sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12063: Memórias de um passado (Joaquim Cardoso) (2): Um só dia e uma só noite no mato bastaram para um grande susto

1. Mensagem do nosso camarada Joaquim Cardoso (ex-Soldado de TRMS do Pel Mort 4574, Nova Lamego, 1972/74), com data de 17 de Setembro de 2013:

Caros Amigos e Camaradas:
Envio este texto, que é mais um pedaço daquilo que se vai mantendo no meu arquivo memorial. Certo das insuficiências que ele contém referentes a datas e, qual a Companhia e/ou Batalhão do pessoal que me acompanhou. Fiz algumas pesquisas, mas considerei insuficientes para arriscar as suas nomeações. Penso contudo que dará para subentender um momento de aflição por que passei em terras Africanas.


MEMÓRIAS DE UM PASSADO

2 - Um só dia e uma só noite no mato bastaram para um grande susto 

Foi em princípios do mês de Setembro de 1972 que cheguei ao Gabú-Sara em Nova Lamego na Guiné, isolado, (como já tive a oportunidade de referir noutro texto), dos meus companheiros do Pelotão de Morteiros 4574/72.
Após a chegada, comecei por contactar os serviços praticados no Posto de Rádio, Central Telefónica e Centro de Mensagens, afectos à CCS do BCAV 3854, de forma a obter experiência e, posteriormente, fazer parte da escala de serviço dos restantes companheiros de transmissões.

Três ou quatro dias(?) depois de ter chegado, fui informado pelo 1.° Sargento Martins que pertencia ao mesmo Pelotão, para na manhã do dia seguinte me equipar com a farda de mato para seguir para o CAOP, (Quartel Velho), a fim de acompanhar uma coluna em serviço de transmissões, (por falta de pessoal no dito Quartel), coluna essa que tinha como finalidade, (soube depois), o reconhecimento de um local que diziam ser muito perigoso e que já tinha sido utilizado pelas tropas opositoras nas suas ações de guerrilha.

Dando cumprimento à ordem que havia recebido, de manhã vesti o camuflado, preparei a mochila, enfiei 4 carregadores de munições no cinto, peguei na G3 e aguardei.
Transportaram-me depois num jeep até ao Quartel Velho e, após me ter juntado ao resto do pessoal, fomos transportados em Berliets e Unimogs que atravessaram a Bolanha, seguindo pela estrada alcatroada em direção a Oco Maúndo.

Percorridos alguns quilómetros(?), as viaturas pararam e apeámo-nos junto a uma picada em terra batida, tendo as ditas viaturas recolhido ao Quartel.
Não conhecia ninguém do grupo por duas razões: -Ter chegado há poucos dias ao Gabú e não pertencer àquele Quartel. Ali estava eu, junto daqueles operacionais, com a minha farda "novinha em folha" ainda a cheirar a naftalina, contrastando com a deles, em que se notava sem qualquer motivo para dúvidas, o desgaste provocado pelo tempo e/ou trabalhos já passados.

Mochila às costas, G3 num ombro e o rádio AVP1 (Banana) no outro. O rádio Racal que fazia parte do meu equipamento, para comunicações a longa distância, seguia às costas de um carregador, contratado para o efeito, (era um luxo!).

O Alferes que comandava a coluna apeada ordenou para o pessoal formar duas filas, uma no lado direito e a outra no lado esquerdo da picada. Já habituados àquelas "andanças", o pessoal começou desde logo a tomar posições de acordo com as funções que cada um desempenhava e, as filas em pouco tempo ficaram formadas. Eu porém mantinha-me fora da fila, juntamente com o acompanhante com o rádio às costas, esperando orientações.

O Alferes que ia acompanhando os movimentos do pessoal, ao ver-me fora da fila, perguntou:
- Ó transmissões, não vais para a tua posição?

Respondi:
- Meu Alferes, cheguei há poucos dias da Metrópole. É a primeira vez que faço este tipo de serviço e não sei que posição tomar!

Dito isto, olhou para mim com ar de preocupado, com voz alterada e em linguagem militar pergunta:
- Sabes trabalhar com essa "merda"? - apontando com o dedo para o rádio.

Respondi-lhe:
- Depois de terminar a especialidade, utilizei um rádio Racal em duas finais de curso de Comandos na Serra das Meadas em Lamego e, sendo os rádios iguais, não vejo motivo para dificuldades.

Tinha já em minha posse os códigos correspondentes, (os que utilizo a seguir são fictícios), coloquei os auscultadores, puxei a antena, coloquei o botão na respectiva frequência, peguei no microfone e chamei o Posto de escuta:
- OSCAR OSCAR, aqui PAPÁ, diga se me ouve? - Escuto.
O OSCAR respondeu:
- PAPÁ aqui OSCAR, afirmativo-informe
O PAPÁ de novo:
- OSCAR aqui PAPÁ, é uma chamada de experiência.
O OSCAR responde:
- PAPÁ aqui OSCAR, ouço em perfeitas condições.
Finalmente o PAPÁ:
- OSCAR aqui PAPÁ, Ok terminado.

Depois do PAPÁ conseguir comunicar, foi para o meio duma fila onde afinal era o seu lugar!
Seria meio da manhã e, à ordem de avanço, as filas puseram-se em movimento.
Seguimos em marcha moderada com os elementos que a compunham distanciados cerca de 3 metros entre si, a arma em posição de fogo e em permanente vigilância das duas partes do matagal. 

Por volta do meio dia, meia hora(?), parámos para comer a ração de combate. Alguém já conhecedor do meio ambiente, fez uma pequena fogueira, não por falta de calor, que disso estavam todos bem abastecidos, mas para tentar afastar a mosquitagem que além de nos morder constantemente, teimavam em pousar no conteúdo da lata de conserva para dar umas bicadas.

A água do cantil em pouco tempo esgotou e só foi possível reabastecê-lo mais tarde, com a água existente nuns charcos de uma clareira rochosa, "quente como caldo" como é habitual dizer-se.
O Enfermeiro distribuiu ao pessoal "quininos" (habituais comprimidos), para sua desinfeção, e não sendo agradável bebê-la naquelas condições, serviu para humedecer os lábios, limpando-lhes a saliva que se havia acumulado.

A meio da tarde a marcha prosseguia, começando a ouvir-se algumas vozes discordantes, queixando-se ao Alferes do esforço que o pessoal estava a fazer. Entretanto, a marcha mudou de direção. Deixámos a picada e entrámos "mato dentro", agora numa só fila.
Caminhámos por um trilho ladeado de capim com mais de 2 metros de altura. A marcha aqui, tornou-se mais lenta, não só devido ao cansaço dos muitos quilómetros percorridos mas também, pelo aumento das dificuldades que se iam encontrando à medida da sua progressão.
Deu para entender que era local perigoso. As ordens vinham da frente para trás e, em passa-palavra dizia-se:
- Redobrar atenção, aproximar 1 metro, alargar 2 metros, etc.

Passado esse trilho, chegámos ao fim da tarde a um local amplo, onde passámos a noite.

É neste local onde apanhei o que considero ser, o maior "cagaço" da minha vida!
O Alferes ordenou ao pessoal para formar um círculo. Eu fiquei, entre outros, no meio desse círculo, distanciado cerca de 3 metros do Alferes. Seriam, 23 ou 24 horas(?), não havia luar, não se podia acender um cigarro, era escuridão quase absoluta.

Estendido no chão, estava o meu cérebro, bem como o resto do corpo, a aliviar-se um pouco do cansaço que a marcha lhes tinha provocado, quando de repente senti, ou sonhei, um puxão na capa com que me cobria, dando a sensação de me quererem raptar!

Acordo terrivelmente assustado, com o coração a bater mais forte que nunca, mas na incerteza, não "piei". Segundos depois outro puxão, mas agora não tinha dúvidas, era mesmo realidade!
Porém, logo de seguida, uma voz em tom de silêncio e com pronúncia Africana chama:
- Meu Alfero?

Ah... que alívio. - Era o guia!

Homem negro, conhecedor do terreno, que orientava o pessoal em plena mata, procurava aos apalpões na escuridão o Alferes para lhe comunicar que ouviram um barulho e convinha fazer reconhecimento.
Verificou-se depois que o dito barulho, fora provocado por animais que passavam próximos, e não por alguém que certamente estaria no nosso imaginário.

Com muita dificuldade refiz-me do susto, voltando à posição inicial, mas o sono que também se terá assustado, naquela noite não voltou.

Ao romper da aurora, vieram ao nosso encontro algumas viaturas que nos transportaram de regresso ao Quartel.
Após a minha chegada, dirigi-me à Enfermaria e pedi algo para colocar nos pés e músculos por forma a reparar o mal que a marcha dos mais que prováveis 30kms (?), lhes tinham causado.

Finalizando, refiro um à-parte que para mim foi curioso:
O Alferes, Comandante do meu Pelotão, abordou-me e perguntou:
- Onde estiveste ontem que não te vi?

Fiquei admirado com tal pergunta, e expliquei-lhe o que tinha acontecido.
Respondeu-me que nada sabia acerca do assunto e, por esse motivo, sendo o nosso Pelotão Independente, de futuro não voltaria a sair do Quartel, para qualquer tipo de serviço, sem sua autorização.

