1. Mensagem, com data de ontem, de Vasco Pires (ex-alf mil art, cmdt do 23.º Pel Art, Gadamael, 1970/72; membro da Tabanca Grande, a viver na diáspora, Brasil]
Assunto: Raspando o fundo do baú..
Caríssimos,
Quando li o desafio do Luis, para "raspar o fundo do baú", nada me ocrreu, contudo, há dias, fazendo um comentário num post, "veio à memória":
O ATO MAIS IRRESPONSÁVELDOS MEUS DOIS ANOS DE SERVIÇO COMO SOLDADO DE ARTILHARIA!
Assunto: Raspando o fundo do baú..
Caríssimos,
Quando li o desafio do Luis, para "raspar o fundo do baú", nada me ocrreu, contudo, há dias, fazendo um comentário num post, "veio à memória":
O ATO MAIS IRRESPONSÁVELDOS MEUS DOIS ANOS DE SERVIÇO COMO SOLDADO DE ARTILHARIA!
Decorria o ano de 1970, quando cheguei a Bissau, no BAC1 (ou já seria GA7?), que era Comandado por um controverso Oficial Superior de Artilharia, a quem a caserna dera o codinome de "Paizinho", entre outros, que vou me abster de mencionar.
Circulavam "estórias" por Bissau, algumas falsas, outras verdadeiras, como o facto de ter "saído no Braço" com o Segundo Comandante, o que acarretou a ruína da carreira do desdito Oficial. Esse comportamento do Comandante, digamos errático para ser generosos, contaminou as relações dos Oficiais do Comando, e consequentemente, se foi alargando (como as pragas).
Após a chegada, foi feita uma apresentação ao material em operação nos Pelotões (10,5, 11,4, e 14); já quanto á situação operacional do TO, apesar de desde a recruta, vermos cartazes "gritando", "O boato fere que nem uma lâmina", as "infomações" vinham mais do "Jornal da Caserna", que propriamente um "briefing" consistente.
Circulavam "estórias" por Bissau, algumas falsas, outras verdadeiras, como o facto de ter "saído no Braço" com o Segundo Comandante, o que acarretou a ruína da carreira do desdito Oficial. Esse comportamento do Comandante, digamos errático para ser generosos, contaminou as relações dos Oficiais do Comando, e consequentemente, se foi alargando (como as pragas).
Após a chegada, foi feita uma apresentação ao material em operação nos Pelotões (10,5, 11,4, e 14); já quanto á situação operacional do TO, apesar de desde a recruta, vermos cartazes "gritando", "O boato fere que nem uma lâmina", as "infomações" vinham mais do "Jornal da Caserna", que propriamente um "briefing" consistente.
Alguns dias após a chegada, mandaram-me, por um curto período, para um Pelotão no Bachile, acredito, que para cobrir férias do Comandante.
Lembro bem, que no entusiasmo de "periquito", aceitei o convite do Comandante de uma patrulha, para ter uma ideia, de como seria um pedido de apoio; errado, porque a ordem expressa do Comando do BAC1, era de que o Pelotão (material e militares), só poderia sair dos quartéis, com uma ordem escrita do Comando do Aquartelamento.
Lembro bem, que no entusiasmo de "periquito", aceitei o convite do Comandante de uma patrulha, para ter uma ideia, de como seria um pedido de apoio; errado, porque a ordem expressa do Comando do BAC1, era de que o Pelotão (material e militares), só poderia sair dos quartéis, com uma ordem escrita do Comando do Aquartelamento.
A ativadade operacional do Pelotão era nula. Deslocava-me a Teixeira Pinto com alguma regularidade, um dia no Bar do CAOP1, fui abordado pelo Major de Operações, que, após se certificar da minha identidade de soldado de Artilharia, desferiu:
- Amanhã, terá uma grande operação, forças especiais e tropa regular vão atacar uma base IN na Mata X [da qual não lembro o nome, e que na altura, como recém-chegado, pouco ou nada dizia para mim]. Nós ( eu e ele) vamos regular o tiro. Amanhã às Y horas, esteja no lugar Z!!!
No auge da minha "periquitice", sem nada perguntar, limitei-me a dizer:
- Sim, senhor, meu Major!
