Guiné > Bissalanca > BCP 12 > CCP 122 (1967/68) > Faxinas ao batalhão .
Guiné > Bissalanca > BCP 12 > CCP 122 > O soldado paraquedista José Ribeiro. Pela escrita, vejo que é nortenho, possivelmente natural do Porto. E deve viver actualmente na Suiça, a avaliar pelo seu endereço de e-mail: zeporto@bluewin.ch. Bluewin é um dos mais conhecidos fornecedores de acesso à Internet, a operar na Suiíça.
Fotos: © José Ribeiro (2007). Direitos reservados.
1. Mensagem enviado pelo José Ribeiro, ex-paraquedista (BCP 12, Guiné 1967/68):
Camarada e amigo Graça: aqui envio a cópia do documento que lhe falava no email anterior! Se o meu Amigo o entender publicar, tem toda a liberdade, o qual me faria imenso prazer.
José Ribeiro
Referência ao texto onde se publicam extractos de VICENTE, Carmo - Gadamael: memórias da guerra colonial. 2ª ed. Lisboa: Caso. 1985. pp. 25-30 (1).
Caros camaradas: Reservando os direitos do autor Vicente do Carmo, vou tentar também ajudar um pouquinho pois que há coisas que estão um pouco deturpadas, e creio que o meu amigo e companheiro desta batalha não me levará a mal.
Colega da mesma recruta, do curso de Pára-quedismo e curso de combate, partimos no mesmo dia para a Guiné, combatemos juntos, não por muito tempo pois ele [ o Vicente do Carmo,] voltou, passado uns meses para Tancos, onde o vim encontrar, à minha chegada, com o posto de 2° sargento, salvo erro. Tudo isto no espaço de dois anos entre o assentarmos praça e a minha chegada, a 23 de Maio de 1968.
Conta como comissão de serviço esta pequena passagem pela Guiné para amealhar uma 3ª comissão! Eu gostaria que a estadia em África fosse contada por meses e não por comissões ! Neste caso teríamos camaradas do Exército que estiveram igual tempo ou quase, em uma comissão que neste caso contou três!!!
O nosso relacionamento era o normal entre camaradas nos bons e maus momentos. Também gostaria de precisar que o Camarada Vicente já tinha irmãos 1° Sargentos nas Tropas Pára-quedistas.
Para me referir ao livro, aqui, bom, só tenho as minhas memórias (de quem só fez uma comissão na Guiné que eram precisamente 18 meses).
Amizades com os fuzos ?
Jamais do nosso tempo na Guiné fomos amigos dos Fuzos , inclusive só um Fuzo e sempre o mesmo ia ao nosso Batalhão. Amizades em Bissau concerteza que existiria, pois entre todos nós teríamos colegas da escola, vizinhos ou amigos e era tudo. Não tínhamos amizades tradicionais com tropas de outros ramos , até porque no Ano de 1966 tivemos também uma grande batalha na estrada entre Bissau e o nosso Batalhão, com os Comandos
Conhecidos arruaceiros como o famigerado Oitenta (3)... O 1° Cabo 80 não era arruaceiro, era um Pára-quedista e um bravo combatente.
Chicotes e cinturões
Este meu colega de guerra [, o Vicente do Carmmo,] nunca sentiu o que representa a boina verde para um Pára-quedista! Farras monumentais com os fuzos!? Concerteza que a guerra do Vicente era uma outra!
Concerteza que para se escrever um livro se tem que inventar, por estas razões temos que não olhar para os cambridges e direitos de não sei de quem para repor a verdade. É verdade que o cinturão nos era imposto, fazia parte da farda de saída que era a amarela, não era autorizado sairmos de camuflado.
Quanto aos chicotes, não eramos da cavalaria por esta razão poderia inventar outra mas como homens que éramos tinhamos sempre connosco o de nascença.
Quanto às correntes de bicicleta, não existia uma bicicleta naquele tempo na Guiné, esta nem tem cabidela, é escrever por escrever! Cabos de aço ? Cabe na cabeça de alguém irmos passear com cabos de aço em Bissau ???? E onde os ir procurar?
