1. Mensagem de Vítor Junqueira (*), ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2753 - Os Barões, (Madina Fula, Bironque, Saliquinhedim/K3, Mansabá , 1970/72, com data de 5 de Agosto de 2009:
Amigo Carlos,
Em anexo segue mais uma das minhas reflexões vespertinas, que sujeito ao teu veridicto.
Um abraço (especial) do,
VJ
2. Comentário ao Poste 4773 do J. Mexia Alves
Meu prezado amigo e camarada Mexia Alves:
A nossa relação vem de há pouco. Tenho pena, pois sinto que estaria mais rico se o fado da vida que tu escreves e cantas tão bem, nos tivesse proporcionado a convivialidade… que não tivemos!
Tenho a mania de que consigo percepcionar a aura que envolve a alma humana. A tua, espelha a imagem de um homem frontal, íntegro e sensível. Só por isso, e também porque falas um dialecto da nossa língua que, pelos vistos, poucos entendem, aqui estou eu a deixar um comentário ao teu post 4773 (**).
Dizes tu, Joaquim, que choras lágrimas de indignação e revolta, quando em certas circunstâncias, a tua consciência te atira à cara, o destino que nós portugueses, (i) responsavelmente, reservámos àqueles que foram dos nossos mais nobres, valentes e leais concidadãos. E muitos são-no ainda, pois embora trazendo no bolso um BI que indica outra nacionalidade, o coração continua português. Entre esses anónimos portugueses de alma, estarão antigos soldados teus, amigos que te protegiam e que protegeste, conforme escreves.
Não me foi dada a honra, como a ti, de comandar naturais daquele território. Mas tive a sorte de, em inúmeras ocasiões, os saber a meu lado empenhados no mesmo combate. Dominava-me então o sentimento de que em grande medida e graças a eles, a minha vida e segurança estavam em boas mãos. Hoje, como há quase quarenta anos, são credores do meu respeito e gratidão.
Por isso mesmo quero dizer-te, Joaquim, sem lágrimas porque as minhas há muito secaram quando com elas reguei a semente da raiva, que partilho a tua revolta quanto à indiferença com que colectiva e institucionalmente tratámos estas pessoas. E suas famílias.
Ainda não há muito tempo, acompanhei comovido através da televisão, a forma como a nação guineense se organizou para receber a visita de uma delegação nacional de alto nível. Nas manifestações populares de boas-vindas (merecemo-las?), muito povo. E no meio desse povo, alguns velhos soldados de caderneta militar na mão, delida e amarelada, mas a meus olhos com a força de um estandarte de guerra, tentavam aproximar-se das autoridades portuguesas com um único desejo: que os reconhecessem como antigos combatentes que dedicaram uma boa parte das suas vidas à nossa pátria e às suas FA, a quem juraram fidelidade. Como seria de esperar, a reacção foi mais uma vez, uma profunda e ostensiva indiferença. Pergunto-me se teria sido assim tão difícil estender a mão àquele punhado de homens, quando é público e notório que se distribuem euros e honrarias por tantos que se limitaram a fazer currículo mamando na teta da república.
Enquanto os que alimentaram a porca com o seu sangue, foram contemplados com o manto do opróbrio e a condenação mais ou menos sumária e explícita de que tiveram o que mereciam. Conforme já li, algures.
Para a grande maioria, é demasiado tarde, já não existe auxílio ou reparação possíveis. Por isso, e quanto àqueles que Deus já levou ou Lhe foram remetidos à força de bala, abandonados à sua sorte e alvos de vinganças cruéis e desnecessárias, peço ao Criador que os compense pela injustiça e indignidade com que Portugal os tratou. Para nós (todos), a penitência da eterna vergonha.
E não me venham os teóricos das guerras militarmente perdidas, das retiradas gloriosas, das descolonizações exemplares, justificar o injustificável. Conheço-lhes a cartilha. A dos tiques disto e daquilo, dos primarismos antidemocráticos, dos salazarismos bafientos ou das mentalidade neocolonialistas, entre as muitas tags que constam do seu repertório. Aqui trata-se apenas de dignidade, justiça e honra. Quando uma sociedade vira as costas a estes valores e assobia para o lado perante reivindicações como as destes nossos antigos camaradas, será que a prazo, vai ter pernas para ir a algum lado?
