quinta-feira, 26 de agosto de 2021

Guiné 61/74 - P22488: Fotos à procura de... uma legenda (155): Boinas... há muitas: a propósito das "boinas vermelhas" do grupo de comandos "Diabólicos", Brá, setembro de 1965 (Virgínio Briote / Carlos Vinhal / Fernando de Sousa Ribeiro / Luís Graça)


Guiné > Bissau > Brá > Setembro de 1965 > Grupo Comandos Diabólicos > "Foto de finais de Set 65, tirada em Brá, quando começaram os "ensaios" com as boinas vermelhas... Da esquerda para a direita: Marcelino da Mata, Azevedo, Virgínio Briote , Black e Valente"...



Guiné > Bissau > Brá > Setembro de 1965 > Grupo Comandos Diabólicos, completo, em frente à camarata do Grupo. Ao centro, na 1ª fila, o 6º a contar da esquera, o comandante do grupo, alf mil 'comando' Virgínio Briote. Na ponta direita, de pé, o srgt mil 'comando' Mário Valente. Na 2ª fila, de pé, na extrema direita, o 1º cabo 'comando' Marcelino da Mata.


Fotos (e legendas): © Virgínio Briote (2012). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Comentários à primeira foto de cima (*):

(i) Fernando Ribeiro:

1. No mato ninguém morre em versão John Wayne, porque o John Wayne nunca morria nos filmes. Ele era sempre o "herói" da fita e um "herói" nunca morre.

Quanto à fotografia em que se veem cinco militares, pode ler-se na legenda, a dada altura: «Foto de finais de Set 65, tirada em Brá, quando começaram os "ensaios" com as boinas vermelhas...» 

Aqui permito-me discordar. Boinas vermelhas nos Comandos, já em 1965?! Eu julgava que elas só tivessem sido usadas depois do 25 de Abril... As boinas parecem vermelhas porque a imagem está toda ela avermelhada! Os pigmentos azuis e verdes da fotografia original desapareceram com o passar dos anos, e quase só ficaram os pigmentos vermelhos. 

As boinas deles deviam ser castanhas, como as de toda a gente, e os uniformes deviam ser de caqui, e não amarelos fosforescentes como parecem ser. As cores da imagem não correspondem às cores originais, nem pouco mais ou menos. Estão completamente alteradas. O tempo não perdoa.

25 de agosto de 2021 às 18:13


(ii) Carlos Vinhal:

Quero subscrever as palavras escritas pelo camarada de armas Fernando Ribeiro. As boinas vermelhas dos Comandos começaram a ser utilizadas só em 1974 e as verdes dos Operações Especiais em 1982. O resto é fantasia.

Dá-me a ideia que as boinas da foto foram coloridas à posteriori.

Boina militar em Portugal:

A primeira unidade militar a usar boina em Portugal foram as tropas paraquedistas da Força Aérea em 1955.

O Exército só adotou a boina (para as suas unidades de Caçadores Especiais) em 1960. São ou foram usadas as seguintes boinas:

  • Boina verde escuro (verde caçador-paraquedista) - Tropas Paraquedistas
  • Boina azul - Polícia Aérea;
  • Boina castanha - inicialmente apenas Caçadores Especiais, depois boina genérica do Exército Português;
  • Boina negra - tropas da Arma de Cavalaria (com excepção dos militares qualificados como Paraquedistas ou Comandos), incluindo a Polícia do Exército;
  • Boina vermelho vivo - Comandos a partir de 1974;
  • Boina verde-claro (verde musgo) - Operações Especiais a partir de 1982;
  • Boina azul ferrete - Fuzileiros Navais
  • Boina negra com uma faixa verde - Regimento de Infantaria da Guarda Nacional Republicana
  • Boina verde escuro - Comandos Territoriais de Infantaria da Guarda Nacional Republicana
  • Boina bege - Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro da Guarda Nacional Republicana
  • Boina camuflada (fora de uso) - 3ª Companhia de Comandos (Guiné) e Força de Flechas da PIDE/DGS,
  • Boina amarela (fora de uso) - Grupos Especiais de Moçambique
  • Boina vermelho grená (fora de uso) - Grupos Especiais Paraquedistas de Moçambique
  • Boina branca (fora de uso) - Formações Aéreas Voluntárias

