1. Mensagem do nosso camarada José Manuel Matos Dinis* (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), com data de 27 de Julho de 2012:
Carlos, meu bom amigo,
Provavelmente já sentias saudades das minhas missivas, mas vais ter que me desculpar a inoperância, que fica a dever-se a um misto de falta de inspiração e preguiça, acentuado pelos calores austrais que nos invadem por esta ocasião. Só apetece, é ir p'rá bolanha.
No entanto, em resultado de uma sombria arrumação, descobri uns pretensos poemas escritos, ou associados à Guiné, coisas do século passado, e com duvidoso valor artístico.
Seja como for, aqui vai a reprodução de duas dessas obras, com o pedido antecipado de desculpas, tendo em conta os excelentes momentos de poesia que o Blogue nos tem oferecido, e a brevidade deste sacrifício.
Para ti e para o restante tabancal, vai um grande abraço.
JD
Lá longe a Pátria
A Pátria é bela,
Sonhada.
Cá longe,
Onde os dias são anos,
E a vida
ganha-se taco-a-taco,
tiro-a-tiro,
que há fome e guerra,
Sol sem pão,
Oficiais,
Sargentos...
e praças,
BUM
BUM, BUM,
Tensão!
sai uma obusada,
lágrimas e rezas,
morteiros,
Filhos da mãe!
Depois passa:
se calhar, há feridos, ou mais.
O momento é solene,
o coraçao ainda bate com força,
ou quase parou,
é uma luta íntima.
Raios me partam!
Lá longe, a Pátria.
Bajocunda, 1971
Nota do autor:
Poema dedicado ao Foxtrot, um Pelotão de rapazes bons, que só agora tem expressão pública, e a dois valorosos combatentes que foram feridos com gravidade, o Marcolino António Pestana e o Orlando Ferdinando Andrade.
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Quando o Estado morrer
Quando o Estado morrer,
Vou ver o enterro,
Numa cova muito funda,
Os homens de pás e picaretas,
Vestidos de tunica,
Deitar terra castanha e preta.
Depois de se rezar,
O povo todo vai embora,
Fica a viúva, coitada,
Que ali deixa um tacho com flores,
À espera de um novo Estado,
Para ser violada.
Este Estado,
só tem um estado,
Que é um estado de Estado...
Desastrado.
Bajocunda, 1971
____________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 20 de Junho de 2012 > Guiné 63/74 - P10053: História da CCAÇ 2679 (51): Uma dívida por pagar (José Manuel M. Dinis)
Vd.- último poste da série de 19 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10168: Blogpoesia (193): Deste-me asas para voar... (Joaquim Mexia Alves)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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4 comentários:
OLÁ POETA ESCONDIDO !
SIMPLESMENTE,GOSTEI.
CHEGA DE "FERAS".
AGORA É HORA DE TRABALHAR.
Boa,José Dinis!
Pelo que vejo,mais um "polifacetado"da escrita se denuncia!!!
Claro que não sou um apreciador e muito menos conhecedor mas...gostei da simplicidade clara do que li e interpretei.
Um abraço
Luis Faria
Também gostei muito, e mais ainda por ter sido escrito por um jovem, tão jovem, apesar de militar!
Parabéns, José Diniz
Um abraço da
Felismina
Zé:
Não te conhecia esta faceta... Os combatentes, para além de serem ex, são uma permanente caixinha de surpresas... O nosso blogue tem sido uma mon(s)tra de talentos... O nosso papel (bloguístico) é esse mesmo, o de ajudar a revelar o poeta, o contista, o novelista, o romancista, o humorista, o crítico, o historiógrafo, o artista, o comediante, o filósofo, o místico, e por aí fora, que há em nós... E sobretudo o ser humano, o português,o cidadão, o camarsda, o amigo, que há em cada um de nós...
Fico com a esperança de ler mais alguns textos poéticos do teu tempo de Buruntuna... Não te conhecia também a costela "anarca"... Fica-te bem... Abaixo o Estado (de fraqueza)!
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