quinta-feira, 29 de agosto de 2019

Guiné 61/74 - P20106: Bombolom XXIII (Paulo Salgado): Primeira Guerra e Guerra Colonial

1. Mensagem do nosso camarada Paulo Salgado (ex-Alf Mil Op Esp da CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72), autor do livro "Milando ou Andanças por África", com data de 22 de Agosto de 2019:

Meus Camaradas do Blogue,
No meu livro Milando ou Andanças por África, tive oportunidade de falar de um combatente da Primeira Grande Guerra – homem que conheci nos meus tempos de pré-adolescência e que me encheu a alma de histórias fantásticas, decerto verdadeiras, ainda que narradas após mais de cinquenta anos…

Aí vai um pedaço da narrativa do velho Ti Brasas (nome fictício do combatente, pedreiro era…):

Paulo Salgado


O Bombolom IV - Primeira Guerra e Guerra Colonial
 

De MILANDO OU ANDANÇAS POR ÁFRICA

Da Quarta Andança – O Pedreiro

Sentados no muro da propriedade, chamada Pombal, ancião e jovem em amena cavaqueira, um revivendo o passado, emocionado, outro, embebecido com a narrativa.

- Conte lá, Ti Brasas, como foi a viagem e a chegada a Moçambique para combater no norte contra os alemães durante a Primeira Grande Guerra – pediu Pedro.

E o bom velho recordou, indo buscar lá bem atrás as lembranças:
- O barco Moçambique ia atafulhado de militares, nos porões fedorentos, nos deques sebentos, ao relento, espalhados por todos os lados, dormindo mal, comendo mal, deitando o que o corpo não quer ao mar, uma imundície e uma sujeira espalhada pelo navio, obedecendo a graduados de fortes bigodes, imponentes nas suas fardas, estou a vê-los, Pedro, descansando no último convés, à sombra de guarda-sóis, perto da ponte de comando, e a dar ordens a uma confusão de mais de mil homens. Quando passámos o equador, eu pensava que era uma linha traçada a negro, e era, pois negros eram os dias de caloraça e de humidade, sem condições para nos banharmos, e as necessidades era de rabo para o mar e com água do mar lavávamos as nalgas, sem fruta, sem comida que se visse, só desespero, só pequenas lutas nos porões e nos conveses por um lugar melhor para pernoita. Como me lembrava dos melões da Vilariça, das laranjas do Pocinho, das uvas códegas do Larinho, de um cadorno de pão com linguiça, de um ou dois ou três copos de tinto, ali só um caldo deslavado e batatas cozidas com pele e migadas por um azeite mal rançoso!

Onde é que vimos alho semelhante? Ah, no velho Carvalho Araújo, de 1970… transportador de carne para canhão, como o Moçambique de 1914…

"Carvalho Araújo" - Com a devida vénia a Navios Mercantes Portugueses
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Nota do editor

Último poste da série de 14 de julho de 2018 > Guiné 61/74 - P18845: Bombolom III (Paulo Salgado) (3): O desembarque das tropas em Cabo Delgado (1915) e no Pidgiguiti (1970)

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