1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos mais uma mensagem desta sua fabulosa série.
As minhas memórias de Gabu
Sexo em tempo de guerra, memórias inegáveis
Tabu?
Indolente, obesa e com um falar melodioso a mulher grande impunha respeito à plebe que por norma a rodeava. A sua tabanca, simples e despida de preconceitos, situava-se entre o quartel novo, onde estava instalada a CCS do BART 6523, e Nova Lamego. Um passeio noturno da rapaziada levava o pessoal a uma visita espontânea à mulher grande.
Noites que procediam ao recebimento do fresco pré eram, normalmente, sinais evidentes para uma emboscada – sem armas pesadas apontadas ao IN ou de fogo cruzado entre as frentes em combate - dos soldados à porta da idosa senhora.
É do conhecimento geral, e não vamos escamotear a inadiável realidade porque se reconhece que o contraditório de opiniões existentes obedece a uma profunda vénia e consequente reflexão, que o sexo foi sempre uma evidente prática comum entre os seres viventes.
Desde os primórdios da humanidade que o ato se pratica em toda a sua extensão. Segundo relatos primários da Religião Cristã, Adão e Eva assumiram o sexo, ainda que virtualmente escondido sob o paladar de uma maçã, mas que no momento de calor e compaixão uniram os seus órgãos genitais e consumaram uma relação sexual.
Neste contexto, importa assumir o ato com frontalidade e não optar pela surdez, procurando o eventual pecador (?) espontâneo imitar a velha avestruz num austero deserto Australiano: ou seja, esconder a cabeça na areia para passar como um ser imaculado!
Os tempos de guerra, prova-se cientificamente, são propícios a encontros amorosos, embora estes se submetam a um clímax instintivo e de uma ocasião efusiva. A guerra do ex-Ultramar não passou incólume a desvarios praticados e não assumidos. A Guiné não foi um caso à parte.
Em Nova Lamego, independentemente de encontros afetivos debaixo de um silêncio colossal, havia quem fizesse render as aventuras de jovens em plena ascensão sexual a troco de patacão. Os pesos (escudos) na Guiné eram bênçãos divinas.
Na minha conceção, embora discutível, admito que o ato sexual praticado pela mulher não passava exclusivamente por uma mera venda do corpo mas pela maneira mais subtil em realizar uns magros pesos para sustentar inadiáveis compromissos familiares. Aliás, os “Filhos do Vento”, uma temática por mim levantada, sintetiza esta irreversível veracidade que nós muito bem conhecemos.
Negócio? Não! Isso eram compromissos de gentes feitas com o sistema. A mulher grande que eu conheci em Gabu tratava o assunto com uma ligeireza quiçá perversa. “Arranjava” bajudas e a malta despejava os seus espermatozoides em vaginas dilaceradas pelos muitos serviços prestados. Consequências? Tudo era tabu! Há quem se refugie numa mítica opção tentando a todo o custo tapar o sol como uma peneira.
Tímidos e envergonhados alguns camaradas afirmavam que voltaram virgens daquelas longínquas paragens africanas. As mãos arrogaram-se às brincadeiras de putos, advogam os mais incautos . Parafraseando um velho político, num momento áureo da Revolução de Abril, dizia ele para o camarada ao lado: “Olhe que não!”…
Não constringiremos cenas passadas. Verídicas! Assumo que não fui imaculado. Hoje, tal como sempre, dou a cara e falo abertamente de um assunto que tende cair no limbo do esquecimento. Deixo em prosa uma etapa da vida que não me passou ao lado. Pratiquei atos sexuais, sim senhor, como tantos outros camaradas de armas em terras guineenses.
Afirmo, com segurança, que numa noite quente, como era hábito, eu e outro camarada, furriel miliciano da minha Companhia, ousámos desafiar a escuridão da tabanca e fomos parar junto a um casal de idosos que gentilmente nos recebeu propondo-nos, de seguida, uma visita à casa do lado, onde uma bajuda feita a espontâneos favores sexuais nos recebeu. Aceitámos.