Tomei nota da sua recomendação e, felizmente para mim, nunca mais voltei ao verdadeiro mato, bastando assim um só dia e uma só noite para apanhar um grande susto.

Castelões- Penafiel, dia 17 de Setembro de 2013
J.Cardoso,
Ex-Sold. Trans. 194530/71

Joaquim Cardoso e Graça

Joaquim Cardoso na Cabina Telefónica

António Santos e Joaquim Cardoso
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Nota do editor

Primeiro poste da série de 21 DE AGOSTO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11966: Memórias de um passado (Joaquim Cardoso) (1): O começo foi assim

Guiné 63/74 - P12062: Convívios (533): Confraternização anual do pessoal da CCAÇ 2797 e Pel Canh SR 2199, dia 5 de Outubro de 2013, na Mealhada (Luís de Sousa)

1. O nosso Camarada Luís de Sousa (ex-Soldado Trms da CCAÇ 2797, Cufar, 1970-72), enviou-nos esta mensagem solicitando a divulgação da Confraternização Anual da sua Companhia e do Pel Canh SR 2199:

Caro Vinhal, 
Venho pedir o favor da divulgação no nosso blogue de mais um encontro da CCaç 2797 e do Pelotão de Canhões s/recuo 2199, que terá lugar no próximo dia 5 de Outubro na Mealhada.

O restaurante escolhido é o "Nova Casa dos Leitões". 

As marcações podem ser feitas com o camarada "Pintarola" ou com o ex-Alf Mil Fernandes pelos números:
916 026 810 ou 239 702 831.

Forte abraço, e, até sempre.
Luís de Sousa
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Nota do editor

Último poste da série de 17 DE SETEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12054: Convívios (532): 19º Convívio dos ex-militares da CArtª 566 - Vila Nova de Gaia, 26 de Outubro de 2013 (José Augusto Ribeiro)

Guiné 63/74 - P12061: Notas de leitura (521): "No Ocaso da Guerra do Ultramar", por Fernando de Sousa Henriques (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 30 de Maio de 2013:

Queridos amigos,
Graças à impressionante afabilidade da Teresa Almeida, da Biblioteca da Liga dos Combatentes, lá vou tendo acesso a material de registo obrigatório.
O Fernando de Sousa Henriques já nos deixou, a ele se deve um outro livro de viagem de saudades que ele coordenou. Este “No ocaso da guerra do Ultramar” é um relato sem rival, nunca vi tanta minúcia, detalhe e pormenor. Preocupou-se em criar o cenário da guerra, com as suas armas e transportes, a natureza da instrução, a caracterização do meio.
E na segunda parte vamos ter o seu testemunho sobre os terríveis acontecimentos ocorridos em Copá e Canquelifá.

Um abraço do
Mário


No ocaso da guerra do Ultramar (1)

Beja Santos

“No ocaso da guerra do Ultramar, uma derrota pressentida”, por Fernando de Sousa Henriques, edição de autor, 2007, é um livro único no panorama da literatura da guerra colonial da Guiné. Único pela quantidade de informação compilada pelo autor: sobre o cenário da guerra; o tipo de armamento e equipamento usados; súmula dos meios de intervenção e de apoio logístico dos três ramos das Forças Armadas; o que faziam o Movimento Nacional Feminino e a secção feminina da Cruz Vermelha Portuguesa. E dispostos todos estes elementos, o leitor é convocado para uma experiência militar, desde a ida “às sortes” até à desmobilização, tudo é esmiuçado: o ato da inspeção médica, o apuramento do mancebo, o número mecanográfico, o grupo sanguíneo, a recruta, o curso de operações especiais em Lamego, os mandamentos do Ranger e, enfim, a mobilização para a Guiné. O autor integrou a CCAÇ 3545 pertencente ao BCAÇ 3883, é enunciada toda a composição das unidades. Em Março de 1972, parte para a Guiné, de Bissau passam para Bolama, a IAO terá aqui a duração de um mês, e depois rumam para o reino de Pachisse, via Xime/Bambadinca/Bafatá/Nova Lamego/Piche. O destino é Canquelifá.

A minúcia do relato não abranda, ficamos a saber quem vão render, que estão na Zona de Ação L-4, zona de savana com cerca de 2000 km2 de extensão, caracterizada por uma superfície plana, de solo argiloso, coberto de mata dispersa. De Canquelifá a Piche distam 33 km. Ficamos a saber que nesse ano de 1972 Piche teria uma população aproximadamente de duas mil almas, predominantemente Fulas mas coexistindo com a etnia Mandinga. O régulo de Piche era Maundé Embaló, que morava numa casa ao lado da oficina de mecânica do batalhão, saíram de Piche e passaram por Cambor e Dunane. Ficaram surpreendidos quando entraram em Canquelifá, havia uma placa com o símbolo internacional identificativo de termas, estavam a ser praxados.

Não há qualquer economia descritiva na caracterização de Canquelifá, o reino de Pachisse, os lençóis de água, tipo de clima, os marcos fronteiriços identificativos de Portugal e Senegal, enquanto a nossa fronteira com a Guiné-Conacri era definida por certas árvores seculares que existiam naquela zona árida e agreste. Canquelifá era um aldeamento com cerca de 1,2 km de comprimentos e 500 m de largura. Dentro do perímetro interno havia 15 abrigos para as nossas tropas e milícias, espaldões previstos para os obuses 14 e o canhão sem recuo. Com todo o detalhe, o leitor ficará inteirado onde estão os edifícios, um a um, quem ocupa as instalações, como era a casa ocupada pelo capitão Peixinho de Cristo, são apresentados o 2.º Sargento Patada e o 1.º Sargento Simões. Depois o autor embala-se na pormenorização do Canquelifá social, o nome das povoações e até as tabancas abandonadas. E mais, o leitor é induzido para as celebrações do ramadão, as cerimónias do casamento, os batuques, os dias de festa na tabanca, o fanado, as tarefas domésticas, os trabalhos a cargos dos homens, os casos de lepra. Logo ficamos a saber que o autor esteve em Bambadinca cerca de três meses a comandar uma companhia de instrução de milícias, assunto que remete para o pelotão de milícias 267, em Canquelifá.

Segue-se o breve historial sobre o BCAV 2922, esteve na região de Piche entre 1970 e 1972, são registadas as atividades militares mais relevantes.

E começa o dia-a-dia de Canquelifá, da companhia “Os Abutres”, os seus patrulhamentos, as obras de beneficiação, o material utilizado, os lazeres com jogos de cartas, jogos de futebol e de voleibol. Ficamos também a saber as recordações do capelão e do médico. O capelão fora já para a Guiné com muitas dúvidas de fé, admitia no futuro deixar o sacerdócio. As missas eram celebradas debaixo de uma árvore frondosa que exista junto à enfermaria. Improvisava-se uma espécie de altar que não era mais do que uma pequena mesa onde se colocava o Cristo crucificado. A homilia consistia numa mensagem de paz interior, tudo muito terra-a-terra. Ficaram muito boas impressões do médico da companhia, desvelado e interessado pela saúde de todos. Temos aqui fartos apontamentos sobre o paludismo, as visitas a Canquelifá e até a deserção do furriel Vagomestre, que nas férias rumou para a Suécia. Falava-se muito da comida, todos tinham saudades do rancho familiar. Todos se dedicaram às pequenas hortas, até se plantavam piri-piri, pimentos e salsa.

Asseguro que nunca li um relato como este, é uma prosa coloquial, quase divagante, Fernando de Sousa Henriques depõe, indignado, pela sorte dos militares guineenses que foram esquecidos na pós-independência, não pactua com o abandono destes camaradas tão fiéis, tão aprumados, tão combativos. Parece que escreve para diferentes públicos ao mesmo tempo, a sua participação na guerra parece confundível que toda a guerra, com os acontecimentos ocorridos em todos os teatros de operações, toma-se a sua mobilização como a mobilização de centenas de milhares de jovens portugueses. Não disfarça o orgulho pelas suas classificações e por ser o número dois da companhia. A sua preocupação é envolver o leitor, dar-lhe a saber que havia rações de combate, como eram os quartéis, qual o comportamento das populações face à guerra. Nesta dimensão é um cronista que não esconde os seus estados de alma, faz reproduzir o seu álbum fotográfico com oportunidade. No final do livro, não descurará as listagens de militares ex-combatentes, teremos ali o BCAÇ 3883 por inteiro, tal como o BCAV 2922, a lista nominativa dos combatentes originários dos Açores, o seu espólio fotográfico insere-nos em Canquelifá, aperta-se-nos o coração com as destruições que irão ocorrer na última fase da guerra, pois o relato será igualmente minucioso com os graves acontecimentos em 1974 que tocaram à desditosa Copá e ao cerco a Canquelifá.

Será esta a matéria para a próxima recensão.

(Continua)
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Notas do editor

Vd. também poste de 28 DE JANEIRO DE 2009 > Guiné 63/74 - P3809: Notas de leitura (12): Os últimos dias do destacamento de Copá, Janeiro/Fevereiro de 1974 (Helder Sousa / Fernando de Sousa Henriques)

Último poste da série de16 DE SETEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12048: Notas de leitura (520): "Guiné Mal Amada - O Inferno da Guerra", por António Ramalho de Almeida (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P12060: Manuscrito(s) (Luís Graça) (11): No melhor pano cai a nódoa... (Luís Graça)



Marco de Canaveses > Paredes de Viadores > Candoz > Quinta de Candoz > 28 de agosto de 2013 > Um quivi, ainda verde...Um fruto de origem chinese cuja cutura se expandiu pelo continente australiano, América e depois pela Europa e, mais recentemente, por Portugal e a região de Entre Douro e Minho... Uma nódoa na paisagem, como o eucalipto e tantas outras plantas exóticas e infestantes (, mas também coisas, ideias, usos, costumes, etc.).