25 de agosto de 2021 às 20:29 

(iii) Gil [Virgínio Briote]:

Caros Camaradas:

Esta foto de Setembro de 1965 foi tirada em Brá. A farda era caqui amarela clara e a boina que usámos, exclusivamente para a foto, era de cor vermelha. Julgo que algum Camarada terá encomendado essas boinas em Lisboa. Tenho a foto original, em papel.

Estávamos no início da formação dos Cmds da Guiné, na que, mais tarde, veio a ser chamada a "fase de grupos". Estes gozavam de grande independência, quase sempre actuaram isolados, com apoio e recolha de Grs Comb das zonas de actuação. Só muito raramente, talvez duas ou três vezes os Grs actuaram em conjunto. Esta filosofia veio a alterar-se com a chegada das CCmds formadas em Lamego.

A boina vermelha, que ouvi dizer cá que não é vermelha mas magenta, só foi autorizada muito mais tarde.

Em 1964/65 estava-se na fase da formação de identidade, que incluia a cor da boina, mas não só.

Um abraço e obrigado pelo vosso interesse.

V Briote
ex-alf mil da CCav 489/ BCav 490 (Jan/Mai) e CCmds do CTIG (Jun 1965 /Set 1966)

25 de agosto de 2021 às 22:04

(iv) Tabanca Grande Luís Graça:

Fernando: Intuitiva e apropriada a tua observação. De facto, nas lendas e narrativas do Faroeste da nossa infância e adolescência, os heróis eram todos brancos e nunca podiam morrer. Hollywood alimentou (e matou) o nosso imaginário. O mundo está dividido entre fortes e fracos, heróis e vilões, índios e cobóis... E o melhor índio só podia dia ser... o morto.

Ainda cheguei, já no tempo do Spínola, a ouvir essa, em Contuboel e em Bambadinca, da parte dos meus soldados fulas: "Um balanta a menos era um turra a menos"... Como se sabe, o racismo nem tem cor nem bandeira, nomeadamente nas "guerras civis" (como também o eram as "guerras coloniais" em que, por "azar do destino",  nos calhou, sem termos feito mal a ninguém...).

26 de agosto de 2021 às 08:36

(v) Tabanca Grande Luís Graça:

Afinal, boinas há (ou havia) muitos... Como havia bonés, chapéus e barretes, de todos os feitios, grandes e pequenos...

Eu aceito plenamente a explicação do Gil (, leia-se: Vb, ou Virgínio Briote). Ele é a honestidade intelectual em pessoa e, como nosso autor e nosso coeditor jubilado, o blogue deve-lhe muito).

Não tenho dúvidas, pois, que as boinas da foto fossem vermelhas, mesmo que a foto tenha sido "retocada" para efeitos de melhoria da sua resolução... Nessa altura, na decadência do Estado Novo, já se podia dizer "vermelho". Mas no auge do regime de Salazar, nos anos 30/40, a palavra era proibida. Oficialmente, o "vermelho" não fazia parte do espectro das cores do arco íris... Até a tinta, nas repartições públicas, era azul ou "carmezim".

26 de agosto de 2021 às 10:24 
__________

Notas do editor:


(**) Último poste da série > 19 de agosto de 2021 > Guiné 61/74 - P22468: Fotos à procura de... uma legenda (147): A imagem da capa do livro de Pedro Marquês da Silva, "Os números da guerra de África" (Guerra e Paz Editores, 2021)

6 comentários:

João Carlos Abreu dos Santos disse...

