domingo, 18 de julho de 2021

Guiné 61/74 - P22384: (In)citações (191): Todos iguais mas uns mais iguais do que outros ?!... O caso dos futebolistas e outros "atletas de alta competição" a quem Pátria isentava do "imposto de sangue"


O Lemos, do FC Porto, "carrasco" do SL Benfica na época de 1970/71,
mobilizado para a Guiné com a CART 6552/72 
(Cameconde e Cabedú, 1972/74).

Cortesia do blogue Estrelas do FCP, do Paulo Moreira (Gondomar)


1. Não falamos no nosso blogue,por uma questão de princípio (e de pudor e de "higiene mental"...), de futebol, política e religião (, futebol clubístico, política partidária, religião apolegética, entenda-se). 

Mas podemos, concerteza, falar dos nossos camaradas que foram capelães (caso do Arsénio Puim, por exemplo), ou futebolista (como, por exemplo, o Lemos, do FC Porto) ou de alguns políticos que foram nossos contemporâneos  (, como James Pinto Bull, guinense, que foi eleito deputado à Assembleia Nacional em 1969, tendo sido membro da chamada Ala Liberal, que defendeu reformas políticas do regime, e que encontrou a morte na sua própria terra natal).

Mas hoje é dos futebolistas  que queremos falar. Dos futebolistas profissionais, craques da bola dos principais clubes e da seleção nacional... Não terão sido muitos, por certo,  os que fizeram a guerra do ultramar / guerra colonial. Eu, pelo menos, não conheci nenhum...

Um dos casos já aqui falados foi do  Lemos [, António José de Lemos, nascido em  Angola, em  1950],ex-jogador do F.C.Porto, que foi nosso camarada na CART 6552/72 (Cameconde e Cabedú, 1972/74). Ou, mais exatamente, camarada do novo membro da Tabanca Grande, o Manuel Domingos Ribeiro (*). Ao que parece, acabou a
 comissão a jogar no UDIB em Bissau, "não deixando de ter alinhado no mato até à sua transferência", como  garante o Ribeiro. (**)

2. Sobre o Lemos, lê-se no blogue  Estrelas do FCP, este detalhado apontamento biográfico, da autoria de Fernando Moreira (que reproduzimos com a devida vénia e as necessárias adaptações);

António José de Lemos:

 (i) nasceu no dia 2 de Fevereiro de 1950 em Luanda, Angola;

(ii) começou por jogar futebol nos juniores do Clube Ferroviário de Luanda até que em 1966 vem para Portugal;

(iii) ingressou nos juniores do Futebol Clube do Porto até passar a sénior, o que aconteceu em 1968;

(iv) por empréstimo dos portistas, ingressou no Boavista FC onde estve esteve durante duas temporadas,  tendo disputado 25 partidas oficiais e apontado 12 golos;

(v) em 1970/71 regressa ao FC Porto;

(vi) na tarde de 31 de Janeiro de 1971, o nome de Lemos "soou alto e soou longe, pela rádio":  marcou, no Estádio das Antas, os 4 golos da vitória do FC  Porto sobre o SLB; 

(vii) os benfiquistas jamais se esqueceram dele; é que, também na Luz, ainda na época 1970/71, Lemos fez o gosto ao pé e desfeiteou as "águias" por mais duas vezes no empate (2-2) no reduto encarnado;
 
(viii) ele recordou, mais tarde,  com precisão e com orgulho, cada pormenor dessa partida que foi um marco na sua carreira de futebolista:

(...) "No primeiro golo, o falecido Pavão fez-me uma assistência primorosa e só tive de empurrar a bola. O meu segundo golo foi espectacular! Quando ninguém acreditava que chegasse à bola, quase na linha de fundo, desferi um pontapé que surpreendeu o Zé Henriques. No terceiro, o Bené fez um lançamento lateral, apanhei a bola e fiz um chapéu ao guarda-redes. E no quarto, estava com um problema num joelho e o Humberto Coelho não acreditou que eu chegasse a tempo mas ultrapassei-o e toquei a bola à saída do guarda-redes." (...)

(ix)   Nas épocas de 1970/71 e 1971/72 marcou, respectivamente, 18 (melhor marcador da equipa) e 8 golos no Campeonato Nacional;

Em 1973 (decorria a época de 1972/73) Lemos – que não obtivera o estatuto de "Atleta de Alta Competição", imprescindível para o subtrair à guerra do Ultramar – foi mobilizado para Cabo Verde pelo Exército Português....

