quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Guiné 63/74 - P15434: A guerra vista do outro lado... Explorando o Arquivo Amílcar Cabral / Casa Comum (15): A Rádio Libertação e a inconfundível voz da "Maria Turra", a locutora, angolana, de origem caboverdiana, Amélia Araújo, hoje com 81 anos e a viver em Cabo Verde


Amélia Araújo gravando os trabalhos da I Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau para a Rádio Libertação, na "região libertada do Boé". Data:  23 e 24 de setembro de 1973.

Fonte: Antena Um / Fundação Mário Soares / Casa Comum / Arquivo Amílcar Cabral (Com a devida vénia...)


Amélia Araújo aos microfones da Rádio Libertação, a rádio do PAIGC, a emitir a partir de Conakry.  Teve início em julho de 1967. Data da foto: c. 1967.

Com 81 anos, Amélia Araújo vive hoje em Cabo Verde. A sua voz pode ser aqui recordada no ficheiro áudio (10' 18'') do portal DW - Deutsche Welle ("Rádio Libertação: Fala o PAIGC").

Fonte: Antena Um / Fundação Mário Soares / Casa Comum / Arquivo Amílcar Cabral (Com a devida vénia...)


1. Estas duas fotos são do portal Casa Comum / Documentos Amílcar Cabral (*), mas foram primeiro visualizadas no programa "Canções da Guerra",  realizado por Luís Marinho, com produção de Joana Jorge e transmissão na Antena Um (todos os dias, de 2ª a 6ª feira, às 14h55)...   

Um dos episódios recentes deste programa da Antena Um foi justamente sobre a Rádio Libertação, o seu papel, na propaganda e contrapropaganda do PAICG. Não se pode fazer a história desta rádio sem falar da "Maria Turra", a angolana, de origem caboverdiana,  Amélia Sanches Araújo,  que lhe deu voz e alma de 1967 a 1974...  Aderiu ao PAIGC em janeiro de 1964.  Com mais quatro guineenses, a Amélia Arújo  foi enviada por Amílcar Cabral para uma formação de nove meses na União Soviética. Em maio de 1967 a União Soviética entrega ao PAIGC, através do seu embaixador em Conacri, uma estação de rádio.

Esse episódio (do programa "Canções da Guerra") pode ser revista no portal da RTP, e aqui:


Antena 1 > Canções da Guerra > Rádio Libertação

"A Guiné foi a mais dura das três frentes de guerra em África. E também aqui a Rádio teve grande importância.

"O PAIGC tinha uma emissão de Rádio a partir de Conakri. Era a Rádio Libertação.

"Uma das suas vozes mais emblemáticas era a de uma mulher: Amélia Araújo, conhecida no lado da tropa portuguesa por Maria Turra." [Este link remete para um poste do nosso blogue, justamente com a história desta mulher que alguns de nós confundiam com a mulher do Amílcar Cabral] (**)


Amélia Araújo, em 2014, em Cabo Verde.
Foto de DW - Deutsche Welle / Madalena Sampaio
(Com a devida vénia...)
2. Além das duas fotos, acima reproduzidas, o portal da RTP disponibiliza, na íntegra o testemunho de Amélia Araújo, à Antena 1 [em data que não é referida]:

Ficheiro áudio, 6' 53'': A Amélia Araújo explica como funcionava a rádio do PAIGC, com escassos meios técnicos, até 1969/70, altura em que receberam, da ajuda sueca, equipamento moderno, potente...[Na realidade. esse sofisticado equipamento, sueco, pedido por Amílcar Cabarl em 1971, só chegaria em meados de 1972; aqui a entrevistad está equivocada quanto às datas; até 1972 operaram com equipamento soviético]. (***)

Havia emissões em português e  crioulo, e algumas línguas vernáulas, como o balanta, o fula, o mandinga, o beafada, etc. A rádio, para além de manter os combatentes informados, nas três frentes (sul, norte e leste), foi um importante veículo de desenvolvimento e difusão do crioulo, bem como de recolha e divulgação do património musical da Guiné e de Cabo Verde...O programa também fazia contrapropaganda, dirigindo-se aos soldados portugueses, e fazendo questão de sublinhar que a guerra travada pelo PAIGC não era contra o povo português mas contra o colonialismo português. (Sinopse: LG)

Outros Links:

A Rádio Libertação e a Voz, Maria Turra – A história [Texto do portal DW - Deutsche Welle, da autoria de Madalena Sampaio, com data de 22/9/2014, e onde se reproduzem também as duas fotos acima com a "Maria Turra"].

