quinta-feira, 2 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25471: Testemunhos - Será Que Pertenço à Geração D? Acho Que Sim (António Inácio Correia Nogueira, ex-Alf Mil da CCAÇ 16 - CTIG, 1971 e ex-Cap Mil, CMDT da CCAV 3487 / BCAV 3871 - RMA, 1972/74)


1. Mensagem do nosso camarada António Inácio Correia Nogueira, Doutor em Ciências Sociais, especialidade em Sociologia, ex-Alf Mil da CCAÇ 16 (CTIG, 1971) e ex-Cap Mil, CMDT da CCAV 3487 / BCAV 3871 (RMA, 1972/74), com data de 30 de Abril de 2024:

Caro camarada Carlos
Boa saúde, meu amigo.
Como pode ter interesse, envio-te um texto designado Geração D que está ligado a um Capitão da Guiné: Carlos de Matos Gomes.
Podes divulgar.

Abraço do amigo agradecido.
António Inácio Correia Nogueira



Testemunhos

Será Que Pertenço à Geração D? Acho Que Sim


Tenho a honra de ser amigo e admirador do autor do livro, publicado recentemente e que se intitula Geração D Da Ditadura à Democracia. Perguntei-me no final da viagem: será que pertenço à geração D, que o autor refere?

Carlos de Matos Gomes, um conhecido Capitão de Abril, foi um distinto oficial do Exército, com comissões em Angola, Moçambique e Guiné, onde protagonizou feitos que o classificam como combatente notável. É um douto investigador de história contemporânea, com inúmeras publicações em nome próprio ou em co-autoria. Com o pseudónimo literário de Carlos Vaz Ferraz, publicou dezenas de romances de entre eles Nó Cego – um fabuloso trabalho – testemunho sobre a Guerra Colonial – porventura, um dos melhores.

Pertenceu ao MFA da Guiné, o movimento charneira do 25 de Abril, de onde emergiram alguns dos seus heróis, feitos na guerra de Guidage e de muitos outros lugares de perigosidade maior, assim tornados pela guerrilha do PAIGC. De entre eles, reconheço, Salgueiro Maia.

Como afirma no seu livro, “Optou por lutar sem esperança de vencer em vez de tentar vencer sem coragem de lutar”.

Escrevi uma obra [Capitães do Fim do Quarto Império] para a qual Carlos de Matos Gomes me privilegiou com uma entrevista e comentou, posteriormente, da seguinte forma: “Um excelente livro para quem queira, com seriedade intelectual, perceber o esgotamento dos quadros na Guerra Colonial que foi uma das causas do seu fim. Contraria as bravatas dos patrioteiros e de mixordeiros da história… tem números, documentos…”.
Nesse livro, comentado pelo autor da Geração D, atrevo-me a escrever:
“Nos anos terminais da Guerra Colonial, a Academia Militar deixou de cumprir, por falta de candidatos, a sua missão capital: formar as elites militares intermédias de combate. Os Capitães do Quadro Permanente soçobraram. Ficou-se em presença de um Exército quase miliciano, num clima de forte contestação à guerra e de fraca motivação para lhe dar continuidade. No entanto, a defesa do Império, a todo o custo, era a política vigente, apesar do visível cansaço da Nação.

Para ajudar a obviar este desiderato, foi decretada a formação acelerada de Capitães milicianos na Escola Prática de Infantaria. Formaram-se à volta de cento e sessenta por ano. Em cerca de catorze meses fazia-se de um estudante universitário, quase sempre em estádio avançado de licenciatura, ou de um licenciado, um Capitão combatente para actuar nos teatros de guerra mais exigentes de Angola, da Guiné e de Moçambique. O modo de selecção destas novas elites pelejadoras, e a formação apressada a que foram sujeitas, deram ensejo a que alguns as apelidassem, desdenhosamente, de “Capitães de proveta” ou “de “aviário”. Eu fui um desses Capitães do Fim. Levei muitos meninos – soldado atrás de mim com a missão de os enquadrar, o melhor possível, em zonas de guerra intensa e evitar a sua morte. Passei o 25 de Abril pertinho de perecer, mas lutei para viver, eu e eles.

O livro do meu amigo, se bem entendi, fala da geração de militares que fizeram o 25 de Abril. Eu não fiz o 25 de Abril, mas contribui para que se desse. Pertenci, pois, à Geração D, “de dilemas, desobediência e também dever”.

Diz o autor da Geração D: “Esta geração protagonizou a grande mudança da história de Portugal, a que acabou com a guerra, a que acabou com a ditadura.” É a geração das lutas estudantis, dos partidos jovens de protesto, da deserção, da descolonização, das discussões políticas de café, da dialéctica, da utopia, da denúncia, da transgressão…

Como diz, mais à frente, Carlos de Matos Gomes: “A Geração D viveu sob um «regime de doidos» do Império e libertou-se dele, calhou-lhe ser a primeira geração que, pela liberdade e universalidade do voto, foi inteiramente responsável pelo seu futuro…
O D dos dilemas é também o do desafio e o do desprezo pelos desprezíveis da Geração D.”


