Miradouro do Vale do Sabor
Foto: Câmara Municipal de Moncorvo, com a devida vénia
1. Em mensagem de 22 de Outubro de 2023, o nosso camarada Francisco Baptista (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616 / BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72), enviou-nos mais um excelente texto, desta feita, a sua ida para o Seminário:
A minha viagem para o Seminário
Até aos doze anos, para oeste de Brunhoso, nunca passei além do rio Sabor, que banhava esses limites da minha aldeia, onde ia por vezes no Inverno a ajudar à apanha da azeitona da Barca, no Verão a apanhar a amêndoa do Picão ou a apanhar os figos, dumas figueiras que a minha mãe tinha herdado, na ribeira das Picotas.
Para norte na direcção do planalto mirandês ia muitas vezes às feiras quinzenais de Mogadouro, por um caminho de terra batida, eram só cinco quilómetros, tocava com a vara vacas e vitelos que o meu pai queria vender, nas feiras quinzenais, que se realizavam num descampado enorme, onde se juntavam muitos animais, os seus donos ou os filhos deles e os compradores e intermediários, o mais conhecido tinha por alcunha o "Chispas", homem falador e irrequieto, natural da vila.
Nunca fomos ricos mas nesses anos com os meus pais em princípio de vida comum, era difícil esticar a manta para tapar umas necessidades pois outras podiam ficar a descoberto.
Recordo-me da casa onde nasci, eu e os meus três primeiros irmãos, todos varões, terei vivido lá dois anos. Casa muito humilde só com duas divisões, uma sobrelevada onde estava a cozinha e a lareira, coberta de telha vã, sem chaminé, o fumo saía por uma abertura que podia ser tapada, no caso de muita chuva ou neve, com uma chapa de metal. Descendo cinco degraus de madeira era o quarto, único, bastante espaçoso e forrado a madeira. Esta casa, contígua à casa grande dos seus sogros, terá sido herdada pela minha avó paterna, de uma parenta pobre chamada Maria "Pequena", casada mas sem filhos.
Anos difíceis para os meus pais, com poucos bens para se governarem, somente algumas terras de cultivo de cereais, emprestados pelos pais deles, e uma pequena horta, os filhos nasceram ao ritmo de um por ano, o nosso pai de compleição atlética mas a ter que tratar-se de doenças quase incuráveis para a época, uma delas a tuberculose, da outra não falo.
Sem saber se pelas condições insalubres da casa, o vento, o frio e calor a que estávamos sujeitos, ou pela falta de assistência médica, morreram dois desses meninos, outros viriam e meninas também, já nascidos em casas maiores, mais arejadas e confortáveis.
Para além dos produtos da horta e da carne de um ou dois porcos que a nossa mãe criava com farelo, castanhas, batatas e hortaliças, de que se curavam os toucinhos e os presuntos, e se faziam muitos enchidos, criava também galinhas e perus que davam ovos, que eram bons cozidos, em omeleta, ou estrelados com algum açúcar no final eram um manjar para mim, davam também boa carne para ocasiões especiais e festas, e para as alheiras que só podiam levar carne de aves ou de vitela, de porco não, segundo a tradição judaica.
Poucos produtos alimentares se compravam para a dieta alimentar da família, para além de algum peixe que a vizinha, tia Clementina, vendia na época própria, que poderia ser sardinha ou chicharro dividido para dois ou três, conforme o tamanho, para dar mais sabor às batatas e às couves, aos tomates, às vagens, aos pimentos e a outras hortaliças que a horta produzia com abundância.
A década de sessenta do século passado, depois do restabelecimento dos povos e das nações após o cataclismo da Segunda Guerra Mundial, foi muito fértil em acontecimentos sociais, políticos e artísticos. Portugal, um pequeno país, guardado de influências externas pelo Oceano Atlântico, a ocidente, e pela Espanha franquista, fascista e imperial a leste, protegia-se da liberdade, da cultura e do progresso, pela vontade férrea de Salazar, um velho ditador puritano e asceta, durante muitos anos educado num seminário e que não querendo ser bispo, tinha uma ambição maior, ser um rei absoluto de Portugal, como os reis da Idade Média que recebiam o poder de Deus, através do Papa que os legitimava. Sem poder ser rei, tinha sangue plebeu, Salazar enquanto governante comportou-se como um rei absoluto sem coroa, tal como o ditador Francisco Franco em Espanha.