Foto: © Luís Graça (2013). Todos os direitos reservados.






No melhor pano cai a nódoa
por Luís Graça







No melhor pano cai a nódoa, diz o povo. 
Ou dizem que diz o povo.
Pergunto: com razão ?
Opto pela dúvida metódica.
Não sei se cai mesmo,
a nódoa no pano.
E afinal o que é que cai ?
E onde ?
A nódoa ou o pano ?
A nódoa no pano ou o pano na nódoa ?

Ou melhor, reformulando a questão:

é a nódoa que cai no pano
ou é o pano que cai na nódoa ?
O pano pode ser voador
como o tapete mágico
das mil e uma noites.
E até provocar um orgasmo de múltiplas nódoas.
E a nódoa, por seu turno,
pode estar ali,
especada,
emboscada,
traiçoeira,
oportunista,
como uma flor carnívora
à espera da sua vítima,
como a orquídea-abelha
à espera do zangão
para ser fecundada.


Pergunto:
será o pano fêmea
e a nódoa macho ?
Se sim, porque dizes o pano, a nódoa ?
Tu, que és pano,
não sei porque deverias ser
estático,
passivo,
objeto,
recetáculo.
Tu, que és nódoa,

terias que ser dinâmica,
proactiva,
sujeito,
vetor ?


Em boa verdade,
não sei mesmo se a nódoa cai,
como a a mação de Newton
por força da gravidade
ou por via do pecado original.
E muito menos se cai no pano.
E logo no melhor pano.

Além disso, por que é que no melhor pano

haveria de cair a pior nódoa ?
Ou por que é que no pior pano
não pode cair também a melhor nódoa ?

Na seda mais fina é que a nódoa pega,
há também quem o diga e ajuramente.
O que vale é que 
a nódoa que põe a amora.
com outra, verde, se tira.
Eu prefiro a bosta de abril
que tira manchas mil.
Mas cuidado com os meses,
que a nódoa de janeiro
não a tira o ano inteiro.
E depois há nódoas e nódoas:
nem toda a água do mar
pode certas nódoas tirar.
E, abrenúncio!,
nódoa de gordura
é alma que cai no inferno.


A conclusão que eu tiro
é que não há pano sem nódoa,
não há nódoa sem pano,
não há ponto sem nó.

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Nota do editor:


Último poste da série > Guiné 63/74 - P12040: Manuscrito(s) (Luís Graça) (10): O dever de servir a Pátria... Éramos todos iguais, mas uns mais do que outros

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12059: Conversas à mesa com camaradas ausentes - Estórias da História da Guerra Colonial – Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (8): De Bafatá até ao regresso a casa

1. Oitavo e último episódio da série "Conversas à mesa com camaradas ausentes", pelo nosso camarada José Martins Rodrigues, ex-1.º Cabo Aux Enf.º da CART 2716/BART 2917, Xitole, 1970/72:

A todos os ex-combatentes da Guiné
Só peço ao meu futuro que respeite o meu passado

No baú das memórias de cada um de nós existem inúmeras “Estórias da Guerra” por contar.
O convívio semanal na Tabanca de Matosinhos e o nascimento da ONG Tabanca Pequena-Amigos da Guiné a que me honro pertencer, despertaram-me para o desafio de retirar do baú as minhas “estórias da guerra”. Para ultrapassar a minha manifesta falta de jeito para a escrita, socorro-me de um método narrativo baseado na descrição cronológica de episódios, a que chamarei “Conversas à mesa com camaradas ausentes”. Do outro lado da mesa estará sentada a esperança de encontrar alguém que se reveja nas “estórias” relatadas e sinta a emoção do reencontro com realidades da nossa vivência na Guiné.


CONVERSAS À MESA COM CAMARADAS AUSENTES

8 - DE BAFATÁ ATÉ AO REGRESSO A CASA

A vinda para Bafatá tinha o sabor de um doce saboreado fora de tempo. Mas era a janela que já se abria à concretização dos sonhos, construídos na esperança de mais uma etapa prestes a ser vencida. Fui aqui colocado, num aquartelamento na zona alta da cidade. Passava uma parte do tempo no parque que ficava por detrás da igreja. Lembram-se camaradas? Era um local agradável, fresco, porque repleto de frondosas árvores e aí nascia uma fonte que se perdia numa pequena bolanha adjacente. Entre as árvores do parque registei uma, de bom porte e que não conhecia. Tinha uns frutos grandes, arredondados, de pele rugosa e acastanhada. Era a Jaca, um fruto que saboreei depois e que considero delicioso, como deliciosas eram todas as outras frutas tropicais disponíveis na Guiné, em especial a polpa do caju.

Entre os outros “afazeres” que me ocupavam em Bafatá, eram uns mergulhos na piscina ali junto do Geba, umas idas ao cinema naquela rua que desembocava no mercado e umas idas ao Posto de Socorros de um Batalhão sediado na cidade e que ficava ao fundo da mesma rua. De vez em quando ia aquele café que fica à direita de quem desce a avenida, saborear um pomposo “bife de porco com batatas fritas”. Gostava de ir ver trabalhar um artesão que executava o seu trabalho na tabanca de Bafatá que, ficava na saída para os lados da ponte. Fazia lindas peças em ouro e prata. Observava deliciado o espelho de água do Geba e a tarefa dos pescadores que, de pé nas suas frágeis canoas, lançavam as redes em tal equilíbrio, quase sem provocar qualquer movimento na embarcação.

Era o sol abrasador, nesta terra no centro da Guiné. Nesta época era uma cidade tranquila, as movimentações militares giravam ao seu redor. Lembro, que daqui tinha saído o bacalhau que, faltando no Xitole, alegrou e deu sentido ao nosso Natal de 1971, apesar do risco que isso comportou. A estrada entre Bafatá e Bambadinca, sede do nosso Batalhão, era alcatroada e estava em muito bom estado. As deslocações entre estas localidades eram fáceis e frequentes. Aproveitei uma boleia e fui até Bambadinca. Lembras-te camarada? Apareci-te de surpresa e passamos um dia muito especial.

Na tua companhia, tive oportunidade de conhecer a “tua” terra, o que não havia conseguido durante toda a comissão. Na parte baixa, ao lado do Geba, ficavam a fonte, o posto dos correios, o posto de combustíveis e o comércio, maioritariamente gerido por europeus. Na parte alta eram as tabancas, principalmente na estrada da saída para o Xitole. E no quartel eram a escola, a capela, a casa do chefe do posto e as áreas militares. E era a enorme bolanha a perder de vista, e as imensas cabeças de gado a pintar a paisagem. Dava um postal magnífico, se não fossem os obuses a destoar do quadro.

Regressado a Bafatá, e uma vez mais em convívio com os meus pares em serviço no posto de socorros do batalhão desta cidade, voltei a exercer a minha função, prestando apoio na assistência a um grupo de militares acidentados, que estavam bastante maltratados. Ao que soubemos, algumas viaturas saíram de Galomaro a caminho de Bafatá e, uma delas despistou-se, ainda antes de terem entrado na estrada alcatroada. Eram algumas fracturas, e escoriações no couro cabeludo e membros. Coube-me prestar assistência a um Furriel, alto, magro, ruivo e de rosto sardento, que seria talvez o ferido com menor gravidade. Noutro momento e noutras crónicas, voltarei a este episódio.

E, os cerca de dois meses em Bafatá chegaram ao fim. Tinha sido um tempo diferente. Tal era a diferença, que cheguei a pensar e até a sentir, que não estava em teatro de guerra. Até que, me enviam para o Xime ao encontro da minha Companhia. Eram os rituais de despedida do MATO. Formados na plataforma de embarque do Xime, o Comandante referia-se ao nosso historial, citando principalmente os louvores e as baixas. Era a hora do balanço, numa linguagem fria, quase desumana, que escondia tanto sofrimento e tantos dramas individuais. Não era ainda a hora de se desligar o interruptor da guerra, mas era a hora e o momento de se levantar o olhar para o horizonte e tentar-se vislumbrar o reencontro com a nossa vida.

E, na maré alta, depois do macaréu, lá partimos na LDG a caminho de Bissau. Já não nos importavam os perigos da viagem no Geba. Já quase tínhamos esquecido os tempos difíceis que ficaram para trás. Só uma coisa importava; BISSAU. Era a ansiosa necessidade de queimarmos mais esta etapa.

Chegados a Bissau, aquartelamos uma vez mais no Depósito de Adidos aguardando transporte aéreo para a Metrópole. E a cidade foi acrescentada de uma pequena multidão ávida de novas emoções, misturadas com a pressa de regressar à VIDA. Em cada um, habitavam já os sonhos e projectos futuros que as circunstâncias tinham adiado. Havia espaço ao sorriso aberto e despreocupado e as conversas estavam carregadas de futuro. Tínhamos pressa de viver. E os dias seguintes foram de isso exemplo.

