quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Guiné 63/74 - P4781: Também quero homenagear os nossos picadores (J. Mexia Alves)

1. Mensagem de J. Mexia Alves (*), ex-Alf Mil da CART 3492 (Xitole / Ponte dos Fulas), Pel Caç Nat 52 (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) e CCAÇ 15 (Mansoa), com data de 3 de Agosto de 2009:

Caros camarigos editores

Tenho andado ocupado com outras guerras, mas não tenho deixado de vir ao fogo acariciador da fogueira da nossa Tabanca.

Por isso aqui vai um texto de homenagem que também quero fazer aos picadores (**).

Peço-vos que me acusem a recepção do dito cujo, visto que por vezes esta coisa falha e os textos não vos chegam às mãos.

Abraço fortemente camarigo para todos do
Joaquim Mexia Alves


2. Em o poste 966...

Caro Luís Graça,

Quero dar as boas vindas ao Mexia Alves. Lembro-me que ele, à época, estava completamente apanhado. Era boa praça.

Recordo-me dele muito bem e de um incidente no início de 1973, numa farra em Bambadinca, em que estava o Major de Operações do Batalhão [BART 3873], os alferes e furriéis da CCAÇ 12 e o Mexia Alves [Alf Mil Op Especiais, comandante do PEL CAÇ NAT 52].

Armou-se uma bronca a propósito de uns versos de uma canção, adaptada ao Comandante do Batalhão (Ten Cor António Tiago, já falecido), em que ele era tratado por Manel Ceguinho, o que levou o Major a dizer ao Mexia Alves que "não estávamos ali para armar em cobardes".

Ficou um ambiente de cortar à faca, que se ultrapassou com uma tirada do Mexia Alves, na qual dizia:

- Cobarde, eu, meu Major ?!... Eu que pico a estrada com os pés... que avanço à frente do Pelotão quando não há picadores ?!...

O Major colocou um sorriso amarelo e recolheu aos seus aposentos e nós lá ficámos a beber e a cantar as canções habituais. Umas bem sérias e outras de baixo nível, bem ordinárias como a da famosa Maria Bardajona...

Um abraço a todos,
António Duarte



Os Picadores

Caros camarigos

Reproduzo o post 966 (***), para também fazer a minha homenagem aos picadores.

Sempre me admirou a coragem daqueles homens que com uma pica na mão, desafiavam constantemente as leis das probabilidades.

Lembremo-nos que a pica era um dos artefactos militares mais modernos da longa panóplia de armamento que o nosso Exército fornecia às tropas, aqui muito bem descrito pelo Luís Graça:

«espantosa tecnologia que era um pau, menos comprido que a altura de um homem, maneirinho, direito, suficientemente pesado para dar sensibilidade à mão, terminando numa das extremidades por um prego grosso e bem afiado...»

Enquanto o resto da tropa seguia junta, para se protegerem uns aos outros, aqueles homens seguiam destacados na frente, separados dos outros, para que, imagine-se, se rebentassem alguma mina os outros não fossem atingidos.

Coisa estranha e cruel, numa tropa tão solidária!

Mas era assim que tinha de ser e era assim que se fazia.

Heróis desconhecidos a maior parte deles, porque em cada saída para as colunas ou para a mata, eles executavam o seu acto heróico à frente dos nossos olhos, conscientemente.

Por isso a reprodução do post acima, para demonstrar que só um gajo muito apanhado do clima, executaria tal missão.

Bem, é que um dia, não faço ideia porquê, decidimos ir do Mato Cão a Missirá pela estrada que já não era percorrida há longos meses.

Pegámos no burrinho como apoio e lá fomos nós estrada fora, com os picadores à frente.

Mas a coisa estava a demorar muito tempo e era preciso voltar no mesmo dia pelo que, o Alferes da coisa, (este vosso humilde criado), já muito apanhado, decidiu ir durante um pouco à frente, servindo-se dos seus pés como picas.

Há um ditado que nos diz que, “ao menino e ao borracho, põe Deus a mão por baixo” que aqui neste caso se poderia alterar para, “ao militar que é tolo, protege-o Deus de ficar num bolo”.

Depois, se bem me lembro, optámos por tentar seguir paralelamente à dita estrada.

Não houve problemas e regressámos ao palácio do Mato Cão em paz e sossego.

Um abraço sentido aos picadores.
Abraço camarigo para todos
Joaquim Mexia Alves


As Picas em acção na estrada Catió/Ganjola

Foto e legenda: © Jorge Teixeira (Portojo) (2009). Direitos reservados.


Bironque, 03DEZ71 > Esta mina AC felizmente foi detectada pelo método científico da vareta, ou pica.

Foto e legenda: © Carlos Vinhal (2009). Direitos reservados.

__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 3 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4773: Blogoterapia (119): Ainda choro e me revolto por todas as nossas mentiras... (Joaquim Mexia Alves, Pel Caç Nat 52 e CCAÇ 15)

(**) Vd. poste de 30 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4760: Pensamento do dia (17): Recordando as Picas (Jorge Teixeira)

(***) Vd. poste de 17 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P966: O Mexia Alves que eu conheci em Bambadinca (António Duarte, CCAÇ 12, 1973)

3 comentários:

Anónimo disse...

Mato Cão-Missirá? Podias ir à vontade.A pensar em ti,dois anos
antes,limpei-a completamente de
minas e quanto aos Turras avisei-os:
"Cuidado,depois de mim chegará um
tal Mexia...

Abraço Grande

Jorge Cabral

Unknown disse...

Regras eram aquelas que criavamos no mato. Era lidar com homens que mal conhecíamos, nós mesmos "imberbes" em coisas militares e então de guerra nem se fala. Ninguém nos ensinou nada. Fomos carne para canhão. Mas tive e ainda hoje tenho um grande orgulho de ter lidado com homens, (muitos deles nem sabiam ler)conflituosos, arruaceiros, cheios de problemas familiares, mas solidários na hora precisa, que defendiam o seu camarada com quem na noite anterior tinham andado à porrada. Pois esses homens, eles mesmo se elegiam, que determinavam, quem é que seguia o picador. E atraz de cada pica seguia sempre um, colado a ele, pronto para o que desse e viesse. Fui muitas vezes o terceiro, porque me mandavam recuar, mas tinha sempre o quarto colado a mim. Diziam eles, olha para o chão que eu olho por ti. E nunca duvidei da coragem que aqueles "meus" homens acima de tudo tinham, o seu espírito de camaradagem e de solidariedade que ninguem lhes ensinou. E dariam a vida pelo seu camarada qualquer que fosse a circunstancia em que caíssemos. Mas logo que entravam nos muros, (não tinhamos arame farpado em Catió )saía aquele ronco de dentro do peito e voltava tudo ao normal. Vai uma cervejinha furriel ?
O responsável da cantina era do nosso pelotão, também ele escolhido por eles, e que se punha a pé para que nada nos faltasse - de beber claro -. Mesmo que fossem já horas do café da manhã para o pessoal que ficou na sorna...

Joaquim Mexia Alves disse...

Agora me lembro caro Jorge que um deles quando eu passava na estrada me disse por detrás de um baga baga:
Olha pá só não levas porrada porque Alfero Jorge Cabral é manga de gajo porreiro, pá!!!

Brigadinha!!!

Abraço camarigo, muito para ti Jorge