Não havia progresso, para além da agricultura e pastorícia, pois ele crente ou já descrente estava a viver nos tempos bíblicos das suas leituras religiosas que tinha vivido também na paz e bucolismo da sua infância.
Os lavradores, refiro-me a todos os que sozinhos ou com a ajuda de familiares ou pagando a trabalhadores, tinham as mãos calejadas e as sujavam na terra, com mais conhecimentos e instrução, já quase todos tinham a quarta classe, dão-se conta que com tantos filhos nascidos depois da última grande guerra, que os poucos hectares de terra que possuem, cada vez mais dividida pelos filhos, em herança, após a morte deles, mal lhes dariam alimento que bastasse a todos.
Sem máquinas agrícolas ou meios técnicos que possam pagar e sem trabalhadores agrícolas, que no limite da pobreza, estavam em fuga para a Europa rica para lá dos Pirinéus, sem terem meios económicos para pagarem a educação dos filhos em colégios ou pagarem a sua hospedagem nas cidades ou vilas onde havia os estabelecimentos de ensino oficiais, mandam os filhos a estudar para os seminários, onde os custos são menores. Tenho pensado que nos finais da década de cinquenta, Salazar terá conversado com o seu amigo e colega do Seminário, o Cardeal Cerejeira, duas faces da mesma moeda, em conhecimentos e sagacidade, um e outro, quando os seus olhos vivos, perscrutavam a sociedade, Salazar com a ajuda da polícia secreta e dos informadores, começam a dar-se conta que a juventude se afasta da Mocidade Portuguesa, da Igreja e de outros convívios "saudáveis". Muitos estudantes universitários contestam a autoridade e o Estado Novo, influenciados por ideologias de esquerda.
Será especulação ou hipótese académica, ambos conservadores religiosos e políticos, terão concluído que para afastar a juventude das ameaças das ideologias de esquerda que a podem corroer como um cancro, o melhor será franquear as portas dos seminários para educar e formar jovens mais às suas imagens e semelhanças.
Nesses meus verdes anos, dei-me conta na realidade de que houve uma mobilização de párocos e de padres de ordens religiosas a querer entusiasmar os jovens nesse sentido, com o agrado das mães contentes por poderem vir a ter um filho padre e os pais a terem um filho a estudar com poucos gastos.
Se chegassem a padres teriam um futuro, digno, sagrado segundo mães, se não conseguissem esse objectivo, muito difícil, poucos o conseguiam, poderiam fazer alguns estudos por preços bastante económicos que lhes poderiam dar acesso a um emprego no Estado, num banco, nos seguros ou nalguma empresa, que os poderia libertar da dureza do trabalho da terra e poderiam aspirar a uma vida mais limpa e digna, com outro prestígio aos olhos dos seus concidadãos e com mais vantagens económicas.
Dos seminários saíram poucos padres mas muitos estudantes, alguns com os estudos liceais completos, outros a meio ou perto do fim, muitos deles nas décadas de 60 e 70, foram preencher as necessidades de quadros milicianos militares da guerra colonial, alferes, furriéis e até capitães, na sua maior parte o regime confiava que eles não tivessem sofrido influências das doutrinas de Marx, Lenine, Mao-Tse-Tung ou dos reformadores republicanos e socialistas.
Alguns tiraram cursos superiores, da minha aldeia, o padre Neto, falarei dele adiante, formou-se como padre nos anos quarenta, nos anos cinquenta o meu amigo Francisco Carvalho, depois de muitos anos de seminário saiu e doutorou-se em filosofia e nos anos oitenta saiu padre o meu parente José Cordeiro. Os três estiveram na congregação dos Salesianos tal como eu e outros mais.
Quando no primeiro trimestre de 1969, o Batalhão de Cadetes milicianos de Mafra, na foz do Lizandro, atroou os ares, nessa noite escura e trágica, com gritos de assassinos e vamos embora, pela morte de três camaradas por incúria e desleixo dos instrutores, responsabilizando o comandante que tinha ficado no quartel, quem deu as palavras de ordem foram os estudantes universitários do Porto, Coimbra e Lisboa. Conheci bem um dos mortos, era um ex-seminarista, educado, afável, humilde, dormia perto de mim na camarata, no corredor oposto ao meu, foi o meu primeiro camarada conhecido a morrer nessa maldita guerra, recordo-o ainda com mágoa.
