sábado, 15 de novembro de 2014

Guiiné 63/74 - P13898: História do BART 3873 (Bambadinca, 1972/74) (António Duarte): Parte XVI: maio de 1973: o IN recruta coercivamente mancebos nas tabancas sob seu controlo (Poindom, Ponta Varela, Ponta Luís Dias e Ponta do Inglês): um dos recrutas era informador das NT


Foto nº 1 > "Algumas centenas de metros mais abaixo o Corubal enfia-se no Geba (...). A vista é extasiante, o que mais perturba o Tangomau é imaginar que se viveu naquele inferno e com aquele panorama edénico, pelo menos o que se avista em direcção a Quinara, a escassos quilómetros. "


Foto nº 2 > "A vista é extasiante, o que mais perturba o Tangomau é imaginar que se viveu naquele inferno e com aquele panorama edénico, pelo menos o que se avista em direcção a Quinara, a escassos quilómetros. " (...)

Foto nº 3 >  "Pouco resta da casa de Inglês Lopes, ao que parece era este o dono da Ponta (... ) Entre 1964 e 1966, a qui esteve um pelotão destacado da companhia do Xime, mais um pelotão de milícias. (...) O destacamento vinha até junto à água, havia um pontão para receber as embarcações, tudo desapareceu".

[Nota de LG:   antigo embaixador em Lisboa da República da Guiné-Bissau, Constantino Lopes, ex-Combatente da Liberdade da Pátria, que esteve preso no Tarrafal, de 1962 a 1969, é hoje o único herdeiro e proprietário da Ponta do Inglês, exploração agrícola, de 50 hectares; o seu pai, Luís Lopes, tinha por alcunha o Inglês; informação que me foi dada pelo próprio Constantino Lopes em 12/11/2008, no Museu da Farmácia, no lançamento do livro do Beja Santos, "O Tigre Vadio"].


Foto nº 4 > "Gã Garneis [ou Gã Garnes, Ponta do Inglês], fixa-se a legenda, estamos no centro de um antigo quartel, apresentam-se pessoas, o Tangomau conversa com Jubalo Jau, que fora prisioneiro na luta, capturado numa operação entre o Buruntoni e a Ponta do Inglês" (...



Foto nº 5 > "É nisto que se faz a aproximação e se vêem as marcas das balas, sabe-se lá se de rajadas ou de tiro-a-tiro. O que interessa é que ficaram lá, entre esculturas. É impressionante, os próprios guias dizem que a população aqui vem regularmente relembrar o que faz uma guerra, ver as marcas que a natureza não pode absorver, as árvores não gritam, tornam-se esculturas vivas, memoriais de sofrimentos ignorados. Se os habitantes de cá respeitam estes pavores da guerra, o que é que nos falta para iludirmos que devemos alguma homenagem a quem tanto aqui penou, mesmo por escassos anos? " (...)


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xime > Gã Garnes [ou Ponta do Inglês] > Novembro de 2010 >  Viagem de Mário Beja Santos (Op Tangomau) (*)



Fotos: © Beja Santos (2011). Todos os direitos reservados [Edição: LG]


1. Continuação da publicação da História do 
António Duarte
BART 3873 (que esteve colocado na zona leste, 
no Setor L1, Bambadinca, 1972/74), a partir
de cópia digitalizada da História da Unidade, em formato pdf, gentilmente disponibilizada pelo António Duarte (**)

[António Duarte, ex-fur mil da CART 3493, a Companhia do BART 3873, que esteve em Mansambo, Fá Mandinga, Cobumba e Bissau, 1972-1974;  foi transferido para a CCAC 12 (em novembro de 1972, e não como voluntário, como por lapso temos indicado); economista, bancário reformado, formador; foto atual à direita].

O único destaque do mês de maio de 1973, vai para: (i)  a  fraca atividade do IN no início do tempo das chuvas; e a (ii)  a informação de que está a "recrutar coercivamente" mancebos nas populações sob o seu controlo (Ponta Varela, Poindom, Ponta do Inglês. Ponta Luís Dias) (pp. 55/57) (LG).

Dez anos depois do início da guerra, o PAIGC continua a manter,  sob o seu controlo,  um importante núcleo populacional, espalhado pelo sector L1 (subsetores do Xime, Mansambo e Xitole: Cancodea Befada, Cancodea Balanta, Mina, Ponta João da Silva, Ponta Luís Dias, Satecuta. Mangai) e estimado em 4100 pessoas, em 1970, pelo comando do BART 2917, a que se deverá juntar mais 1900, a norte do Rio Geba, nas regiões de Madina e Banir). Contas feitas, no setor L1, o IN teria uma população de 6 mil sob o seu controlo. Em contrapartida, a populção sob controlo das autoridades portuguesas andaria à volta das 20 mil, também segundo a mesma fonte.