Uma vez mais, era no Café Bento que a malta tinha encontro marcado. Todos, uns mais que outros, fomos à descoberta da outra face da Guiné. Era o gastar dos “Pesos” amealhados para a “festa” da despedida. Alguns terão vivido nestes dias, momentos que jamais se voltariam a repetir nas suas vidas.

Numa dessas tardes, na companhia de camaradas, subia a principal avenida da cidade a caminho da piscina da UDIB quando senti a necessidade de me apoiar num dos postes da iluminação pública. Um acesso febril, acompanhado de uma debilidade física crescente, fizeram-me desistir da planeada tarde na piscina. Pela primeira vez em toda a comissão, estava com paludismo. Lembras-te camarada? Ajudaste-me a regressar aos Adidos e, na enfermaria, foi confirmado o meu estado de saúde. E, mais uma vez aqui fiquei internado. Tinha sido à chegada e era agora à saída. Impossibilitado de gastar os pesos que havia guardado para estes dias, pedi-te que deles fizesses o melhor uso, porque de nada me valeriam na metrópole.

No dia do embarque, deixei a enfermaria dos Adidos a bordo de uma carrinha militar, rumo ao aeroporto de Bissalanca, já praticamente recuperado do paludismo. Com emoção e uma incontida alegria, deixei que o meu olhar voasse, uma vez mais, sobre as últimas imagens daquela terra. Sentia, que as imagens colhidas naquele olhar me iriam acompanhar durante toda a vida.

Era a hora de ocupar o meu lugar a bordo do Boeing da Força Aérea Portuguesa.

Vinte e dois meses depois, tínhamos aprendido a viver e a conviver em circunstâncias muito particulares, tínhamos criado amizades indestrutíveis, e crescemos. Crescemos muito. Decididamente não éramos os mesmos. Os verdes jovens que haviam chegado tempos atrás à Guiné, partiam agora mais maduros e mais preparados para as adversidades que a vida futura lhes colocasse no caminho. Esses tempos foram uma grande lição de vida.

Chegados a Lisboa, foi uma correria até à Calçada da Ajuda, pois era necessário despojarmo-nos de todos os haveres que a instituição militar entregou à nossa guarda. Era o “espólio”, essa palavra mágica que significava a rotura física com o nosso passado recente. Mas para o sofrimento, as memórias, os afectos e as amizades não haverá nunca espólio capaz de apagar as marcas que carregamos para a sua vida futura. Serão património do carácter, e da personalidade de cada um de nós.

E a correria continuaria depois até à estação de Santa Apolónia. Era preciso chegar a casa e o comboio rumo ao Porto não esperava. Fomos muitos neste trajecto. Para uma boa parte de nós, o destino era o Douro Litoral e o Minho. Lembras-te camarada? À saída de estação de Campanhâ partilhamos o mesmo táxi porque, para chegares a Leça da Palmeira, passaríamos pela minha casa em Matosinhos. Ainda hoje recordo o teu gesto de pagares a totalidade da despesa do táxi.

Cheguei a casa já pela madrugada. Bati à porta. Algum tempo depois surge ensonada a minha querida Mãe. Naquele tempo em nossa casa não havia telefone e, mesmo sabendo os meus familiares que eu regressaria naquele dia, não me esperavam naquela hora. O meu Pai continuou deitado até eu entrar no seu quarto. A minha irmã, logo que se apercebeu da minha chegada, pulou da cama. Depois dos efusivos e apetecidos abraços, prolongamos até ao alvorecer do novo dia uma atmosfera de grande carinho e alegria. Faltava o meu irmão, que tinha ido clandestinamente para França para fugir ao serviço militar. E faltava ainda a minha namorada que, logo pela manhã, apareceu lá em casa. As boas notícias também chegam depressa e a sua presença foi um doce bálsamo.

Estava finalmente entre os meus e de regresso ao caminho para o meu futuro. Para trás ficara um tempo que me ajudou a ver o mundo e os homens com um olhar mais atento e generoso, fruto da convivência de espírito aberto com outras culturas. As realidades do mundo não se esgotam no horizonte em que nascemos.

Para vós camaradas que, chegados aqui com a vossa paciência e generosidade, não se cansaram de estar desse lado da mesa assistir às minhas narrativas, vai o meu abraço fraterno, de quem assume continuar a pertencer de corpo inteiro à grande Família dos ex-combatentes da Guiné.

Voltarei com as crónicas das minhas viagens à Guiné-Bissau.
Até Breve.
José Martins Rodrigues
Ex-1.º Cabo Enfermeiro
CART 2716
XITOLE -1970/72

(FIM)


O delicioso caju à mão de semear

O Mercado de Bafatá

Apreciando o Ourives de Bafatá

Catedral de Bissau
____________

Nota do editor

Vd. os postes da série de:

31 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11893: Conversas à mesa com camaradas ausentes - Estórias da História da Guerra Colonial – Guiné Bissau (José Martins Rodrigues) (1): Mobilização

10 DE AGOSTO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11927: Conversas à mesa com camaradas ausentes - Estórias da História da Guerra Colonial – Guiné Bissau (José Martins Rodrigues) (2): A viagem para a Guiné

16 DE AGOSTO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11945: Conversas à mesa com camaradas ausentes - Estórias da História da Guerra Colonial – Guiné Bissau (José Martins Rodrigues) (3): Da chegada a Bissau ao aquartelamento no Xitole

22 DE AGOSTO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11968: Conversas à mesa com camaradas ausentes - Estórias da História da Guerra Colonial – Guiné Bissau (José Martins Rodrigues) (4): Da adaptação ao Xitole, até ao baptismo de fogo

29 DE AGOSTO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11991: Conversas à mesa com camaradas ausentes - Estórias da História da Guerra Colonial – Guiné Bissau (José Martins Rodrigues) (5): Os meses seguintes até às férias na Metrópole

5 DE SETEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12010: Conversas à mesa com camaradas ausentes - Estórias da História da Guerra Colonial – Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (6): As férias na Metrópole e o regresso ao Xitole
e
12 DE SETEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12030: Conversas à mesa com camaradas ausentes - Estórias da História da Guerra Colonial – Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (7): Os meses seguintes, até Bafatá

Guiné 63/74 - P12058: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (28): Mais vídeos com música do tempo da tropa colonial (Rapazinho e Santa Luzia), gravados recentemente em Gadamael Porto


Vídeo (0' 46''). Rapazinho. Alojado em You Tube > ADBissau 


Vídeo (1' 22'). Santa Luzia, Alojado em You Tube > ADBissau


1. Gravação feita há dias em Gadamael Porto, e enviada pelo nosso amigo e parceiro Pepito, diretor executivo da AD - Acção para o Desenvolvimento, com sede em Bissau. Além do Piriquito (*), temos hoje mais dois temas: Rapazinho e Santa Luzia

Acompanhamento: gaita de beiços, palmas, vozes.

Recorde-se, a seguir,  a letra a canção popular "Santa Luzia" (**)... Já a do Rapazinho, ainda não consegui identificar a música e a apanhar a letra (que parece provocar risota ou galhofa entre no grupo de fulas que canta, mulheres e homens...) (LG)

Santa Luzia dos meus amores,
Santa Luzia bonita és,
Santa Luzia dos meus altares,
Linda Viana cai a teus pés.

Quem vai a Santa Luzia,
A Viana do Castelo,
O mais lindo panorama,
Que é de todos o mais belo.

2. Em relação ao primeiro vídeo, comentei na altura (*):

É espantoso como este jovem de Gadamael Porto, 40 anos depois do fim da guerra, reproduz esta cantilena que era tão popular entre nós (e entre os nossos camaradas guineenses, quer do recrutamento local, quer milícias)...

Muito provavelmente ouviu-a a seu pai ou tio(s), antigos combatentes do exército português... Como é espantoso o acompanhamento a realejo e a alegria das mulheres...

Não conhecia esta versão que tem um verso com referência à "passarinha di gazela" (?)... 


Obrigado, Pepito, pela tua sensibilidade e amizade, ao gravares este vídeo em Gadamael Porto e carregá-lo no You Tube...

Bom começo para o teu novo projeto, o teu novo "núcleo museológico", desta vez o da Memória de Gadamael...

Parabéns também ao Manuel Vaz, entre outros gadamaelenses da nossa Tabanca Grande, que têm contribuído de maneira decisiva para a preservação e divulgação da memória de Gadamael...

Quem disse que "um povo feliz é um povo sem história'" ?

O Pepito apressou-se a esclarecer:

Luís: Só te enganas numa coisa: o que cantava era tropa na altura. Noutro dos filmes que gravei, há uma parte (surpresa) que é espantosa!

Depois da divulgação destes 3 gravações vou pedir ao Pepito que me diga qual é o vídeo em que há a tal "parte (surpresa) que é espantosa"... Presumo que se refira à tal canção do Rapazinho (cujo letra não consegui entender bem, mas em que há um comentário jocoso, á parte,  sobre os "tugas"..).

3. O Pepito acaba de me responder, "just in time":

Pois, é Luís... Acertaste na surpresa, mas falhaste no essencial.
De facto é no vídeo Rapazinho, mas o que se ouve como voz de fundo não é "tugas", mas sim "olha os turras"...

