Pedras Negras de Pungo Andongo
1. Em mensagem do dia 3 de Junho de 2020, o nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, Fá, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), enviou-nos esta Boa memória da sua paz, mais uma a relembrar os seus bons tempos vividos em Angola
BOAS MEMÓRIAS DA MINHA PAZ - 13
PEQUENOS CAPRICHOS II
Concurso Provincial de Angola
Ainda saboreávamos a aventura do concurso de pesca de Santo António do Zaire, e já se falava na representação Cabindense a participar no Concurso Provincial, a realizar junto à Praia da Caotinha, entre Lobito e Benguela. E, modéstia à parte, apostava-se muito numa participação honrosa. Éramos 3: os irmãos Neves (Campeões de Badmington) e eu.
Fomos apetrechados do melhor que havia. Boas canas (e fortes), fio especial e chumbeiras de modelos estudados/alterados, fundidas nas Oficinas Gerais. E mandei fazer uma mala, tipo caixão, de madeira pau-santo, cheia com um bloco de esferovite, com espaço vazio adaptado para o encaixe da cana e seus apetrechos. Ah! E estreámos umas camisas alusivas ao povo Fiote de Cabinda.
Quando o motorista do Mercedes Presidencial nos levou ao aeroporto, teve o cuidado de me transmitir que o Senhor Presidente mandou dizer que todos os dias enviasse informações, via telex.
No aeroporto fomos elucidados de que o pesadíssimo caixão não era necessário e que nos garantiam os necessários cuidados com o manuseamento de todo o material desportivo.
De Luanda para sul, seguimos em autocarro especial, com grande número de participantes, fiscais e dirigentes. Lembro-me bem de ter visto aquelas enormes fazendas, bem trabalhadas e visíveis ao longo da estrada.
Também me lembro que seguimos um percurso por forma a visitarmos alguns pontos de maior interesse. É pena que a minha memória, hoje, não possa especificar melhor esses importantes locais. Uma coisa fixei bem: as Pedras Negras do Pungo Andongo. Belas, gigantes e misteriosas, elas são património paisagístico invulgar.
Pedras Negras de Pungo Andongo
Por aqui, na região de Pungo Andongo, é bem marcante a imagem da Rainha Ginga, a quem atribuem (erradamente) as suas pegadas nas rochas. Reinou com forte oposição aos portugueses, entre 1620 e 1680 (data da sua morte)
Uma imagem da Gabela
A Restinga do Lobito é deslumbrante
Voltei ao sul de Angola e aqui, em Benguela, cheguei a assistir a um filme neste anfiteatro ao ar livre
Nunca tinha assistido a um frenesim igual. Corria-se de um lado para o outro, numa excitação invulgar. Parecia que algo de transcendental estava para acontecer. Fomos assistir (de longe) ao sorteio, na reunião de delegados. Alguém pôs a questão de que não havia isco nem peixe para fazer engodos. Tanto no Lobito como em Benguela, haviam “esgotado/açambarcado/boicotado” todo o pescado. Alguém, do Lobito, teve pena de nós e deu-nos 2 sardinhas para os três pescadores.
Foi neste local que organizaram o concurso, talvez escolhido pela sua singela beleza e não pelas desejadas condições para a pescaria.
Quando chegámos ao local, nem queríamos acreditar. Tudo nos surpreendeu e tudo nos correu mal.
Íamos a pensar em pescar peixes grandes e ao fundo, mas logo notámos ser impossível. Via os concorrentes a pescar peixinhos pequeninos na margem e não acreditava. Pensei que com os meus lançamentos para longe, iria naturalmente apanhar algum peixe de jeito. Enganei-me redondamente. As águas eram baixas e cheias de rochas, onde sempre se prendiam as chumbeiras.
Quem assistia, até ria do nosso esforço.
Lá foram as chumbeiras e as sardinhas. Desistimos e fomos assistir à luta dos outros.
Precisamente no pesqueiro ao meu lado direito, reinava o vencedor. Comodamente sentado, trabalhava com uma cana comprida, com fio 0,16 e um pequeno anzol. Nem utilizava o carreto. Levantava a cana e um dos seus TRÊS colaboradores metia o berbigão no anzol. O pescador deixava-o cair entre o cardume em luta, devido ao constante bombardeio de engodo, lançado por outro colaborador. O peixe era recolhido pelo mesmo que metia o isco. O outro colaborador fazia a ligação com o pequeno camião, carregado de material. Havia mais 6 colaboradores que trabalhavam com os outros dois pescadores da mesma equipa. Em pequenos intervalos, um deles, preparava pormenorizadamente outra cana, para possível troca imediata.
