quinta-feira, 9 de maio de 2019

Guiné 61/74 - P19766: (De)Caras (129): O reencontro de dois velhos amigos, na ilha de São Miguel: Arsénio Puim, ex-capelão militar, açoriano, e Lino Bicari, ex-padre missionário, italiano...


Região Autónoma dos Açores > Ilha de São Miguel > O reencontro de dois amigos da Guiné: o ex-missionário italiano (e ex-guerrilheiro do PAIGC) Lino Bicari (, casado com uma portuguesa, vivendo hoje no Alentejo) e o Arsénio Puim, ex-alf mil capelão, CCS/BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), expulso depois do TO da Guiné, em maio de 1971, e hoje enfermeiro reformado.

Foto (e legenda): © Arsénio Puim  (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Arsénio Puim, Bambadinca, c. 1970/71
Foto: © Gualberto Magno  Passos Marques (2009).
 Todos os direitos reservados.
1. Mensagem, datada de 6 do corrente, do nosso camarada Arsénio Puim:

[ açoriano, da Ilha de São Jorge, ex-alf mil capelão; foi expulso do seu Batalhão, o BART 2917, e do CTIG em maio de 1971, apenas com um ano de comissão; no final da década de 1970 deixou o sacerdócio, formou-se em enfermagem, casou-se, teve 2 filhos; vive na Ilha de São Miguel; está reformado; é membro da nossa Tabanca Grande; tem cerca de 40 referências no nosso blogue; é autor da série "Memórias de um  alferes capelão", de que se publicaram doze postes]


Caro Luís Graça

Envio em anexo um pequeno texto relativo a uma fotografia de dois amigos da Guiné (dos quais conheces um) que mando noutro email, para publicação no Blogue, se assim o entenderdes.

Um abraço amigo, Arsénio Puim


2. O reencontro de uma amizade originada na Guiné 

por Arsénio Puim

Na semana passada tive o prazer de receber, nesta bela ilha açoriana de São Miguel, o meu grande amigo Lino Bicari e sua esposa, que residem hoje no Alentejo. (*)

Conhecemo-nos na Guiné em 1970 – era eu capelão militar em Bambadinca e ele era padre missionário em Bafatá – numa altura em que o capelão chefe, pe. Gamboa [, Pedro Maria da Costa de Sousa Melo de Gamboa Bandeira de Melo, ] promoveu um encontro durante dois dias dos capelães da Zona Leste – Bafatá, Bambadinca, Galomaro, Nova Lamego e Piche – precisamente na Casa dos Padres Missionários Italianos de Bafatá.

Mais tarde voltei duas ou três vezes à Casa dos simpáticos missionários italianos, aproveitando sempre esta estadia para um reconfortante convívio sacerdotal e um renovar de forças no exercício da minha missão de capelão.

Desde então, há 48 anos, nunca mais nos tínhamos visto e comunicámos apenas em duas ocasiões, por email.

Na sua simplicidade, Lino Bicari é sem dúvida um homem de altos ideais humanos e dum currículo muito rico, corajoso e autêntico. Desenvolveu uma acção profunda e muito válida ao serviço do povo da Guiné (e não só) concretamente na área do ensino e educação e da saúde, quer enquanto missionário quer, depois, sob a vigência do Partido e do Governo do PAIGC. 

Uma história de vida rara!

Mando uma fotografia do reencontro destes dois «jovens», ambos com 83 anos de idade, que, se assim o entenderem, poderão publicar no Blogue. (**)

Arsénio Puim
 _____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 19 de outubro de 2018 > Guiné 61/74 - P19116: Notas de leitura (1111): Salvatore Cammilleri, missionário siciliano do PIME, expulso da Guiné em 1973 por ordem de Spínola, autor de "A identidade cultural dos balantas" (Lisboa, 2010, tr. do italiano: Lino Bicari e Maria Fernanda Dâmaso) - Parte I (Luís Graça)

(...) Lino Bicari é um ex-padre, italiano, missionário do PIME que no início dos anos 70 descobriu outra vocação, levado pelo romantismo revolucionário de Che Guevara e Camilo Torres (também ele ex-padre). Nascido em 1936, aos 23 anos, Lino Bicaria aderiu à guerrilha do PAIGC e é o único estrangeiro que tem o estatuto de combatente da liberdade da Pátria. Viveu 23 anos na Guiné-Bissau. Radicou-se em Lisboa em 1990. Dele disse o jornalista João Paulo Guerra, no jornal Público, de 24 de setembro de 1990:

(...) Não é um homem desiludido, mas um homem amargo quer hoje, à margem da Igreja e do Estado da Guiné-Bissau, continua, no entanto, a afirmar-se religioso e militante do PAIGC." (...)

 Fui saber mais, socorrendo-se da entrevista com ele, feita pelo João Paulo Guerra ("Crónica dos feitos da Guiné: A última missão do padre Lino").