Nota que o pessoal que canta é Beafada e não Fula.
Um abraço amigo para todo o pessoal

pepito
 _____________

Notas do editor:


(**) Vd. outras gravações anteriores, em postes de julho de 2010:

19 de julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6761: (in)citações (2): Mais duas músicas do tocador de harmónica de Guileje (Pepito / AD - Acção para o Desenvolvimento)

20 de julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6765: (In)citações (3): A lavadeira de Guileje: 'Já passei a roupa a ferro, já lavei o meu vestido, amanhã vou-me casar e o Manuel é meu marido' (Pepito / AD - Acção para o Desenvolvimento)

28 de julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6800: (In)citações (4): A lavadeira Lisboa e o tocador de harmónica Sene Coiaté, com a Júlia Neto, na inauguração do Núcleo Museológico Memória de Guiledje (Pepito, AD - Acção para o Desenvolvimento)

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12057: "Memórias da Guiné", por Fernando Valente (Magro) (9): Os reordenamentos populacionais

1. Continuação das "Memórias da Guiné" do nosso camarada Fernando Valente (Magro) (ex-Cap Mil Art.ª do BENG 447, Bissau, 1970/72), que foram publicadas em livro de sua autoria com o mesmo título, Edições Polvo, 2005:


MEMÓRIAS DA GUINÉ

Fernando de Pinho Valente (Magro)
ex-Cap. Mil de Artilharia 

9 - Os Reordenamentos Populacionais

Fui colocado nos Serviços de Reordenamentos Populacionais.
Inicialmente, e durante cerca de dois meses, trabalhei no Planeamento, no Comando-Chefe, na Amura. E depois chefiei os Serviços no Batalhão de Engenharia 447, em Brá.

Tratava-se de um serviço dirigido por militares destinado essencialmente às populações civis. Tinha em vista proceder ao agrupamento de diversas pequenas "tabancas" com o fim de constituir médios aldeamentos onde fosse rentável dotá-los com algumas infra-estruturas, tais como: escolas, postos sanitários, fontanários, tanques de lavar, cercados para gado, mesquitas ou capelas.

Além disso tinha-se também em vista, com a execução do Reordenamento, a defesa e controlo da população.
 
Na Amura estava à frente dos Serviços o Major Matos Guerra, indivíduo muito instável e nervoso. Foi substituído, passados alguns meses, pelo Major Carlos Azeredo que mais tarde foi chefe da Casa Militar do Presidente Mário Soares, comandante da Região Militar Norte, Governador da Madeira...

No Comando-Chefe eram decididos os trabalhos a realizar e de lá chegavam ao Batalhão de Engenharia ordens da natureza desta que a seguir transcrevo:

"From: Comchefe POP
To: Batengenharia

Mande comprar materiais para construir um Pool de: 1.550 casas zn; 50 T2; 40 escolas; 10.000 m de arame farpado. Deve indicar urgentemente a este necessidade aquisição ferramentas."


No Batalhão de Engenharia 447 foi organizado um mapa de medições para os vários tipos de construção e de acordo com essas medições assim eram quantificados os volumes de materiais a adquirir bem como colecções de ferramentas necessárias para a execução dos trabalhos.

Para, por exemplo, 60 casas T2, havia necessidade de adquirir:

  • 11.700 ripas; 
  • 780 kg de pregos n.º 15; 
  • 600 kg de pregos n.º 7; 
  • 480 kg de pregos zincados; 
  • 420 anilhas de chumbo 6/8"
  • e 8.520 chapas de zinco.

As paredes das construções eram em adobe, que os beneficiários eram incumbidos de executar, o que faziam bem, amassando terra argilosa com palha e secando os adobes ao sol.

A armação das coberturas das construções era em rachas de cibe (árvore da família das palmeiras). Um tronco dessa árvore aberto em duas partes e cada uma dessas metades aberta de novo ao meio dava origem a quatro rachas de cibe.

Os cibes eram adquiridos pelo Batalhão de Engenharia. Tinham de respeitar normas específicas: terem determinados metros de comprimento, serem secos, possuírem uma certa secção e não fazerem qualquer curvatura, de modo que, quando aplicados, não apresentassem flecha.

As unidades militares em cuja área se executavam reordenamentos tinham interesse em adjudicar o fornecimento das rachas de cibe aos indí­genas da região. Dessa maneira, estando ocupados, deixavam de fazer a guerrilha, além de materialmente poderem beneficiar de modo a satisfazerem algumas das suas aspirações.

As obras eram geridas e supervisionadas pelo pessoal da Unidade Militar da área.
Geralmente era nomeado um alferes, um furriel e dois cabos (um carpiteiro e o outro pedreiro nas suas vidas civis) para fazerem um estágio de alguns dias no Batalhão de Engenharia da Guiné onde praticavam na construção de algumas casas.

Havia pelo menos uma casa no início de construção, na fase das fundações; outra com as paredes exteriores em execução; outra ainda com as paredes interiores e a armação do telhado a serem realizadas e finalmente uma outra em fase de acabamento. Essa equipa, depois de ficar devidamente elucidada sobre o modo de construção das casas, regressava às suas unidades e ficava responsável pela execução dos trabalhos na sua área.

Como já referi, os materiais eram fornecidos pelo Batalhão de Engenharia à exepção dos adobes que eram executados pelos nativos. Quanto às rachas de cibe, ou eram obtidas na própria área das construções ou fornecidas pelo Batalhão de Engenharia.


Construção de uma casa no reordenamento de Bissássema. Na foto: 1.º Cabo José Leonardo e os Soldados João Ventura e Idalmiro Melo da CCAÇ 3327


Foto: © José Leonardo, cedida por José da Câmara

No Comando-Chefe era elaborado um plano de urbanização (se assim se podia chamar) com a planta dos arruamentos e a disposição das casas e a localização das várias infra-estruturas.

O local dos reordenamentos também era escolhido pelo pessoal do Comando-Chefe e naturalmente tinha em linha de conta a possibilidade de as terras próximas serem agricultáveis e a defesa das populações poder ser viabilizada.
 
No decurso das obras sempre que havia qualquer problema de ordem técnica o Batalhão de Engenharia dava o respectivo apoio.
 
Fiz, por isso, algumas viagens para o interior da Guiné em helicóptero ou de avião (Dornier) a que chamávamos DO's.
 
Fiquei, então, com uma visão geral da Guiné.

Desloquei-me para o sul. Estive em Cufar, Catió e Cacine. No norte estive em Binta e Farim. Para leste fui a Bafatá, Bambadinca, Nhabijões, Nova Lamego e Buruntuma.
 
Nas férias da Páscoa de 1971 passei alguns dias na Ilha de Bubaque, no Arquipélago de Bijagós.
Mais perto de Bissau desloquei-me de automóvel diversas vezes a Nhacra, Safim, João Landim e ao Cumeré.

Na minha actividade, integrado no Batalhão de Engenharia, estive sempre atento para que nunca faltasse material nem ferramentas nos locais dos reordenamentos, pois o General Spí­nola fazia muitas viagens para o interior de helicóptero e sempre que via do ar um reordenamento em execução ordenava que o piloto aterrasse para poder visitar as obras.
 
O meu receio era que alguém, alguma vez, se queixasse da demora do envio de materiais por parte do Batalhão de Engenharia para justificar um possível atraso na execução dos trabalhos. Isso, porém, que eu saiba, nunca aconteceu.
 
Por outro lado era absolutamente necessário que na proximidade da época das chuvas as casas estivessem com a cobertura executada, cobertura essa que se prolongava para além das paredes exteriores mais de um metro, formando um terraço coberto à volta das casas, pois se assim não fosse as paredes de abobe, sem qualquer protecção, eram destruí­das pelas chuvas.

Desta minha actividade houve um facto que me poderia ter trazido graves consequências se não tivesse procedido com firmeza imediatamente após ter dele conhecimento.
 
Um coronel foi um dia oferecer-se ao meu Comandante (Tenente-Coronel Lopes da Conceição, já falecido com o posto de General) para promover o corte de rachas de cibe na área do seu Batalhão e posterior fornecimento à Engenharia das mesmas.
 
O meu Comandante chamou-me ao seu gabinete. Apresentou-me o Coronel e disse-me o que ele pretendia.
 
A ideia do Coronel era pôr os nativos da região da sua Unidade militar a trabalhar na floresta, dando-lhes oportunidade de auferirem algum rendimento.

Uma vez que se tratava de um material imprescindí­vel para as obras que tinha em curso, e embora na área do Batalhão que o Coronel Comandava não houvesse qualquer reordenamento, aceitei imediatamente a proposta e indiquei as condições em que se teria de fazer o fornecimento: o custo e as normas específicas que as rachas de cibe tinham de respeitar.
 
Dei-lhe mesmo um pequeno caderno de encargos-tipo que teria de ser seguido.

Passados uns tempos o Primeiro Sargento que comigo colaborava apresentou-se no meu gabinete e, depois da continência militar, bradou:
 
- O meu Capitão já viu os cibes que estão a ser depositados à volta do campo de futebol?
 
- Não.
 
- Se o meu Capitão tivesse alguns minutos disponí­veis propunha-lhe que os visse.

Levantei-me e fui com o Primeiro Sargento até ao local onde estavam depositados os cibes. Tinham vindo da área do Batalhão do tal Coronel.
 