Mas o inesperado aconteceu: o avião, que transportava Lemos e a sua "Companhia de Operações Especiais" (, leia-se: a CART 6552/72), fez um "desvio" na rota e aterrou em… Bissau (Guiné). 

(...) "E todos aqueles soldados que julgavam ir para uma "guerra" branda no arquipélago das belas mulatas e da romântica morna, lá ficaram naquela que era a colónia portuguesa com a conjuntura militar mais difícil e perigosa. Acresce que, no início do ano de 73, o PAIGC (movimento independentista) incrementara as acções de guerra criando muitas dificuldades às tropas portuguesas que combatia desde Janeiro de 1963. A Guiné estava a 'ferro e fogo' e, talvez por isso, a "Companhia" de Lemos tenha sido desviada para aquele território." (...)

Diz o Fernando Moreira que o Lemos "voltou da Guiné em 1974 ainda a tempo de participar na época de 1974/75, a última que faria pelo FC Porto", (...) teno jofadao" ao lado de grandes futebolistas como Rolando, Custódio Pinto, Nóbrega, Pavão, Bené, António Oliveira, Flávio, Abel, Seninho, Heredia, Rodolfo, Fernando Gomes e o extraordinário Cubillas.  Contudo não logrou qualquer título pois, desafortunadamente para ele, esteve nos últimos anos de um período em que as agruras do futebol passaram pelas Antas. (...) Em quatro temporadas no FC Porto, nos 92 jogos do campeonato em que interveio, marcou 47 golos."

Depois veio a inevitável "curva descendente": Em 1975/76 ingressou no SC Espinho, na temporada seguinte rumou ao USC Paredes, em 1977/78 jogou no AD Sanjoanense, passou na época seguinte pelo Académico de Viseu FC e, entre 1979/80 a 1983/84, defendeu a camisola do FC Infesta...

3. No mesmo blogue, Estrelas do FCP, do Paulo Moreira, de Gondomar,  escreveu o seguinte comentário o Ludgero Lamas, companheiro do Lemos no FC Porto:

(...) Joguei futebol com o Lemos no FC Porto. Devo dizer que o jogo com o Benfica 4-0, foi delirante. O meu Amigo Lemos, ganhou nesse dia, um camião TIR cheio de tintas, electródomesticos, e outros, sendo que um televisor Grundig foi por mim comprado, sendo o dinheiro apurado na venda distribuido por todo o plantel. Uma atitude de grande nobreza. 

Devo referir que na altura não existia o estatuto de alta competição, a menos que fosse só para atletas do Benfica, dado que eram os únicos que não eram mobilizados para as Províncias, pois no nosso clube, ainda tivemos os casos de Séninho, e o falecido Chico Gordo, mobilizados para Angola, onde jogaram, e foram campeões (no Moxico), para onde também fui mobilizado, e posteriormente desmobilizado.

Do Lemos, devo referir a sua semelhança com o alemão Gerd Muller, e que se não chegou mais longe, o mesmo se deve às vicissitudes da vida." (...)

4. Até o circunspecto "Diário de Lisboa", que era veepertino,  perdeu... a cabeça,  dando em título de caixa alta, na 2ª edição de domingo, dia 31 de janeiro de 1971, o resultado do jogo nas Antas,  que foi conhecido como "Lemos, 4 - Benfica, 0", com desenvolvida notícia na 1º página e na página 23. Era então presidente do FC Porto o banqueiro Afonso Pinto de Magalhães.







Citação:
(1971), "Diário de Lisboa", nº 17281, Ano 50, Domingo, 31 de Janeiro de 1971, Fundação Mário Soares / DRR - Documentos Ruella Ramos, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_6022 (2021-7-18)


4. A propósito deste tema ("todos iguais mas uns mais iguais do que outros"), num depoimento já aqui em tempos publicado, escreveu o nosso camarada Mário Gaspar (***):
 
(...) "Discute-se um facto, e é a verdade que flui da minha boca, e os filhos dos ricos e poderosos de então – do nosso tempo de guerra, que não é nunca foi uma brincadeira de criança – falo por mim como Miliciano, esses filhos de ricos e poderosos que andaram na Escola da Câmara e mais tarde num Colégio Sousa Martins, em Vila Franca de Xira,  estiveram na Recruta na "minha tropa", mas na Especialidade de Atirador não vi nenhum.

Dei os meus primeiros passos no Serviço Militar no dia 3 de Maio de 1965 no Curso de Sargentos Milicianos (CSM), no RI 5, em Caldas da Rainha.