Ainda de acordo com a história do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72),  "na área do sector do Bart [2917]  existem muitas bolanhas ricas, verificando-se no entanto que estas, com excepção das do Enxalé, Nhabijões e Finete, ou estão abandonadas (Samba Silate, São Belchior, Saliquinhé, etc.) ou são exploradas por populações sob controlo IN (todas as bolanhas da margem direita do Rio Corubal e margens do Rio Malafo)."  (LG).

Maio de 1973: o IN recruta coercivamente mancebos nas tabancas sob seu controlo (Poindom, Ponta Varela, Ponta Luís Dias e Ponta do Inglês): um dos recrutas era informador das NT













_________________

Notas do editor:

(*) Vd- poste de 11 de janeiro de  2011 > Guiné 63/74 - P7590: Operação Tangomau (Mário Beja Santos) (13): Os mistérios da estrada da Ponta do Inglês


(...) Os mistérios da estrada da Ponta do Inglês

1. Toda a região do Xime exerceu e exerce fascínio no Tangomau. (...)

Foi ali, de 1962 para 1963, que se abriu a segunda frente, Domingos Ramos vivia em Tubacutà, dentro da mata do Fiofioli; chegaram ao arrojo de colocar em Gundaguê Beafada um dístico “Aqui começa o território livre da República da Guiné, isto em 1963. 

A despeito do que era propalado pela propaganda, o controlo do Xime e Bissari, até ao Corubal, era exercido pelas forças comandadas por Domingos Ramos e pelos líderes que lhe sucederam. O Xime era um eixo estratégico e daí a tentativa, que se prolongou por alguns anos, de ter aberta a via até à Ponta do Inglês, na desembocadura do Corubal, em frente a Quinara.

 Esta estrada irá ser um calvário, entre minas e emboscadas, ali se verteu sangue e o destacamento da Ponta do Inglês tornou-se um inferno. O que o Tangomau conhecia era a região de Ponta Varela, o Poindom, até à Ponta do Inglês e respectivos acessos. A população cultivava as bolanhas, fundamentais para o aprovisionamento, era terras úberes; a navegação no Corubal fora tornada impraticável, de modo que qualquer saída do Xime e qualquer detecção significava confronto a prazo. (...)

4 comentários:

Luís Graça disse...

Tenho ideia, pelas conversas que tive em Bissau, em março de 2008, com antigos combatentes do PAIGC, que o antigo setor 2 da frente Xitole-Bafatá, na nomenclatura deles, estava desfalcado, em meados de 1973...

Se me a memória me não falha, o PAIGC deve ter desviado combatentes para o sul (Guileje / Gadamael) e para o norte (Guidaje)... E agora faz sentido a notícia do alegado recrutamento à força de "mancebos" das tabancas controladas pelo PAIGC...

Por outro lado, eles sabiam que não haveria risco de fuga, em massa, das populações sob o seu controlo, já que com Spínola iniciara-se a política de abertura )e sedução): elementos pop da área sob controlo IN iam e vinham visitar os seus parentes e amigos a Nhabijões ou ao Enxalé... Por outro lado, eles podiam agora reabastecer-se à luz do dia no comércio de Nambadinca, sem risco de serem mortos em emboscadas ou serem aprisionados...

Os tempos eram outros.. E a verdade é que, se o PAIGC nunca conseguiu o controlo da entrada e saída do Geba Estreito que era o porto fluvial do Xime ("via real" de acesso ao leste), também é verdade que as NT nunca conseguiram "reconquistar" as populações que "fugiram para o nmato" em 1963, apesar de inúmeras operações que fizeram da região do Poindom / Pota do Inglês, um das mais sangrentas da guerra...

Percebe-se porquê, quando se olha para o mapa do Xime: aquilo é como os covos para se apanhar polvos ou lagosta; entra-se no funil, mas já não se sai, a não ser á porrada...

Na prática, o subsetor do Xime era uma península, rodeade água, tarrafo e palmeirais a oeste (Rio Corubal) e a norte (Rio Geba)... E com fortes manchas de floresta-galeria no meu tempo, que hoje parecem ter desaparecido (com o crescente abate de árvores, com o repovoamento, com a desertificação, com as mudanças climáticas, etc.).

E verdade é que a estrada do Xime-Ponta do IngLês ainda tem muito que contar, tal como a Nau Catrineta... E as fotos do Beja Santos, agora revisitadas, causaram-me calafrios... O 26 de novembro de 1970 foi há 44 anos, é uma efeméride que nunca esqueço...

jpscandeias disse...

Duarte num desses ataques ao aquartelamento que foi, como sempre feito ao fim do dia, estava a tomar um duche perto da nossa messe. Era um lugar mais seguro que o quarto que partilhamos que tinha um telhado de treta. Foi o que nos calhou aos 3, o Osório, enfermeiro, tu artilheiro e eu infante, um "blend". Neste ataques referidos penso que estive presente em todos, logo fiz o pleno. Mas como sabes era ao Lino e companhia que competia dar a resposta no imediato e depois diferida.
Fazia parte da rotina e acho que nunca nos tirou o apetite nem o sono.
Não sei concordas mas foi como senti. Na mata os contactos piavam bem mais fino, tiravam o apetite, o sono não.

joão silva Ccac 12 1973

Anónimo disse...