As rachas de cibe eram verdes, arqueadas e com secção inferior à das normas.

Fiquei furioso.
 
Encaminhei-me imediatamente para a Central Rádio e lá redigi uma mensagem que mandei emitir, que dizia mais ou menos isto:

"As rachas de cibe recebidas no Batalhão de Engenharia não respeitam as normas específicas de que lhe foi dado conhecimento. Não serão aceites nem pagas por este Batalhão pelo que deverá mandar retirá-las do local onde foram depositadas."

Esta guerra das rachas de cibe para mim tinha acabado, julgava eu. Mas não.

Volvidos alguns dias sobre este acontecimento, o meu Comandante mandou-me chamar ao seu gabinete. Muito sisudo disse-me que o Coronel (não pretendo mencionar o seu nome) se tinha queixado de mim ao General Spí­nola por causa de uma mensagem rádio que eu lhe tinha enviado.
 
Contei-lhe a história e convidei o Comandante a deslocar-se ao campo de futebol onde ainda estavam depositadas as rachas de cibe. Pegou no pinguelim, pôs a sua boina e para lá nos dirigimos.
 
Depois de ter constatado no local em que condições foram fornecidas as rachas de cibe, disse-me:
- Tem toda a razão. Não se preocupe mais com isso. Eu tratarei do assunto com o nosso General.

Na mensagem que enviou poderia ter sido menos duro, mas não tenho dúvidas que fez o que devia.
Soube mais tarde que o General Spí­nola apreciou a minha atitude e, evidentemente, não concordou com a maneira de agir do Coronel nessa sua iniciativa.

Em Julho de 1971 deslocou-se à Guiné uma delegação da ONU.
 
Como dessa visita constava a sua passagem pelo Batalhão de Engenharia 447, os Serviços de Reordenamentos Populacionais tiveram de redigir um pequeno memorando, a fim de elucidar os elementos dessa delegação sobre as suas actividades, memorando que transcrevo adiante:


Serviço de Reordenamentos Populacionais 

Actividades > Apoio técnico e de materiais às obras de reordenamentos.

Cada reordenamento é constituído por um número determinado de casas de adobe destinadas à população; uma ou duas casas de adobe também, mas com melhor acabamento destinadas aos chefes; uma ou duas escolas em blocos de cimento; um posto sanitário em blocos de cimento; um ou dois cercados para gado; fontanários; bebedouros e lavadouros.

Prevê-se futuramente uma construção destinada ao culto religioso.

O Serviço de Reordenamentos do Batalhão de Engenharia elaborou as Instruções de Reordenamentos, onde constam normas e pormenores das construções, desenhos, sequência de trabalhos, medições, orçamento e quadro resumo dos materiais necessários.

Tem o Serviço de Reordenamentos do Batalhão de Engenharia habilitado inúmeros oficiais, sargentos e cabos com o estágio de reordenamentos. Esses elementos, formando equipas constituídas por um oficial (alferes), um encarregado de obras (furriel) um pedreiro (cabo) e um carpinteiro (cabo) executaram no interior da província com a colaboração das populações, cerca de 8.000 casas cobertas a colmo e 3.880 cobertas a zinco nos últimos anos.

O Serviço de Reordenamentos do Batalhão de Engenharia 447 tem apoiado essas construções com material e, quando solicitado, tem prestado assistência ténica localmente.

A esse volume de trabalho correspondem as seguintes quantidades de materiais:

  • Rachas de cibe - 542.000
  • Chapas de zinco - 550.960
  • Ripas - 756.600 metros
  • Pregos - 120.280 kg
  • Anilhas de chumbo - 27.160 kg
  • Cimento - 19.400 sacos
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Nota do editor

Último poste da série de 11 DE SETEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12028: "Memórias da Guiné", por Fernando Valente (Magro) (8): O Clube de Oficiais

Guiné 63/74 - P12056: (In)citações (54): O significado histórico e pedagógico do Monumento aos Combatentes da Lourinhã, inaugurado em 26/6/2005: Discurso de Jaime Bonifácio Marques da Silva, Lourinhã, AVECO, 25/8/2013



Lourinhã > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 25 de agosto de 2013 > Comemorações do 8º aniversário da inauguração do Monumento aos Combatentes do Ultramar. Da esquerda para a direita, o Jaime Bonifácio Marques da Silva e o João Delgado, dois dos elementos da comissão "ad hoc" que há 8 anos atrás concretizou o sonho dos combatentes da Lourinhã.  

Fotos (e legendas): © Luís Graça(2013). Todos os direitos reservados


1. Texto do discurso do meu amigo, camarada, conterrâneo, lourinhanense, atualmente residente em Fafe,  Jaime Bonifácio Marques da Silva [, foto atual, abaixo], ex-alf mil paraquedista, BCP 21 (Angola, 1970/72), proferido em 25/8/2013 (e que nos chegou à caixa do correio a 10 do corrente):


AVECO - Associação dos Veteranos Combatentes do Oeste

Lourinhã, 25 de agosto de 2013

8.º Aniversário da Inauguração do "Monumento de Homenagem aos Combatentes do Concelho da Lourinhã que Participara, na Guerra Colonial"

TEMA: O significado histórico da construção do monumento em memória dos combatentes da Lourinhã mortos na guerra do ultramar no contexto da evocação dos 50 anos do seu início


Saudações...

Introdução



“Não há futuro sem passado. Uma comunidade, uma nação constrói-se em torno de um projeto comum, em volta de um desígnio que todos junta e anima. Mas só é possível construir esse sonho futuro quando houve uma história comum, que alicerçou valores e criou partilha de ideias. Vamos hoje, minhas senhoras e meus senhores, celebrar um puco dessa história.” 


Minhas senhoras e meus senhores, estas foram as primeiras palavras dirigidas a todos os presentes na abertura da cerimónia solene da inauguração deste Monumento em 26 de junho de 2005.

A frase foi lida por mim que coordenei a cerimónia, mas as palavras são da autoria (à data) do Exmo Coronel Tavares Nunes, comandante da EPI (Escola Prática de Infantaria de Mafra), responsável pela conceção e organização da cerimónia.

O que fizemos a 26 de junho de 2005, é o que iremos fazer, hoje, 25 de agosto de 2013 ou seja:  continuar a “celebrar” um momento da História de Portugal para a qual os jovens da Lourinhã deram o seu contributo, alguns com o tributo do seu próprio sangue. Ao construirmos este memorial, pretendemos, tão só, perpetuar a sua memória.

A Direção da Associação dos Veteranos Combatentes do Oeste (AVECO) ao convocar-nos, hoje, para evocarmos o 8.º aniversário da sua Inauguração cumpre, antes de mais, o dever cívico de lutar contra o esquecimento de uma Nação para com aqueles que a serviram e tratou mal.

A este propósito, o Dr. António Barreto, na qualidade de Presidente das Comemorações do Dia de Portugal, Camões e das Comunidades Portuguesas, no dia 10 de Junho de 2010 que, segundo o jornal O Público de 11 de Junho do mesmo ano, afirmou:

“Os antigos combatentes ainda não tiveram o merecido reconhecimento dos poderes públicos”.

“ O estado cumpre mal o seu dever de respeito perante aqueles a quem tudo se exigiu”. Nem a Assembleia da República cumpre o papel que lhe está conferido”.


Foi com esta intensão de “luta contra o esquecimento” e de “evocação da memória” que um grupo de ex-combatentes da Lourinhã lançou a ideia da construção deste memorial, constituindo, para o efeito, uma Comissão Promotora.

Em nome dessa Comissão (já extinta, evidentemente) agradecemos à Direção da AVECO o convite para evocarmos os passos que foram realizados desde a ideia à concretização.

Irei, por isso, tentar descrever os diferentes momentos desse percurso e refletir sobre o significado histórico e a função pedagógica que esteve presente na conceção e edificação do monumento

Génese:

A génese da construção deste monumento remonta-se ao verão de 2003 quando, informalmente, um grupo de ex-combatentes se reuniu na Casa do Benfica, aqui na Lourinhã, para preparar o 1.º Encontro de Ex-Combatentes da Guerra do Ultramar do nosso Concelho. Este 1.º Encontro viria a realizar-se no dia 1 de dezembro do mesmo ano. O programa, para além da cerimónia religiosa e da romagem ao cemitério com a deposição de uma coroa de flores no Talhão dos Combatentes, encerrou com um almoço convívio no restaurante os Severianos.

Presidiram a esse almoço convívio o Exmo Presidente da Câmara José Manuel Custódio e o Exmo Tenente General Jorge Silvério. É no decorrer desse almoço que um dos elementos da Organização, usando da palavra para agradecer a presença das entidades oficiais, dos veteranos e dos familiares e amigos presentes no convívio, lança ao Senhor Presidente da Câmara o repto para que o Executivo Camarário apoiasse a construção de um monumento em memória dos Lourinhanenses tombados na Guerra Colonial.

