terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Guiné 61/74 - P16913: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (52): à semelhança da França (em relação aos seus "tirailleurs sénégalais"), quando é que Portugal reconhece aos seus antigos soldados guineenses a nacionalidade portuguesa?


Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) > Imagem da progressão de um força da CCAÇ 12 (três mais grupos de combate, 1º, 2º e 3º), no subsetor do Xitole, na época das chuvas. As praças da CCAÇ 12 em meados de 1969 (uma centena) eram do recrutamento local. Só os graduados e especialistas (cerca de meia centena) é que eram de origem metropolitana (, pertencentes à CCAÇ 2590). A recruta, o juramento de bandeira, a instrução de especialidade e a IAO  (instrução de aperfeiçoamento operacional) foi foram feitos no Centro de Instrução Militar de Contuboel. Todos temos uma dívida de gratidão para com estes homens. alguns dos quais eram ainda adolescentes, com 16 anos...Portugal tem uma dívida de gratidão e reconhecimento a estes guineenses, 80 % dos quais já não estarão vivos. 
Esta é uma das muitas imagens de diapositivos digitalizados, do valioso e magnífico álbum fotográfico do ex-fur mil at inf Arlindo Roda, da CCAÇ 12 (1969/71), posto generosa e solidariamente à nossa disposição. Natural de Leiria, o Roda é professor do ensino secundário, reformado, é uma apaixonado jogador de damas e de xadrez, e vive em Setúbal.

Foto: © Arlindo Roda (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


1. Comentário ao poste P16908 (*), assinado por Cherno Baldé:

[ Foto à esquerda, Cherno Baldé,com a sua mãe em Cambaju, em maio de 1977; é  o nosso "agente" em Bissau (na realidade, este "menino" de Fajonquito, hoje homem grande, pai de 4 filhos, crente, bom muçulmano, casado com um bonita nalu, quadro superior com formação universitária na ex-URSS e em Portugal, representa todos os nossos amigos guineenses que não têm forma de comunicar connosco, e que mantêm, com os portugueses, antigos combatentes, fortes laços afetivos, baseados numa experiência e num respeito comuns); é além disso, o nosso assessor para as questões étnico-linguísticas e religiosas da Guiné-Bissau; é autor da série "Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé)"](**)

Caro amigo Carlos Vinhal,

Bem vistas as coisas, nada impede que antigos adversários, "inimigos", sejam depois amigos se as condições reais que tinham motivado a guerra mudarem.

Devo dizer que, ainda criança, assisti, atónito, à recepção que os metropolitanos reservaram aos guerrilheiros do PAIGC em 1974, na minha aldeia. Notem bem, eu disse "os metropolitanos", porque o caso dos soldados nativos era diferente, porque estes sabiam, de certeza, que aqueles, lobos com pele de ovelha,  não poderiam ser, em caso algum, seus amigos após uma guerra de mais de 12 anos em condições de ódio e de violência extrema. E, ao contrário dos metropolitanos, este era o seu país que, tudo indicava, não pretendiam deixar, ignorando as consequências que daí poderiam advir.

Um soldado é um soldado, um pequeno pião num complexo jogo de interesses e, na minha opinião, não é a este nível que interessa analisar a questão da guerra na Guiné e as suas consequências, pois as falhas na resolução final aconteceram ao nível superior das forças armadas portuguesas ou do que restava delas, militares de carreira que tinham frequentado academias e colégios militares para saber interpretar em todos os momentos a situação real do conflito, as possibilidades e impossibilidades a ter em conta e preparar o terreno para o avanço ou o recuo, conforme os casos.

Hoje só temos que constatar que houve um falhanço de repercussões negativas de extrema gravidade, com consequências no presente e futuro dos nossos países. Para mim é isto que é importante e quem não o percebeu, então ainda não percebeu nada.

Na semana passada a França reconheceu, finalmente, aos antigos combatentes africanos [, cuja origem remonta a 1857],  chamados “tirailleurs sénégalais”  [, atiradores senegaleses,] o direito a cidadania francesa. É tarde?!! Sim, mas como se costuma dizer, sempre vale mais tarde que nunca

E Portugal, para quando o reconhecimento dos seus antigos combatentes da guerra colonial no seu ex-império em África, muitos dos quais se encontram em território português???

Um abraço amigo,
Cherno Baldé
_______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 2 de janeiro de 2017 > Guiné 61/74 - P16908: (In)citações (104): Inimigos de ontem, amigos de hoje? (Carlos Vinhal, ex-Fur Mil da CART 2732)

(**) Último poste da série > 20 de julho de 2016 > Guiné 63/74 - P16321: é que Os portugueses tiveram tendência para menosprezar o PAIGC, antes e depois da guerra... Recordando uma cilada dos "homens do mato" aos homens grandes de Sancorlã/Cambaju, ao tempo da CCAÇ 412, Bafatá, 1963/65

3 comentários:

Antº Rosinha disse...

Neste momento há mais militares e dirigentes do PAIGC, e seus descendentes com nacionalidade portuguesa do que antigos comandos que acreditaram que nunca os abandonaríamos, a eles e ao povo.

Esta afirmação minha, sem elementos, só "a olho" é extensível principalmente a Angola.

Os portugueses abrilistas, é que decidiram qual o "tratamento" a dar aos "colonialistas", pretos e brancos, e como tudo correu muitíssimo mal em toda a África e hoje também na Europa, deita-se a culpa aqueles "ventos da história".

De todos os crimes coloniais em África, escravatura para as américas, conferência de Brelim, 1880 a dividir as riquezas africanas, as independências de 1950/60, foi este último acto, o mais cínico e criminoso e o mais apoiado internacionalmente.

Só nós "TUGAS" e comandos africanos, e imensos soldados africanos e mestiços, é que denunciávamos este cinismo.

Mas éramos poucos contra a ONU!!!! em Nova York.

Costa Abreu disse...

Posso fazer uma pergunta?
Sera que alguem me saiba, ou queira responder?
1. Temos presentemente um Presidente da ONU que e Portugues.
2. Temos presentemente um Presidente de Republica que e muito popular e grande amigo de Mocambique onde viveu.
Nos os antigos combatentes das colonias (Provincias) Portuguesas cada vez somos menos.
Os NOSSOS militares africanos cada vez sao menos.
Os Franceses ja nos deram uma bufetada na cara dando a Nacionalidade Francesa aos militares das colonias deles. Nao sera altura de haver alguem com TOMATES para fazer o mesmo em Portugal?
Como diz o Rosinha (mais militares e dirigentes do PAIGC, e seus descendentes com nacionalidade portuguesa do que antigos comandos que acreditaram que nunca os abandonaríamos)
Nao sera este o momento para se fazer JUSTICA aos ex-combatentes das ex-colonias Portuguesas?
Julio Abreu
Grupo de Comandos Centurioes
Ex-Guine Portuguesa

Anónimo disse...

Caro amigo Cherno

É claro que aqueles que combateram incorporados nas Forças Armadas de Portugal têm o direito à cidadania de Portugal, desde que o queiram. Portugal ao sonegar esse direito aos que combateram por uma Guiné lusitana está a ser ingrato e traiçoeiro.

Um abraço

Carvalho de Mampatá.