No mesmo Curso estiveram Rui Rodrigues e Gervásio, entre outros, jogadores da Académica de Coimbra. E Peres, este julgo também ser já jogador do Sporting Clube de Portugal, e o "famoso", "poderoso" de facto, Simões, do Benfica, Campeão Europeu, e que fez parte dos heróis do Futebol na Seleção Portuguesa, terceira classificada no Campeonato do Mundo de Futebol, em 1966.

Este acontecimento se dá quando eu – nunca fui voluntário – tive de "prestar provas para o Curso de Rangers, em Lamego".

Muitos os Milicianos recusaram frequentar o mesmo, ainda fiz parte da Equipa de Natação que representava o RI 14, em Viseu, no Campeonato da Região Militar, na Piscina, em Tomar. O Comandante deste Regimento que chefiava os nadadores era o conhecido também ex-futebolista da Académica de Coimbra, que venceu uma Taça de Portugal, o então Tenente-Coronel Faustino.

Nadei contra "nadadores civis federados", militares que representavam as suas Unidades. Julgo que também esses estavam no grupo dos "poderosos". Continuei por não ser voluntário, e por sorteio da vida, saiu-me ir frequentar o XX Curso de Minas e Armadilhas, na Escola Prática de Engenharia, em Tancos. 

Aí há a excepção, encontra-se o Aspirante Miliciano Oliveira Duarte, outro dos "poderosos". No meu conceito incluo estes que falei, nunca os culpando por estarem no grupo. Oliveira Duarte, jogador já do Sporting Clube de Portugal,  foi vítima de um jogo de "poderosos", estes sim "poderosos e «cunhas»", destes mesmos Militares que se livraram da guerra. 

Oliveira Duarte teve de partir para Angola, mas sendo "poderoso", frequentou o Curso de MA e lá foi para o grupo de futebol, livrou-se da guerra – perdeu, como nós todos, tempo – e nós não só tempo – lembrar que nos ofertavam por estarmos em zonas de guerra.

Ainda outros Desportistas, e não só do Futebol, caiu-lhes na sorte terem frequentado outras Especialidades, e atractivas e não foram à guerra.

Curioso, e é bom lembrar que os Milicianos na Guiné recebiam, julgo que ate fins de 1968 ou 1969 inclusive, menos verba mensal que os dos mesmos postos em Angola e Moçambique. Dizem estarmos mais junto à metrópole.

Estive na frente de um outro grupo que lutou para que o aumento de tempo que consta nas Cadernetas Militares ou Documentos que referissem o mesmo. E esse aumento é de 100%. Considerando que as horas de trabalho normal é de 8 horas, se nos encontrávamos de Serviço 24 horas, seriam 400%. Pois eu nem me contaram os 100%.

Nós somos, neste caso os não poderosos. Senhores com o nome de baptismo Cunha conheço… Mas esses "poderosos cunhas", vi por aí. Até na entrada em alguns "lares" e incluo todos, os "poderosos cunhas" estão presentes.

Quero lembrar um outro grupo que bem podia servir para dar a opinião, desconheço se foi ou não analisado: o caso dos nossos Capitães Milicianos que,  após terem cumprido o Serviço Militar e terem regressado a casa e frequentarem finais de Cursos Académicos,  são chamados e foram Camaradas não só, como nós na Guiné como noutras frentes de guerra. (...) (****=
__________

Notas do editor:



(***)  Vd. poste de 5 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16564: Inquérito 'on line' (71): Os Filhos dos Ricos e Poderosos, incluindo os jogadores de futebol... (Mário Gaspar, ex-Fur Mil At Art, Minas e Armadilhas, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68) 

(****) Último poste da série > 18 de julho de 2021 > Guiné 61/74 - P22383: (In)citações (190): Saudando uma decisão amadurecida, de oito anos, a entrada do Manuel Domingos Ribeiro para a Tabanca Grande: é o único representante , até à data, da CART 6552/72 (Cameconde e Cabedú 1972/74)

24 comentários:

paulo santiago disse...

O Oliveira Duarte,de que fala o Mário Gaspar,foi meu colega na Escola Regentes Agrícolas de Coimbra.Era mais velho que eu,lembro-me da transferência da Académica para o Sporting.Foi uma transferência cara,850 contos (?) muito dinheiro para a época. O presidente do Sporting,à data,era um General,e foi uma das causas da transferência,pensava o O.Duarte que seria mais difícil ser mobilizado. Com muitos meses de SM,já Alferes,foi mobilizado para Angola,e foi tanto o tempo de serviço que ainda foi promovido a Tenente naquela colónia.Quando regressou,após comissão,voltou à Académica e à Escola Agrícola,onde acabou o Curso.