No momento em que usou da palavra, o Exmo Presidente da Câmara não sóanuiu à ideia, como também incentivou a Comissão Organizadora do Encontro a apresentar um projeto exequível, disponibilizando o departamento Técnico do município para nos apoiar. Sugeriu, também, que se formasse uma Comissão Promotora para a Construção do Monumento de modo a servir de interlocutor válido entre os ex-combatentes, a autarquia e as entidades, necessariamente, a envolver para a concretização da ideia

A Comissão Promotora para a Construção do Monumento foi constituída por José Félix Picão de Oliveira, combatente na Guiné na região de Conquelifá; Jaime Bonifácio Marques da Silva, combatente em Angola – integrado no Batalhão de Caçadores Paraquedistas n.º21 – BCP21), João Henriques Rodrigues Delgado, José Marques Bonifácio da Silva e Adílio Braz da Fonseca, também combatentes em Angola

O primeiro ato formal da dita Comissão foi o envio de um ofício dirigido ao Senhor Presidente da Câmara dando-lhe conta da nossa intensão.

Em 23 de janeiro de 2003 a Comissão Promotora recebeu um ofício informando-nos que em relação ao nosso pedido de apoio para a construção de um “Memorial onde se eternize os nomes dos combatentes Lourinhanenses mortos na Guerra Colonial”, a Câmara tinha deliberado em reunião do executivo, realizada em 21.01.2003, o seguinte: “A Câmara deliberou aprovar a proposta apresentada, delegando no Sr. Presidente da Câmara para prosseguimento do assunto.”

As fases da construção:

Começou aqui, verdadeiramente, o percurso das dificuldades que foram sendo ultrapassadas até à concretização da ideia.

A primeira dificuldade, foi a preocupação de encontrar alguém que se disponibilizasse para desenhar no papel um esboço que, de certo modo, concretizasse a nossa ideia.  O José Picão conseguiu o apoio do senhor Arquiteto Augusto Silva, apresentando, este, durante o almoço do 2.º convívio realizado no dia 1 de dezembro de 2004, no mesmo restaurante, um conjunto de esboços figurativos do que poderia vir a ser o futuro monumento. Após a apreciação e discussão, os presentes no almoço convívio, votaram na versão que foi dada ao bronze e aqui permanece neste espaço maior da nossa vila há oito anos.

A segundo dificuldade, talvez a maior, era, a partir da ideia concretizada no esboço, conseguir um orçamento exequível para a sua concretização. Os primeiros orçamentos solicitados e apresentados por diferentes escultores foram muito desanimadores e quase nos levou a adiar a construção do monumento, dado o seu elevado custo. Felizmente, um nosso amigo, professor catedrático na Faculdade das Belas Artes do Porto, sugeriu-nos que contactassemos uma licenciada em Artes Plásticas na especialidade de Escultora que tinha sido a melhor aluna do seu curso em estatuária. Foi assim que chegámos ao contacto com a escultora Andreia Couto natural de S. João da Madeira. Lembro-me de fazermos a primeira reunião com a senhora escultora no Café Velasques no Porto, junto ao estádio das Antas. Entreguei-lhe o desenho do senhor Arquiteto Augusto Silva e passados dias, apresentou um orçamento considerado exequível pelo município.

A proposta é apresentada formalmente pela Senhora escultora, através de ofício dirigido ao Senhor Presidente em 7 de Novembro de 2004. A Câmara aceitou a proposta e informa a escultora através de ofício que lhe é dirigido em 30 de novembro 2004.

Em Abril de 2005, os cinco elementos da Comissão Promotora deslocaram-se à Fundição a Vila Nova de Gaia, a convite da Senhora escultora, para avaliarem e proporem alguma alteração à imagem esculpida, ainda, na fase de modelação em barro.

A partir desta data, foi a conclusão da fase de passagem a gesso, fase do bronze, transporte, colocação no local e a inauguração.


26 de junho de 2005: dia da inauguração


A cerimónia da inauguração tem lugar no dia 26 de Junho de 2005, por altura do 3.º convívio dos combatentes da Lourinhã, com a dignidade que o significado histórico do Monumento encerra e merece.

Presidiram à cerimónia, por parte da edilidade o Exmo Presidente da Câmara José Manuel Custódio e o Exmo Tenente General Jorge Silvério, ilustre comandante do Comando de Pessoal do Exército, em representação das Forças Armadas por despacho do Exmo Tenente - General Governador Militar de Lisboa datado de 19 de maio 2005.

Os dois ilustres personagens, filhos da nossa terra, juntamente com os cinco ex-combatentes da Comissão Promotora para a Construção do Monumento, constituíram a Comissão de Honra, instituída pela autarquia para presidir ao evento.

A cerimónia foi concebida e organizada pelo Exmo Coronel Tavares Nunes, Comandante da EPI, também, representante na cerimónia do Exmo Tenente General GML (Governo Militar de Lisboa) por despacho deste em 23 maio 2005.

Para além das ilustres figuras, anteriormente, mencionadas, deram-nos, ainda, a honra da sua presença e amizade:

i) Em representação das Forças Armadas estiveram presentes, ainda: um Pelotão da EPI, a Fanfarra do GML (Governo Militar de Lisboa), o Exmo Padre Rui Peralta, Capelão da EPI, Exmo Tenente General Chito Rodrigues Presidente da Liga dos combatentes Portugueses, o Exmo Comandante da GNR da Lourinhã, o Exmo Comandante da Capitania do Porto de Peniche Capitão Tenente Damásio Afonso

ii) Em representação da autarquia da Lourinhã, para além do seu Presidente, estiveram presentes:  o  Exmo Presidente da Assembleia Municipal da Lourinhã João Ferreira, os Exmos Vereadores João Duarte, José Tomé, Raul Leitão, Júlia Alfaiate e Nuno Sampaio.

iii) Em representação das associações de combatentes, deram-nos a honra da sua presença o Senhor Manuel Patuleia Mendes, Exmo Presidente da ADFA (Associação dos Deficientes das Forças Armadas) e o Senhor António Basto, Exmo Presidente da APVG (Associação Portuguesa dos Veteranos de Guerra)

iv) Estiveram presentes, também, Familiares e Amigos dos combatentes da Lourinhã que tombaram em combate e, cujos nomes, se encontram mencionados neste Memorial

vi) Associaram-se, ainda, ao evento muitos ex-combatentes da Lourinhã e de outras zonas do país, bem como, o povo da Lourinhã que quis estar presente na homenagem a estes “filhos da terra”.

O evento terminou com um almoço festivo oferecido pela Câmara Municipal a todos os participantes na efeméride nas instalações do Hóquei Clube da Lourinhã.

Será de toda a justiça destacar e agradecer, neste momento, volvidos que são oito anos, o empenhamento do Exmo Presidente da Câmara da Lourinhã, Senhor José Manuel Custódio, para a efetiva construção deste Monumento. Em nome dos ex-combatentes da Lourinhã, o nosso muito obrigado.

Solicitamos ao Senhor Vereador Eng.º João Duarte, hoje em representação do senhor Presidente, que faça o favor de transmitir ao Senhor Presidente da Câmara esta nossa mensagem de gratidão.


O significado histórico e pedagógico do Monumento 

Para nós, ex-combatentes, este Monumento tem um significado histórico, social e político, bem como, uma mensagem pedagógica importante para as gerações pós 25 de abril. Ele encerra parte da história de Portugal escrita, também, com o sangue de vinte Lourinhanenses nossos conterrâneos mortos em combate nesta guerra: 9 em Angola, 6 na Guiné e 5 em Moçambique.

A este propósito, o lourinhanense Luís Graça, ex-combatente na Guiné e coordenador do Blogue “Luís Graça e Camaradas da Guiné” afirma: “Vinte Mortos foi o contributo da minha terra, o imposto de sangue que os lourinhanenses pagaram na defesa dum Império e de um regime em agonia.”

A edificação deste Memorial, como criação artística, é uma forma consciente de lutarmos contra o esquecimento. A obra de arte, na sua diversidade de manifestações e quando comporta uma mensagem, como o é, neste caso, cumpre a sua função social de despertar as consciências.

Já fui abordado por várias pessoas, nem todas da geração pós 25 de abril, que me manifestaram a sua discordância pela forma demasiada realista e talvez chocante da figura agressiva do soldado progredindo com a arma na mão pronta a ser disparada.

Afirmei a essas pessoas que esta forma de expressão realista, talvez seja a forma mais objetiva, a mais corajosa e a mais chocante de enfrentar a verdade a verdade histórica

Disse-lhes, ainda: Não há volta a dar. Jamais alguém terá hipótese de inventar forma de “fazer de conta que esta guerra nunca aconteceu”, nem mesmo com “anjinhos” a fazerem de soldados! …

Em África, disse-lhes, andámos a fazer guerra, não outra coisa, quer queiramos quer não. Tivemos que apontar as nossas armas para não morrer! Foram dos piores momentos das nossas vidas, cujas imagens jamais se apagarão da nossa memória.

Participei em operações no norte de Angola precedidas do lançamento de bombas de “Napalm” pelos aviões da Força Aérea (o seu uso era proibido pela convenção de Genebra). Os aviões e os helicópteros não lançavam balões ou bombinhas de S. João para fazer a “Psico.” Não. Foram lançadas bombas, cuja matéria química incendiária, uma vez em contacto com o corpo, queima o indivíduo até à morte numa agonia dolorosa e terrível.

Numa dessas operações, num assalto a uma base do MPLA situada nos Montes 1020 no norte de Angola, os guerrilheiros do MPLA, mataram um dos soldados do meu pelotão.

Só perceberá este horror quem viu e viveu esta guerra horrível e inútil.