Somente depois de fazer a quarta classe, para meu gosto e desgosto, obedecia, os meus pais mandavam, fiz uma grande viagem para o Seminário de Mogofores, na Beira Litoral, onde o meu irmão mais velho já tinha estado um ano, os outros mais novos teriam como primeira grande viagem destinos semelhantes. Eu gostava de ir estudar, ir para o seminário nem tanto, nunca gostei de rezar mas o dinheiro era pouco. Os seminários faziam preços económicos para alojamento e alimentação, poderia até ser grátis para os filhos dos mais pobres.
No meu caso, quem me procurou entusiasmar para ir para de Mogofores foi o padre Neto da congregação dos Salesianos, amigo da casa dos meus pais, como a família dele. O pai dele era um homem respeitável na comunidade, tal como a sua mãe. O pai era um barbeiro, de ar calmo e sabedor em fazer curativos e aconselhar pomadas e chás para outros problemas. A mãe era uma senhora delicada, muito religiosa, socialmente muito estimada. Tiveram também uma filha freira, da mesma congregação religiosa.
Pela vida fora eu e o padre Neto, fomos sempre amigos, sendo eu adolescente e ele um homem já perto dos quarenta anos, sentia-me lisonjeado por ele me tratar, tu cá, tu lá, como um igual.
Em textos anteriores já enfatizei a beleza das minhas viagens pela linha do Sabor e do Douro. O vale do Douro português será provavelmente um dos vales mais belos do Mundo.
O vale do Sabor é belo, emociona-me, arrepia-me, é o meu vale de lençóis, de águas bravas, águas azuis, verdes, castanhas cinzentas, hoje com a construção da barragem, de águas calmas, de ladeiras cobertas de oliveiras, amendoeiras, de salgueirais, troviscais, reflectidas em grandes espelhos de água.
Esta é sobretudo uma viagem no tempo, a idade não me permitia muita independência de espírito, estava muito ligado à terra, para a adjetivar com palavras belas. Dos montes da minha terra, dos vales, rios e ribeiros, gostava sem o saber, como gostava dos meus pais e irmãos, sem que que lho confessasse. O rio Douro tinha maior caudal e maiores arribas do que o Sabor.
Mal recordo a cidade do Porto, terei mudado logo, na estação de S. Bento para linha do Norte em direcção a Mogofores. Na linha do Norte, espreitei o mar que com curiosidade, nunca o vira, ter-me-ei dado conta da transformação da paisagem, sem montes, tão plana, tão diferente da transmontana.
Ainda hoje estranho um pouco as paisagens planas, dá-me a impressão que mudei de país. A região de Aveiro pela planura e pela ria lembra-me sempre a Guiné.
A linha do Sabor, que seguindo o rio a alguma distância, não o mostrava, já não existe, foi abandonada como todas as outras linhas dos afluentes do Douro, por ordem de um governante iluminado do poder central de Lisboa, com poucos protestos da capital do Norte. Não há norte ou sul, em Portugal há interior e litoral, no litoral vivem os cidadãos e no interior alguns indígenas em fase de extinção.
Na minha viagem para o seminário de Mogofores, terei ido só ou acompanhado, já não me lembro, sei que levava uma grande mala de cartão, não havia outras, com roupa marcada pela minha mãe, com as minhas iniciais, lençóis e toalhas também. Levava roupa para um ano, as distâncias eram grandes, os comboios lentos, não haveria férias de Natal ou da Páscoa.
Sendo um filho obediente, com um espírito rebelde, aceitava a necessidade de ir para o seminário, atendendo às dificuldades económicas da família que crescera, já éramos sete irmãos. A vida na agricultura nesse tempo era dura, além disso eu gostaria de aumentar os meus conhecimentos.
A minha predisposição à partida seria idêntica à dos meus conterrâneos, novos ou velhos, quando partiam para o Brasil e dos outros que saltaram fronteiras em direcção à França, a necessidade de melhor futuro fazia-nos partir a todos.
Não gostei da vida do seminário, muita igreja, logo pela manhã depois de levantar, muitas rezas, muitas filas por longos corredores húmidos, frio, fazia-me falta uma lareira, padres muito religiosos mas com pouca alma. Por vezes falava com o cozinheiro para matar saudades, era da minha aldeia, surdo, tinha aprendido a escrever, a falar e a arte da cozinha, numa casa de apoio para rapazes com dificuldades, no Colégio dos Órfãos no Porto dirigido por essa congregação.
Perto do Natal terei cometido uma barbaridade, um erro grave, um grande pecado que não consigo lembrar, por esse motivo fui chamado ao Prefeito, o padre que administrava a justiça com severidade, por quem fui punido com a dureza que se impunha, fortes reguadas. No final do castigo, furioso lancei o meu grito de revolta e disse a esse padre vermelhusco, mirandês de Ifanes, que ele não era meu pai e que portanto não tinha direito de me maltratar assim.
