sexta-feira, 10 de maio de 2019

Guiné 61/74 - P19770: Os nossos seres, saberes e lazeres (323): Excertos do "meu diário secreto, ainda inédito, escrito na China, entre 1977 e 1983" (António Graça de Abreu) - Parte V: Ppequim, 1 de setembro de 1980: visita de uma delegação militar portuguesa


1. Mais um excerto do diário (inédito) do nosso camarada António [José] Graça de Abreu, de quando viveu na China: recorde-se que ele foi professor de Português em Pequim (Beijing) e tradutor nas Edições de Pequim em Línguas Estrangeiras. Viveu em Pequim e Xangai entre 1977 e 1983. Ex-alf mil SGE, CAOP 1 (Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74), é membro sénior da nossa Tabanca Grande, e ativo colaborador do nosso blogue com mais de 230 referências. Vive em Cascais. É um cidadão do mundo, poeta, escritor e reputado sinólogo. Nasceu no Porto em 1947.] (*)



Pequim, 1 de Setembro de 1980

Esteve cá uma delegação de militares portugueses, composta por oito representantes dos três ramos das forças armadas. Visitaram a China, com idas a Qingdao, Xangai, Chengdu, Kunming e Macau. 


Tiveram a sorte de conhecer uns tantos aquartelamentos modelo, a convite do Exército Popular chinês. Foi uma oportunidade rara de entrarem um pouco por dentro da complexa e tão mal conhecida máquina militar chinesa. Entre os nossos, vieram o brigadeiro Rui Espadinha, director da Oficina de Material Aeronáutico de Alverca, o coronel Mingot de Almeida, director do departamento de Indústria de Defesa Militar do Estado Maior do Exército e um tenente-coronel da Fábrica Militar de Braço de Prata. Trouxeram alguns dossiers e catálogos sobre eventual venda de armamento e tecnologia militar made in Portugal. 

Tenho sérias dúvidas de que se consiga vender uma só munição aos chineses que estão entre os maiores fabricantes de armas do mundo. Este convite terá talvez mais a ver com a intenção chinesa de conhecer o que se faz em Portugal e de serem eles a vender-nos armas, e não a comprar.

Fui ao Hotel Pequim almoçar com os nossos militares. Conversa entusiasmante e inteligente, até meteu as Guerras do Ultramar, em que todos participámos, eu como alferes na Guiné- Bissau, 1972/74.

Fiquei sentado ao lado do general Conceição e Silva, da Força Aérea, director do Instituto de Defesa Nacional e chefe da delegação. Cirandando em volta da nossa mesa redonda, com nove lugares, as empregadas desdobravam-se em cuidados para nos servir. Traziam travessas de comida fragrante e colorida, rodopiavam, enchiam delicadamente os copos. 

Pedi uma garrafa de Maotai, a aguardente de sorgo mais famosa da China que do alto dos seus 52 graus de álcool inebria e faz flutuar qualquer simples mortal. Alguns dos militares lusitanos deglutiam em pequenos sorvos o Maotai e bebiam com os olhos as moçoilas chinesas, meio entrapadas numas rígidas fardetas brancas. 

Disse ao general Conceição e Silva. “Ah, estas mulheres são lindas! Bem vestidinhas, eram uma maravilha!” O general que não estava interessado em roupas e adereços, respondeu de imediato: “Bem vestidinhas?... Bem despidinhas, meu caro amigo!...”

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Nota do editor:

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