1. A propósito do falecimento de Maria Cristina Allen, acabámos de receber do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) esta sua mensagem:
A Cristina, a Guiné e a sua presença na nossa sala de conversa
Mário Beja Santos
Conheci a Cristina em março de 1968, acabara de chegar de Ponta Delgada, uma prima anunciara-me que constituíra um estupendo grupo que reunia aos sábados, intimava-me a comparecer. Disse que sim, jantei em casa da minha irmã, perto do Largo do Rato, desci depois a Braancamp e entrei num bar do Hotel Flórida e conheci gente que a Teresa Filomena arrebanhara, bem-disposta e coloquial.A Cristina, a Guiné e a sua presença na nossa sala de conversa
Mário Beja Santos
Apresentados e conversados, seguimos para o Aeroporto da Portela, o seu bar panorâmico ainda era muito concorrido. Fiquei ao lado de uma jovem pequena e airosa que logo me questionou de que paragens vinha, impressionou-me muito não só pela sua beleza mas pela conversa cativante. Por intermédio da Teresa Filomena lá estabeleci novo encontro fora do grupo, e poucas semanas depois, vindo ao fim da tarde de dar instrução no Regimento de Infantaria N.º 1 (Amadora), a Maria Emília Brederode Santos e o José Manuel Medeiros Ferreira deixavam-me à porta de um café onde passei a namorar com a Cristina. Depois fui apresentado aos pais, a minha futura sogra dispensou-me um formidável acolhimento no período que precedeu a minha saída da força militar onde estava incorporado e a aguardar transporte para a Guiné, em rendição individual. E a 24 de julho desse ano, a assistir ao choro convulsivo dos meus entes queridos, embarquei no Uíge, dado curioso comecei a bordo a encontrar-me com gente do BCAÇ 2852, iremos passar mais de um ano bem próximos, eles em Bambadinca e eu no Cuor. Chegado a Bissau, e assim que me deram o número do SPM (o 3778) telefonei à Cristina. E assim nasceu uma correspondência que foi essencial para escrever os meus dois volumes do Diário da Guiné, tudo lhe contava, ao pormenor, desde os arranjos do quartel, as idas a Mato de Cão, as carências, as flagelações, o trabalho do professor com crianças e graúdos. Todo este volume de correspondência trocada foi entregue ao Luís Graça, ficou como fiel depositário, pedi-lhe que se eu partisse para as estrelinhas entregasse tudo no Arquivo Histórico-Militar. Tomou-se a decisão de casar em Bissau, o que aconteceu em 20 de abril de 1970, dia em que se esbarrondou um sonho de Spínola e que custou a vida a três majores, um alferes e vários guias, barbaramente retalhados numa força do PAIGC, algures entre Pelundo e Jolmete. Conto no segundo volume do meu diário as peripécias que me permitiram casar, o David Payne, então médico do batalhão, combinou com o comandante deste, que eu precisava de ter uma baixa à neuropsiquiatria em Bissau, andei envolvido, nos meses de março e abril, e até 3 dias antes de partir, num conjunto de operações, e meti-me num Dakota em Bafatá com a guia para o HM241, casei, tive uns dias de lua de mel e depois a Cristina passou a visitar-me no hospital, onde se passaram cenas do arco da velha. Ela regressou e montou a nossa casa, conviveu-se com casais amigos ainda em Bissau, foram amizades que permaneceram.
1970 > Cristina Allen em Bissau
A Cristina entrou no blogue quando ambos fomos devastados pela morte da nossa filha mais nova, alguém, a propósito, suscitou um comentário e a Cristina respondeu. Entregava-me as folhas escritas à mão e eu punha tudo no computador e enviava para os editores do blogue. Teve um poder catárquico, este tipo de intervenção.
Nos últimos anos, a saúde da Cristina sofreu um forte abalo. Quando a conheci já ela padecia de lúpus eritematoso sistémico, habituei-me àquelas crises e sobretudo à necessidade quase permanente de muito repouso, não foi fácil, até porque as filhas repontavam, a mãe saía pouco, houve que fazer um esforço de sensibilização às crianças para aquela estranha doença. Surgiu-lhe vasculite, foi um golpe psicológico rude, uma mulher bonita com as pernas inchadas, avermelhadas. Aumentou o consumo de tabaco, isolou-se e em 2019 era percetível que havia um certo transtorno psíquico para além da gravidade do quadro das comorbilidades. A 24 de dezembro de 2019 houve que chamar o INEM, transportada para Santa Maria, ali permaneceu entre a vida e a morte, os problemas respiratórios eram muito graves, um quadro de pneumonia em cima de um enfisema pulmonar. E o transtorno deu em demência, quando teve alta, um mês e meio depois, houve que encontrar a solução de um lar, e ali permaneceu até que em 5 de abril, inopinadamente, o Pai Misericordioso compadeceu-se da sua vida tão lastimosa, teve uma paragem cardiorrespiratória, nada se pôde fazer.
Haverá velório nesta quarta-feira, entre as 17 e 20 horas (não foi doente COVID, pelo tudo se regerá pelas normas habituais de segurança), na Igreja do Campo Grande. Quinta-feira, no mesmo local,celebrar-se-á missa pelas 15 horas seguindo para os Olivais, para cremação. Obrigado por a recordarem e lhe desejarem a contemplação divina, ela nunca esqueceu a Guiné e sentiu-se muito reconfortada no blogue, adorou a sala de conversa.
Um abraço do
Mário
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Nota do editor
Vd. poste de 7 de Abril de 2021 > Guiné 61/74 - P22075: In Memoriam (390): Maria Cristina Robalo Allen Revez (8/3/1943 - 5/4/2021), ex-esposa do nosso camarada Mário Beja Santos, faleceu no Lar de Santa Catarina de Labouré, Lumiar, Lisboa (Editores)
9 comentários:
Fora de Lisboa e sem carro, estou impossibilitado de comparecer. Para o Mário, a total Solidariedade, com um ABRAÇO! Jorge Cabral
Caro Camarada Beja Santos
Lamento o sucedido, mas a vida é assim e, com o sentimento próprio de quem já passou pela mesma situação, só sei dizer que acabou o sofrimento para quem estava em tal situação.
Os meus sentidos pêsames para ti e todos familiares.
Jorge Picado
Que a tua companheira e mãe das tuas filhas descanse em paz, e desculpa,camarada Mário Beja Santos.
António Graça de Abreu
Ao amigo Beja Santos vão os meus sentimentos de pesar pela dolorosa perda. Que Deus, na sua infinita bondade possa apaziguar o seu coração e colmatar o vazio desta solidão.
Cherno Baldé
Caro amigo Mário
Não me foi possível participar no velório, ao contrário do que já sucedeu noutra ocasião,
também não poderei ir a Lisboa amanhã de manhã. Estarei noutro local e não foi possível alterar o compromisso.
Seja como for, deixo-te os meus sentimentos pelo sucedido com a esperança e a convicção de que terá sido um "final" piedoso.
Abraço
Hélder Sousa
Ao camarada Mário Beja Santos também quero exprimir os meus sentimentos de tristeza e de solidariedade. Não há nada que possamos fazer perante uma fatalidade como esta, a não ser dar um abraço muito sentido.
Mário
Recebe um abraço de solidariedade neste momento particular de dor.
Os meus sentidos pêsames
Abraço
Carlos Silva
Mário
Recebe um abraço de solidariedade neste momento particular de dor.
Os meus sentidos pêsames
Abraço
Carlos Silva
O meu abraço solidário caro camarada Mário Beja Santos.
Que Deus tenha em bom lugar a tua ex-companheira.
Manuel Carvalho
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