No dia seguinte fui falar com o Director, um padre naturalmente, a dizer que queria regressar a casa. Não me deixaram, obrigaram-me a passar o ano nesse "quartel", frio e húmido, o pior que conheci na minha vida.
Não gostei de Mafra, o tenente de instrução do meu pelotão era um sádico, que nos meses frios e húmidos do Inverno, nos tratava como animais, para meu desgosto era natural do Nordeste Transmontano.
O frio húmido do litoral entrava-me dentro pela carne e pelos ossos, o frio dos meus montes era mais agreste mas mais seco, era um ar frio que me afagava, ainda hoje é assim.
Nesse tempo os seminários condicionavam mais a personalidade dos jovens adolescentes do que a vida militar, pela disciplina excessiva, pelas práticas e o ensino religioso, tão obsoletos. Para os seminários iam jovens pré-adolescentes mais fáceis de moldar, para a tropa iam jovens já adultos, quase homens feitos.
No século passado, os seminaristas eram reconhecíveis por terem um semblante demasiado sério, quase triste, como se os anos de recolhimento e clausura lhes tivessem roubado, a alegria, a imaginação e os sonhos. A Igreja é uma instituição hierárquica, tal como a tropa que foi copiar a organização à Igreja. Em ambas se cultiva o poder e a ostentação para dominar e impressionar os simples cidadãos, há bispos, arcebispos, padres, generais, coronéis, capitães, todos muito vaidosos e vistosos, Deus, um velho já cansado a todos absolve.
Salazar esteve quarenta anos no poder, pela sua graça, de alguns polícias demoníacos e com a ajuda da Igreja e das Forças Armadas.
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Notas do editor
Último poste da Francisco Baptista de 6 DE JUNHO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24374: (In)citações (246): O regresso dos Soldados (Francisco Baptista, ex-Alf Mil Inf)
Último poste da série de 24 DE OUTUBRO DE 2023 > Guiné 61/74 – P24787: Coisas & loisas do nosso tempo de meninos e moços (13): 50 ofícios e profissões de antigamente, extintos ou em vias de extinção (Luís Graça, Lourinhã)
14 comentários:
Belo texto Francisco!!
E ainda há quem!!!!!!........
Abraço fraterno
Eduardo Estrela
Quem não gosta ? Numa linguagem espontânea, sem filtro, tu, amigo Francisco, fazes brotar desse teu veio para a escrita, narrativas dos sítios por onde passaste, de um modo que nos prendes à leitura, sem pressa de chegar ao fim. Parece que estou a ver a casa onde nasceste e todos os recantos.
Um grande abraço e continua.
Carvalho de Mampatá.
Oh!, Francisco, que bom é poder voltar a ler-te, aqui no nosso blogue. Há uns tempos que náo aparecias. Mas eu já te tinha desafiado: Brunhoso e as tuas memótias de infància tinham que marcar presen nesta nova série das coisas e loisas do antigamente...
Gostei mesmo de ler o texto e apreciar a franqueza, frontaçlidade, autenticidade... Faz-me lembrar o Miguel Torga, de "A Criação do Mundo"... Um dia destes reproduzo também aqui a descrição, genial, qie ele faz da sua ida, contrariado, para o seminário de Lamego, com um burro com a cama e os tarecos, a mãe â frente e o pai atrás, palmihando umas dezenas de quilómetrosz... e o puto a rosnar pragaS, ebelde como tu, ou não fora também transmontano.
Sobre o seminário, os ex-seminaristas, a tropa e a guerra, ainda há muito que dizer. Tocaste em muitos pontos sensíveis. Sei do que falas... Mas há uma plêiade de gente que passou pelos seminários e que ilustram ou ou ilustraram as letras, as artes, as cièncias, o jornbalismo, etc., do país... Estou-me a lembrar, assim de repente, além do Miguel Torga, do Virgílio Teixeira, do José Marmelo e Silva, do Aquilo Ribeiro, do Camilo, etc.
Tu não escreves Francisco (embora escrevas bem), tu conversas, cujos interlocutores tanto pode ser o madeiro a arder num dia de inverno no teu Brunhoso, como um amigo confidente, sentados na margens do sabor num dia de outono. A preocupação não é a qualidade da narrativa (embora esteja perfeita, como sempre) mas as lindas imagens que constróis a partir das tuas vivências e das tuas palavras, que me fazem lembrar Torga e Aquilino.