Na minha fantasia, iríamos regular o tiro, a bordo de um helicóptero; na hora e local determinado, como não poderia deixar de ser, me apresentei devidamente "armado" com a minha tabela de tiro. Qual não foi a minha surpresa, quando subimos numa Dornier!
Por lá andamos ás voltas, ele identificando os alvos, e eu, tabela de tiro no colo, calculando, e transmitindo a ordem de fogo para o Pelotão!!! Felizmente nada ocorreu de anormal.
Quando descemos, me faltaram as palavras e a coragem, para transmitir o meu espanto do ato que tínhamos acabado de cometer.
Ainda hoje, mesmo que tenha cometido outros erros, considero este como o ato mais irresponsável, dos meus dois anos de serviço na Guiné, como soldado de Artilharia.
E siga a Artilharia...
Forte abraço a todos
Vasco Pires
- Amanhã, terá uma grande operação, forças especiais e tropa regular vão atacar uma base IN na Mata X [da qual não lembro o nome, e que na altura, como recém-chegado, pouco ou nada dizia para mim]. Nós ( eu e ele) vamos regular o tiro. Amanhã às Y horas, esteja no lugar Z!!!
No auge da minha "periquitice", sem nada perguntar, limitei-me a dizer:
- Sim, senhor, meu Major!
Na minha fantasia, iríamos regular o tiro, a bordo de um helicóptero; na hora e local determinado, como não poderia deixar de ser, me apresentei devidamente "armado" com a minha tabela de tiro. Qual não foi a minha surpresa, quando subimos numa Dornier!
Por lá andamos ás voltas, ele identificando os alvos, e eu, tabela de tiro no colo, calculando, e transmitindo a ordem de fogo para o Pelotão!!! Felizmente nada ocorreu de anormal.
Quando descemos, me faltaram as palavras e a coragem, para transmitir o meu espanto do ato que tínhamos acabado de cometer.
Ainda hoje, mesmo que tenha cometido outros erros, considero este como o ato mais irresponsável, dos meus dois anos de serviço na Guiné, como soldado de Artilharia.
E siga a Artilharia...
Forte abraço a todos
Vasco Pires
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Nota do editor:
28 de janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12648: O segredo de... (17): O maior frio da minha vida (Fernando Gouveia)
28 de janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12648: O segredo de... (17): O maior frio da minha vida (Fernando Gouveia)
6 comentários:
Não percebi!
Abraços
AMM
Caríssimos AMM/Luis Graça
Cordiais saudações.
Lamento, não ter sido mais claro ao expor o meu pensamento.
Sim, considerei na altura, e considero ainda hoje, um ato irresponsável da minha parte.
Um soldado recém chegado ao TO, sem qualquer informação anterior, tanto sobre a região, como sobre a operação em curso,envolvendo diversas unidades tentando tomar uma base IN,subir numa aeronave para dar apoio de artilharia,não me parece ser um procedimento adequado; ainda com a agravante de fazer os cálculos de tiro em precárias condições.
forte abraço a todos
Vasco Pires
Ex-soldado de Artilharia (IOL)
Vou tentar esclarrrreeecer..esclarrerreecerei..
Caros camaradas
O V.Pires tem razão.
O tiro de artilharia era bastante complexo..é que não bastava fazer os cálculos correctos..também existiam outros factores não menos importantes..como a temperatura do ar a percentagem de humidade do mesmo e das cargas as condições do próprio obus ou peça.. nomeadamente do tubo (estrias com mais ou menos desgaste)os hidráulicos com óleo suficiente..o próprio aparelho de pontaria.. se já muito usado..etc.etc..
Seria fastidioso estar e enumerar todas as variáveis para que se fizesse um tiro de precisão..e a precisão na artilharia é sempre relativa...por isso meus caros infantes..cavaleiros (infantes) e artilheiros (infantes) e até pilavs..não gozem com a artilharia ..tá bem..
Quanto ao V.Pires meu distinto camarada artilheiro..eu imagino se me tivessem feito o mesmo quando cheguei à Guiné..foi na verdade uma irresponsabilidade de quem deu a ordem..
