sábado, 9 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - P21752: (In)citações (175): Saudade (Francisco Baptista, ex-Alf Mil Inf)

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Baptista (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72), autor do livro "Brunhoso, Era o Tempo das Segadas - Na Guiné, o Capim Ardia", com data de 7 de Janeiro de 2021:


Saudade

Francisco Baptista

Ontem, Dia de Reis segundo o calendário católico, foi um dia nefasto, com notícias que nos abalaram um pouco a todos. A primeira foi sobre o alarmante número de infectados em Portugal, com o covid-19 que atingiu o seu máximo, com mais de dez mil pessoas afectadas por essa moléstia.

Já em 2021, ouvi na RTP que numa grande votação online, organizada pela Porto Editora, a saudade foi eleita a palavra do ano de 2020. O locutor da estação de televisão entre o anúncio da votação e o seu resultado fez um intervalo com outras notícias diferentes, desafiando os ouvintes a pensar no resultado. O meu voto foi também para a saudade apesar de ter pensado também no covid 19 e na pandemia, as segundas e terceiras mais votadas. Ao escolhermos por maioria a saudade, essa palavra que é dor, melancolia, memória, nostalgia, distância, tristeza, mas que também é poesia, amor, pátria, amizade, fraternidade, escolhemos a esperança na vida que os portugueses sempre tiveram apesar das maiores adversidades. A Saudade tem múltiplos significados e definições que variam de acordo com a sensibilidade e a experiência de vida de cada um.

Carolina Michaelis, a célebre escritora, filóloga e pedagoga definiu-a assim:
[Saudade é a] lembrança de se haver gozado em tempos passados, que não voltam mais; a pena de não gozar no presente, ou de só gozar na lembrança; e o desejo e a esperança de no futuro tornar ao estado antigo de felicidade.”]

Eu, em viagem de família em Veneza, num encontro ocasional num restaurante com dois portugueses um jovem e uma senhora, dias depois, lembrando a conversa calorosa que tivemos, descrevi desta forma a saudade numa crónica:
"Os portugueses da diáspora que inventaram a palavra saudade evocam-na como quem procura o afecto e o calor da Pátria. Há nela um sentimento doce porque nos faz recordar bons momentos passados com pessoas que estimamos muito. Há nela um sentimento amargo, que nos magoa pela distância que interpõe entre uns e outros, que só se acalma nos reencontros possíveis entre abraços e beijos, nessa proximidade física que os portugueses como povos latinos adoram."

Todos temos a nossa saudade. Uma palavra complexa que sendo amarga ou doce nos ajuda a viver.

A segunda má notícia de ontem, divulgada pelos meios de comunicação de toda a Terra foi a invasão do Capitólio americano por uma horda de milhares de fanáticos, às ordens desse bárbaro e imbecil Donald Trump. Os Estados Unidos da América são uma grande democracia, que se tornou também uma nação imperial, sem perder muitos princípios básicos da democracia que copiou dos ingleses e da Revolução Francesa. Com muitos defeitos como a escravidão, o genocídio de nações indias, a descriminação racial e situações de prepotência e exploração a nível internacional, algumas foi corrijindo, outras sem remédio, continua a ser a maior democracia dos tempos modernos. Que o Império Americano não se auto-destrua como o Império Romano que ele quis imitar e que na sua fase decadente teve imperadores imbecis e idiotas como Calígula e Nero. Não sabemos o que podemos esperar dos impérios Russo ou Chinês, já que eles nunca tiveram raízes democráticas.
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Nota do editor

Último poste da série de 23 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21679: (In)citações (174): Apesar de agnóstico, ainda conservo, na cabeceira, um crucifico-talismã que alguém deixou na tabanca onde eu pernoitava: Ká pudi larga mezinho qui pudi salvar kurpu (Luís Mourato Oliveira, o último comandante do Pel Caç Nat 52, Mato Cão e Missirá, 1973/74)

17 comentários:

Anónimo disse...

Caro Amigo Francisco Baptista

Em tempos de despedidas, e a propósito da palavra *Saudade* pergunto-me (pergunto-te):

-Como se poderá regressar de onde nunca se chegou
para o que já não existe?