P.Santiago

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Obrigado, Paulo, pela tua "achega"... A minha cultura futebolística é muito lumitada... Será que não existia mesmo, no nosso tempo tempo (leia-se "antes do 25 de Abril) o tal estatuto da alta competição que permitia "safar" os melhores atletas da guerra do ultramar, mesmo que tivessem que fazer o serviço militar (como o Eusébio).

A malta do FC Porto insinua que o regime de então "protegia" o Benfica, "por portas e traversas", até da "insenção do tal "imposto de sangue" que todos (quase todos...) fomos obrigados a pagar...

Mantenhas. Luis

paulo santiago disse...

Luís,tal como tu,não tenho grande cultura futebolística.Sei que cumpriam o SMO. Em 1973,um dia em Lisboa,encontrei o Tony (meu colega de ano no colégio) fardado (Alferes)que estava numa unidade ligada aos transportes.Não sei dessas intrigas entre Porto e Benfica,o Tony era atleta deste último.
O presidente do Sporting,que falei no outro comentário,era o Gen. Homem de Figueiredo,que pouco valeu ao Oliveira Duarte,que estava em Luanda,mas fazia colunas para o Norte.

Abraço

Carlos Vinhal disse...

Confesso que o Lemos me deu uma grande alegria quando naquele célebre jogo marcou 4 golos ao Benfica. Lembro-me bem dessa tarde de domingo a ouvir o relato no quarto do Carneiro e do Branco, dois lisboetas que não terão achado graça nenuhma.
Mal adivinhava eu que passado pouco tempo o próprio Lemos estaria naquela terra como combatente.
Abraço
Carlos Vinhal
Leça da Palmeira

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Portanto, tudo indica que os futebolistas, dos grandes clubes aos mais pequenos, todos cumpriam o SMO (Serviço Militar Obrigatória). Feita a recruta e o juramento de bandeira, deviam ter depois uma "tropa" mais aligeirada... E a grande maioria não terá sido mobilizada para o Ultramar... Foi assim ?

Antº Rosinha disse...

O Oliveira Duarte jogava no Sporting de Luanda.

Quando apareciam jogadores de nomeada vindos para Luanda, eram disputados pelo benfica, sporting ou porto, e embora pertencessem às suas unidades, arranjavam espaço para treinar e jogar.

O mesmo acontecia com atletas de andebol, voleibol, basket e hoquei.

O desporto em Angola era um festival semanal permanente.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O que mudou neste país, desde 31 de janeiro de 1971 ? Muitas coisa, mas o futebol (clubístico) continuou a ser "paixão" de massas (, outros chamam "alienação"), independentemente dos regimes políticos...

Os jogadores, esses, já não recebem camiões TIR de tintas, móveis e electrodomésticos, por golos marcados, nem precisam de fazer o serviço militar (que deixou de ser obrigatório), e muito menos de ir para a guerra... Mas muitos continuam a lidar com a fama e a natural decadência...


Tabanca Grande Luís Graça disse...


Em 25 de setembro de 2015, a Sábado ainda se lembrava dele:

"Durante dois meses ia para os treinos com a G3 no carro"

Carlos Torres
25 de setembro de 2015

Lemos não ganhou qualquer título no FC Porto, mas ficou famoso por ter marcado quatro golos ao Benfica num só jogo, em 1971, o que lhe valeu como prémio tintas, móveis e electrodomésticos

https://www.sabado.pt/desporto/detalhe/durante-dois-meses-ia-para-os-treinos-com-a-g3-no-carro

Fernando Ribeiro disse...

Um outro antigo jogador do F.C.Porto que foi mobilizado para o Ultramar foi o Albertino. Ele foi mobilizado para Angola, onde foi colocado no Tôto, no norte do território, mas passou grande parte da comissão na cidade de Carmona, onde jogou num clube local, um clube civil. Ele mesmo me contou o facto, que consta da sua biografia no Estrelas do FCP.

Embora não tenha nada a ver com o assunto, recordo que a rádio daquela cidade (Rádio Clube do Uíge) transmitia nesse tempo relatos de futebol na língua local (quicongo, a língua do antigo reino do Congo), num notável esforço de aproximação à população africana da cidade e do distrito. Foi caso único em Angola.

Por outro lado, recordo que em Mafra, aquando da minha passagem pelo Curso de Oficiais Milicianos em 1971, o recorde absoluto da pista de obstáculos (muro, vala, galho, etc.) pertencia ao Artur Jorge, que a tinha feito na íntegra em 40 segundos, salvo erro. Ninguém da minha incorporação conseguiu igualar, sequer, o recorde, que continuou a pertencer ao Artur Jorge.