Meu caro Luís Graça,

Se me permites, o recrutamento à força de que falas tem um nome: rapto!

Foi daquela forma que o PAIGC alimentou muito as suas forças beligerantes e não necessariamente por aderência ideológica, como algumas vezes se afirmou ou deu a entender nas páginas do nosso blog.


Quando raptados os jovens conseguiam fugir algumas vezes, mas quando isso não acontecia, fosse por medo ou doutrinação, sem alternativas viáveis, acabavam por enfileirar as forças terroristas, muitas vezes como carregadores e depois como combatentes. Assim se fazia a guerra do lado de lá.

Na zona de acção da CCaç3327, em Bissássema, há um caso de rapto de 11 rapazes pelo PAIGC. Felizmente que os jovens conseguiram fugir. Em nome da verdade, também houve um caso de deserção de uma milícia, que nem se soube para onde foi.

E já agora, sem pretender levantar controvérsia, mas sim um debate sério, militarmente falando, porque aqui tem sido feitas afirmações nesse sentido, gostaria que tu ou alguém explicasse o que era isso de populações controladas pelo PAIGC ou de zonas libertadas por aquele grupo terrorista no território da Guiné.

Pelo que me recordo essas expressões não eram usadas na CCaç3327 e também não o eram no PelNat#56, quando ali estive em deligíncia.

A minha companhia andou por zonas assim reclamadas, mas nem por isso deixou de construir casas, escolas, fontenários, estradas e, claro, desenvolveu toda a actividade militar própria de uma companhia independente de intervenção. A Mata dos Madeiros e Bissássema falam por si.

Já a zona do Destacamento de São João, onde estive treze meses, também reclamada como zona libertada e controlada, servia de treino aos nossos oficiais e sargentos que frequentavam os EUA (Estágio para as Unidades Africanas). O único complexo habitacional, militares e familiares, era limitado pelo arame farpado que ajudava a proteger o complexo militar. Nunca fui impedido de atingir os meus objectivos enquanto lá estive.

Naturalmente que observo, e só, as minhas experiências sobre este assunto.

Um abraço do tamanho do oceano que nos une.
José Câmara

Luís Graça disse...

José Câmara:

Obrigado pelas tuas pertinentes e oportunas observações. A expressão “população sob controlo do IN” não é minha (nem do António Duarte), mas sim dos comandos dos batalhões que passaram pelo setor L1 (Bambadinca)…

Vejam-se as histórias de unidade dos BCAÇ 2852 (1968/70), BART 2917 (1970/72) e BART 3873 (1972/74)…

Se vires o recorte da HU do BART 3873 que inserimos no poste, vem lá, preto no branco, na pag. 56:

“90. População: Há notícia de que o inimigo recrutou coercivamente mancebos nas tabancas (sob seu controle) do POINDOM, PTA VARELA, PTA LUÍS DIAS E PONTA DO INGLÊS”.

Também se utilizava a expressão “População sob duplo controle”: caso, no tempo (CCAÇ 12, junho 69/mar 71) de tabancas balantas como, por exemplo, Nhabijões (entretanto reordenada, um dos maiores reordenamentos do CTIG) e Mero (cuja população acaba pro se virar contra o PAIGC, justamente por causa de raptos de bajudas)…

Como unidade de intervenção, a CCAÇ 12 e outras forças das NT) ia a todo o lado, na época seca, com mais porrada ou menos porrada…

Só não fui a Mina / Fiofioli…

Os páras, de heli, e com proteção aérea, também iam a todo o lado… A expressão “área libertada”, obviamente, que fazia parte da linguagem de propaganda do PAIGC.

Mas é inegável que havia no interior da Guiné, mesmo no coração da Guiné (como é o aso do setor L1, que incluía a margem direita do Rio Corubal, e também,a norte do Geba, os regulados do Enxalé e do Cuor), algumas largos milhares de pessoas (cerca de 6 mil, no setor L1) que “viviam no mato”, o mesmo é dizer, fora do controlo da “autoridade administrativa portuguesa”…

Podia-se ter ragado tudo a napalma,comio fizeram os amercianos do Vietname... No meu tempo, no tempo do Spínola, não tocávamos as colheitas das bolanhas da margem direita do Rio Corubal... Estavam ao alcance da nossa aviação... Mas destruir as colheitas era condenar à fome muita gente inocente... Há camaradas. aqui do blogue, que fizeram a Op Lança Afiada, de 10 dias, em março de 1969, e que podem fazer, com autoridade, destas áreas populacionais que o PAIGC "controlava" desde 1963... Estou-me a lembrar do Torcato Mendonça, da CART 2339 (Mansambo, 1968/69), que participou nesta grande operação de limpeza...

Também concordo contigo que a expressão “foram raptados” seria mais apropriada…

Um abraço fraterno do editor Luís Graça