domingo, 29 de julho de 2012

Guiné 63/74 - P10204: Blogpoesia (194): Lá longe a Pátria e Quando o Estado morrer (José Manuel M. Dinis)

1. Mensagem do nosso camarada José Manuel Matos Dinis* (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), com data de 27 de Julho de 2012:

Carlos, meu bom amigo,
Provavelmente já sentias saudades das minhas missivas, mas vais ter que me desculpar a inoperância, que fica a dever-se a um misto de falta de inspiração e preguiça, acentuado pelos calores austrais que nos invadem por esta ocasião. Só apetece, é ir p'rá bolanha.
No entanto, em resultado de uma sombria arrumação, descobri uns pretensos poemas escritos, ou associados à Guiné, coisas do século passado, e com duvidoso valor artístico. Seja como for, aqui vai a reprodução de duas dessas obras, com o pedido antecipado de desculpas, tendo em conta os excelentes momentos de poesia que o Blogue nos tem oferecido, e a brevidade deste sacrifício.

Para ti e para o restante tabancal, vai um grande abraço.
JD


Lá longe a Pátria

A Pátria é bela, 
Sonhada. 

Cá longe, 
Onde os dias são anos, 
E a vida ganha-se taco-a-taco, 
tiro-a-tiro, 
que há fome e guerra, 
Sol sem pão, 
Oficiais, 
Sargentos... 
e praças, 
BUM 
BUM, BUM, 
Tensão! 
sai uma obusada, 
lágrimas e rezas, 
morteiros, 
Filhos da mãe! 
Depois passa: 
se calhar, há feridos, ou mais.

O momento é solene, 
o coraçao ainda bate com força, 
ou quase parou, 
é uma luta íntima. 
Raios me partam! 
Lá longe, a Pátria. 

Bajocunda, 1971

Nota do autor:
Poema dedicado ao Foxtrot, um Pelotão de rapazes bons, que só agora tem expressão pública, e a dois valorosos combatentes que foram feridos com gravidade, o Marcolino António Pestana e o Orlando Ferdinando Andrade.

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Quando o Estado morrer

Quando o Estado morrer, 
Vou ver o enterro, 
Numa cova muito funda, 
Os homens de pás e picaretas, 
Vestidos de tunica, 
Deitar terra castanha e preta. 

Depois de se rezar, 
O povo todo vai embora, 
Fica a viúva, coitada, 
Que ali deixa um tacho com flores, 
À espera de um novo Estado, 
Para ser violada.

Este Estado, 
só tem um estado, 
Que é um estado de Estado...
Desastrado.

Bajocunda, 1971
____________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 20 de Junho de 2012 > Guiné 63/74 - P10053: História da CCAÇ 2679 (51): Uma dívida por pagar (José Manuel M. Dinis)

Vd.- último poste da série de 19 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10168: Blogpoesia (193): Deste-me asas para voar... (Joaquim Mexia Alves)

4 comentários:

MANUELMAIA disse...

OLÁ POETA ESCONDIDO !
SIMPLESMENTE,GOSTEI.
CHEGA DE "FERAS".
AGORA É HORA DE TRABALHAR.

Luis Faria disse...

Boa,José Dinis!

Pelo que vejo,mais um "polifacetado"da escrita se denuncia!!!
Claro que não sou um apreciador e muito menos conhecedor mas...gostei da simplicidade clara do que li e interpretei.
Um abraço
Luis Faria

Anónimo disse...

Também gostei muito, e mais ainda por ter sido escrito por um jovem, tão jovem, apesar de militar!

Parabéns, José Diniz

Um abraço da

Felismina

Luís Graça disse...

Zé:

Não te conhecia esta faceta... Os combatentes, para além de serem ex, são uma permanente caixinha de surpresas... O nosso blogue tem sido uma mon(s)tra de talentos... O nosso papel (bloguístico) é esse mesmo, o de ajudar a revelar o poeta, o contista, o novelista, o romancista, o humorista, o crítico, o historiógrafo, o artista, o comediante, o filósofo, o místico, e por aí fora, que há em nós... E sobretudo o ser humano, o português,o cidadão, o camarsda, o amigo, que há em cada um de nós...

Fico com a esperança de ler mais alguns textos poéticos do teu tempo de Buruntuna... Não te conhecia também a costela "anarca"... Fica-te bem... Abaixo o Estado (de fraqueza)!