(...) "O padre Lino Bicari chegou à Guiné em Maio de 1967. Tinha 31 anos, um curso teológico e formação em medicina tropical, em psicopedagogia e didáctica e etnologia. De passagem por Lisboa, meteu na bagagem curso rápidos de língua portuguesa e administração colonial e, como todos os missionários destinados às colónias portuguesas, assinou compromissos renunciando aos seus direitos como cidadão italiano e submetendo-se às leis e tribunais portugueses, à Concordata, ao Acordo e ao Estatuto missionários.

Na Guiné vivia-se o quarto ano de guerra e Lino Bicari foi colocado em Bafatá, a cidade natal de Amílcar Cabral. A guerra, para ele como para os outros missionários, significava ouvir tiros Ao longe e viver num centro populacional sob controlo militar, de onde só podia ausentar-se à luz do dia.

(..) Foi em Itália, onde se deslocou em 1972 no âmbito de um programa de apoio ao Terceiro Mundo, que o padre Lino Bicari conheceu José Turpin, dirigente do PAIGC e, por seu intermédio, trocou correspondência com Amílcar Cabral. Quando tomou a decisão da sua vida, resolvendo trabalhar com o PAIGC, a Secretaria de Estado do Vaticano sentiu-se embaraçada. Não disse que sim, nem que não, e acabou por consentir, pedindo-lhe apenas que, formalmente, se desligasse do [Pontifício] Instituto para as Missões Estrangeiras [PIME]

(...) "No final de 1973, proclamado já o Estado da Guiné-Bissau [, em 24 de setembro de 1973,], Lino Bicari entrou de novo no território. Mas, dessa vez, não levava o visto de Lisboa nem as guias de marcha do colonialismo missionário. Entrou através da fronteira com a Guiné-Conakry, numa ambulância da Cruz Vermelha e foi instalado pelo PAIGC na região de Boé, a sul de Madina, como responsável pelo Hospital Regional. 'Não era uma base de guerrilha mas uma zona totalmente libertada, defendida por forças armadas locais e, dada a sua configuração geográfica, de difícil acesso às tropas portuguesas', recorda Bicari." (...).

(**) Último poste da série > 17 de abril de  2019 > Guiné 61/74 - P19687: (De)Caras (104): Capitão de Infantaria Francisco Meireles, cmdt da CCAÇ 508, morto em Ponta Varela, Xime, em 3/6/1965 - V ( e última) Parte (Jorge Araújo)

5 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O capelão-chefe major Gamboa, que vivia no "Vaticano", em Bissau, na altura em que o Puim fui expulso do CTIG, nasceu no Fundão, Castelo Novo, em 21 de agosto de 1919... Irá fazer 100 anos, se ainda for vivo.

https://geneall.net/pt/nome/463246/pedro-maria-da-costa-de-sousa-de-macedo-gamboa-bandeira-de-melo/

Será que ele deixou memórias (escritas) do tempo em que esteve na Guiné ?

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Ver aqui a blibliografia de Lino Bicari em Português:


http://memoria-africa.ua.pt/Catalog.aspx?q=AU%20bicari,%20lino

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Lino Bicari e Maria Fernanda Dâmaso estiveram (ou ainda estão) ligadas a projetos de desenvolvimento do ensino bilingue (crioulo e português) na Guiné-Bissau, e em especial na ONG FASPEDI - Fundação para o Apoio ao Desenvolvimento dos Povos do Arquipélago de Bijagós, com sede em Bubaque, criada entre outros pelo padre italiano Luigi Scantamburlo.

http://www.faspebi.com/

Luigi Scantamburlo é Doutor em Linguística, especialidade de Lexicologia, Lexicografia e Terminologia (Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas / Universidade NOVA de Lisboa), Ver aqui a sua tese dissertação de doutoramento:

"O Léxico do crioulo guineense e as suas relações com o português: ensino bilingue português-crioulo guineense"

https://run.unl.pt/handle/10362/10960

Tabanca Grande Luís Graça disse...


Ver também aqui a proposta de grafia para o crioulo guineense,do linguista e antropólogo Luigi Scantamburlo:

https://www.academia.edu/9996467/PROPOSTA_DE_GRAFIA_PARA_O_CRIOULO-GUINEENSE

Unknown disse...

Bom dia….Dr Arsénio Chaves Puim ,já não tenho contacto com ele perto de 50 anos , era uma miúda ,mas nós crianças nessa altura tínhamos uma admiração por ele ,era uma pessoa com um carinho e simplicidade para connosco inexplicável.
Estou com minha família nos EUA há 42 anos ,morávamos na Carreira de Cima ,Santa Bárbara.
Os meus cumprimentos e um grande abraço.
Laura Câmara ( Mendonça)

lauramendonca63@hotmail.com
Se quiser entrar em contato comigo.
Abraço a toda a sua família.