Há mais vídeos e ficheiros áudio disponíveis, no portal Media > RTP > Canções da Guerra, direta ou indiretamente relacionados com a Rádio Libertação.


3. Mais alguns exemplos de documentação constante do portal Casa Comum / Arquivo Amílcar Cabral, referente à Rádio Libertação:

(i) Reunião sobre a Rádio do PAIGC, de 21/6/1966: listagem dos tópicos debatidos, definição dos programas, horários e idiomas (1 página);

(ii) Declaração assinada por Amílcar Cabral, Secretário Geral do PAIGC, comprovando a recepção de uma estação de emissão rádio enviada pela Embaixada da URSS [, em Conacri], com data de 20/5/1967 (em francês);

(iii) Mensagem de Ano Novo de Amílcar Cabral, Secretário Geral do PAIGC, emitida pela Rádio Libertação, no dia 1 de Janeiro de 1971 (27 pp.) (em francês).



(...) A Maria Turra era (é, porque está viva, em Cabo Verde) Amélia Araújo, natural de Angola, casada com o cabo-verdiano José Araújo, esse já falecido.  (...)

A mulher do dr. Manuel Boal - outro natural de Angola - era Maria da Luz (Lilica) Boal, nascida em Tarrafal de Santiago. Essa,  sim, dirigiu a Escola Piloto em Conacri, trabalhou nos manuais escolares, etc. (...)


Tanto os Araújo como os Boal estavam em Portugal em 1961 e fizeram parte do grupo que, nesse ano, fugiu de Portugal, com o apoio de oganizações protestantes, do qual muitos se foram juntar aos movimentos de libertação dos respectivos países. O dr. Boal começou por se juntar em Leopoldville ao MPLA para, mais tarde, quando este foi forçado a saír da cidade, ir ter com a mulher a Dakar e colaborar com o PAIGC.

Quanto ao dr. Mário Pádua - que desertou do Exército colonial em Angola e veio a ser médico do PAIGC, no Hospital de Ziguinchor, onde tratou o soldado Fragata - não sei se era casado na altura. (...)

(***) Vd. poste de 9 de novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13865: Da Suécia com saudade (45): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte VI): Para além de meios de transporte automóvel (camiões e outras viaturas Volvo, Gaz, Unimog, Land Rover, Peugeot, etc.), até uma estação de rádio completa, móvel, foi fornecida ao movimento de Amílcar Cabral, sempre para fins "não-militares"... (José Belo)

(...) "Em 1971 Amilcar Cabral pediu o fornecimento de uma estação de rádio montada em dois camiões Mercedes Benz...também fornecidos pela Suécia. (...)

"Em 19 de Setembro 1972, dois transmissores (e o material de estúdio respectivo) começaram a funcionar desde o Norte da Guiné [leia-se: Senegal], com programas também para Cabo Verde.

"Os técnicos responsáveis por estas transmissões foram treinados na companhia sueca Swedtel." (...)

1 comentário:

Antº Rosinha disse...

Como esta senhora do PAIGC, havia muitos caboverdeanos em Angola, em todas as repartições e em todas as capitais de distrito, que tal como na Guiné, sobressaía a sua presença.

Vou dizer uma coisa que muita gente pode não acreditar e considerar tolice minha:

Quando Amílcar Cabral na fundação do PAIGC, se torna simultaneamente co-fundador do MPLA, havia um sentimento de irmandade entre todos os que foram estudantes da "Casa do Império" de todas as colónias portuguesas, que hoje já não existe mais, e hoje já não existe mais essa irmandade.

Embora apoiem todos a CPLP, e os dirigentes todos falem português, nota-se que há indiferença entre eles.

No tempo colonial, um caboverdeano ou Sãotomense ou Goês, que eram os que mais emigravam, iam para Angola ou Moçambique ou Guiné, co-habitavam naturalmente como se não tivessem ido para terra estranha.

Daí, Amilcar Cabral, os irmãos Pinto de Andrade por exemplo, relacionavam-se com todos os dirigentes angolanos ou guineenses como patrícios uns dos outros.

Acabou esse relacionamento, e até se nota em alguns casos, no caso da Guiné, desentendimentos com angolanos e caboverdeanos.

E com Moçambique há muito distanciamento que se nota perfeitamente.

Esse relacionamento «inter-colonial» era muito interessante, mas só essa gente tropical é que a poderia explicar melhor, mas não explicam.

Uns morreram ou "matarm-se", e a maioria foi inibida de poder falar.

Cumprimentos