Mudando de assunto: seria conveniente que os termos e palavras que usávamos no Ultramar e que pertenciam à gíria castrense fossem acompanhados de uma curta tradução. Hoje em dia, quantos visitantes do blog saberão o que é o "imposto de sangue"? E uma "passagem à peluda"? E um "bate-estradas"? Pelo menos, sugiro que se coloque o link para um glossário em local bem visível, de preferência no cimo do blog.

Anónimo disse...

Em referencia ao post
"Guiné 61/74 - P22384 de 18 de Julho:
A companhia de madeirenses CC 1439 (1965/67) também tinha entre os seus quadros um futebolista profissional , o Eduardo, furriel miliciano de Cabo Verde, que jogava num clube da 1a divisão, não sei qual. A foto melhor dele foi-me enviada a 15 de Junho passado pelo Henrique Matos. Nessa foto, onde eu não apareço porque estava em Porto Gole na altura, se me não engano, que foi tirada quando o Alferes Henrique Matos chegou a Enxalé eu pude identificar , além do Alferes Henrique Matos, sentado no meio do grupo, os furriéis Bonifácio ( passarinho) natural da Lourinhã, o Furriel António Lopes, e o furriel Eduardo. E ainda o Alferes Sousa e o furriel Teixeira. Não sei como fazer para copiar essa foto aqui; mas talvez o Henrique Matos leia este comentário e possa complementar com mais info, se achar pertinente.
Joao Crisóstomo, Nova Iorque

...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

imposto de sangue

Português
Substantivo
Imposto de sangue m ( plural Impostos de Sangue )

imposto de sangue ( termo depreciativo para recrutamento militar )

https://en.wiktionary.org/wiki/imposto_de_sangue

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O imposto de sangue... (negrito nosso)

A metamorfose republicana

Viriato Soromenho Marques
29 Julho 2014 — 16:40

DN - Diário de Notícias

https://www.dn.pt/globo/europa/a-metamorfose-republicana-4052801.html

A Primeira Guerra Mundial manifestou uma das características marcantes do movimento republicano em Portugal: o entusiasmo pelo império colonial africano. A exaltação com a corrida para África tinha ficado bem patente, já em 1890, com a violenta reação da ativa minoria republicana à inevitável e sensata cedência de D. Carlos I ao Memorando da Rainha Vitória (conhecido por "Ultimato"), que nos colocava fora do Mapa Cor-de--Rosa.

Muito antes de o nosso Corpo Expedicionário Português (CEP) começar a ser dizimado nos campos de batalha da Flandres, já alemães e portugueses lutavam em Angola e Moçambique. AI República pensou, contudo, que teria de pagar um imposto de sangue na Europa para que Portugal, depois de perdidas a Índia e o Brasil, pudesse manter o seu império em África.

O que mudou pouco antes da Revolução de que nasceu a nossa III República, foi o colapso dentro dos republicanos, do anterior consenso sobre África. De um lado, Salazar, líder dos "velhos republicanos" conservadores e tendencialmente sidonistas, que seguiu com total intransigência as pisadas de 1890 e 1916, numa defesa incondicional do direito a manter um império colonial, como a democrática França o fez na Indochina e na Argélia, até a força das armas ter ditado a sua queda.

Do outro lado, os "novos republicanos", que verberaram o colonialismoe a guerra em três frentes a que ele conduziu. Sem perceber esta rutura interna ao ideário do republicanismo português sobre o lugar de Portugal em África, não perceberemos nada, nem sobre a Primeira Guerra Mundialnem sobre o 25 de Abril de 74, e ainda menos sobre os gigantescos custos humanos e materiais da descolonização que se lhe seguiu. (...)

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Imposto de sangue ? Paguei eu e todos aqueles de nós que, mesmo discordando do "legitimidade" da guerra do ultramar / guerra colonial, a fizeram, de armas na mão, com "sangue, suor e lágrimas"...

Imposto de sangue pagaram os meus soldados, os fulas, recrutados "à força", aos 15/16 anos...

(...) Na época do Império Otomano, a entrega obrigatória de filhos de cristãos aos turcos para servirem como guardas do sultão era chamada de "imposto de sangue"...


(...) Em teoria era um imposto cobrado a todas as regiões cristãs do Império Otomano, mas recaiu mais pesadamente na Bósnia, Albânia e Bulgária. (...)