Um abraço do,
V. Junqueira
OBS: Negrito da responsabilidade do Editor
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 5 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4643: Blogoterapia (113): Saudades do blogue dos primeiros tempos, em que tudo se contava na primeira pessoa (Vítor Junqueira)
(**) Vd. poste de 3 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4773: Blogoterapia (119): Ainda choro e me revolto por todas as nossas mentiras... (Joaquim Mexia Alves, Pel Caç Nat 52 e CCAÇ 15)
Vd. último poste da série de 14 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4684: (Ex)citações (35): Milicianos ou do Quadro Permanente, todos fomos combatentes (Paulo Santiago)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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10 comentários:
Vitor Junqueira
Sem qualquer relação com Pessoas.
SIMPLESMENTE OBRIGADO MUITO OBRIGADO PELO TEU ESCRITO!
O povo Português necessita dessas palavras, como de pão para a boca.
Muito mas muito OBRIGADO!
Um abraço do tamanho do Cumbijã
Mário Fitas
Camarada Junqueira,Obrigado mais que justas as tuas palavras aqui escritas tal como as do camarigo,
Mexia Alves,todos os que por lá passaram e conviveram,sentem a amargura de nada se ter feito,por
todos aqueles que defenderam a
verde/rubra,talvaz por isso hoje ache que não tenho Pátria vivo num circo.
José Nunes
MecElect.
Beng 447-Brá
68/70
CARO VICTOR JUNQUEIRA,
SABE BEM "OUVIR" OS TEUS DESABAFOS E GRITOS DE ALMA DO MEXIA ALVES.
SEMPRE QUE ALGUÉM,MAIS AFOITO, TENTAVA JUNTO DA COMUNICAÇÃO SOCIAL,ATRAVÉS DE UM ESCRITO NA
QUALIDADE DE LEITOR COM PEDIDO DE PUBLICAÇÃO,E FOMOS CONCERTEZA MUITOS,SISTEMÁTICAMENTE O DESTINO DESSAS PALAVRAS/DESABAFO ERA A CHAMADA "CESTA SECÇÃO".
SEMPRE QUE ALGUÉM DE DENTRO DA MESMA COMUNICAÇÃO TENTAVA FAZÊ-LO CAIA-LHE A "ESPADA DE DÂMOCLES"
A AMEAÇA DE DESEMPREGO DOBRE A CABEÇA...
É TEMPO DE ACABARMOS COM ESTE SILÊNCIO CÚMPLICE EM QUE VIVEMOS.
OBRIGADO PELAS TUAS PALAVRAS.
UM ABRAÇO
MANUEL MAIA
Caro camarada
Estou de acordo contigo como tambem com o Mexia Alves.
Isto já não vai com palavras é preciso agir.
Não se esqueçam que a net. é uma arma.
E os nossos alvos tem sites e mails.
Pergunto que estão á espera.Vamos a eles, carago.
um abraço
Mário Pinto
Vitor
Estava a ler o teu post e lembrei-me de um dia,em princípio de Janeiro de 2004,quando nos HUC,de
cabeça perdida,estive quase a andar
à pancada no serviço das infecto-
-contagiosas.Eu e Carlos Santos,ex-
FurMil da 2701 fomos aquele serviço
visitar um amigo guineense,não foi
militar mas prestou trabalho muito
importante às NT.Era,ainda é, sero-
positivo.Apareceu-nos uma assistente social,e de modos um
pouco bruscos,diz-nos que aquele
senhor tinha que abandonar o HUC
naquele dia.O Carlos,vive em Coimbra,constava lá nos papéis como
responsável pelo nosso amigo,aliás
tinha sido ele juntamente com o ex-
AlfMil Martins Julião,que o tinham
ido buscar ao aeroporto e o meteram
naquele hospital.Continuando,à
imposição daquela assistente social
procurámos fazer-lhe ver ser
impossível naquele dia tirar o nosso amigo.Começa com a ameaça de
ir falar com o director e com a
segurança e termina rematando...