Grande livro, para ler e meditar. Passaram 50 anos, viva o 25 de Abril…

_____________

Nota do editor

Post anterior de 25 DE ABRIL DE 2024 > Guiné 61/74 - P25445: Os 50 anos do 25 de Abril (13): Testemunhos - Numa Das Malas Velhas Da Minha "Fundação" (António Inácio Correia Nogueira, ex-Alf Mil da CCAÇ 16 - CTIG, 1971 e ex-Cap Mil, CMDT da CCAV 3487/BCAV 3871 - RMA, 1972/74)

9 comentários:

antonio graça de abreu disse...

Pois. Sem 25 de Abril de 1974 não haveria 25 de Novembro de 1975, ambos necessários.

Abraço,

António Graça de Abreu

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Nogueira, claro que pertences/pertencemos à geração D, a que nasceu na ditadura, fez a guerra e conheceu as alegrias da democracia...

Ficas convidado para partilhar, no nosso blogue, um ou outro capítulo do teu livro, que aches mais relevante, de maior interesse documental, sobretudo para aqueles de nós, como tu, que combateram no TO da Guiné e integram a Tabanca Grande. As questões que levantas no teu liuvro (que eu não li, a não ser pelas notas de leitura publicadas) são pertinentes: quem esteve na Guiné como eu, de junho de 69 / a março de 1971, e num companhia africana (CCAÇ 12), como tu, deu-se conta do gravíssimo problema que era a falta de comandantes operacionais, em número e em qualidade... E depois com as sucessivas baixas (e desvios de militares para os reordenamentos), os cabos substituiam os furriéis, os furriéis os alferes e os alferes os capitães...

Podemos depois falar sobre isso...

Um alfabravo. Luis

Valdemar Silva disse...

Parece que a grande alegria a nível nacional sentida por quase todos os portugueses em festejar o 50º Aniversário do 25 de Abril apoquentou alguns esquisitos que ainda não curaram o baile que levaram e por isso lembram-se do 25 de Novembro que ainda falta uns meses e mais de ano para ser assinalado.
Volto a repetir o comentário já feito noutro poste atrás.

No Jornal da CNN, de 27-04-2024, o Gen. Pezarat Correia é entrevistado e faz afirmações muito interessantes e razoáveis, abordando as grandes manifestações populares dos 50 anos do 25 de Abril e a polémica em torno das comemorações do 25 de Novembro.
Ele disse que sobre o 25 de Novembro fala-se para o ano e, porque não, o 11 de Março, adiantando como afirmou Eanes serem datas fracturantes e as datas fracturantes não se comemoram, assinalam-se.

Valdemar Queiroz

antonio graça de abreu disse...

O 25 de Novembro foi fractura, foi. Repôs finalmente a democracia e a liberdade.Em nome dos "grandiosos ideais de Abril" há quem não goste.

Abraço,

António Graça de Abreu

Valdemar Silva disse...

Há quem não goste dos grandiosos ideais de Abril : Democratizar, Descolonizar, Desenvolver.
E a chatice foram os milhares que festejaram por todo o lado o 50º Aniversário do 25 de Abril, aparecendo um esquisito cheio de medo a falar do que vai acontecer em 2025.

Saúde da boa
Valdemar Queiroz

Victor Costa disse...

Eu sempre liguei mais à Física e à Matemática e por isso tenho dificuldade em manipular e utilizar as palavras para atingir um objectivo. Mas uma coisa é certa eu vi e vivi a actuação do Sindicato dos Metalúrgicos na Refinaria de Sines, como tropa de choque do Partido Comunista durante o PREC e por isso convidou-os a visitar o Youtube para ouvirem a lição de três minutos e meio que Zita Seabra deu na CNN, ao Arménio Carlos sobre o 25 de Novembro de 1975.

https://www.youtube.com/watch?v=xZuPBFixD_E&t=20s

Um abraço,
Victor Costa
Ex.Fur.Mil.At.Inf.C.Caç.4541/72

Valdemar Silva disse...

Ah! Costa, Costa a vida custa.
Ver uma tropa de choque do Partido Comunista e conhecedor de armamento dos tempos da guerra da Guiné, não é só uma atitude física até dá para explicar por palavras.
E sobre esse assunto do 25N vamos esperar pelos dias, se este entusiasmo do 50º do 25 Abril continuar vão se abrir mais umas gavetas e armários para assustar as criancinhas.
Eu continuo na minha, o baile que os finórios levaram com o Movimento dos Capitães só pode ser atenuado com um 'ponham lá a música do 25 Novembro'.

Saúde da boa
Valdemar Queiroz

Victor Costa disse...

Ó Valdemar ! Está a custar-te ouvir a voz da líder da U.E.C. e Deputada do PCP Zita Seabra ?
Que chatisse o PCP ter só 12,46% nas eleições para a Assembleia Constituinte de 1975.
Tu que sabes manipular tão bem as palavras, não consegues substituir a palavra (convidou-os) por convido-vos.
Há, o termo tropa de choque é dela e diz outras coisas e cita nomes também interessantes. Já que eu não te posso convidar, vai ver o site.
Eu vou repetir.

https://www.youtube.com/watch?v=xZuPBFixD_E&t=20s

Victor Costa
Ex.Fur.Mil.At.Inf.C.Caç.4541/72

Valdemar Silva disse...

Ó Costa deixa-te disso.
Pese embora não nos podermos esquecer dos acontecimentos do "Verão Quente 1975", aqui no blogue evitamos discutir politica partidária e temos nos dado bem.

Valdemar Queiroz