Cito a entrada da Wikipédia sobre os janízaros:

Os janízaros ou janíçaro (do turco Yeniçeri, ou "Nova Força") constituíram a elite do exército dos sultões otomanos. A força, criada pelo sultão Murade I, cerca de 1365, era constituída de crianças cristãs capturadas em batalha, levadas como escravas e convertidas ao Islã. (...)

Seu código de conduta era rigoroso e obrigava:

Obediência absoluta aos oficiais
Abstinência de álcool
Proibição do uso de barba
Proibição de casamento
Não exercer nenhuma profissão em paralelo
Moradia em quartéis

Deviam ainda aceitar certas condições:

Antiguidade como critério de promoção
Treinamento ou exercícios a qualquer momento
Castigo corporal por parte de oficiais
Pena capital como instrumento de misericórdia (...)

https://pt.wikipedia.org/wiki/Jan%C3%ADzaro

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Fernando Ribeiro, fica aqui a tua sugestão para se incluir, no Pequeno Dicionário da Tabanca Grande", o termo "imposto de sangue" (cuja uso e definição não serão consensuais, tal como, por exemplo, não o é a expressão em francês "chien de guerre", mercenário, e que em português não se pode traduzir como "cão de guerra")...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Imposto de sangue, "blood tax"... ou "devshirme" (em turco)... Ler aqui (de preferência em inglês).

https://en.wikipedia.org/wiki/Devshirme

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Mas voltemos ao essencial deste poste: havia ou não havia, no tempo da guerra do utramar / guerra colonail (1961/74), equivalenet ao "estatuto do atleta de alta competição" de hoje ?
Tenho de perguntar aos nossos camaradas formados em ciências do desporto, como por exemplo, o Jaime Bonifácio Marques da Silva.

No Decreto-Lei n.º 123/96, de 10 de Agosto, lê-se, no preâmbulo:

(...) A Lei n.º 1/90, de 13 de Janeiro, Lei de Bases do Sistema Desportivo, reconhece, no seu artigo 15.º, a importância do desporto de alta competição como paradigma da actividade desportiva.

Por sua vez, o Decreto-Lei n.º 125/95, de 31 de Maio, veio, no desenvolvimento da referida lei, regulamentar as medidas de apoio à prática desportiva de alta competição.

Acontece que, no período de tempo entretanto decorrido, se verificou uma grande intensidade na prática desportiva, já que este ano tem lugar um dos maiores eventos desportivos mundiais, os Jogos Olímpicos.

A experiência colhida veio demonstrar a necessidade de proceder a alguns ajustamentos no referido decreto-lei, nomeadamente no que se refere ao acesso ao ensino superior dos praticantes sujeitos ao regime de alta competição, à possibilidade de ser concedida mais de uma licença extraordinária àqueles que desempenhem as suas funções profissionais no sector público, à decisão de atribuir a respectiva dispensa, à atribuição de prémios aos praticantes profissionais e, finalmente, à dependência dos benefícios concedidos no presente diploma da inscrição num registo nacional dos praticantes com estatuto de alta competição. (...)

https://dre.pt/pesquisa/-/search/405681/details/maximized

Unknown disse...

Nao conheci o Lemos, mas estivemos "juntos" no mesmo dia na boite Chez Toi em Bissau. Estava eu com uns camaradas da Marinha a beber uns Wiskeys com agua Perrier, ja com uns "copos", resolvi sacudir uma garrafa e "burrifar" o pessoal que se encontrava na boate. De repente, aparecem dois individuos que se dirigiram a mim e perguntam-me "sabe quem e a pessoa que foi atingida com a sua brincadeira?" Disse-lhe que talvez fosse o General Spinola. Eles disseram-me que tinha sido o Lemos, do FCP e que se fosse homem iriamos resolver o "problema" la fora . Como tinha as "costas largas" porque os segurancas eram cabos fuzileiros meus conhecidos (um deles era o famoso cabo Lage). Disse aos dois amigos do Lemos que me tinham "convidado" para ir la fora "Vamos la para fora". Quando ia a sair o Lage perguntou-me, "Sr. Tenente ja se vai embora" e disse-le que ia la para fora para uma briga com os dois individuos que me seguiam. O Laje disse -me que iriam "encarregar-se deles. Fingi que ia sair, o Lage e outro cabo agarraram os individuos pelas calcas e pelo colarinho e os dois sairam voando do Chez Toi.

Pensando melhor hoje, nao me sinto orgulhoso pelo que fiz,

Jose "Zeca Macedo"- Tenente FZE
DFE 21
Guine 73-74

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Excerto de um interessante reportagem, assinada por Vítor Hugo Alvarenga, no sítio IOL > Mais Futebol, que reproduzimos aqui com a devida vénia...