"este senhor nem é português,nem
devia aqui ter entrado"Foi o
descambanço,se fosse homem tinha
levado."a senhora é uma irresponsável""este homem nasceu
português""prestou serviços ao
nosso Exército",bem, ficámos de
cabeça perdida.Acabámos por sair
garantindo-lhe que se o expulssasse
do hospital,mando-o para um asilo,
que indicou,ía haver merda.Não
expulsou e passados dois dias
tirámo-lo do hospital,e ficou nos
meses seguintes,até regressar à
Guiné,em casa do Carlos ou na minha
Entretanto,faleceu a minha saudosa
irmã,acabando aquele meu amigo por
ser uma companhia para a minha mãe,
a quem tratava por avó.
Em 2005,a emoção,as lágrimas que
me rebentaram,quando encontrei os
meus soldados Bubacar Só,Mamadu Jau
e a querida população de Sincha
Sambel,onde vivi os piores momentos
da comissão,e o ano passado,quando
no primeiro dia em Bissau,encontro
o meu ex-1ºcabo Mamadú Sanhá.Que
posso eu fazer por estes homens
que durante 22 meses,24 sobre 24
horas me acompanharam e me protegeram?é uma pergunta que me
martela a cabeça muitas vezes.Muito
pouco,eu sei.Sei como foi complicado arranjar uma mísera pensão,por ferimento em combate,ao
meu ex-1ºcabo Suleimane Baldé,actual Régulo de Contabane,
que em Abril esteve aqui em casa,e
que muito se emocionou quando em
17 desse mês participou na romagem
de saudade à campa do António Ferreira,morto na emboscada do
Quirafo.Mereciam mais,sei-o,mas cá
também fomos esquecidos,vejam o
caso do Batista que não sei quando
se resolve
Abraço
P.Santiago
Caro Vitor,
Tiro o chapéu à clareza da tua exposição. Só a hipocrisia pode contra-argumentar. Mas essa tem resposta para tudo, quer relativamente a ssuntos perenes,quer a necessidades efémeras.
Estou em acreditar que a sugestão do Mário, com alguma publicidade, poderá dar algum resultado.
Inactivos é que não vamos lá.
Abraço fraterno
J.Dinis
Só a amizade muito sentida, embora pouco vivida, te leva meu caro Victor a escrever essas coisas sobre mim, que eu não mereço.
E que aliás te retribuo com toda a verdade.
Assino tudo o que aqui escreves e as tuas lágrimas secas são tão fortes como as minhas molhadas.
A tua franqueza e frontalidade, muito directas felizmente, dizem tudo aquilo que eu não disse e quereria dizer.
Já vai sendo tempo de chamar os "bois pelos nomes" e se não o fazemos agora, qualquer dia não há ninguém com conhecimento de causa para o fazer.
Como escreves e eu escrevi, não são só os que ficaram, mas também os que vieram para serem cá desprezados e achincalhados.
Enquanto outros se pavoneiam nas varandas dos discursos.
Chega!
Obrigado Victor!
para quando um almoço juntos? Ainda por cima nem moramos longe um do outro!
Abraço muito camarigo para ti e para todos.
Caro Vítor
Corajosas e verdadeiras as palavras que escreveste. Os novos senhores não as ouvem, nem querem ouvir. Não querem saber daqueles africanos que combateram a nosso lado e que eram portugueses e que acreditaram em nós e depois abandonámos miseravelmente à sua sorte. Esta é uma página que nos envergonha e mancha a nossa história. Também já o tinha dito no post sobre "o meu regresso".Ainda há quem esteja vivo! Bem hajas Vítor! Bem hajas Joaquim! Bem hajam todos aqueles que sentem esta injustiça.
Luís Dias
Os deuses devem estar loucos !