Um abraço do J.Belo

Manuel Luís Lomba disse...

Salvé, Francisco Baptista

Otelo Saraiva de Carvalho esperou 46 anos, pelo cerco e assalto ao Capitólio americano, para eu lhe perdoar o cerco e assalto à Assembleia Constituinte, em Lisboa. Por alturas do S. Martinho de 1975, Otelo e os seus conúbios do PC e do futuro BE cercaram e assaltaram essa Assembleia, com o propósito de impedir a institucionalização da Democracia; por altura do dia de Reis de 2021, Trump incitou os seus conúbios a cercar e assaltar o Capitólio, com o propósito de impedir a certificação da eleição do novo presidente do seu país.

O cerco e assalto à Assembleia Constituinte durou 2 dias e não custou vitimas mortais; o cerco e assalto ao Capitólio demorou 3 dias e custou 5 vítimas mortais.

O "Grupo dos Nove" demorou duas semanas a remover Otelo, o seu custo foi de 3 vítimas mortais (manobra no R. da PM). Quanto tempo demorará o Congresso a remover Trump? Quantas vidas custará a sua remoção?

Vivemos tempos extraordinários.

Abraço para ti, extensivo a todos os camarigos.

Valdemar Silva disse...

Luís Lomba
O que foi isso do'...cerco e assalto à Assembleia Constituinte, em Lisboa......Otelo e os..do PC e futuro BE cercaram e assaltaram essa Assembleia...'
ASSALTARAM????? de assaltar para roubar?
Ou para como muitos de nós bem vivos em Novembro de 1975 quer dizer «incomodar»?
O raio das palavras são lixadas e nunca sabemos a ideia como são utilizadas porque dão para a célebre 'não foi essa a intenção'.
Pois naquele dia a rapaziada da construção civil cercou a Assembleia, cercou para ninguém sair, não houve nenhum assalto e até ofereceram frangos assados aos Constituintes.
No fim o Almirante 'é tudo fumaça' disse : porra, embirro estar sequestrado.

Caro Francisco Baptista desculpa meter este comentário, que como bem saberás nada teve de parecido com aquele assalto de grunhos ao Capitólio dos USA e muito menos com as saudades de tempos do dá cá um abraço.

Ssúde da boa
Valdemar Queiroz

Anónimo disse...

Aos interessados pela pequena história para amadores,sugerem-se melhores fontes de consulta quanto às responsabilidades do cerco à Assembleia.
Para Otelo de Carvalho já era “tarde” e... muito lhe passava “ao lado”.
Demasiado.
Testemunhas ainda existem em abundância e,passíveis de proporcionar interessantes conversas.
Interessantes e factuais.
Os muitos erros políticos criados pelas escolhas de um “mítico”Otelo de Carvalho,analisados desde uma perspectiva de esquerda,acabam por o responsabilizar ainda mais do que algumas leituras apressadas vindas de outros quadrantes.
Mas,a ser-me permitido,prefiro o cheiro do esterco fresco das minhas renas aos estercos políticos requentados.

O tema “Saudade” apresentado por Francisco Baptista não aparenta referir-se à “saudade-política-nacional “.
De qualquer modo ,a minha gratidão a Manuel Lomba por me recordar que mais vale a saudade do que.....o resto.

J.Belo

Tabanca Grande Luís Graça disse...

saudade | s. f. | s. f. pl.

sau·da·de |au| ou |a-u|
(latim solitas, -atis, solidão)
nome feminino

1. Lembrança grata de pessoa ausente, de um momento passado, ou de alguma coisa de que alguém se vê privado.

2. Pesar, mágoa que essa privação causa.

3. [Botânica] Planta (Scabiosa atropurpurea) da família das dipsacáceas. (Mais usado no plural.) = ESCABIOSA, SUSPIRO

4. [Botânica] Nome de várias espécies de plantas com flores de cores variadas. (Mais usado no plural.)

5. [Botânica] Flor de uma dessas plantas. (Mais usado no plural.)


saudades
nome feminino plural
6. Boas lembranças ou recordações (ex.: a antiga chefe não deixou saudades).