Ficamos a saber que o Lemos, apesar de tudo, teve um tratamento VIP (, dadas as circunstâncias...): de maio de 1973 a abril de 1974, esteve em Bissau, a jogar pela UDIB, a União Desportiva Internacional de Bissau, enquanto os seus camaradas da CART 6552/72 foram penar para Cameconde, o aquartelamento mais a sul da Guiné onde a guerra estava feia...

Recorde-se que a CART 6552/72 chegou a Bissau a 26/5/1973, fez uma rápida IAO no Cumeré e seguiu a 12/6/1973 para Cameconde... O Lemos ficou, pois, em Bissau...

https://maisfutebol.iol.pt/25-de-abril-de-1974/25-de-abril/canhoes-apontados-para-lisboa-e-um-portista-a-sofrer-no-ultramar

IOL > Mais futebol > 25 de abril de 2014 > 25 de abril de 1974 > Canhões apontados para Lisboa e um portista a sofrer no Ultramar

Vários jogadores a viver de perto o 25 de abril. José Rachão no Cristo-Rei e Lemos a penar na Guiné-Bissau, queixando-se de tratamento desigual.

(...) Lemos: os quatro golos ao Benfica e pesadelo na Guiné

António Lemos , aquele Lemos dos quatro golos ao Benfica em 1971, foi outra lança portuguesa em África. O avançado do FC Porto chegou antes do 25 de abril e não tem dúvidas: esse tempo mudou a sua carreira e a sua vida.

«Era titular do FC Porto desde 1970 e, sinceramente, pensei que tinha feito o suficiente no futebol português para não me acontecer aquilo. Era o pior que me podiam fazer. A verdade é que foi pesado para mim, em termos físicos e mentais. Ainda voltei ao FC Porto mas só joguei no clube mais uma temporada.»

Lemos considera que houve tratamento desigual nessa fase.

«Apanhei um comandante que não gostava de mim, se calhar foi por isso, mas a verdade é que por volta da mesma altura foram para Angola o Seninho e o Chico Gordo e eu acabei na Guiné-Bissau. Não me recordo de ter acontecido o mesmo a jogadores do Benfica ou do Sporting…»

O avançado tinha adiado o serviço militar obrigatório mas não conseguiu escapar ao seu destino. Ficou em Bissau entre maio de 1973 e abril de 1974.

«A Guiné estava a ferro e fogo e cheguei a andar no mato, passei momentos complicados. Depois o FC Porto lá conseguiu que eu fosse para a capital e ainda joguei na UDIB, a União Desportiva Internacional de Bissau. Por lá fiquei até à Revolução, até acordar certo dia e ouvir um grande alvoroço. Quando soube do 25 de abril, fiquei deliciado. O meu tempo ali estava a acabar. Finalmente!»

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Mais outra história sobre s futebolistas que apanhados pelo Serviço Militar Obrigatório e o 25 de Abril:

https://maisfutebol.iol.pt/25-de-abril-de-1974/25-de-abril/canhoes-apontados-para-lisboa-e-um-portista-a-sofrer-no-ultramar


Manuel Fernandes, um comando à força a caminho de África

Abre-se espaço para o lado mais cruel. Os clubes exerciam a sua influência e os próprios jogadores procuravam formas de escapar aos desígnios indesejados.

José Freixo (Académica) lembra-se de usar o dinheiro do futebol para pagar a colegas e trocar serviços. Acácio Casimiro (Boavista) chegou a ser mobilizado para Angola – em 1972, quando estava no Sp. Espinho – mas trocou com outra pessoa mediante uma compensação financeira. Nem todos tiveram a mesma sorte.

Manuel Fernandes Domingues, conhecido no mundo do futebol como Manuel Fernandes, viu a sua carreira no Farense ser interrompida por uma recruta que o levaria até Angola, sem aviso prévio.

«Estava na seleção de esperanças, falava-se no Sporting…É verdade que tudo mudou com o serviço militar. Tentei ficar colocado em Tavira mas mandaram-me para as Caldas da Raínha. Entrei na tropa a 23 de abril e estávamos na recruta quando a Revolução aconteceu. Durante uma semana, não nos disseram nada sobre o assunto. Só nos fomos apercebendo aos poucos.»

O pior viria depois. Manuel Fernandes cumpriu a recruta e pouco jogou no Farense, já que preferia matar saudades da família aos fins-de-semana. De repente, uma decisão estranha.