Um alfa bravo
C.Martins
Caríssimo C. Martins,
Cordiais saudações.
Por essas e por outras, é que a "ave" é chamada de periquito!
Muitas "luas" mais tarde, fui convocado ao gabinete do Oficial de Operações de um Batalhão, situado perto da fronteira do Senegal, que solenemente me ordenou;
- Vamos fazer uma grande operação, e você vai sair com o seu Pelotão!
- Ás suas ordens meu Major, todavia, por determinação do Comando da Artilharia em Bissau, é necessária uma ordem por escrito. Fico aguardando instruções.
Estou aguardado até hoje, Caro C. Martins!
forte abraço
Vasco Pires
Caros camaradas
Eu que pouco ou nada sei de artilharia, não venho avaliar o ato do camarada Vasco Pires, mas eis-me a terreiro porque o palco de atuação, foi a minha praia entre os meses de abril a setembro de 1973.
A Base-IN nas proximidades do Bachile (a que decerto se refere) situava-se nas matas da Caboiana. Nos meus patrulhamentos ao seu redor (do lado do Cacheu) testemunhei que continuava bem ativa: Parecia-me um centro de instrução e treino de tiro, tão grande o tiroteio de armas ligeiras que houvia à distancia de 2,3,4km,(?) quando passava na orla da mata na zona do Burné.(Tenho uma estória para contar a este propósito, mas fica para outra altura).
Entre as muitas questões que gostaria de esclarecer, para melhor compreensão do que foi aquela guerra(se ela é possível?) deixo 2, para as quais gostava que alguém me ajudasse a entender:
1- Porque é que o Com-Chefe "permitia" a existência de Bases-IN, no interior do território, bem longe das fronteiras, de acessos muito difíceis para pessoas e abastecimentos, em áreas bem circunscritas?( Exemplos: Caboiana, Morés, Ponta do Inglês, etc.)
2- Porque é que o aquartelamento do Bachile, ali tão próximo da Caboiana não era mais atacado pelo IN? Viviam em aparente sossego,sem hostilidades, com o IN ali tão perto! Seria porque os soldados da CCAÇ 16 eram manjacos na sua maioria? (etnia com fortes afinidades com o IN) Seria com medo da retaliação da artilharia dos 2 obuses?
Seria por ser uma base de instrução e treino e não atacavam para não serem atacados?
Responda quem souber! Alguém deve saber de dentro ou de fora da tertúlia.
Um abraço
JLFernandes
Vasco Pires
27 abril 2014 16:33
"Onde é que o "cerne" da tua irresponsabilidade... Nem toda a malta conhece a "cultura" da artilharia... Abração. Luis"
Caríssimo Luis,
Cordiais saudações.
Como eu já lamentei, num comentário no post, deveria ter sido mais claro, lembrando que este é um Blog de Veteranos de Guerra, e não de ex-Artilheiros; aliás, somos tão poucos, que não daria para formar um secção, acredito eu.
Como já disse no comentário:
"Um soldado recém chegado ao TO, sem qualquer informação anterior, tanto sobre a região, como sobre a operação em curso,envolvendo diversas unidades tentando tomar uma base IN,subir numa aeronave para dar apoio de artilharia,não me parece ser um procedimento adequado; ainda com a agravante de fazer os cálculos de tiro em precárias condições."
Não me extendi no comentário,contudo, posso acrescentar:
Um observador, militar inexperiente operacionalmente, voando numa Dornier às voltas numa mata quase sem referências, já seria imprudente.
Esse observador, função para a qual fui treinado (IOL), acumular nessas condições (numa Dornier, com a Tabela de Tiro no colo, às voltas) as funções de Posto de Comando de Tiro é fator agravante.
Não fosse suficiente esse militar inexperiente, já ter sido arvorado em Chefe do Posto de Comando de Tiro, ainda acumulava a função de Comandante de Bataria.
Vale lembrar que estamos falando duma operação com várias Unidades (Regulares e Especiais) se deslocando no terreno, na tentativa de tomar uma base IN.
Este mail, é uma resposta ao seu pertinente comentário acima, fica a seu critério publicá-lo ou não.
forte abraço
Vasco Pires
Ex-Soldado de Artilharia (IOL)
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