7. Cumprimentos a alguém (ex.: mande-lhe saudades minhas).


"saudade", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2020, https://dicionario.priberam.org/saudade [consultado em 10-01-2021].

Anónimo disse...

Poucos saberão que o dia 30 de Janeiro é o Dia Internacional da Saudade.

O tal décimo primeiro mandamento que diz ...“Não deverás citar Fernando Pessoa em vão”....é difícil de cumprir;
principalmente quando ele escreve “A minha Pátria é a língua portuguesa “.

Haverá melhor definição do Cais de Alcântara no tempo das guerras de África que: “Ah,todo o cais é uma saudade de pedra!”

Em tempo de despedidas um saudoso abraço aos Amigos.

J.Belo

“Não há saudades mais dolorosas
Do que das coisas que nunca foram “

Carlos Vinhal disse...

Caro José Belo, na Doca 2 Dul do Porto de Leixões fizeram uma barreira para impedir as poeiras de assaltarem a cidade. Lá está no cimo da barreira este verso do Fernando Pessoa: "Ah, todo o cais é uma saudade de pedra!".
A propósito do teu oportuno comentário.
Abraço
Carlos Vinhal
Leça da Palmeira

Anónimo disse...

José Belo, meu amigo de longe:

"Como se poderá regressar de onde nunca se chegou
para o que já não existe?"
Melancolia e nostalgia criam estados de espírito difusos de sonolência e sonho, que nos levam a viajar por lugares onde nunca vivemos e aonde nunca voltaremos. Tu que estás sempre em viagem pela Terra inteira mesmo quando recolhido na tua moradia em Key West ou na tua isba na Lapónia Sueca sabes melhor do que eu o significado da frase que escreveste. Tu que estás longe da tua Pátria e que os anos de vida já exigem de ti, o melhor. o essencial, tu sabes bem o significado da palavra saudade e sabes conjugá-la bem nos seus sinónimos mesmo sem a ajuda de Fernando Pessoa. Passa bem, tenho saudades tuas, sem te ter conhecido. Que os poetas te ajudem e te protejam. Um grande abraço.
Francisco Baptista

Anónimo disse...



Amigo Luís Lomba:
Gostei de te rever mas não gostei do que escreveste porque acho que o assalto ao Capitólio e o cerco à Assembleia Constituinte não podem ser comparáveis. O assalto ao Capitólio nos EUA , uma grande nação e potência mundial, orgulhosa de ser uma democracia institucionalizada desde a sua formação e um exemplo para todos os povos da terra, além do significado mundial, deixa-nos também perplexos pelos perigos em, que um Presidente louco pode lançar sobre a Terra inteira. O cerco à Assembleia Constituinte, de um pequeno país, com poucos anos de democracia , no rescaldo de uma revolução, tem que se condenar mas tolera-se. Sobre o assunto da politica nacional , que não é do agrado do Luís Graça nem do Carlos Vinhal, que se discuta, com razão, o José Belo e o Valdemar Silva já te deram respostas melhores do que eu te poderia ter dado. Alcaide de Faria, aparece sempre, mesmo não concordando contigo aprecio muito os teus conhecimentos e a forma como os expões. A propósito há já alguns anos fui eu e a minha mulher a uma festa no Carnaval, levados por um casal amigo, a uma casa solarenga, em Faria. Os donos eram muito simpáticos e hospitaleiros. Provavelmente também lá estavas.
Um grande abraço a todos

Carlos Vinhal disse...

E o comentário anterior é de...?
Carlos Vinhal

Anónimo disse...


Francisco Baptista

Muito obrigado Carlos, e muito obrigado pela edição do meu texto, que já devia ter agradecido.
Um grande abraço.

Anónimo disse...


Francisco Baptista

Muito obrigado Carlos, e muito obrigado pela edição do meu texto, que já devia ter agradecido.
Um grande abraço.

Manuel Luís Lomba disse...

Camaradas e comentaristas:

Muito aprecio os vossos comentários e a sua vivacidade.