Os amigos que conheço de Trás-os-Montes e da Beira Alta, quase todos passaram pelo seminário e todos eles transportam os mesmos sentimentos que sobressaem da tua narrativa.
No Minho, sendo uma das regiões mais católicas (senão a mais católica) do país, é minha convicção que o fenómeno não era tão acentuado.
Para meus pais, os dois analfabetos, não se ia à igreja. Vivia-se a igreja. A igreja era o centro da sua vida e do seu pequeno mundo. Passei por todas as estações: Batizado, crismado, cruzado, anjinho e mais que se possa imaginar.
Corroborando o que dizes, um dia apareceu um padre na hora da catequese, falando sobre a vida no seminário, contando a sua experiência, da alegria que é ter Deus no coração… Tal e qual a "Psico" na Guiné.
Fiquei maravilhado com o homem e já me estava a ver no seminário.
Cheguei a casa todo entusiasmado e logo disse aos meus pais: Quero ser padre. Quero ir para o seminário. Resposta pronta do meu pai: Tem juízo nessa cabeça!
Joaquim Costa
É um prazer ler-te,amigo Baptista
desde á muito tempo.Já o disse e volto a repetir,
os teus textos,são imagens que se
desenrolão com a leitura.E é esse o segredo(?)ou o saber
de um bom escritor....Um abraço e continua.....
Ora viva Francisco Baptista, saúde!
Após um longo interregno, é com muito gosto que leio e comento o teu Post, de imersão no teu passado de menino e moço, nas tuas origens de Brunhoso, nesse Trás-os-Montes de altos relevos e lindas paisagens, de almas profundas.
As tuas descrições são muito interessantes, deixando imagens muito claras dos espaços físicos e dos ambientes sociais em que viveste.Também as tuas considerações sócio-políticas e religiosas nos transportam a esses lugares e a esses tempos, tão diferentes dos de hoje.
Parabéns pela tua escrita escorreita, de memórias e estados de alma, do menino de outrora e do homem de hoje.
Em comum, entre outras coisas, termos nascido nesse tempo de muitas dificuldades, em aldeias rurais, onde era muito duro granjear o pão de cada dia com que se sobrevivia. No meu caso, no seio de uma família pobre, de escassos recursos, com o pai resineiro/camponês/operário e com fraco salário. Mas não tive a oportunidade de ir para o Seminário e para frequentar a Escola Secundária, tinha que me deslocar diariamente para a Marinha Grande, que distanciava 13/14Km do Porto do Carro, à boleia, a pé e de bicicleta.
Mas isto é outra estória que não é para aqui chamada.
Um forte abraço e até uma próxima.
AMEN...
Eu cá fui para o seminário de Santarém por vontade do meu Avô materno que adorava,e que já tinha um filho padre.
Um dia fui ao director "espiritual" com a seguinte questão; quem é que criou deus ? em vez de me responder que ele sempre existiu,foi mais contundente e e convincente.
Deu-me uma grande carga de porrada.O resultado foi ter fugido do seminário e como consequência a expulsão.
Ainda bem, porque provavelmente hoje não seria o papa "chico" mas "moi".
Com o devido respeito para os crentes.
O anti-clerical primário e ateu militante
C.Martins
Francisco, que dizer?
Podia subscrever muito dos comentários antecedentes mas isso poderia ser indício de preguiça.
É certo que este texto, tão íntimo, mas ao mesmo tempo tão aberto ao exterior, quando em pinceladas breves, mas certeiras, descreves os enquadramentos de tão diversas situações, não é sobre "a guerra da Guiné" mas sem dúvida que mostra bem, ainda que de forma localizada (nem tanto, nem tanto...) como se vivia longe dos grandes aglomerados populacionais e do que era preciso fazer para, mais que viver, sobreviver!
Mais um "novo conto da montanha", um "fresco" sobre a vida em muitos lugares do interior rural, do nosso tempo e que afinal, tendo mudado, não está assim tão afastado.
Abraço
Hélder Sousa
PS
Em vez de "moi" queria dizer "moi-même"
Caro F.Baptista
Excelente texto que retrata a dura realidade das nossas aldeias.
ab
C.Martins
Olá Francisco. Sempre gostei dos teus textos. Ultimamente não os tenho comentado mas desta vez não resisto a contar o seguinte: Por razões semelhantes e à boa maneira do Nordeste também os meus pais (mais a minha mãe), a seguir à escola primária também me quiseram meter no seminário. Como eu tinha plena consciência que os meus pais não tinham dificuldades económicas para me porem a estudar no liceu, disse-lhes muito simplesmente, que se me pusessem no seminário fugiria na primeira oportunidade e que nunca mais me veriam.
