sábado, 16 de novembro de 2019

Guiné 61/74 - P20353: Os nossos seres, saberes e lazeres (364): A minha ilha é um cofre de Atlântidas (6) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 21 de Maio de 2019:

Queridos amigos,
Aí por 1630, o Vale das Furnas teve forte sacudidela, fugiu gente aterrorizada, depois a vida retomou a sua normalidade, os capitães donatários puseram a economia a funcionar. A ter-se em conta o que escreve o fidalgo Senna de Freitas em "Uma Viagem ao Vale das Furnas em Junho de 1840", gente abastada aqui tinha os seus bens, caso do Conde da Ribeira, o Brigadeiro Pacheco de Castro, o Barão das Laranjeiras, entre outros.
Por essa época havia mais de 600 vacas, centenas de cabras e ovelhas poucas. E o Fidalgo da Casa Real dava pormenores da vida turística de então:  
"As pessoas que vão ao Vale das Furnas fazem excursões em burrinhos à vila da Povoação, à Ribeira Quente, ao Pico da Vara (que é o mais alto da ilha), à Achada das Furnas, ao Pico da Vigia, à Lagoa, às matas d'Alegria, à cascata da Briosa, à cascata das Camarinhas".
As águas tinham fama como termais, saúde, lazer e ambiente edénico concorreram para que o Vale das Furnas se tenham tornado num dos locais mais procurados pelos seus jardins, panorâmicas, lagoas, piscinas e o espetacular território das furnas, não há nada de parecido em Portugal e arredores.

Um abraço do
Mário


A minha ilha é um cofre de Atlântidas (6)

Beja Santos

Vale das Furnas equivale a dizer: furnas ferventes, matas-jardins, lagoa, uma porta para o paraíso. O viandante acoitou-se no Parque Terra Nostra, a sua origem remonta a 1775, o então cônsul dos EUA, Thomas Hickling, fez aqui construir a sua residência de verão, a Yankee Hall. Dois séculos depois, aquilo que era uma área inicial de dois hectares, expandiu-se com jardins de água, alamedas sombrias, canteiros de flores, vieram especialistas portugueses e ingleses para ordenar o jardim, chegaram igualmente árvores de todo o mundo. Quando surgiu o hotel, o parque era o complemento natural, o espaço de lazer para contemplar mais de três mil árvores e espécies arbustivas, com um jardim de camélias sem igual. Mas voltemos ao livro “Uma Viagem ao Vale das Furnas em Junho de 1840”, do Fidalgo e Comendador da Ordem de Cristo Bernardino José de Senna Freitas. Estes geiseres são impressionantes, ninguém lhes pode ficar insensível. O fidalgo descreve minuciosamente as caldeiras uma a uma, aqui fica um exemplo:  
“Em distância, talvez de trinta passos da caldeira grande, uma outra atrai a nossa admiração. Esta caldeira está em posição cavernosa; em remotos tempos era denominada caldeira do polme, e hoje caldeira de Pedro Botelho: com impetuosidade estrondosa, que atemoriza as pessoas que observam, se eleva acima do seu nível de água lodosa, ou espécie de lava, muito quente, com espesso fumo envolto naquele polme, tornando-se difícil ver-se a sua horríssona boca, ou cratera: esta espécie de lava, que aquela furna expele, segundo alguns viajantes, é semelhante à do Vesúvio”.




Então, não é que saindo do Vale logo nos abeiramos de jardins onde, fruto da estação, despontam as azáleas. O viandante ajoelha-se para ver se entende aquele brilho metalizado que irradia das pétalas, será dos minérios da terra, da luz do céu destapado? Não tem resposta, mas que não há azáleas como estas está certo e seguro que não há, em qualquer outro ponto do mundo.


Voltamos à panorâmica da casa do cônsul Hickling e das transformações posteriores. A piscina de água férrea é de visita obrigatória, toma-se banho a qualquer hora do dia ou da noite, está sempre quentinha. Depois convém limpar bem para não vir para o duche carregado de “ferrugem”, pode ter consequências desagradáveis para a roupa do dia-a-dia. Consolado com este banho, e pensando que o fidalgo Senna de Freitas diz que são muito boas estas águas para as dores reumáticas e outras maleitas, segue-se um passeio pelo Parque Terra Nostra.



Para captar as cores do paraíso há que esperar por uma certa luz, e depois embrenhamo-nos pela Alameda Ginkgo Biloba, pelo caminho podemos dar com fetos, dálias, verónica, begónias e lobélias, pressente-se que as hortênsias vão rebentar dentro de pouco tempo. O património florestal tem-se desenvolvido aqui, temos agora jardins com plantas endémicas, de fetos e de cycas, o jardim de flores e plantas anuais, isto para já não falar no prodigioso jardim das camélias.




Há monumentos dentro do parque, desde bustos à ”Memória aos Viscondes da Praia”. Sempre que aqui vem, o viandante embeiça-se pelo Mirante “O Açucareiro”, está marcado pelo romantismo, a vista é um desfrute, se está bom tempo até é aprazível estar aqui a ler uma revista ou um livro antes de retomar a marcha.




E aqui nos detemos, não há visita em que não se venha saudar este vetusto metrosidero, estes grandes proprietários micaelenses como o Visconde da Praia ou José do Canto rivalizaram em trazer estas espécies exóticas, tiveram sucesso, medraram e são pontos de encanto nos respetivos jardins. Espera-se que tenham gostado. E espera-se igualmente que o leitor nos acompanhe no passeio pela Lagoa das Furnas e na Mata-jardim José do Canto.
É já a seguir.


(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 9 de novembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20327: Os nossos seres, saberes e lazeres (363): A minha ilha é um cofre de Atlântidas (5) (Mário Beja Santos)

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