Fomos assistindo, conversando e sempre em tons amistosos. Por volta das 11h15, o pescador, oriundo da região de Aveiro, resolveu entrar numa de camaradagem e ofereceu isco igual para eu poder também pescar. Lá me adaptei o melhor que pude, até porque seria difícil pescar sem lançamento e sem chumbo, porque o meu fio era 0,55 e não corria. Bem, o certo é que ajustei de tal forma o meu esquema que passou a dar bons resultados. Quando soou o apito final ao meio dia, eu tinha tirado 62 peixes. O vencedor, meu vizinho, que ganhou com 221, interpelou-me com um sorriso amarelo:
- Foda-se, se lhe tenho dado o isco mais cedo, você ganhava!
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Nota: - O homem, que demonstrou ser muito competitivo, já era idoso e apoiava-se fortemente nos colaboradores.
Ah! Mas ainda consegui ficar num “honroso” “cagagésimo” 6.º lugar.
José Ferreira
(Silva da Cart 1689)
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Nota do editor
Último poste da série de 6 de junho de 2020 > Guiné 61/74 - P21049: Boas Memórias da Minha Paz (José Ferreira da Silva) (13): Pequenos caprichos - I: Concurso de Pesca na foz do rio Zaire
8 comentários:
Grande pescador, meu amigo Zé Ferreira.
Eu, que até sou 100% ignorante na arte da pesca, consigo perceber , pela minúcia das tuas descrições, que és um verdadeiro um pescador do melhor que há em Portugal.
Um abraço
Carvalho de Mampatá
Como eu não percebo nada de pesca, não vou comentar.
No entanto digo para não dizer nada, um bom pescador é aquele que pesca sem pescar nada, é o chamado dar banho à minhoca, depois passa no "Bulhon" e compra a melhor pescaria. Mesmo em Angola, há sempre um "Bolhão" perto de si!...
Um abraço Zé, e... dedica-te à pesca, tens mais jeito.
cumprim/jteix
O meu comentário é apenas e só para dizer que, tanto a Foz do Zaire, como a Gabela e as Pedras Negras de Pungo Andongo, que tudo isso conheci.
A Bordo do Paquete Quanza, naveguei no Rio Zaire em 1958 e antes de atracar em Luanda.
Na Gabela, porque tinha lá pessoas Amigas e que visitava. Pungo Andongo porque eu Vivia em Camabatela e ia muitas vezes a Malanje e depois lá ia ver aquelas Pedras que tão apreciadas eram.
Quanto a Pesca, gosto e passo muitas horas pescando (nada). Assim em concursos, não entro.
Abraço para todos
Não há qualquer dúvida, de pesca percebes tu !
Então com um fio de o,55 , sem carreto , consegues pescar sessenta e tal peixes e ainda por cima , com isco dado por um concorrente adversário ? Creio que os peixes que pescaste sofriam de miopia aguda ou então , como diz o Carvalho de Mampatá, és de facto o melhor pescador de Portugal.
Eu atrevo-me ainda a ir mais longe, és o melhor pescador do Mundo !
E por isso mesmo , usando dos poderes que me foram conferidos pelo então Governador de Cabinda ,reverto a classificação obtida e atribuo-te o Primeiro Lugar , desclassificando o então vencedor .
E, MAi NADA !
Pode acontecer que afirmar que houve felicidade com muita adrenalina em África, noutros tempos, pode vir a ser escandaloso, da maneira como tudo está ocorrendo hoje.
José Ferreira da Silva, esse anfiteatro não será o Miramar junto ao porto de Luanda?
Abraço
César Dias
Em Benguela era o cine Kalunga, muito semelhante ao Miramar de Luanda.
De facto o da foto é o Miramar em Luanda, vendo-se ao fundo do lado esquerdo do ecrã os guindastes do Porto de Luanda.
O Kalunga foi cópía do Miramar.
Caros amigos Rosinha e César Dias,
Obrigado pela vossa correcção. Efectivamente, também estranhei que a foto conseguida não coincidisse com a leve memória que ainda mantenho. Todavia, pensei que deveria ter havido alguma remodelação, o que seria natural durante estes 48 anos.
Pelo lapso, peço desculpa a todos os camaradas, especialmente àqueles que mais acreditam nas minhas histórias. No entanto, confirmo a ida a esse cinema numa noite (1972) em que dormi no maior hotel daquela cidade, cujo nome também não me lembro. O que mais recordo são as ruas todas com lindas árvores nos passeios, enfeitando essa cidade jardim, exalando perfume e protegendo do sol os seus habitantes.
Grande abraço
José Ferreira
(Silva da Cart 1689)
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