Quanto aos braços engessados, mais à frente explicarei!
Arruaceiros ? Eles eram os melhores de todos nós!
E quanto aos arruaceiros, valha-nos Deus que ele concidera os nossos bravos como o 80, o Latas , o Ribeiro , o Setúbal , o Almada , o 3 e tantos outros como arruaceiros !... Saberá o Vicente que estes eram aqueles que em quem mais confiavamos na guerra ?
Eram estes mesmos e não sei porquê os que utilizavam a MG em combate, eu nunca fui um arruaceiro mas também nunca virei a cara à luta, talvez tivese dado muita porrada mas também apanhei muita, até talvez tivesee apanhado mais que aquilo que dei , mas como diz o outro nunca fiz papel de cobarde e nisto tenho honra. Se fui um arruaceiro que me desculpem todos os boinas verdes mas foi para honrar as tropas Pára-quedistas.
A UDIB (boinas negras) contra o ASA Clube (boinas verdes)
Neste dia, sábado, faziamos 6 meses da nossa chegada á Guiné e como tinham vindo os manda-mais da marinha fazer queixa ao nosso comandante porque Páras tinha dado porrada nos marinheiros, o nosso comandante com todo o Batalhão reunido passou-nos um violento sabão e dos grandes, como manda a lei!
Para terminar o seu discurso o nosso Comandante disse algo do génereo: "Que já tinha ouvido em qualquer parte, talvez dos meus Pais, enquanto me vierem fazer queixa de vós, porque fosteis ao focinho aos outros tudo vai que vai, mas o dia que eu tenha o desgosto de ir eu mesmo pedir satisfações aos outros, aí ides apanhar uma porrada que não mais saireis da tropa"... Isto dito mais ou menos nestas palavras. E de manhã, não à noite e foi o nosso comandante, estando eu de serviço ao Batalhão !
Depois da malta destroçar , vejo a virem, da enfermaria um, colegas com os braços engessados - três, seis, dez - e aí eu perguntei o que se tinha passado... Rapidamente cheguei á conclusão que qualquer coisa não estava a bater bem. De tarde fui para Bissau com o meu cinturão porque era obrigado, e creio que quase todo o batalhão tinha metido dispença de formatura para a noite. Estas foram as nossas armas .
Uma manga verde, lançada ao acaso: o rastilho de uma tragédia
Uma manga verde foi o que o Vicente apanhou na cabeça, de certeza ! Como se fosse preciso tamanho disparate para todos nós começarmos à porrada! Se ela estava programada !!!
Por pudor, não contarei aqui o que me sucedeu mas, como costumo dizer, dei mas tambem apanhei. Muito ou pouco ? Não conta para a história, o mais que posso é lamentar o que se passou, que não se deveria ter passado. Mas crianças como nós éramos, nos nossos 18 aninhos - pois era a média de idade que tinhamos nós, os Pára-quedistas -, quem poderá nos atirar a pedra? Ou nos tratar de arruaceiros ? Quem? Os outros eram melhores ? Para a porrada, pelos vistos, não!
Uma batalha campal: fuzileiros armados de G-3 a granadas de mão
A verdade é que, tendo os marinheiros o quartel ali a uns metros do local, válidos,inválidos, feridos e aqueles em boa saúde, fugiram para o seu quartel e, como não poderia deixar de ser, ao entrarem aqueles valorosos soldados todos partidos e com o peso da derrota gerou-se o pânico !
E com os nervos à flor da pele alguém teve a infeliz ideia de dar ordem para que saisse o piquete da guarda. Se não tivessem saído estes, tinha tudo ficado por ali sem mais histórias como das outras vezes.
Escusado será dizer que alguns destes fusos foram desarmados por nós, não tendo nós mesmos feito uso destas armas, como nos tinham ensinado na instrução. Mantivemos a nossa dignidade e controle sobre a situação, de outra maneira estavamos hoje aqui a falar não de feridos e dois mortos mas de uma catástrofe nacional. E este parágrafo deve de ser muito bem estudado por todos os intervenientes!
