Caro amigo Carlos Vinhal
Foram várias as vezes que o meu pelotão teve que fazer segurança à ponte sobre o rio Udunduma, que fica já nas proximidades de Bambadinca, partindo do Xime e passando pela tabanca de Amedalai.
Esta segurança foi efectuada pela Cart 2520, de Julho a Dezembro de 1969. Como durante este período de tempo tínhamos menos um pelotão no Xime, de três em três semanas lá estávamos "caídos" sem termos as mínimas condições. Não dormíamos directamente no chão porque os nossos colchões de espuma resolviam este problema. A nossa alimentação era fornecida por Bambadinca, muitas vezes o pequeno almoço chegava a horas tardias, o almoço quase a meio da tarde e o jantar quantas e quantas vezes também chegou fora de horas.
Na higiene pessoal não houve problemas, porque foi assegurada pela água corrente do rio. O rio serviu para o pessoal se dedicar à pesca com anzóis que eram comprados numa loja de comerciantes libaneses em Bambadinca. Também dávamos uns mergulhos a partir da ponte e assim refrescávamos os nossos corpos e as nossas almas. Lembro-me que foi a mergulho que recuperei a prótese dentária que um dos meus militares deixou cair ao rio.
Felizmente não nos aconteceu nada de mal durante os períodos de tempo que aqui permanecemos, além de pequenos percalços que fomos ultrapassando, como foi o caso do Júlio Custódio ter um ataque de paludismo no princípio de noite e só poder ser evacuado na manhã do dia seguinte.
Recordo-me do dia em o Sebastião Carrega, abateu em pleno voo, com um tiro de G3, um daqueles enormes patos que normal e curiosamente voavam aos pares. Lembro-me também do João Moura ter abatido a tiro uma águia de uma enorme envergadura, que estava pousada numa árvore na envolvência do nosso pequeno destacamento.
Curiosamente e apesar das dificuldades, estas seguranças à ponte livraram-nos da intensa actividade que decorreu no Xime e até de alguns ataques e flagelações executadas pelos elementos do PAIGC.
Entretanto recebe um grande abraço deste camarada de armas.
José Nascimento
Ponte sobre o Rio Udunduma
Ponte sobre o Rio Udunduma. O Moura à esquerda ajudando a segurar a águia
Ponte sobre o Rio Udunduma
____________Nota do editor
Último poste da série de 14 de maio de 2015 > Guiné 63/74 - P14613: Memória dos lugares (291): Bissau, Bambadinca e Farim, em 2011 (José Maria Sousa Ferreira, ex-viola solo do conjunto musical "Os Bambas d'Incas", Bambadinca, 1968/70)
4 comentários:
Eu bem digo que o tiro à águia é mais fácil que o tiro ao leão.O leão (verde!) é o rei dos animais, a águia (vermelhusca), uma simples ave de rapina.
Abraço,
António Graça de Abreu
Como diria o meu camarada da CART 11 'Os Lacraus' ex-fur.mil. Cândido Cunha: que
mal faria águia para ser abatida, se calhar por comer ratos e cobras.
Mas, quem esteve de serviço no destacamento da Ponte do Udunduma, que eu por lá passei várias vezes, tinha que fazer alguma coisa.
Um abraço
Valdemar Queiroz
Caro camarada José Nascimento
A Ponte do Rio Udunduma, com o seu perímetro de segurança, tem sido aqui referida algumas vezes.
Recordo-me dos textos que o Jorge Araújo aqui tem colocado e que nos deu uma panorâmica geral do ambiente vivido. Também uma outra ponte, sobre o Rio Caium, foi várias vezes aqui salientada.
Este teu texto e as fotos de apoio mostram uma mesma realidade, embora com ambiente diferente, sendo isso mesmo uma das vantagens deste Blogue, que é colocar aqui quase que uma evolução temporal dos locais e suas realidades.
Quanto à águia abatida.... mesmo assim não deixa de ser imponente, basta ver a sua envergadura, e aqueles que pensaram que com tal gesto lançariam algum aviso atemorizador a alguma "águia Vitória" certamente que já compreenderam que tal esforço foi em vão.....
Abraço
Hélder S.
Camaradas, também penei por lá... E o desconto e o tédio eram tantos que às tantas havia malta a atirar aos jadudis (abustres), embora fosse geral o respeito por estas aves necrófogas a quem chamavamos os "almeidas" da Guiné... O jadudi "cheirava" a morte à distância... Morança com a coberta de colmo cheia de jaduis era sinal de velório... e de choro... e de comida... e de restos de comida.
Infelizmente, na altura também não tínhamos a mesma consicência ecológica que temos hoje. Mas eu nunca fui caçador, a não ser no prato.
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