Reporto-me à informação sobre "boina" de tecido camuflado:
Foi usada, na Guiné, não apenas pela 3ªCCmds como igualmente pela sucedânea 5ªCCmds.

João Carlos Abreu dos Santos disse...

Sobre o "livro"...
Concordo, 'grosso modo', com a recensão crítica que Luís Graça emitiu.
Quanto à ilustração da capa do citado livro:
1.- Aquele registo fotográfico remonta ao dia 10Jun1973, após cerimónia do Dia de Portugal celebrado em Bissau;
2.- O original daquele registo fotográfico, tanto quanto é de meu conhecimento, terá pertencido ao veterano Joaquim Artur Spínola Martins (furriel miliciano comando da 35ªCCmds), o qual em tempo foi partilhado algures através da internet;
3.- No original fotográfico, consta, ao lado direito do alf cmd Marcelino da Mata, o furriel cmd Joaquim Spínola;
4.- A colorização da boina - em tom vermelho escuro -, é um logro, porquanto Marcelino da Mata nunca na Guiné alguma vez usou uma "boina vermelha", principalmente numa cerimónia militar!
A foto de capa foi objecto de grosseira manipulação, fosse pela editora ou pelo autor, pelo que aqui exorto o jornalista a vir a este blogue prestar os devidos esclarecimentos, incluindo comprovada declaração de ter sido obtida autorização, do retratado (ou post-mortem de seus familiares), para a manipulação referida e como tal servir de gongórica capa a uma "narrativa", a qual, de forma também abusiva, além de insistir no tal "vietname português", pretende comparar Marcelino da Mata e a gesta de militares portugueses na Guiné (1961-1974), a... John Wayne e fitas do far-west!

Anónimo disse...


João Parreira

27 ago 2021 17:07

Olá, Luís, Sobre as boinas recordo-me que em 1965 - possìvelmente na altura em que foram tiradas as fotos com os 5 camaradas de boina vermelha (que desconhecia) saí de Brá e fui para a esplanada de um café em Bissau, de boina vermelha (tinha mandado tingir a castanha).. Passado algum tempo parou um jipe perto de mim, e um dos soldados disse-me que por ordem do comandante, que teve conhecimento da boina que estava a usar, e como tal, tinha de regressar a Brá no mesmo jeep..

Votos de saúde e um bom fim-de-semana. Ab,. João

Anónimo disse...


E.Esteves de Oliveira (by email)
27 ago 2021 18:34

Caro Luís,
Boinas encarnadas, à experiência ou não, surgiram em fins de 1964, princípios de 1965, já eram usadas com muito ronco pelos Comandos, embora aparentemente só tivessem sido oficializadas em 1974 - antes ou depois do 25 de Abril, isso já não sei.
Antes, nem o Benfica era vermelho...
Esteves

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Obrigado, camarada...

Quanto ao Benfica (, abre-se uma exceção, de vez em quando, para se citar os nossos queridos clubes de futebol...), de facto nunca foi "vermelho", foi sempre "encarnado"... Ab, Luis

Fernando Ribeiro disse...

A primeira fotografia era a cores no original; não tenhos dúvida nenhumas quanto a isso. A passagem do tempo fez as cores alterarem-se profundamente e, quando a fotografia foi "sacaneada", ela já se apresentava com este aspeto completamente avermelhado. Não acredito que alguém tenha retocado ou pintado o que quer que fosse. Por que haveria de fazê-lo? Tentei recuperar as cores originais da fotografia com o auxílio de dois programas gratuitos que tenho aqui no computador (IrfanView e Xn_View, que aliás são muito semelhantes entre si), mas o resultado não é nada famoso: as caras dos militares europeus ficaram excessivamente amarelas. Logo, também os uniformes terão ficado demasiado amarelos. No entanto, para tentar corrigir o amarelo, tenho que mexer nas outras cores, que por sua vez passam a ficar desequilibradas e a emenda é pior do que o soneto. O fraco resultado a que consegui chegar pode ser visto aqui.