Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, Os Tigres do Cumbijã (Cumbijã, 1972/74) é natural de V. N. Famalicão. Engenheiro ténico e professor reformado, vive em Fânzeres, Gondomar.
Em boa hora o Joaquim Costa decidiu, no princípio do ano de 2021, deixar de ser um “consumidor passivo”, um simples leitor, do blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, para se tornar um “elemento ativo”, um “autor”… E começou logo, ainda em plena pandemia de Covid-19, a pré-publicar alguns excertos (cerca de 2 dezenas) do livro que agora deu à estampa. Todos ficámos a ganhar, a começar por ele, que, ao expor-se-à crítica dos leitores, muitos deles antigos combatentes, receberia em troca cerca de 170 comentários “a quente”.
O que seguramente ajudou a melhorar a versão final deste livro que eu saúdo e agradeço: vem enriquecer o património literário e documental da Tabanca Grande, que é uma tertúlia virtual centrada na experiência de uma guerra, a guerra colonial (1961/74), e em particular a da Guiné, sendo porventura a maior tertúlia do género, em português, quer pelo número de visualizações do blogue (cerca de 13,2 milhões, desde 2004) quer pelo número dos seus membros registados (N=854) e ainda pelo volume de memórias partilhadas. Memórias mas também afetos. E este livro é sobretudo um livro de afetos.
O Joaquim Costa é mais um talento literário que o nosso blogue veio revelar, com a particularidade de, sendo um bom minhoto, a sua prosa ter também belos nacos do português camiliano, a começar pela ironia, o humor e até o sarcasmo, tão bem patentes na reconstituição de algumas das suas memórias de infância e na evocação da sua família, bem como na descrição de cenas da vida castrense.
Já tive ocasião de lho dizer, e agora passo a partilhá-lo com os seus futuros leitores: Joaquim, quisestes escrever um livro com uma parte da tua história de vida, que é também a de muitos de nós, e que quiseste dedicá-lo aos que te amam e estimam. A tua narrativa tem momentos portentosos sobre a epopeia de Cumbijã e de Nhacobá, os seus bravos e as suas vítimas. Um dia, quando fizermos uma antologia dos nossos melhores textos, o teu testemunho, na 1ª pessoa, sobre a Op Balanço Final (17-23 maio 1973), por exemplo, terá que lá figurar, com toda a justiça.A historiografia militar pode, em meia dúzia de linhas secas, telegráficas, resumir aquela “guerra de baixa intensidade”, num contexto geopolítico marcado pela guerra fria e o fim dos impérios, mas que não foi feita para “meninos de coro”, como todas as guerras... Mas faltar-lhe-á, por certo, à escrita do historiador, o nosso "sangue, suor e lágrimas", que na Guiné, no meu e no teu tempo, não foi uma figura de retórica. E é bom que os nossos filhos e netos saibam, por fim, que ali não fizemos só a guerra mas também a paz.
Joaquim Costa, ex-fur mil, CCAV 8351, Os Tigres do Cumbijã, Cumbijã, 1972/74 |
Obrigado, Joaquim, também por dares voz a muitos combatentes, de um lado e do outro, que nunca tiveram nem terão oportunidade de escrever, e muito menos de publicar, sob chancela editorial, as suas “vivências” sobre aquela guerra e aquela terra (que, estranhamente, acabou por ficar no nosso coração, contagiando até os nossos filhos). E muitas memórias vão morrer connosco...
Não quero acabar esta nota sem referir os sucessivos murros no estômago que, metaforicamente falando, recebeste, a começar pelo batismo de fogo, as primeiras minas e emboscadas, o primeiro morto... Na realidade, aqueles de nós (e fomos muitos) que passámos por essa dura, trágica, traumática experiência, sabe dar valor às tuas palavras onde há raiva e impotência mas também coragem e dignidade, quando falas do primeiro camarada que morre ao teu lado.
Mesmo sem quereres fazer juízos de valor sobre a legitimidade, a condução e o desfecho daquela guerra, acabas por nos mostrar, com fino mas cáustico humor, que às vezes acontecia sentirmo-nos como um bando de cegos, comandados por outros cegos, à beira de um precipício. Felizmente voltaste, “são e salvo”, para escrever este livro e dares mais valor e força à liberdade, à justiça, à paz e à solidariedade.
Luís Graça, sociólogo,
editor do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.
(**) Vd,. poste de 31 de dezembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22861: Notas de leitura (1404): Joaquim Costa, "Memórias de guerra de um Tigre Azul: O Furriel Pequenina. Guiné: 1972/74", Rio Tinto, Gondomar, Lugar da Palavra Editora, 2021, 180 pp. - Parte I: "E tudo isto, a guerra,para quê ? Não sei"...
6 comentários:
Costa
Estou muito longe, mesmo que botasse agora os pés ao caminho, não tenho bater dos foles para viajar até ao barbeiro, quanto mais até Gondomar.
Boa apresentação/confraternização é que é preciso.
Abraço e saúde da boa
Valdemar Queiroz
ps (não confundir com sigla partidária) ainda não li o livro todo.
Amigo Valdemar,
Nunca dei grande valor às redes sociais
Não sou dado a coisas virtuais
Para mim é fundamental o contacto pessoal
Um aperto de mão, um abraço, etc., etc.,...
Contudo, a descoberta e a participação no blogue, veio, de certa forma, alterar a minha forma de ver estas “modernices”
Nunca estive contigo, nunca te apertei a mão e nunca te dei um abraço (nem um bj!!!), contudo sinto que estou perante um amigo de longa data. Estranho, ou talvez não! Somos dois Minhotos…
Valdemar não vai a Gondomar
Quem sabe, um dia, Gondomar vai a Valdemar…
Um grande abraço e muita saúde
Joaquim Costa
Um gesto honito.
Valdemar
não vai ao ar
nem vai ao mar
e se calhar
sem respirar
e sem andar
pode ficar
a esperar.
Saúde da boa
Valdemar Queiroz
Caro camarada Joaquim Costa
Muitos parabéns pela edição do teu livro, as memórias que às gerações futuras têm de ser transmitidas estão ali contempladas.
lamento não estar presente no lançamento do teu "Tigre Azul de Cunbijã" que em pouco tempo "devorei" na leitura. A distância entre Alverca e Gondomar é grande. Mas com frequência passo em Sobral de Monte Agraço e me recordo do comentário "da velhice" à porta do mercado municipal.
Um grande abraço
Lá estarei, no dia 11 de Junho. E tenho todos os melhores motivos para abraçar o Joaquim Costa nesse dia. Vou assistir ao lançamento de um livro que qualquer combatente lerá com entusiasmo e comoção, ainda que haja por entre algumas páginas motivo de sorriso e até de riso. Está ali tudo, sobre um período muito quente da guerra da Guiné, que o Joaquim retrata com uma grande honestidade. Não se vangloria de nada o Joaquim, apenas descreve o que foi, com um grande rigor e seriedade. Eu sou testemunha de muito do que ele nos oferece no seu retrato da guerra de Combidjã, passada ali bem perto do sítio onde também cumpri o papel que me coube.
Um abraço para o Luís, para o Joaquim e para todos os combatentes.
Carvalho de Mampatá
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