«Fui 'selecionado' para o curso de comandos. Eu que nunca quis ser comando na vida! Selecionaram-me, lá tirei o curso e estava na Amadora quando, de repente, dizem-me que vou ser enviado no dia seguinte para Angola. Ainda liguei para o Farense mas nada havia a fazer. Se calhar houve excesso de confiança, do clube e meu. Nunca imaginei aquilo, ir para Angola depois do 25 de abril.»

Manuel Fernandes tinha 21 anos.

«Fiquei em Luanda durante cerca de um ano, até à independência. Ainda fiz alguns jogos no FC Luanda, filial do FC Porto, mas o campeonato acabou por parar, não havia condições de segurança. De resto, foi um ano mau, havia guerrilhas por todo o lado e lembro-me de ter estado debaixo de fogo várias vezes. Enfim, ficou a experiência.»

O extremo regressou em outubro de 1975. Voltou a vestir a camisola do Farense, seguindo-se Estoril, Portimonense, Amora, Juventude e Lusitano de Évora, cidade onde vive atualmente.

Anónimo disse...

DOR DE COTOVELO DE UM BENFIQUISTA..

O Lemos julgo que passou a maioria da comissão em Bissau e jogou na UDIB.
Quando me encontrava já em Bissau após a retracção de gadamael e aguardando embarque para a Metrópole assisti no Pelicano a uma cena de copos pouco edificante, onde a principal figura foi o Lemos.
Disseram-me que era comum o Lemos dar uns ares de vedeta, não sei se era verdade , mas na cena que assisti deu esses ares, e só não intervi porque a minha condição de benfiquista me inibiu.
Julgo que a cena acabou com a intervenção da PM.

O Lemos tinha muita força e pouca técnica.
Nos célebres 4-0 o relvado das Antas mais parecia um campo de batatas.

Já não tenho rancor nenhum ao Lemos.

AB
C.Martins

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Era importantes que o Manuel Domingos Ribeiro, ex-furriel mil da CART 6552/72, camarada do Lemos, nos confirmasse qUE o futebolista do FCP nunca chegou a conhecer Cameconde, e que a sua guerra se limitou à UDIB, com umas "escapadelas" ao Pelivanova e ao Chez Toi.

Tudo indica que os grandes clubes na época protegiam, de uma maneira ou de outra, os seus atletas a cumprir o serviço militar obrigatório. Estamos a falar do futebol.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

De qualquer modo, o Lemos ainda está vivo, foi nosso camarada e tem aqui um lugar, no blogue da Tabanca Grande, para nos poder contar, em primeira mão, as suas histórias da vida militar.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

A caminho da fisioterapia,vejo que já temos mais de 2 dezenas comentários a este poste. Quer se goste ou ou não, o futebol é uma das paixões dos portugueses... Depois de Descobrir o Caminho Marítimo para a India, ficamos sem mais nada que que fazer, como disse o poeta.

Anónimo disse...

Estava em Aldeia Formosa / Quebo nesse Domingo. Curiosamente e por coincidência, a "malta" do Posto de Rádio do STM, eu, Álvaro Vasconcelos, o Agostinho Barbosa, o António Silva Monteiro e o Adriano Duarte Costa,nesse dia, conseguimos "arranjar" um frango ( ou franga). Tratamos de o depenar (escondemos as penas no caixote do lixo do Posto), demos uma "palmada" num caixote de batatas, na arrecadação de géneros, "palmamos" o volume de uma garrafa de cerveja tipo "basu-ca" de azeite na mesma "dependência" e delicia-mo-nos num banquete que nos preparou, de estômago bem recheado para a tarde de audição do relato que nos entreteve. Lembro-me que o "coitado" do Agostinho Barbosa (encontra-mos-nos e falamos com frequência,pois reside em Paredes) que "degolou" a "presa" e a "depenou", não ouviu o relato, porque entrou na escala de serviço precisamente na hora do jogo. Ele adepto do SLBenfica; o "Tony" Monteiro é do SCPortugal, o Costa era simpatizante da Académica eu sou "portista" (clube do "sítio" onde nasci, por isso, do meu bairro, da minha cidade, do (meu) "Norte", de Portugal, da Europa e do Mundo. Por isso o Lemos é recordado como qualquer outro jogador, antigo, actual e/ou futuro atleta de qualquer modalidade, das muitas que o "Porto" tem, incluindo de desportistas com limitações físicas, os quais são "mal amados" (todos sem excepção!...) pelo "portugal-dos-pequeninos" que "abundam" no Portugal de alguns dos que, afinal, também no nosso "poilão" se sentam!...