Discutimos os custos, acertámos o valor e, isoladamente, lá fomos fazer o respetivo serviço. Depois de pagarmos e no meio de uma franca cavaqueira apareceu-nos a bajuda, aquela que tinha saciado os nossos eternos anseios carnais, com uma deficiência descomunal numa das pernas. Infelizmente era coxa.
Ressalve-se, porém, que a rapariga era de facto bonita mas as contingências da vida carimbou-a com um enorme defeito físico. Olhámos um para o outro e em mansinho comentámos: “A nossa amante foi mesmo esta bajuda? Muito bem, o serviço está feito e nada a comentar”, ficou a experiência.
Chegados ao quartel, como era hábito, tomámos um delicioso banho com água barrenta e introduzimos na uretra do pénis uma milagrosa pomada que, ao que tudo indicava, queimava o mais atrevido intruso verme que, ocasionalmente, procurava poiso numa outra superfície humana até então desconhecida.
Numa outra noite e com a luz ténue de uma lamparina a gasóleo já à meia haste, fui ter com a mulher grande e perguntei-lhe se por acaso havia bajuda nova: a mulher já experiente nestas andanças e com um olhar vazio, olhou-me de alto a baixo e atirou-me com esta: “ei furrie você é comando… manga di mau”.
Sinceramente não me apercebi da sua ligeireza ao detetar no camuflado os dísticos que sempre transportava na farda. Acalmei-a e disse que era na verdade ranger, não comando, mas mau… nunca. Coloquei em solene a minha forma de ser e a cordialidade que sempre marcou a minha amizade para com o próximo. A conversa prolongou-se e às tantas, e num repente, a mulher grande brindou-me com o meu desejo. Ficou a certeza que outros anseios se seguiram.
De outros encontros imaginariamente amorosos ressalta também uma visita ao bairro do Pilão, em Bissau. Vagueando entre a imprevisibilidade de ruelas apertadas de tabancas nada iluminadas, algumas completamente às escuras, acompanhado de um velho amigo, desafiei o imprevisto e fui ao encontro dos imortais desejos sexuais.
Confesso que cheguei a temer a aventura. Passaram por nós homens negros, altos, de túnicas compridas, enfim, silhuetas que a determinada altura nos levaram a duvidar da fartura. Cumprimentávamos e eles, simpaticamente, respondiam. Tudo ok, comentámos.
O Pilão era um bairro dos subúrbios de Bissau onde a malta da metrópole por norma não passeava. A noite tinha um cunho arrojado. A palavra passava e os tropas arrepiavam caminho.
Todavia, ousei desafiar essa perigosidade e encontrei uma jovem mulher de corpo descomunal, a quem me entreguei por alguns momentos de delírio sexual. Paguei e aventura terminou aí. Nunca mais a vi!
Concluindo: Porquê escamotear verdades de jovens entregues a elementares gostos sexuais procurando, nalguns casos, tentar passar isento a constrangimentos entretanto criados? Tabu? Ou consequências lógicas dos nossos verdes anos e de uma guerra entretanto inacabada?
Ficam as perguntas avulsas para uma eventual troca de opiniões.
Resenha final: ASSUMAMOS! Deus fez o homem e a mulher e projetou os dois seres com um fim comum: AMAR E… PROCRIAR.
Um abraço camaradas,
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523
___________
Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
1 DE JANEIRO DE 2015 > Guiné 63/74 - P14106: Memórias de Gabú (José Saúde) (50): Recordando o saudoso enfermeiro Dinis. Homem, militar e amigo.
1 comentário:
Ola Jose Saude,
Finalmente um homem que nao tem medo de falar nem e santo, realmente as historias sobre sexo sempre foram segredo, nunca ninguem durante a guerra se serviu das bajudas??? Quero felicitar-te pela tua cinceridade de homem grande.
Julio Abreu
Grupo de Comandos Centurioes
Ex-Guine Portuguesa
Enviar um comentário