Como resultado desta operação, fomos a companhia de caçadores paraquedistas 122 para um lugar célebre, onde anos depois foram mortos 3 Majores, o Bachil em tendas de campanha, durante um mês a fazer operações. A CCP 121 foi para um outro local.
Fuzos, a Campanhia ou outro nome que eles tinham, foram todos para Moçambique por terem sido dados como culpados (creio eu )! E para se evitarem outros confrontos.
Outros factos a corrigir
Queria também repor aqui umas verdades, caso do Comandante Civil e Militar o General Arnold Schulz voltou para Portugal em fins de Maio de 1968, neste caso um ano depois deste triste acontecimento que foi no dia 3/6/1967...
O Oitenta também não era enfermeiro nem nunca o foi!! E a seguir a este episódio o 80 terminou a comissão obrigatória e por conseguinte voltou para Portugal!
Obrigado pela atenção e saudações a todos os militares em especial os que se bateram em Africa, sem distinções de fardamentos.
José Ribeiro
Ex-paraquedista da CCP 122 (Guiné, 1967/68)
Comentário de L.G.
Obrigado, José, pelo teu contributo para esclarecer a verdade sobre a tristemente famosa Batalha de Bissau. Eu não conheço o Vicente do Carmo, nem ele sequer é membro da nossa tertúlia. Mas, se ele nos ler, naturalmente que também está no direito de te responder.
Em relação ao teu texto, gostaria de esclarecer a questão das datas: tu dizes que "este triste acontecimento" ocorreu em 3 de Junho de 1967, um ano antes da substituição do Schultz por Spínola. O Vicente do Carmo, no seu livro Gadamael, situa a batalha de Bissau em Janeiro de 1968.
Como sabes, aqui não nos interessa a polémica pela polémica, mas a verdade dos factos. Todos estamos a lutar contra a degenerescência dos nossos neurónios e o esquecimento (social) a que os outros portugueses nos votaram. Por isso, o teu depoimento é muito importante. Tu estiveste lá, na porrada, nas ruas de Bissau, não ouviste contar em segunda ou terceira mão (2)... Por outro lado, é bom lembrar que estes acontecimentos não eram isolados, que se repetiram em Bissau e aconteceram noutros sítios, com maior ou menor freqência e gravidade (3)... E, já agora, temos de evitar cair no erro do maniqueísmo, a divisão do mundo em bons e maus...
Espero que voltes a escrever-nos. E diz-me se queres passar a figurar na lista dos membros da nossa tertúlia. Só me falta uma foto tua, actual. Comfirma também o teu oposto e a tua unidade. Diz-me também quando chegaste à Guiné. Boa sorte, para ti.
_________
Notas de L.G.:
(1) Vd. post de 11 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1515: Antologia (58): A batalha de Bissau em Janeiro de 1968: boinas verdes contra boinas negras... Saldo: 2 mortos (Carmo Vicente)
(2) Vd. outros posts:
13 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1522: Bissau em estado de sítio por causa dos graves incidentes entre paraquedistas e fuzileiros em Janeiro de 1968 (Álvaro Mendonça)
10 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1512: Estórias de Bissau (11): Paras, Fuzos e...Parafuzos (Tino Neves)
(3) Vd. 10 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1579: Buba: Graves incidentes entre camaradas, comandos e fuzileiros, em 19 de Abril de 1969 (Zé Teixeira)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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1 comentário:
História muito mal contada Já alguem perguntou aos Para-quedistas o que vieram fazer á porta do Quartel de Marinha ?? Se não foi com intenção de provocar Foi o quê? O seu Quartel situava-se a uns bons Kilometros das Instalações do INAB O que vieram lá fazer ? O Sentinela mais não fez que defender o Quartel Era para isso que la estava Fez fogo Pois fez o qualquer outro faria nessa função . Estive na Guiné logo de seguida estive aquartelado com Para-Quedistas em Teixeira Pinto Fiz Operações com Para-Quedistas tenho amigos Para-quedistas que viveram esse episódio Nunca houve qualquer inimizade Antes imperou sempre o respeito e a condição de Militar Foi triste e não devia ter acontecido. Ok Mas procurem a verdade dos factos Não se armem em Inocentes / herois
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