É, por isso, repito, que este Monumento tem um significado histórico e pedagógico muito importante, sobretudo para as gerações pós 25 de abril de 1974 no momento em que os portugueses evocam os 50 anos do início desta Guerra designada por “ A Guerra de África, Guerra do Ultramar ou Guerra Colonial (designação oficial portuguesa até ao 25 de Abril de 1974), ou, ainda, Guerra de Libertação (designação utilizada pelos movimentos africanos independentistas). Desenrolou-se entre 1961 e 1974 em África, em três teatros de operações diferentes:

i) Angola (1961). O primeiro morto em combate da Lourinhã foi o Joaquim Alexandre Neto,  natural dos Casais de Porto Dinheiro em 12 de junho de 1961;

ii) Guiné (1963). Em 23 de janeiro de 1965 morreu o José António Canoa,  natural da Lourinhã;

ii) Moçambique (1964). Em 2 de outubro de 1967 morreu o Manuel Filipe Henriques,  natural do Casal das Barrocas;

iii) A última morte em combate de um lourinhanense ocorreu na Guiné em 5 de maio de 1973. Foi o José João Marques Agostinho, do Reguengo Grande.

Por isso, as novas gerações quando por aqui passarem e olharem com “olhos de ver” para este soldado, descobrirão, certamente, que ali, para além do bronze esculpido, estão, também, as circunstâncias trágicas da morte em cada um dos nomes cravados na pedra.
Também com a ajuda da nova historiografia sobre a Guerra Colonial que tem sido editada nos últimos tempos pelos principais centros de investigação universitários portugueses e alguns estrangeiros, as novas gerações e particularmente os jovens em idade escolar perceberão e chegarão à conclusão que esta Guerra:

1.º Foi “ Uma guerra inútil, uma guerra injusta e uma guerra evitável “como afirmou o General Ramalho Eanes, na altura Presidente da República e também, ele, ex – combatente.

2.º Descobrirão que no início de 1961 quando rebenta a Guerra em Angola, os líderes do “regime”, Almirante Américo Tomás, Presidente da República e o Dr. Oliveira Salazar, presidente do Concelho de Ministros, recusaram-se a aceitar os sinais evidentes dos “ventos de mudança” que pairavam, nessa altura, em todo o mundo em relação ao movimento descolonizador. Sabiam-no, mas não quiseram aceitar.

Afirma o Coronel de Artilharia Aniceto Afonso e o Coronel do exército, Calos Matos Gomes na obra editada conjuntamente e intitulada: ALCORA – O Acordo Secreto do Colonialismo - Portugal, África do Sul e Rodésia na última fase da Guerra Colonial, página 325:

“O fim da Segunda Guerra Mundial foi também o fim da Europa como centro de domínio à escala planetária. Perdida a posição de supremacia mundial ocupada durante séculos, obrigada a concentrar os esforços na sua reconstrução, a Europa em ruinas não tinha condições para manter o poder que detivera sobre vastíssimas e longínquas regiões do planeta”.


Ainda, a propósito do início do movimento descolonizador que se seguiu ao final da Segunda Guerra Mundial em todo o mundo, Maria Manuela Stocker, na obra intitulada Xeque-Mate a Goa, página 252, afirma:

“A história da queda da Índia Portuguesa é uma história da fragilidade externa crescente de um país colonial ameaçado. Uma ameaça que começa na Ásia, na periferia do império, onde uma nova soberania pôs em causa a estabilidade de fronteiras centenárias. Essa fragilidade alastrou ao resto do império, no continente africano, com a internacionalização da oposição ao colonialismo português e o desenvolvimento da contestação interna ao regime. (…)

Portugal foi chamado a iniciar o seu processo de descolonização em 1947, pela recém criada União Indiana. (…)


E continua: “O Estado Novo optou por não se envolver no processo histórico resultante da Segunda Grande Guerra Mundial, de dissolução dos antigos laços imperiais que o ligavam aos seus territórios de além – mar.”


3.º As novas gerações descobrirão que os líderes do Estado Novo, Tomás e Salazar, preferiram arrastar um país pobre para uma Guerra sem sentido e para a qual nem sequer estava preparado nem tinha os meios técnicos e humanos para a suportar. Só a disponibilidade da “carne para canhão” da sua juventude.

Tive a oportunidade de rever no início o desta semana (22.8.13) no Canal História, no programa “O Preço da História”,  o Senhor General Almeida Bruno reafirmar a propósito da falta de condições de Portugal para suportar a Guerra. Disse: “O maior problema não era os homens, mas o material. O equipamento não era grande coisa, não era grande coisa”. Repetiu.

4.º Os jovens poderão descobrir, ainda, que este Monumento é um Livro de História. Se o folhearem poderão descobrir, como exemplo paradigmático como os Estado Novo tratava aqueles que serviam a Pátria, a história do Soldado Arsénio que, como tantos outros, morreu no decorrer de uma operação em combate e, se tivesse o apoio do helicóptero para o retirar da zona operacional a tempo, certamente poderia ter sobrevivido, como me afirmou o alferes seu comandante de pelotão. O Helicóptero só esteve disponível para aevacuação, quatro horas após o rebentamento da mina que lhe decepou um pé e lhe provocou vários ferimentos por todo o corpo, vindo a falecer no hospital de Luanda no dia seguinte, quatro de setembro de 1972.

E descobrirão, com surpresa e horror que nenhum responsável da Forças as Armadas teve a coragem de contactar pessoalmente a família do Soldado Arsénio para lhe anunciar a notícia da sua morte e apoiá-la naquele momento trágico.  Não, nunca tiveram a coragem de dar a cara. Comunicavam a tragédia através dos CTT, cujo mensageiro da desgraça era o Carteiro.

Neste caso concreto do meu primo Arsénio, contou-me a minha tia, o carteiro não teve coragem de se dirigir diretamente aos meus tios para lhes comunicarem a notícia e pediu a uma das minhas primas para o fazer.

5.º Finalmente, as novas gerações, interrogar-se-ão, seguramente, (porque os combatentes já o fizeram e não obtiveram resposta) por que razão não foi instituída no gabinete do Presidente da República Américo Tomás um grupo responsável para levar a mensagem e estar presente junto das famílias nesse momento trágico ou junto dos gabinetes do Primeiro-ministro Salazar ou dos ministros do Ultramar ou da Defesa Nacional ou nos gabinetes dos Chefes de Estado - Maior dos três ramos das Foras Armadas - Exército, Marinha e Fora Aérea ou junto, ainda, do movimento associativo afeto ao Estado Novo e que apoiava e incentivava a nossa participação na Guerra como a Mocidade Portuguesa (quantos deles meteram cunhas para se “safarem da Guerra!) ou do Movimento Nacional Feminino ou da Legião Portuguesa ou da PIDE (tão lesta a entrar na casa das famílias para prender quem se opunha à Guerra!) ou, ainda, e talvez com mais propriedade, por que razão os responsáveis do regime não incumbiu, dessa missão dolorosa, a direção da Liga dos Combatentes?

Infelizmente, os jovens, descobrirão que os líderes do tempo dos seus pais e avós, os líderes deste sua Pátria, não foram capazes de assumirem as suas responsabilidades perante os cerca de um milhão de portugueses que participaram na Guerra, dos quais 8 mil tombaram no campo de batalha, cerca de 120 mil ficaram estropiados e , estima-se, que cerca de 100 mil ex-combatentes sofrem de “stress” pós traumático de guerra.

Foram cobardes. Nenhum deu a cara perante as famílias. Esconderam-se atrás de um funcionário dos CTT, transformando os Carteiros em mensageiros da desgraça e do infortúnio.

Se não fosse a dinâmica e a capacidade de luta dos ex-combatentes em criarem as sua próprias associações para os apoiar, nomeadamente a ADFA -Associação dos Deficientes das Foras Armadas, fundada em 1974 (há 39 anos) e a associação APOIAR , fundada em 1994, para apoiar os ex-combatentes que padecem de perturbações de stress pós traumático que adquiriram quando estiveram em combate, teriam sido literalmente abandonados à sua sorte.

O estado não foi pessoa de bem para com os seus combatentes e suas famílias. Às mães, disseram, sem escrúpulos:
- A pátria deu-te a missão de dar à luz e criar o teu filho. Nós, sacrificámo-lo no altar da pátria.
- Foi a vontade de Deus
- Deus to deu, Deus to tirou.
- Resigna-te.
- Cumpriste a tua obrigação para com a tua Pátria.

Finalizo, relembrando, ainda, o Professor António Barreto na defesa dos combatentes:

“Todos fizeram o seu esforço e ofereceram o seu sacrifício, seguindo determinações políticas superiores. As decisões foram as do Estado português.”

Referiu-se, também, à forma como, por vezes, são tratados os veteranos:

“Um antigo combatente não pode nem deve ser tratado de colonialista, fascista, democrata ou revolucionário de acordo com as conveniências ou interesses menores. Foram, simplesmente, soldados portugueses.

“ Não há antigos combatentes milicianos ou de carreira ou contratados. Há veteranos e antigos combatentes, ponto final”.


O país deve respeito aos que fizeram a guerra: Merecem que as suas associações sejam consideradas de utilidade pública. Merecem estar presentes nas cerimónias públicas oficiais. Mas, sobretudo, merecem respeito”

Viva os ex-combatentes. Viva Portugal. Obrigado