 12' que falhei. Acho que vi todas as coboiadas.
Do que contas, 110 "saloons", 14 salões de jogo e dezenas de bordéis, revelam a importância da povoação e também das potencialidades de desordem que tais "instituições" podiam gerar.
Como de costume, consegues fazer sempre a ligação entre o que vês e as tuas memórias guineenses.
Abraço
Hélder S.
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