É a memória que faz a História e não a história que faz a memória.

Admito a desproporcionalidade dos acontecimentos na Assembleia Constituinte e no Capitólio, a relativização da responsabilidade de Otelo e de Trump, mas reitero a minha convicção: ambos atentaram contra a Democracia - por dolo e ou incompetência, como expoentes máximos das Forças de Segurança nacionais.

As manifestações e os seus cercos são democracia; assaltos e a depredação são vandalismo ou sublevação.

Chamo à colação desta afirmação uma gratificante memória.

Há anos, uma minha viagem para Lisboa coincidiu com um denso tráfego, sobretudo de autocarros, carreando professores,o Ministério da Educação foi ponto de reunião e de manifestação de cerca reunira-se 200 mil e depois desfilaram em Lisboa.

Moral desta história: não houve um desacato, um vidro partido, nem sequer um risco num automóvel!

Nessa madrugada, eu também estive lá, misturado com a malta do cerco à Assembleia, consegui uma cópia fresquinha do "documento" assinado pelo Almirante Pinheiro de Azevedo - e a seguir ele e o Governo entraram em greve!

E no relativo aos frangos assados, eis o meu testemunho: o seu destino era exclusivo a alguns - uns poucos comeram tudo, a maioria não comeu nada...

Abraço e votos do melhor confinamento para todos os camarigos

Valdemar Silva disse...

Caro Luís Lomba, porquê 'camaradas e comentadores'?
Mesmo relativizando, querer arranjar comparações Assembleia Constituinte/Capitólio é comparar simples alhos com abóboras do Entroncamento. Então o camarada Luís Lomba andou a partir vidros, a assaltar e roubar dentro do Palácio de São Bento? Claro que não, por ser uma pessoa séria e estar com a rapaziada da construção civil manifestando-se a favor dum contrato colectivo de trabalho, nunca comparado com aqueles grunhos armados às ordens do trumpnero.
O Otelo (coitado do Otelo pá), atentados contra a democracia e tal. Ó Luís Lomba estávamos no prec, a democracia propriamente dita só foi instituída a partir da Constituinte.
Nunca me esqueci daquela 'é só...fazer as contas', por isso ainda estou a: vamos lá ver, 200.000 pessoas, 2.000 autocarros, ...tudo impecável, pontas de cigarros no chão...é só fazer as contas.
Quanto aos frangos assados, tomara eu os daquele tempo, parece que havias uns esquisitos a preferirem o jejum à comidinha da classe operária.

Abracelos e cuidado com o vírus parte II
Valdemar Queiroz

Anónimo disse...

Amigo Francisco Baptista,
Se me permites..."Todos temos a nossa saudade. Uma palavra complexa que sendo amarga ou doce nos ajuda a viver." Nem mais!
Sobre os acontecimentos em Washington, eu prefiro passar ao lado das circunstâncias políticas que os pdermitiram. Possívelmente mais virá e não será nada bonito.
Os EUA cresceram muito socialmente desde que aqui cheguei em 1973. Tem sido uma subida lenta, degrau a degrau, mas consistente. Infelizmente, um desses degraus partiu-se nos últimos quatro anos, um compasso xde espera. Há que repará-lo. Se eu apfrendi alguma coisa neste grande país americano é que ele nunca olha para trás. Não perde tempo com aquilo qu não tem remédio. O melhor está sempre a seguir.
Abraço transatlêntico.
José Câmara

Anónimo disse...

“Não perder tempo com aquilo que não tem remédio “

Frase muito feliz do Amigo,Camarada e “ vizinho” lá muito ao Norte ,nestes States que,apesar de tudo o “circunstancial” ,continuam a dar oportunidades para quem as queira (ou saiba) tomar.
Frase que bem poderia servir como “picada” a percorrer neste 2021.

Um abraço desde o ponto mais ao Sul dos States

J.Belo

Anónimo disse...

Amigo e Camarada José Belo,
Abrao que retribuo do fundo do coração. Vamos aproveitar a picada que sugeres para continuarmos em frente.
Aproveita da melhor maneira a tua estada nas Key West. Haja saúde!
José Câmara