Aproveitemos as eleições para mostrarmos o que queremos !
E o que não queremos !
E quem queremos !
E quem não queremos !
Deixemo-nos de "palpites" pseudo-revolucionários !
Mas atenção ! Nas urnas, que o blog não é político ... mas está eivado de política !
E sabem porquê ?
Porque viver é político !
António Matos
Amigo Vítor, foi assim que vi esta catástrofe humana:
A mais alta de todas as traições
Muitos africanos foram os nossos melhores amigos
Tinham orgulho em envergar uma farda portuguesa
Na instrução eram afincados, cumpridores, e...
No combate davam tudo... até a vida... com nobreza!
Após a revolução dos cravos
Reinou no país a anarquia
Assaltou-se as Instituições
O povo em “partidos” se dividia
Gente a falar do que não sabia
Ou que não sabia do que falava
Que ora dizia uma coisa
E passados minutos... negava
No meio de todas as convulsões
O poder político era “restaurado”
Os governos tomavam decisões
Aos repelões... uns p’ra cada lado
E assim, no meio deste “arraial”
Foi assinado, se bem me lembro
O acordo p’ra descolonização
Nesse ano, em 9 de Setembro
Só para se ter uma leve ideia
Do resultado deste “processo”
Olhe-se para o drama de Timor
O grotesco de um insucesso
Mas se Timor é a “cara” da moeda
A “coroa” anda envergonhada
Vamos virá-la e falar nela
Iluminar uma traição abafada
Uma ignóbil e cobarde traição
A história qu’aqui se vai contar
Parte do povo ignora... naturalmente
Outra sabe... mas prefere não falar
Assim, começando pelo princípio
Na “nossa” África colonial
Os africanos eram baptizados, e…
Registados... em nome de Portugal
Portugueses para todos os efeitos
Eram convertidos ao burgo cristão
Eram detidos, julgados e punidos
Por leis e juízes da nossa Nação
Pois era, muitos desses africanos
Nas nossas escolas estudavam
Dignos de respeito e estima, e…
No nosso meio trabalhavam
Eram tratados com igualdade
E cumpriam serviço militar
Prestavam juramento de bandeira
Juravam, também, a Pátria honrar
Na tropa ostentavam com orgulho
As mesmas insígnias e fardas
Tornavam-se aprumados, vaidosos
Seguravam firmes as espingardas
Combatiam fiéis ao nosso lado
Ao nosso lado feridos tombaram
Alguns estropiados p´ra sempre
Outros... a vida sacrificaram
Em Angola, Moçambique e Guiné
Foram louvados e condecorados
Foram graduados do Exército
E, como Heróis foram saudados
Logo após a descolonização
Estes “pretos” foram abandonados
Portugal deixou de os considerar “seus”
Os “deles” acusavam: “- São renegados!”
Votados ao desprezo e à humilhação
Fria e cruelmente torturados
Apátridas ao “seu” novo “Partido”
Foram sumariamente executados!
Odiados por um simples facto
Que nunca lhes foi perdoado
Gostarem e lutarem pelos “portugas”
Seu único e último... pecado
Perante a velada indiferença
Dos políticos e das Nações
É tempo da História julgar
A MAIS ALTA DE TOD’AS TRAIÇÕES
Haverá porventura... gesto humano mais divinal…
Q’um homem possa fazer para outro auxiliar…
Que disponibilizar o seu mais supremo bem... a vida?
Jamais deixemos a sua memória alguém desonrar!
Magalhães Ribeiro
P.S. - A nós que ouvimos a malta do PAIGC a dizer aos "chacinados", esquartejados, etc, à boca cheia, que nada tinham a temer, pois todos juntos eram poucos para reconstruir a Guiné e outras ardilosas artimnahas, ainda hoje agonia o estômago de ódio, revolta e desgosto.
Só desejo a todos aqueles que lhes pesem culpas neste cartório, por tão tamanha traição, que a terra lhes seja bem pesada na hora do seu tenebroso embarque final.
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