Sabia que talvez eu não conseguisse levar isso p´ra frente mas o que é certo é que resultou.
Abraço
Fernando Gouveia
Eu já disse que gostava de saber escrever como o Francisco Baptista.
Esta abordagem do "ir para o Seminário" fazia parte da consciente educação de ser religiosamente obediente.(sxe sxoubesses o que custa mandar querias sxempre obedexer)
Desta vez, esqueci-me estar DPOC e até me pareceu estar a ouvir o Francisco Baptista a falar comigo com sotaque sibilante num Café, durante a tarde deste Outono já chuvoso mas ainda quente.
Saúde da boa
Valdemar Queiroz
Também eu aprecio com o maior prazer a prosa de Francisco Baptista, que nos dá uma descrição extraordinariamente fluente sobre a vida de um rapaz de uma pequena localidade do Nordeste Transmontano. Também eu comparo Francisco Baptista a Miguel Torga, mas já tenho alguma dificuldade em compará-lo a Aquilino Ribeiro. Embora o planalto beirão, a que Aquilino chamou "Terras do Demo", tenha uma enorme semelhança com as terras de Mogadouro, a prosa de Aquilino é demasiado erudita. Sobretudo o romance "O Malhadinhas", que retrata um almocreve que existiu de facto em Barrelas (atual Vila Nova de Paiva), chega a ser de leitura penosa, tão vasto é o vocabulário empregue, que nos obriga a recorrer constantemente ao dicionário. Há um outro escritor, agora quase totalmente esquecido, que talvez possa ser equiparado a Francisco Baptista, melhor do que Aquilino Ribeiro. Refiro-me a João de Araújo Correia, que foi um escritor do Peso da Régua, que retratou nos seus escritos a vida dura das gentes do Alto Douro.
Sempre que eu viajava de comboio entre o Porto e Lisboa, ficava "engasgado" com a palavra Mogofores, nome da localidade bairradina que tinha uma estação na Linha do Norte e onde o comboio também parava. Interrogava-me sempre, e sobretudo, sobre a maneira de pronunciar tão estranho nome. Só muitos anos mais tarde é que vim a saber: Mugufôres. Mais vale tarde do que nunca.
O autor do livro "Manhã Submersa" foi Vergílio Ferreira e não Virgílio Teixeira. Por outro lado, Camilo Castelo Branco não frequentou o seminário. Teve um padre como professor, o que não é bem a mesma coisa. Assim como uma andorinha não faz a primavera, um padre não faz um seminário.
http://www.camilocastelobranco.org/index2.php?co=57&tp=3&cop=66&LG=0&mop=141&it=paginas
Para não ser mal interpretado, quero acrescentar que eu não considero que os escassos meses em que Camilo passou pelo seminário tenham feito dele um ex-seminarista. A sua rebeldia não o terá permitido.
Sobre o que eu disse ou não disse, sobre o que outros disseram e o que omitiram , havia muito mais a acrescentar, bem o sei. O José Belo , um erudito, (uns são outros não são, eu não sou , o Fernando Ribeiro o disse e eu sem acrimônia o reconheço) lá longe , que pela distância e pelo estudo comparativo de outras sociedades mais desenvolvidas levanta questões pertinentes que despertam a minha mente sonâmbula.
Hoje não irei acrescentar muito mais ao que já foi dito e escrito, eu que não sou barítono ou tenor estou muito contente com os aplausos que recebi dos mais eruditos e de todos os outros, gosto de todos por igual.
Gostaria de ter feito um comentário final mais completo mas estive à espera do comentário do Fernando Ribeiro que eu aprecio muito , por fim apareceu e de um outro camarada mais antigo, que no passado os fazia curtos e convincentes e que agora , não sei se por se considerar velho, a partir dos 65 anos todos temos viagens baratas, todos somos velhos, fica mudo e quedo.
Jorge Picado, meu capitão não me abandones na bolanha, todos te ouvimos com atenção , todos gostamos de ti.
Estou a pensar escrever brevemente um post , já o tinha pensado, que possa desenvolver alguma coisa o diálogo que alguns camaradas propuseram.
Um grande abraço a todos
Francisco Baptista
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