sábado, 29 de julho de 2023

Guiné 61/74 - P24515: Os nossos seres, saberes e lazeres (583): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (113): Oh Bruxelles, tu ne me quittes pas! (4) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 1 de Junho de 2023:

Queridos amigos,
Espero não voltar a envolver-me em empreitadas deste tipo, depois de me ter regalado no museu com a impressionante exposição sobre tesouros escondidos, aceitei fazer o programa das oito igrejas históricas, isto sem esquecer que pretendo visitar o Museu do Holocausto. Ora, não se viaja sem procurar ver edifícios representativos, belas praças, jardins, percorrer prazenteiramente uma cidade como esta, ainda por cima em dia de céu azul, ensolarado e de tempo ameno. A catedral é de facto um tesouro, quem vê a carcaça não vê o interior, de uma enorme riqueza, como igualmente a igreja de S. João tem imenso esplendor, desconfio que a partir de agora vai ser como cão por vinha vindimada, importa visitar a igreja de S. Pedro, há a da Beguina (estrutura medieval para recolher idosos) e outras, aqui pontifica o barroco e depois de um dia destes espero fazer uma cura de águas, resistir à tentação de entrar tão cedo noutros esplendores do barroco.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (113):
Oh Bruxelles, tu ne me quittes pas! (4)


Mário Beja Santos

Haverá momentos, à procura do cumprimento do roteiro das oito igrejas em passeio pedestre, em que não sei a quantas ando, até me recordei daquele dia em que pela primeira vez entrei na Galeria dos Ofícios, em Florença, isto no tempo em que os museus italianos estavam abertos entre as 8h30 e as 14h30, tinha feito o meu trabalho de casa do que pretendia ver de grandes mestres, pus-me na bicha ainda não eram 8h, entrei parecia um touro desembolado, comecei pelos génios do Duecento, era tal o deslumbramento, era tal a vontade absorver aquela bela pintura que só conhecia dos livros que quando cheguei aos grandes mestres do século XV, senti uma dor de cabeça tal que voltei para o hotel, tomei um analgésico e jurei para nunca mais me meter em semelhante empreitada, quem quer ver com critério tem que selecionar. Sabe-se lá porquê, ando por aqui empolgado, Malines tem feitiço, gosto a sério desta combinação entre o antigo e moderno, é uma cidade cheia de aprumo, a catedral, a que já fiz referência, é imponente, passeio-me pelas ruas e dou conta do zelo com que tudo se preserva, a casa das corporações, o antigo hospital, o edifício das manufaturas de Wit (hoje a mais importante oficina de restauro de tapeçarias históricas do mundo), o edifício dos arquivos de Malines, a estatuária, a reprodução com bom gosto dos sinais antigos de indicação dos lugares. Bom, alma em Almeida, atiro-me de novo ao programa das igrejas, já está estabelecido o limite de horário, o dia em Malines encerrará no Museu do Holocausto, digo adeus às questões do critério e fico com a impressão que não será tão cedo que entrarei em igrejas barrocas, mesmo que estejam pejadas de inigualáveis tesouros artísticos.
Despeço-me da catedral, a carcaça é do século XIII, confesso que gostei de muitos pormenores, há bastante delicadeza nos altares laterais, saio e contemplo demoradamente a visão deste gigante de pedra que se embebe noutra arquitetura, muito própria do tempo. E vou a caminho de outra igreja.
Este pormenor na Grand Place é bem curioso, será seguramente uma réplica, preserva os elementos típicos e está cheio de charme.
Fazia parte do programa visitar o Grande Seminário, confesso a desilusão, vendo esta fachada ainda é possível sonhar que o interior guarda correspondência, não será assim, ainda por cima a igreja está fechada e as instalações estão ocupadas pelo dia a dia de um conjunto de identidades. Este grande seminário tem como antecedente um antigo colégio onde se assegurava a formação dos padres, o que agora nos é dado ver é da segunda metade do século XIX, é bem provável que haja no seu interior edificações do século XVIII, se as houver irei confirmar na próxima visita (porque vontade de voltar não me falta).
Estamos agora na igreja de S. João, fica perto do museu Hof van Busleyden, o templo deve o seu nome a S. João Baptista e S. João Evangelista e os dois figuram no esplendoroso retábulo pintado para esta igreja por Rubens, em 1616-1617. A obra foi pilhada pelos franceses durante a Revolução Francesa mas regressou mais tarde a Malines, mesmo com algumas perdas.
Fabuloso altar de Rubens
Pormenor escultórico, tivesse eu tempo, ficaria aqui sentado em contemplação.
Mais uma pintura de Rubens numa capela lateral.
Fiquei com a impressão neste dia de ter contemplado alguns dos mais sumptuosos púlpitos da era barroca, Malines não terá razão de queixa de ter alguns dos mais impressionantes trabalhos em madeira deste tipo.
Preparava-me para sair quando fica especado pelas dimensões e proporções do órgão, o que gosto mais, confesso, é a harmonia da integração de uma peça tão majestosa, leve e elevada em contraste com o suporte da madeira, não será tão maciça devido às belas esculturas que ornam as portas de entrada.
De novo no ar livre, vinha à procura de um banco para esticar as pernas e folhear os guias que me acompanham para tentar entender melhor as riquezas desta Burgúndia que confinava com a Borgonha francesa, ainda não encontrei explicação cabal se esta Burgúndia dos Países-Baixos meridionais também era crismada por Borgonha. E se registo aqui estas duas imagens é para recordar que Malines era uma capital e não devia ser nada insignificante, aqui foi educado o futuro Carlos V antes de viajar de barco e aportar nas Astúrias, e daqui seguir para Madrid para ser sagrada imperador.
Pronto, ainda tenho mais igrejas para visitar, sinto a pressão do tempo e jurei a mim próprio que nem que seja por meia hora ainda passarei pelo Museu do Holocausto.

(continua)

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Nota do editor

Último poste da série de 22 DE JULHO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24496: Os nossos seres, saberes e lazeres (582): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (112): Oh Bruxelles, tu ne me quittes pas! (3) (Mário Beja Santos)

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